sexta-feira, 19 de abril de 2024

FOGO ESTRANHO

Fogo estranho é a expressão bíblica utilizada para indicar o tipo de fogo trazido por dois sacerdotes e que foi rejeitado pelo Senhor (Levítico 10:1-3). A Bíblia diz que Nadabe e Abiú trouxeram fogo estranho diante de Deus e acabaram sendo consumidos.

Os intérpretes se dividem quanto a melhor interpretação da expressão “fogo estranho”. De fato o texto bíblico não revela explicitamente seu significado. Aqui vale ressaltar que as duas pessoas envolvidas naquele episódio, Nadabe e Abiú, tinham sido instruídas por Deus acerca de como proceder na ministração dos cerimoniais que faziam parte do culto no Tabernáculo.

Levítico 10 fala sobre como os dois sacerdotes se colocaram diante de Deus para lhe oferecer incenso. Porém, Deus não se agradou do que aqueles homens fizeram, e identificou aquilo como “fogo estranho”, algo que o Senhor não lhes tinha ordenado.

Com base em todo esse contexto, algumas possibilidades são apresentadas quanto ao melhor significado do que seria o “fogo estranho” apresentado pelos filhos de Arão. Vejamos:

Em primeiro lugar, a expressão “fogo estranho” pode se referir ao modo ilícito que os dois sacerdotes apresentaram o incenso a Deus. Talvez eles não tivessem observado a ordenança divina que regulamentava aquele procedimento.

Deus havia prescrito o tipo de incenso correto que deveria ser oferecido, e proibido qualquer tipo de “incenso estranho”. Deus também havia indicado como o incenso deveria ser ascendido e queimado (cf. Êx 30:37). O incenso deveria ser queimado continuamente, de manhã e de tarde. As brasas para ascender o incenso deveriam vir do próprio altar (cf. Lv 16:12,13).

Então Nadabe e Abiú podem ter utilizado incenso errado, ou mesmo usado incensários inadequados; ou ainda ascendido os incensários com brasas de fogo de outra fonte, e não do altar. Nesse último caso, os dois sacerdotes teriam literalmente trazido fogo estranho diante de Deus.

"No pátio da tenda da consagração, havia fornos onde os sacerdotes preparavam sua comida, e pode ser que Nadabe e Abiú tomaram o fogo desse lugar" (Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, vol. 1, p. 809).

Ellen G. White afirma: "Os filhos de Arão tomaram fogo comum, o qual Deus não aceitava, e insultaram ao infinito Deus, apresentando fogo estranho diante dele" (No Deserto da Tentação, p. 97).

Em segundo lugar, os dois filhos de Arão podem ter adotado uma prática que não havia sido prescrita. Talvez eles tivessem tentado executar certo cerimonial num momento inadequado, ou trazido uma oferta que não havia sido ordenada por Deus. Ainda nesse sentido, também existe a possibilidade de os dois sacerdotes terem se apropriado de funções que não lhes cabiam. Alguns intérpretes sugerem que eles acabaram usurpando uma função que era exclusiva do sumo sacerdote, e talvez tentaram até entrar no Santo dos Santos.

"Entrar no Santo dos Santos sem a aprovação divina poderia levar à morte. O mesmo fogo divino que consumira o sacrifício inaugural, provendo expiação para o povo, consome agora aqueles que se aproximaram do altar divino de maneira desautorizada. Assim, a mesma ira divina contra o pecado, que caiu sobre Cristo no Seu sacrifício vicário pelo Seu povo, cairá sobre aqueles que rejeitarem esse sacrifício e, mesmo assim, tentarem se aproximar de Deus com seus pecados" (Bíblia de Genebra).

Em terceiro lugar, muitos estudiosos relacionam o fogo estranho trazido por Nadabe e Abiú com a exortação acerca da embriaguez na sequência do mesmo texto (Levítico 10:8-11). Então pode ser que os dois homens tenham entrado diante da presença do Senhor embriagados.

"Vinho e bebida forte podem entorpecer as faculdades de modo que a pessoa perca a clara distinção entre o certo e o errado, entre o santo e profano e entre o puro e o impuro. … naquela condição, eles não viam qualquer diferença. Fogo era fogo, não era? Deus, porém, examinou o coração dos dois e viu o que ninguém podia ver. Havia uma diferença. De modo semelhante, o primeiro dia da semana é tão bom quanto o sétimo dia, pelo raciocínio humano – exceto pela ordem de Deus; e isso faz uma diferença vital, a diferença entre a vida e a morte" (CBASD, vol. 1, p. 810).

Independentemente do que a expressão “fogo estranho” possa significar literalmente naquele contexto, fica evidente que a ideia principal transmitida por ela indica uma profanação do culto ao Senhor. Deus não tolerou o pecado de Nadabe e Abiú. O texto bíblico diz que “saiu fogo de diante do Senhor e os consumiu; e morreram perante o Senhor” (Levítico 10:2).

Basta uma leitura superficial deste capítulo para que muitos pintem uma tela de um Deus carrasco que tinha prazer em fulminar pecadores. Atentando, porém, para o contexto da época, pela necessidade geral e urgente de educar um povo para fazer “diferença entre o santo e o profano e entre o imundo e o limpo” (v.10), fica mais fácil de entender as medidas que o Senhor teve de tomar a fim de preservar toda uma nação. Apesar das muitas deficiências e limitações daquele povo, era dele que viria o Messias, o Salvador do mundo. O Senhor precisava intervir e impedir que a insensatez daqueles sacerdotes fosse causa de apostasia entre o povo.

O silêncio de Arão diante de tão terrível tragédia familiar marcou o início de seu sacerdócio com o derramamento de sangue mais difícil de seu ministério. Ele pôde sentir a agonia que Deus Pai sentiria quando contemplasse a morte de Seu Unigênito. Arão não pôde chegar perto dos corpos de seus filhos e nem sequer pôde chorar ou observar o período e os rituais de luto. Deveria permanecer no tabernáculo com os filhos que lhe restaram somente a ouvir e contemplar a lamentação de “toda a casa de Israel” pelo “incêndio que o Senhor suscitou” (v.6). Quão machucado não deveria estar o coração do velho sacerdote! Como comer das ofertas daquele dia diante de tamanho infortúnio?

Querido leitor, em matéria de adoração, Deus não abre mão de que sejam observados os princípios por Ele estabelecidos em Sua Palavra. Em nenhum outro momento da vida de Jesus encontramos Ele reagindo de forma tão enérgica quanto quando expulsou os cambistas do pátio do templo. O local designado para adorá-Lo deve ser um lugar onde tão somente o resultado seja a verdadeira adoração através da manifestação do fogo do Espírito. Quando o homem age pelo impulso de suas próprias paixões e vontades, confundindo adoração com sensações, está acendendo “fogo estranho” em lugar sagrado, incitando a ira de um Deus que é “Santo, Santo, Santo” (Ap 4:8). 

Cultuamos a Deus segundo os termos dEle ou temos levado “fogo estranho” para o culto? Na pregação, na adoração e no louvor deve prevalecer a vontade de Deus, não nossas preferências. Somos povo sacerdotal, portanto, também devemos nos abster de tudo o que entorpece os pensamentos. Nossa mente está suficientemente sóbria/temperante para não oferecer “fogo estranho” a Deus?

Deus é misericordioso e cheio de graça, mas Levítico 10 mostra que mesmo a paciência dEle tem limite. Ele não Se deixa escarnecer e põe fim aos estragos que um profano pode causar. Vivamos à luz de Seus mandamentos e sejamos fiéis; assim tudo dará certo. Ao entrarmos nos últimos dias da história da Terra, adoremos a Deus com reverência em espírito de santidade e verdade.

quarta-feira, 17 de abril de 2024

FILHOS FORA DA IGREJA

Filhos fora da igreja. Que triste! Mas ainda dentro do coração imenso de uma mãe que ora. Do pai também. É de cortar a alma. Enquanto isso, lágrimas escrevem a palavra “saudade” com os leitos dos seus rios serpenteando até os joelhos calejados. 
⁣⁣
O coro silencioso de pais intercessores jamais ficará mudo aos ouvidos de Deus. A Onipotência ouve porque se importa, e responde pelo tanto que ama. ⁣
Desta vez, conclamo este exército de leitores sentir empatia genuína pelos colos vazios de filhos crescidos. Se a liberdade de escolha virou o Éden do avesso, a escolha de perder a liberdade também é um direito. Afinal, ninguém consegue ser livre longe do Senhor. É prisão na escuridão. ⁣
Se você está no grupo dos madrugadores de plantão, clamando pelo retorno de uma filha aos braços de Jesus, continue até o sol raiar. Persista enquanto as pedras não clamam. Nada move mais a volta de um bumerangue do que a força do vento contrário do Espírito.⁣
Chega o momento em que deixar ir também é uma expressão de amor, ainda que devastadora. E se a camisa-de-força não serve de modelo para as vestes celestiais, o brado de uma prece ecoa até os fundamentos do abismo.⁣
“Pais e mães deveriam muitas vezes erguer seu coração a Deus em humilde súplica por si e por seus filhos” (Ellen G. White, Orientação da Criança, p. 518). E quer algo ainda mais poderoso? “As orações das mães cristãs não são desatendidas pelo Pai de todos” (p. 526).⁣
Sobre a parábola mais conhecida de Jesus? A Bíblia omitiu uma personagem que eu peço permissão para acrescentar. Posso imaginar? O pai do filho pródigo estava no portão todos os dias enquanto a mãe dele orava lá no quarto todas as noites. Ambos gemeram pela falta do filho tão amado. ⁣
Faço um urgente apelo: não desanimem ainda que o inferno pareça zombar. Existe aí um lugar vazio gritando a falta de alguém no Lar do Céu? Vamos orar. Interceder. Suplicar. Eles voltarão. A oração pode impossíveis.⁣

Odailson Fonseca (via instagram)

Deixo mais dois lindos pensamentos de Ellen G. White:

“O amor de Deus anela sempre aquele que dEle se afastou, e põe em operação influências para fazê-lo tornar à casa paterna. [ … ] Uma cadeia dourada, a graça e compaixão do amor divino, é atada ao redor de toda pessoa em perigo” (Parábolas de Jesus, p. 202).

“O Céu aguarda e anela a volta dos pródigos que vagueiam longe do rebanho. Muitos dos que se extraviaram podem ser trazidos de volta, pelo amoroso serviço dos filhos de Deus” (Nos Lugares Celestiais, p. 10).

NOVO FILME "THE HOPEFUL"

Um novo filme adventista intitulado The Hopeful, que conta a história das origens da Igreja Adventista do Sétimo Dia, desde William Miller até John N. Andrews e os seus filhos, será exibido nos cinemas dos Estados Unidos nos dias 17 e 18 de abril.

John N. Andrews foi o primeiro missionário enviado pela Igreja Adventista para um destino fora dos Estados Unidos. O filme, realizado por Kyle Portbury, centra-se no viúvo Andrews que viaja para a Suíça com os seus filhos. Ele conta-lhes histórias, que são retratadas no filme, sobre os primórdios do movimento Adventista e os pioneiros que nele se destacaram. À medida que o filme recua no tempo, leva o público na viagem emocional da dor, decepção, alegrias e esperanças dos pioneiros da igreja, e como o desenvolvimento do movimento levou a família Andrews ao seu posto no estrangeiro.

A descrição do filme, feita pelos produtores, diz o seguinte:

A fé de William Miller está em ruínas. Depois de sobreviver milagrosamente a uma batalha feroz na Guerra de 1812, Miller questiona porque é que Deus o poupou. A sua busca por sabedoria leva-o a uma profecia surpreendente - o mundo vai acabar. The Hopeful é a história de um homem sobrecarregado com o conhecimento da volta de Cristo. A mensagem de Miller ressoa em alguns - mesmo quando é desprezada por outros. Quando uma jovem chamada Ellen Harmon ouve um dos seus sermões, ela é transformada. E, através do seu testemunho, a mensagem começa a ganhar força. A sua pregação cresce para além da profecia e desenvolve-se numa visão mais holística de como os cristãos devem viver e adorar. Vemos florescer as sementes de um novo movimento global de fé - a Igreja Adventista do Sétimo Dia. The Hopeful é a história verídica de uma comunidade cujas vidas foram transformadas ao aprenderem o que significa esperar verdadeiramente por Jesus. Este drama arrebatador, que se desenrola na Nova Inglaterra do século XIX, convida o público de todas as idades a imaginar como a esperança pode mudar o mundo.

Os produtores da Hope Studios desenvolveram The Hopeful para que fosse partilhado.

Em maio de 2023, o filme foi o centro das atenções sendo a projeção principal no Festival Internacional de Cinema Cristão (ICFF) em Orlando, Florida. O ICFF, fundado pelo cineasta adventista do sétimo dia Marty Jean-Louis, cresceu e tornou-se o maior festival de cinema cristão do mundo, ostentando uma lista internacional de mais de 20 mil assinantes. Embora o festival organize normalmente várias projeções simultâneas, The Hopeful reivindicou um estatuto único, como a única sessão de quinta-feira à noite, atraindo a maior audiência. Participantes em representação de várias denominações cristãs elogiaram a cinematografia e a narrativa do filme, tendo muitos expressado que este lhes serviu de apresentação ao Adventismo do Sétimo Dia e à sua história.

As exibições do filme destacaram o seu potencial para ser uma ferramenta eficaz para evangelismo e divulgação, disseram os produtores, e culminaram com o apoio oficial da Divisão Norte-Americana na sua Reunião de Final de Ano em Outubro de 2023.

O filme tem a duração de 1 hora e 30 minutos e foi produzido pelo Hope Studios, sediado no Hope Channel International, no edifício sede da Conferência Geral dos Adventistas do Sétimo Dia. A Hope Studios forneceu recursos para a promoção do filme.

Assista o trailer:

 

terça-feira, 16 de abril de 2024

VOCÊ TEM SIDO CONIVENTE COM PECADOS ALHEIOS?

Não, você não verá nenhum pastor pregar sobre o pecado da conivência. Afinal, não é um pecado mencionado pelo nome na Bíblia, por isso, muitos têm dificuldade de enxergá-lo. Infelizmente, vivemos uma geração de cristãos para quem parece que pecado é só sexo ilícito, tomar um porre e apoiar o partido político de que eu não gosto. Fora disso, parece que tudo está liberado: injustiças, ira, ódio, egoísmo, arrogância, ofensas, deboche, vaidade, ganância… e conivência.

Mas o que, afinal, é o pecado da conivência? Por definição, conivência é: “Cumplicidade por tolerância. Colaboração moral no delito por deixá-lo perpetrar, podendo evitá-lo”. Em outras palavras, o conivente é o que peca por tomar conhecimento de um pecado, uma injustiça, um absurdo e apoiar, ou tolerar, o ato. É fazer-se participante do mal por não denunciar o mal como mal nem fazer nada contra ele. É tornar-se tão mau quanto o mau.

Fica claro que conivência é um pecado intimamente ligado à covardia e ao egoísmo: melhor ficar na minha do que ter a coragem de me posicionar diante do que é errado. Às vezes, o conivente opta por esse pecado por ingenuidade, cegueira espiritual e influência de outras pessoas, mas, na maioria dos casos, é uma opção pura e simples pelo erro mesmo – para não perder vantagens pessoais ou para não se prejudicar, por exemplo.

"A conivência com o mal impede a luz que Deus deseja brilhar a partir de Seus servos" (Testemunhos para a Igreja, vol. 7, p. 200).

Ser conivente é extremamente confortável, pois não te fará se indispor com ninguém. Já fazer o certo vai te custar caro, principalmente porque vai testar amizades. Já perdi amigos por não querer pecar por conivência. Lembro de pessoas que eu admirava e que tiveram atitudes vergonhosas. Quando me posicionei contra os absurdos cometidos, fui acusado de deslealdade. Resultado? Passaram a me boicotar e me ver com maus olhos. Paciência. Quando você tem de optar entre o pecado da conivência e o apoio ao que é justo, puro, amável, de boa fama e virtuoso, o cristão não pode pensar duas vezes, ou isso pesará em sua consciência pelo resto da vida. Como já cometi pecados tenebrosos na vida e, apesar de me saber perdoado, os carregar dolorosamente na lembrança, sei que não vale o preço. É melhor perder amigos do que a paz de espírito e com o Espírito.

Não vou enganar você. Tenha esta certeza: optar por não pecar por conivência sempre terá um custo. Sempre. Não é te custará barato escolher o que é justo. 

"Não nos podemos esquivar à verdade, não nos podemos separar dos retos princípios, sem abandonar Aquele que é nossa força, nossa justiça, e nossa santificação. Devemos estar firmemente arraigados na convicção de que seja o que for que, em qualquer sentido, nos desvie da verdade e da justiça em nossa associação e parceria com os homens, não nos pode beneficiar, e desonra grandemente a Deus. Toda espécie de engano ou conivência com o pecado é aborrecível ao Senhor" (Mensagens Escolhidas, vol. 2, p. 130).

Tenho visto muita gente pecar por conivência. A boa notícia é que o conivente revela muito do seu caráter e da sua fé ao se tornar conivente com injustiças, mentiras e atos reprováveis. E você passa a conhecer quem as pessoas realmente são e quais são as suas prioridades. Conivência, por mais enojante e decepcionante que seja, é um ato revelador.

Meu irmão, minha irmã, convido você a um exame de consciência. Será que você tem sido conivente com pecados alheios? Você tem mantido silêncio diante de atitudes vergonhosas, injustas e anticristãs, a fim de não se indispor com pessoas, manter algum tipo de benefício ou levar algum tipo de vantagem? Tem balançado a cabeça, afirmativamente, quando as pessoas falam mentiras?

"Precisamos guardar-nos contra a indevida severidade no trato com os que erram; mas precisamos também ser cuidadosos para não perder de vista a excessiva malignidade do pecado. Há necessidade de mostrar-se paciência e amor semelhantes aos de Cristo pelo que erra, mas há também o perigo de se mostrar tão grande tolerância pelo seu erro que ele se considerará não merecedor de reprovação e a rejeitará como inoportuna e injusta" (Atos dos Apóstolos, p. 283).

Como tem sido sua postura diante da inverdade, de atos de injustiça ou de posicionamentos anticristãos de supostos cristãos – ou não? Quão gritante tem sido o seu silêncio diante da maldade? Desperte! “Portanto, aquele que sabe que deve fazer o bem e não o faz, nisso está pecando” (Tg 4:17).

"Deus nos manda falar, e não ficaremos silenciosos. Caso haja erros claros entre Seu povo, e os servos de Deus passem adiante, indiferentes a isso, estão por assim dizer apoiando e justificando o pecador, e são igualmente culpados, incorrendo tão certo como ele no desagrado de Deus; pois serão tidos como responsáveis pelos pecados do culpado" (Testemunhos Seletos, vol. 1, p. 334, 335).

Não ache você que conivência é um pecado menor do que adultério, aborto ou qualquer outro dos pecados mais frequentes nos lábios e nas redes sociais dos pregadores. Simplesmente porque a conivência com atos de injustiça contraria frontalmente a essência do Deus que é justiça. É, portanto, a sabotagem do projeto de Deus na terra.

"Deus não o terá por inocente se tiver conivência com um procedimento incorreto, exerça embora o que assim procede uma grande influência, ou sejam grandes suas responsabilidades" (Obreiros Evangélicos, p. 102).

“Finalmente, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é respeitável, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se alguma virtude há e se algum louvor existe, seja isso o que ocupe o pensamento de vocês. O que também aprenderam, receberam e ouviram de mim, e o que viram em mim, isso ponham em prática; e o Deus da paz estará com vocês” (Fp 4:8‭-‬9).

Fica o convite: arrependa-se. Confesse. Deixe. E a misericórdia de Deus virá sobre você.

Paz a todos vocês que estão em Cristo,

Maurício Zágari (via Apenas)

A inserção de textos de Ellen G. White, em negrito, foram feitas pelo blog.

segunda-feira, 15 de abril de 2024

GUERRA DOS TRONOS

A expressão “guerra dos tronos” foi popularizada devido a uma violenta fantasia épica escrita por George R. R. Martin. A saga seduziu uma multidão de fãs ao apresentar o que a humanidade tem de pior. Os livros deram origem a uma das séries de TV mais caras da história, intitulada em inglês Game of Thrones. Imprópria para os cristãos, ela pode representar mais um passo para condicionar uma geração às estratégias do diabo no tempo do fim.

Esse enredo é ficção, mas uma guerra real pelo trono do Universo ocorreu há muito tempo. Felizmente, o lado luminoso venceu, e os rebeldes foram expulsos do Céu (Ap 12:7-9). Ocorre que o conflito teve novos desdobramentos, em outros cenários, e agora ganha intensidade e dramaticidade no fim dos tempos (v. 12).

O tema do trono permeia o Apocalipse, um mosaico dos grandes enfoques bíblicos, e mostra que os eventos retratados nesse livro que encerra o cânon incluem uma disputa mortal pelo poder, com repercussões eternas. No caso do oponente de Deus, o poder é apenas uma tentativa de controlar o mundo e receber adoração. Mas por que o trono ganhou tal destaque?

SÍMBOLO DE SOBERANIA
Trono é uma cadeira especial, ricamente ornamentada, tendo um assento alto, um encosto retangular e braços e pernas torneados, às vezes com figuras de animais, onde costumam sentar-se reis, monarcas, papas e outros dignitários poderosos. Em sentido abstrato, é uma metáfora para o poder real, um lugar de onde saem decisões e ordens, favores e sentenças, bênçãos e maldições, vida e morte.

A palavra vem do grego, com o sentido de assento ou cadeira com um apoio para os pés. No grego antigo, a expressão Dios thronos era usada para descrever o “suporte dos céus”, o eixo do mundo. Desde a antiguidade, reis e divindades sentados em tronos são comuns na iconografia do Oriente Próximo.

De acordo com Homero, os aqueus costumavam colocar tronos vazios nos palácios reais e nos templos para que os deuses pudessem sentar-se neles, caso desejassem. Por sua vez, os romanos tinham um trono para o imperador e um para a deusa Roma. Estátuas dela eram colocadas sobre os tronos, que se tornavam centros de adoração. O problema é que desses tronos não poderia surgir nenhuma ajuda. O auxílio também não podia vir dos tronos gravados nas moedas romanas e associados a vários deuses, tampouco dos tronos vazios, com apenas um capacete, símbolo da guerra e do governo.

Bispos representantes da Igreja Católica, da Igreja Ortodoxa e da Igreja Anglicana, entre outras, também se assentam em um trono, a cathedra, que representa sua autoridade formal sobre o rebanho. O trono do papa (a Cathedra Romana) é localizado na Basílica de São João de Latrão, a catedral do bispo de Roma. Contudo, nenhum deles pode realmente defender os súditos.

No contexto bíblico, o trono tem um lugar de destaque. No Antigo Testamento, em que o termo “trono” aparece 135 vezes, vemos muitas referências ao trono de Deus como símbolo de seu poder e personificação de sua justiça, especialmente nos Salmos. “O teu trono, ó Deus, é para todo o sempre; cetro de equidade é o cetro do teu reino”, diz o poeta (Sl 45:6). “Justiça e direito são o fundamento do teu trono; graça e verdade te precedem”, acrescenta (Sl 89:14). “Nos céus, estabeleceu o Senhor o seu trono, e o seu reino domina sobre tudo”, lemos em outro lugar (Sl 103:19).

O Altíssimo tem um trono esplendoroso, e alguns profetas tiveram o privilégio de contemplá-lo. Em sua visão espetacular, Isaías (6:1-3) viu “o Senhor assentado sobre um alto e sublime trono”, circundado por serafins. Usando linguagem parecida, Jeremias (17:12) diz: “Trono de glória enaltecido desde o princípio é o lugar do nosso santuário.” Com palavras pitorescas, Ezequiel (1:26, NVI) descreve: “Acima da abóboda sobre as suas cabeças havia o que parecia um trono de safira, e, bem no alto, sobre o trono, havia uma figura que parecia um homem.”

Ao redor do trono divino sempre estão seres servindo, louvando e adorando aquele que vive para todo o sempre, o único digno de receber toda a glória e honra. Durando mais do que as estrelas, o trono divino está firme “desde a antiguidade” (Sl 93:2) e “subsiste de geração em geração” (Lm 5:19). Além de ser fundamentado na justiça e revestido de santidade, ele é o depósito dos infindáveis tesouros celestiais.

MOLDURA CONCEITUAL
Se o trono é mencionado em muitos lugares da Bíblia, é no Apocalipse que ele ganha destaque e centralidade. Das 62 vezes em que a palavra “trono” aparece no Novo Testamento, 47 se encontram nesse livro, sendo que 36 vezes (76,6%) se referem ao trono de Deus. Você acha que isso é coincidência?

“Estruturalmente, a parte visionária do livro (4:1–22:5) começa e termina com visões que fortemente enfatizam a centralidade do trono: a primeira no contexto celestial (4:1–5:14) e a última no contexto terrestre de uma nova criação (22:1-5)”, escreveu Laszlo Gallusz num estudo publicado no Journal of the Adventist Theological Society. “Essa inclusão sugere que o livro tenha sido organizado dentro da moldura das visões do trono.”

A visão da sala do trono, em Apocalipse 4 e 5, com seu duplo foco no trono de Deus (capítulo 4) e do Cordeiro (capítulo 5), concentra 19 menções ao trono em 25 versos. Como disse Elisabeth Schüssler Fiorenza em seu livro Revelation: Vision of a Just World, essa visão estabelece “o fundamento retórico e provê as imagens simbólicas, chave para tudo o que vem a seguir”. Para Gallusz, que é professor no Seminário Teológico de Belgrado (Sérvia), “o status que o Cordeiro recebe no capítulo 5 se torna inteligível somente em relação ao trono divino”.

A primeira coisa que João viu depois que a porta do Céu se abriu foi o trono (4:2), o que pode ser uma forma de indicar a mudança para a esfera celestial na visão. “Portanto”, conforme sublinha o teólogo, “o trono de Deus é retratado em Apocalipse 4 como o eixo do mundo, o centro imóvel de toda a realidade”. Deus e o Cordeiro estão no centro porque sãos os criadores de tudo, efetuaram a salvação da humanidade, garantem a justiça no Universo e merecem a adoração de todos os seres. O Cordeiro (arnion), principal título cristológico no livro, aparece 29 vezes, sendo 28 delas aplicadas a Cristo, que é o fator decisivo para a solução do conflito cósmico.

Como se fosse um arco-íris, o Apocalipse retrata uma série de círculos concêntricos, mostrando Deus e Cristo no centro, depois os quatro seres viventes, os 24 anciãos, uma hoste de anjos e os redimidos de todos os tempos e lugares. As expressões “ao redor do trono”, “rodeando o trono” e equivalentes (4:3, 4, 6, 8; 5:11; 7:11), tradução dos termos gregos kyklothen e kyklo (“círculo”, “anel”), sugerem um arranjo circular. Essa ideia de que o Céu é “diagramado” em círculos concêntricos com um trono no meio não é exclusividade do Apocalipse, pois aparece também nos livros apócrifos de Enoque.

As cenas de tronos em Apocalipse envolvem aspectos do ambiente do culto (vindos da tradição litúrgica judaica) e do mundo político (voltados ao contexto greco-romano). Os hinos de louvor, que aparecem em vários lugares do livro e acompanham seus eventos principais, indicam adoração. Em seu livro Revelation’s Hymns, Steven Grabiner argumentou que o tema do conflito cósmico é fundamental para a compreensão da narrativa do Apocalipse, e os hinos devem ser lidos nesse contexto. O conflito começou no templo celestial, onde a soberania absoluta de Deus foi desafiada, e os hinos de louvor ao Criador ocorrem nesse ambiente. Por sua vez, o ato de lançar as coroas diante do trono divino (4:10), indicando que apenas Deus merece toda honra, pode ser compreendido em contraposição aos cerimoniais reais helenísticos e romanos, em que os conquistados depositavam suas coroas aos pés do conquistador (Tácito, Anais 15.29). Por isso, o trono está ligado aos temas da adoração e da disputa pelo poder, coisas que formam o epicentro dos eventos finais.

A ideia de que o motivo do trono estrutura todo o conteúdo do Apocalipse, como defende Gallusz, precisaria de um estudo mais aprofundado, mas não há dúvida de que esse é um dos temas centrais do livro. Não por acaso, a partir do capítulo 4, o autor retrata Deus como ocupando o trono celeste nada menos do que 12 vezes, empregando seis formas gramaticais diferentes.

O trono não tem que ver apenas com o lado político da guerra, mas com a vindicação do caráter de Deus. A leitura do Apocalipse e da história religiosa do mundo a partir do plano da salvação, típica dos evangélicos, precisa ser completada por essa dimensão do grande conflito (ver Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, p. 68). Uma perspectiva começa com o mundo e termina com o fim dele. A outra começa antes da criação e continua na eternidade.

VOCÊ NO TRONO
O trono divino revela claramente o poder de Deus, mas também sua santidade e seu amor. Por isso, ele está ligado aos principais eventos do plano da salvação. Conforme destacado por Gallusz, “as visões do trono aparecem em cinco contextos no Apocalipse: nas cenas do templo celeste, na descrição do ‘dia da ira’, na resolução do conflito cósmico, na cena do julgamento milenial e na visão final da nova criação”.

Esses aspectos colocam outros grupos do Apocalipse em relação direta com o trono de Deus, seja na categoria de aliados (em que a esfera de ação é o Céu) ou na categoria de adversários (cuja esfera de ação é a Terra). A besta, que tem seu próprio trono (16:10), o que indica que ela tenta usurpar o poder de Deus, seguindo o espírito de Satanás, entra na segunda categoria.

Na visão adventista, besta é o poder romano cristianizado, ou o cristianismo romanizado. A vitória do cristianismo sobre seu rival, o paganismo, criou um império alternativo. A ambição pelo poder brilhou nos olhos de alguns líderes dos primeiros séculos e eles se uniram a um império que criava seus próprios deuses. Surgiu então a igreja imperial. No livro Igreja: Carisma e Poder, lançado em 1981 e que o levou a ser silenciado pelo Vaticano, Leonardo Boff criticou a hierarquia “piramidal”, “personalizada”, “cósmica e sagrada” da igreja de Roma, em que a voz do superior é a voz de Deus.

Falando da besta do mar descrita em Apocalipse 13, identificada por uma série de intérpretes como a Roma cristã, Jacques Doukhan escreveu em seu livro Secrets of Revelation: “Por trás da máscara de religiosidade esconde-se a aspiração totalmente humana pelo poder. Deus não tem importância para a igreja. É tudo um jogo político.” A aparente democracia do Vaticano na atualidade é vista por muitos como apenas uma estratégia para recuperar o poder e a influência de outros tempos. Isso pode demorar, pois Roma “pensa em séculos”, mas é o alvo final.

A questão não é apenas estar no trono, pois no Apocalipse Jesus promete que os vencedores poderão sentar-se com ele em seu trono (3:21). Os santos receberão autoridade para julgar e se assentarão em tronos (20:4). A questão é sentar-se no trono para tentar tomar o lugar que pertence exclusivamente a Deus e a Cristo.

Ao longo do livro, o trono serve para destacar a legitimidade do poder divino e a vindicação do caráter de Deus, pois o livro se encerra com as relações restauradas. No fim do Apocalipse (22:1-5), numa linguagem típica da criação e do Jardim do Éden, incluindo o rio e a árvore da vida, o fim da maldição e a vida novamente na presença de Deus, o conflito termina e tudo volta ao estado original. O trono de Deus (partilhado pelo Cordeiro), que aparece como a fonte dessas bênçãos (v. 1), estará no meio da cidade (v. 3), sem opositores e com milhões que celebram a vitória.

“A cena visionária final também resolve a questão do poder, que é o assunto central no livro”, observa corretamente Gallusz. “Ela retrata o lado vitorioso do conflito cósmico, os legítimos ocupantes do trono, mas ao mesmo tempo ressalta a diferença fundamental entre a natureza do governo de Deus e a do governo dos poderes terrestres. Enquanto o regime da besta é voltado para si e nega a vida, o reinado de Deus promove a vida, pois busca o bem-estar da criação.”

No novo mundo pós-conflito, Deus será o centro de toda a criação outra vez, e todos se regozijarão ao redor de seu trono. Se o trono de justiça foi usado para vencer e julgar, agora o trono de graça será a fonte de eterna felicidade. A melhor notícia é que Deus está no trono e sempre estará. O trono não está vago. O Universo não é governado por um déspota, mas pelo Rei amoroso e justo. Na verdadeira guerra dos tronos, o lado bom vence.

Marcos De Benedicto (via Revista Adventista)

quinta-feira, 11 de abril de 2024

OS FARISEUS DO SÉCULO XXI

Os fariseus, no tempo de Jesus, organizavam-se em comunidades ou fraternidades que chamavam de “haburot”. Para entrar nelas, deviam ser testados duramente num período de cerca de um ano, às vezes menos. Ao ser aceito, ficava-se ligado por uma série de votos, cada um mais complexo e secreto. Em muitas ocasiões, como escreve Paulo, a condição de fariseu era passada de pai para filho (“fariseu filho de fariseus”). Calcula-se que podiam chegar a mais de seis mil membros, distribuídos pelo território de Israel e na diáspora.

Quando o sujeito era admitido na comunidade fariseia (alguns a chamavam de “chabura”), a família passava automaticamente a fazer parte das referidas irmandades. Quanto mais alto na escala, mais puro e mais honorável aos olhos dos homens e de Yaveh. Não podiam vender a ninguém que não fosse “santo e separado”. Os negócios, como sempre, ficavam entre eles mesmos. Os do primeiro grau eram conhecidos como “chaber” ou “bem hacheneseth” (“filho da união”). Tratava-se dos fariseus ordinários (a maioria dos que Jesus encontrou ao longo da vida). Os três graus restantes eram designados pelo nome genérico de “teharoth” (“purificações”).

O “chaber”, ou fariseu comum, tinha a obrigação de pagr o dízimo (por tudo que consumia) e de se manter puro, a qualquer custo. Neste último quesito, era fundamental que o fariseu jamais se misturasse, sob nenhum pretexto, aos chamados “am-ha-arez” (o povo comum). Isso significava o pior dos pecados; ou seja, a impureza total.

Os “am-ha-arez”, eram considerados incultos, ignorantes da Lei de Moisés e, em consequência, em permanente pecado aos olhos de Deus. O pior é que, além de se contaminar com os “am”, os fariseus de primeiro grau podiam contagiar a impureza a seus irmãos de segundo grau, e estes, por sua vez, aos de terceiro; e estes, naturalmente, aos que quarto grau. Como se pode ver, aquilo era uma loucura. As mulheres dos “santos e separados” não pertenciam a nenhum dos graus da irmandade fariseia. E, apesar de todo esse preconceito explícito, o povo judeu os tinha em considerável estima. As disposições contra os “am” (ou povo comum) contavam-se às centenas. Vejamos um exemplo:

“Quando a esposa de um “haber” deixa que a esposa de um “am” moa no moinho da sua casa, se o moinho parar, a casa ficará impura; se ela continuar moendo, só ficará impuro aquilo que ela puder tocar estendendo a mão” (Toh 7,4). Quando alguém se contaminava com impureza, sua obrigação era fazer uma oferenda, obtendo assim, o perdão de Deus pela suposta culpa. Isso, claro, significava dinheiro. Um dinheiro para o Templo (na realidade, para os sacerdotes).

E foi justamente com os fariseus que chegou a adoração à “Torah Oral”. Até o aparecimento dos “santos e separados”, o povo judeu se guiava pela Torah Escrita; ou seja, o manifestado por Deus a Moisés. Essas manifestações integram o Pentateuco (os cinco primeiros livros da Bíblia) – as chamadas Escrituras Sagradas, ou, a Lei. Mas os fariseus foram além e estimaram que o dito por Yaveh a Moisés havia sido muito mais e muito mais complexo e importante que o registrado na Torah Escrita. Foi assim que nasceu a Torah Oral: milhares de normas e interpretações que, segundo os fariseus, constituíam a correta interpretação e o desenvolvimento último da Torah Escrita.

O Pentateuco, enfim, segundo a filosofia farisaica, não era suficiente para servir a Yaveh. Essas normas complementares procediam dos tempos do exílio na Babilônia (584 a.C.) e foram “atualizadas” pelas gerações seguintes. Nos tempos do Mestre Jesus contava-se 613 preceitos (365 proibições e 248 mandamentos positivos), com uma constelação de “subpreceitos”; um monumento jurídico, que, segundo os fariseus, procedia diretamente de Deus.

As ramificações da chamada Torah Oral eram tantas que o povo se sentia incapacitado para cumpri-las. Nem mesmo os especialistas – os escribas – estavam em condições de reter na memória tamanha teia jurídica. Era o “pesado julgo” a que o Filho do Homem fez alusão. Para os fariseus, a Torah Oral era mais importante que a escrita. Isso foi uma fonte de conflitos com outro grupo judaico: os saduceus. A fidelidade à Torah Oral levava as irmandades farisaicas a todo tipo de extravagâncias. Eles diziam que a Torah Oral dá resposta a qualquer ordem da vida diária. Tudo estava na Lei (eles chamavam de “tradição dos pais”, “tradição dos anciãos”, ou “halakah”). A “halakah”, também conhecida como “a trilha pela qual transita Israel”, continha todos os aspectos imagináveis da conduta humana e contemplava todo tipo de ritos, dízimos, pureza, impureza, orações, mandamentos, comportamento durante o sábado, relações conjugais, festas de todo tipo e disposições legais, tanto nas leis civis quanto nos assuntos criminais. Os fariseus consideravam a Torah Oral o fundamento da nação judaica. Ninguém podia questioná-la. Jesus, ao defender o espírito da Lei de Deus e não a letra, tornou-se inimigo da casta dos “santos e separados”.

Os fariseus eram homens arrogantes e vaidosos, orgulhosos de si mesmos, que olhavam por cima do ombro todos os que não eram da fraternidade. Sua religiosidade ficou reduzida a um pacto comercial com Yaveh. Deus lhes dava e eles devolviam. Nada era gratuito. Jamais faziam nada por altruísmo. Na hora de entregar as esmolas, faziam-se acompanhar por outros fariseus que tocavam o sino ou a trombeta, chamando a atenção da vizinhança. Como dizia o Mestre, “esses já tiveram sua recompensa”. Para os “santos e separados”, a caridade fazia parte de sua filosofia e era feita não por piedade ou generosidade, mas porque acreditavam que essas obras eram retribuídas em curto, médio ou longo prazo por Yaveh. Sabiam da misericórdia de Deus, mas esse perdão divino, de acordo com os fariseus, era apenas para os justos. Os pecadores não mereciam essa misericórdia. Com outras palavras, os fariseus eram os exclusivistas religiosos de outrora que negavam a Lei do Amor em troca de leis comportamentais fanáticas.

Se, como ensina Jesus, os fariseus são aqueles que abandonaram “o mandamento de Deus para seguir a tradição dos homens”, nossa época está cheia deles. E nem é preciso procurar muito.

O Mestre disse: “Bem profetizou Isaías a vosso respeito, hipócritas, como está escrito: Este povo me honra com os lábios, mas seu coração está longe de mim. De nada adianta o culto que me prestam, pois as doutrinas que ensinam são preceitos humanos” (Isaías 29:13).

"Vós abandonais o mandamento de Deus para seguir a tradição dos homens" (Marcos 7: 6-8).

A igreja cristã hoje em dia, infelizmente, também tem vários “fariseus”. Refiro-me aos líderes religiosos/as que ficam estabelecendo regras de comportamento para as outras pessoas e cobrando seu cumprimento.

Essas regras podem alcançar diversas áreas das vidas das pessoas, como a forma de se vestir, os lugares que podem frequentar, o que lhes permitido fazer para se divertir, como podem se relacionar e assim por diante. Em algumas igrejas, são tantas as regras e tal o rigor na sua aplicação, que as pessoas ficam sufocadas, tornando-se verdadeiras prisioneiras. A modéstia, o bom senso e a temperança - são princípios naturais para todo aquele que segue a Lei do Amor. Não é uma listinha de moralidades, mas discernimento espiritual. Não há barganhas com Deus, há relacionamento.

Os “fariseus” não acabaram nos tempos de Jesus, o que é uma pena. Eles mudaram de roupagem e estão aí, bem vivos e influentes, causando o mesmo tipo de estrago que causaram dois mil anos atrás. Então, muito cuidado com eles.

“Ai de vocês, mestres da lei e fariseus, hipócritas! Vocês fecham o Reino dos céus diante dos homens! Vocês mesmos não entram, nem deixam entrar aqueles que gostariam de fazê-lo” (Mateus 23:13).

“Em verdade vos digo, que os publicanos e as prostitutas vos precedem no Reino de Deus” (Mateus 21:28-32).

Muitos cristãos deixam de cumprir o mais importante da lei de DEUS que é a JUSTIÇA, a MISERICÓRDIA, o AMOR e a FÉ - pela qual somos salvos. Desde o princípio Deus já dizia através dos profetas que o que Ele realmente queria de nós é a MISERICÓRDIA - que significa compadecer-se da miséria alheia, e não o sacrifício – “Afinal, o que desejo é misericórdia, e não sacrifícios; entendimento quanto à pessoa de Elohim, Deus, mais que ofertas e holocaustos” (Oséias 6:6).

“A ninguém fiqueis devendo coisa alguma, exceto o amor com que vos ameis uns aos outros; pois quem ama o próximo tem cumprido a lei" (Romanos 13:8).

“Pois toda a Lei se resume num só mandamento, a saber: Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Gálatas 5:14).


"O maior dos enganos do espírito humano, nos dias de Cristo, era que um mero assentimento à verdade constituísse justiça. Em toda experiência humana, o conhecimento teórico da verdade se tem demonstrado insuficiente para a salvação. Não produz os frutos de justiça. (...) Os fariseus pretendiam ser filhos de Abraão e se vangloriavam de possuir os oráculos de Deus; todavia, essas vantagens não os preservavam do egoísmo, da malignidade, da ganância e da mais baixa hipocrisia. (...)

O mesmo perigo existe ainda hoje. Muitos se têm na conta de cristãos simplesmente porque concordam com certos dogmas teológicos. No entanto, não introduziram a verdade na vida prática. Não creram nela nem a amaram; não receberam, portanto, o poder e a graça que advêm mediante a satisfação da verdade. As pessoas podem professar fé na verdade; mas, se ela não os tornar sinceros, bondosos, pacientes, dominados, tomando prazer nas coisas de cima, isso é uma maldição a seu possuidor e, por meio de sua influência, uma maldição ao mundo.

A justiça ensinada por Cristo é conformidade de coração e de vida com a revelada vontade de Deus. Os pecadores só se podem tornar justos à medida que têm fé em Deus e mantêm vital ligação com Ele. Dessa forma, a verdadeira piedade elevará seus pensamentos e enobrecerá a vida. Então, as formas externas da religião se harmonizarão com a interior pureza cristã. Nesse caso, as cerimônias exigidas no serviço de Deus não são ritos destituídos de sentido, como os dos fariseus hipócritas" (Ellen G. White - A Fé Pela Qual eu Vivo, p. 108).

quarta-feira, 10 de abril de 2024

DIANTE DO SUPREMO TRIBUNAL

A parábola das bodas (Mt 22:1-14) apresenta-nos uma lição da mais elevada importância. Pelas bodas é representada a união da humanidade com a divindade; a veste nupcial simboliza o caráter que precisa possuir todo aquele que há de ser considerado hóspede digno para as bodas.

Nesta parábola são ilustrados o convite do evangelho, sua rejeição pelo povo judeu e o convite da graça aos gentios. Esta parábola, porém, apresenta-nos maior ofensa da parte dos que rejeitam o convite, e juízo mais terrível. O chamado para o banquete é um convite real. Procede de alguém que está investido de poder para ordenar. Confere grande honra. Contudo esta é desapreciada. A autoridade do rei é menosprezada, e o convite dele é recebido com insulto e morte. Trataram seus criados com escárnio e desprezo e os mataram. Contra os que ofenderam o rei foi decretada mais que a exclusão de sua presença e de sua mesa. "Enviando os seus exércitos, destruiu aqueles homicidas, e incendiou a sua cidade" (Mt 22:7).

Nesta parábola, o banquete é provido de convidados, e mostra que uma preparação precisa ser feita por todos os que a ele assistem. Quem negligencia esta preparação é expulso. "O rei, entrando para ver os convidados, viu ali um homem que não estava trajado com veste nupcial. E disse-lhe: Amigo, como entraste aqui, não tendo veste nupcial? E ele emudeceu. Disse, então, o rei aos servos: Amarrai-o de pés e mãos, levai-o e lançai-o nas trevas exteriores; ali, haverá pranto e ranger de dentes" (Mt 22:11-13).

O convite para o banquete foi transmitido pelos discípulos de Cristo. Nosso Senhor enviou os doze, e depois os setenta, proclamando que era chegado o reino de Deus, e convidando os homens a arrependerem-se e crerem no evangelho. O convite não foi atendido, porém. Os convidados para irem à festa não compareceram. Mais tarde os servos foram enviados com a mensagem: "Eis que tenho o meu jantar preparado, os meus bois e cevados já mortos, e tudo já pronto; vinde às bodas" (Mt 22:4). Esta foi a mensagem levada à nação judaica depois da crucifixão de Cristo; mas a nação, que se arrogava de ser o povo peculiar de Deus, rejeitou o evangelho a eles levado no poder do Espírito Santo. Muitos fizeram isso da maneira mais insolente. Outros ficaram tão exasperados com o oferecimento da salvação, e perdão por terem rejeitado o Senhor da glória, que se voltaram contra os mensageiros. Houve "uma grande perseguição" (Atos 8:1). Muitos homens e mulheres foram lançados na prisão, e alguns dos portadores da mensagem do Senhor, como Estêvão e Tiago, foram mortos.

Assim o povo judeu selou sua rejeição da misericórdia de Deus. O resultado foi predito por Cristo na parábola. O rei enviou "os seus exércitos, destruiu aqueles homicidas, e incendiou a sua cidade" (Mt 22:7). O juízo pronunciado atingiu os judeus na destruição de Jerusalém e na dispersão do povo.

O terceiro convite para o banquete representa a pregação do evangelho aos gentios. O rei disse: "As bodas, na verdade, estão preparadas, mas os convidados não eram dignos. Ide, pois, às saídas dos caminhos e convidai para as bodas a todos os que encontrardes" (Mt 22:8 e 9).

Os servos do rei que foram pelos caminhos, "ajuntaram todos quantos encontraram, tanto maus como bons" (Mt 22:10). Era um grupo misto. Alguns deles não tinham maior respeito ao doador da ceia do que os que haviam rejeitado o convite. A classe primeiramente convidada não podia, como pensava, sacrificar os privilégios mundanos para comparecer ao banquete do rei. E entre os que aceitaram o convite havia muitos que pensavam somente em se beneficiar. Foram para partilhar das provisões do banquete, mas não tinham desejo de honrar ao rei.

Quando o rei entrou para ver os convidados, foi revelado o verdadeiro caráter de todos. A cada um foi provido um vestido de bodas. Essa veste era uma dádiva do rei. Usando-a, os convidados demonstravam respeito ao doador da festa. Um homem, porém, estava com seus trajes comuns. Recusara fazer a preparação exigida pelo rei. A veste provida para ele com grande custo, desdenhou usar. Deste modo insultou seu senhor. À pergunta do rei: "Como entraste aqui, não tendo veste nupcial?" (Mt 22:12) nada pôde responder. Condenou-se a si mesmo. Então o rei disse: "Amarrai-o de pés e mãos, levai-o e lançai-o nas trevas exteriores" (Mt 22:13).

O exame dos convidados pelo rei representa uma cena de julgamento. Os convidados à ceia do evangelho são os que professam servir a Deus, cujos nomes estão escritos no livro da vida. Nem todos, porém, que professam ser cristãos, são discípulos verdadeiros. Antes que seja dada a recompensa final, precisa ser decidido quem está apto para participar da herança dos justos. Essa decisão deve ser feita antes da segunda vinda de Cristo, nas nuvens do céu; porque quando Ele vier, o galardão estará com Ele "para dar a cada um segundo a sua obra" (Ap 22:12). Antes de Sua vinda o caráter da obra de cada um terá sido determinado, e a cada seguidor de Cristo o galardão será concedido segundo seus atos.

Enquanto os homens ainda estão sobre a Terra, é que a obra do juízo investigativo se efetua nas cortes celestes. A vida de todos os Seus professos seguidores é passada em revista perante Deus; todos são examinados de conformidade com os relatórios nos livros do Céu, e o destino de cada um é fixado para sempre de acordo com seus atos.

Pela veste nupcial da parábola é representado o caráter puro e imaculado, que os verdadeiros seguidores de Cristo possuirão. Foi dado à igreja "que se vestisse de linho fino, puro e resplandecente" (Ap 19:8), "sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante" (Ef 5:27). O linho fino, diz a Escritura, "é a justiça dos santos" (Ap 19:8). A justiça de Cristo e Seu caráter imaculado, é, pela fé, comunicada a todos os que O aceitam como Salvador pessoal.

A veste branca de inocência foi usada por nossos primeiros pais, quando foram postos por Deus no santo Éden. Viviam eles em perfeita conformidade com a vontade de Deus. Todas as suas afeições eram devotadas ao Pai celeste. Luz bela e suave, a luz de Deus, envolvia o santo par. Esse vestido de luz era um símbolo de suas vestes espirituais de celeste inocência. Se permanecessem leais a Deus, continuaria sempre a envolvê-los. Ao entrar o pecado, porém, cortaram sua ligação com Deus, e desapareceu a luz que os aureolava. Nus e envergonhados, procuraram suprir os vestidos celestiais, cosendo folhas de figueira para uma cobertura.

Isto fizeram os transgressores da lei de Deus desde o dia em que Adão e Eva desobedeceram. Coseram folhas de figueira para cobrir a nudez causada pela transgressão. Cobriram-se com vestidos de sua própria feitura; por suas próprias obras procuraram encobrir os pecados e tornar-se aceitáveis a Deus.

Isto jamais pode ser feito, porém. O homem nada pode idear para suprir as perdidas vestes de inocência. Nenhuma vestimenta de folhas de figueira, nenhum traje mundano, pode ser usado por quem se assentar com Cristo e os anjos na ceia das bodas do Cordeiro.

Somente as vestes que Cristo proveu, podem habilitar-nos a aparecer na presença de Deus. Estas vestes de Sua própria justiça, Cristo dará a todos os que se arrependerem e crerem. "Aconselho-te", diz Ele, "que de Mim compres... vestes brancas, para que te vistas, e não apareça a vergonha da tua nudez" (Ap 3:18).

Este vestido fiado nos teares do Céu não tem um fio de origem humana. Em Sua humanidade, Cristo formou caráter perfeito, e oferece-nos esse caráter. "Todas as nossas justiças" são "como trapo da imundícia" (Is 64:6). Tudo que podemos fazer de nós mesmos está contaminado pelo pecado. Mas o Filho de Deus "Se manifestou para tirar os nossos pecados; e nEle não há pecado" (1Jo 3:5). 

O pecado é definido como "o quebrantamento da lei" (1Jo 3:4). Mas Cristo foi obediente a todos os reclamos da lei. De Si mesmo, disse: "Deleito-Me em fazer a Tua vontade, ó Deus Meu; sim, a Tua lei está dentro do Meu coração" (Sl 40:8). Quando esteve na Terra, disse aos discípulos: "Tenho guardado os mandamentos de Meu Pai" (Jo 15:10). Por Sua obediência perfeita tornou possível a todo homem obedecer aos mandamentos de Deus. Ao nos sujeitarmos a Cristo, nosso coração se une ao Seu, nossa vontade imerge em Sua vontade, nosso espírito torna-se um com Seu espírito, nossos pensamentos serão levados cativos a Ele; vivemos Sua vida. Isto é o que significa estar trajado com as vestes de Sua justiça. Quando então o Senhor nos contemplar, verá não o vestido de folhas de figueira, não a nudez e deformidade do pecado, mas Suas próprias vestes de justiça que são a obediência perfeita à lei de Jeová.

Os convidados às bodas foram inspecionados pelo rei. Só foram aceitos os que obedeceram aos seus requisitos e usaram o vestido nupcial. Assim ocorre com os convidados para a ceia do evangelho. Todos são examinados pelo grande Rei, e só serão recebidos os que trajarem as vestes da justiça de Cristo.

Justiça é fazer o bem, e é pelos atos que todos serão julgados. Nosso caráter é revelado pelo que fazemos. As obras mostram se a fé é genuína.

Não é bastante crermos que Jesus não é um impostor, e a religião da Bíblia não é uma fábula artificialmente composta. Podemos crer que o nome de Jesus é o único debaixo dos Céus pelo qual devemos ser salvos, e contudo podemos não torná-Lo pela fé nosso Salvador pessoal. Não é bastante crer na teoria da verdade. Não é bastante fazer profissão de fé em Cristo, e ter nosso nome registrado no rol da igreja. "Aquele que guarda os Seus mandamentos nEle está, e Ele nele. E nisto conhecemos que Ele está em nós: pelo Espírito que nos tem dado" (1Jo 3:24). "E nisto sabemos que O conhecemos: se guardarmos os Seus mandamentos" (1Jo 2:3). Esta é a evidência genuína da conversão. Qualquer que seja nossa profissão, nada valerá se Cristo não for revelado em obras de justiça.

A verdade deve estar plantada no coração. Deve dirigir o espírito e regular as afeições. Todo o caráter deve ser estampado com a expressão divina. Cada jota e cada til da Palavra de Deus deve ser introduzido na vida diária.

Aquele que se torna participante da natureza divina estará em harmonia com o grande padrão de justiça de Deus, Sua santa lei. Esta é a norma pela qual Deus mede as ações do homem. E esta será também a pedra de toque do caráter no juízo.

Muitos há que dizem que na morte de Cristo a lei foi revogada, mas nisto contradizem as próprias palavras de Cristo: "Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas. ... Até que o céu e a Terra passem, nem um jota ou um til se omitirá da lei" (Mt 5:17 e 18). Foi para expiar a transgressão da lei pelo homem que Cristo depôs Sua vida. Pudesse a lei ser mudada ou posta de lado, Cristo não precisaria ter morrido. Por Sua vida na Terra, honrou a lei de Deus. Por Sua morte, estabeleceu-a. Deu Sua vida como sacrifício, não para destruir a lei de Deus, não para criar uma norma inferior, mas para que a justiça fosse mantida, para que fosse vista a imutabilidade da lei e permanecesse para sempre.

Satanás declarara que era impossível ao homem obedecer aos mandamentos de Deus; e é verdade que por nossa própria força não lhes podemos obedecer. Cristo, porém, veio na forma humana, e por Sua perfeita obediência provou que a humanidade e a divindade combinadas podem obedecer a todos os preceitos de Deus.

"Mas a todos quantos O receberam deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus: aos que crêem no Seu nome" (Jo 1:12). Este poder não está no instrumento humano. É o poder de Deus. Quando uma alma recebe a Cristo, recebe também o poder de viver a vida de Cristo.

Deus requer de Seus filhos perfeição. Sua lei é um transcrito de Seu caráter, e é o padrão de todo caráter. Essa norma infinita é apresentada a todos, para que não haja má compreensão no tocante à espécie de homens que Deus quer ter para compor o Seu reino. A vida de Cristo na Terra foi uma expressão perfeita da lei de Deus, e quando os que professam ser Seus filhos receberem caráter semelhante ao de Cristo, obedecerão aos mandamentos de Deus. Então o Senhor pode contá-los com toda a confiança entre os que formarão a família do Céu. Trajados com as vestes gloriosas da justiça de Cristo, participarão da ceia do Rei. Têm o direito de associar-se com a multidão lavada no sangue.

O homem que foi à ceia sem a veste de bodas representa a condição de muitos hoje em dia. Professam ser cristãos e reclamam as bênçãos e privilégios do evangelho; contudo não sentem a necessidade de transformação de caráter. Nunca sentiram verdadeiro arrependimento dos pecados. Não reconhecem a necessidade de Cristo, nem exercem fé nEle. Não venceram suas inclinações para a injustiça, herdadas e cultivadas. Contudo pensam ser bastante bons em si mesmos, e confiam em seus próprios méritos em vez de nos de Cristo. Como ouvintes da Palavra, vão ao banquete, mas não tomaram a veste da justiça de Cristo.

Muitos que se chamam cristãos são meros moralistas humanos. Recusaram a dádiva que, somente, podia habilitá-los para honrar a Cristo com representá-Lo ao mundo. A obra do Espírito Santo lhes é estranha. Não são praticantes da Palavra. Os princípios celestes que distinguem os que são um com Cristo dos que se unem ao mundo, tornaram-se quase indistintos. Os professos seguidores de Cristo não são mais um povo separado e peculiar. A linha de demarcação é imperceptível. O povo está-se subordinando ao mundo, às suas práticas, costumes e egoísmos. A igreja passou para o mundo, transgredindo a lei, quando o mundo devia passar para a igreja na obediência da mesma. Diariamente a igreja se está convertendo ao mundo.

Todos estes esperam ser salvos pela morte de Cristo, ao passo que recusam viver Sua vida de abnegação. Exaltam as riquezas da livre graça, e procuram cobrir-se com a aparência de justiça, esperando assim ocultar os defeitos de caráter, mas seus esforços serão vãos no dia de Deus.

A justiça de Cristo não encobrirá pecado algum acariciado. O homem pode ser intimamente transgressor da lei; todavia, se não comete um ato visível de transgressão, pode ser considerado, pelo mundo, possuidor de grande integridade. A lei de Deus, porém, lê os segredos do coração. Todo ato é julgado pelos motivos que o sugeriram. Somente quem estiver de acordo com os princípios da lei de Deus, permanecerá em pé no Juízo.

Deus é amor. Demonstrou Ele este amor na dádiva de Cristo. Quando "deu o Seu Filho unigênito, para que todo aquele que nEle crê não pereça, mas tenha a vida eterna" (João 3:16), nada reteve de Sua possessão adquirida. Deu todo o Céu, do qual podemos tirar poder e eficiência para não sermos repelidos nem derrotados por nosso grande adversário. Mas o amor de Deus não O leva a desculpar o pecado. Não o desculpou em Satanás; não o escusou em Adão ou em Caim; nem o desculpará em qualquer outro homem. Não tolerará nossos pecados, e não passará por sobre nossos defeitos de caráter. Espera que vençamos em Seu nome.

Os que rejeitam o dom da justiça de Cristo estão rejeitando os atributos de caráter que os constituiriam filhos e filhas de Deus. Rejeitam aquilo que, unicamente, lhes poderia conceder aptidão para um lugar na ceia de bodas.

Na parábola, ao perguntar o rei: "Como entraste aqui, não tendo veste nupcial?" (Mt 22:12) o homem emudeceu. Assim será no grande dia de Juízo. Os homens agora podem justificar seus defeitos de caráter, mas naquele dia não apresentarão desculpas.

As igrejas professas de Cristo nesta geração desfrutam dos mais altos privilégios. O Senhor Se tem revelado a nós numa luz sempre crescente. Nossos privilégios são muito maiores que os do antigo povo de Deus. Temos não somente a grande luz proporcionada a Israel, mas também a evidência crescente da grande salvação trazida a nós por Cristo. Aquilo que para os judeus era o tipo e símbolo, é para nós realidade. Eles tinham a história do Antigo Testamento; nós temos essa e a do Novo. Temos a certeza de um Salvador que veio, um Salvador que foi crucificado, ressurgiu, e, à borda do sepulcro de José, proclamou: "Sou a ressurreição e a vida" (Jo 11:25). Em nosso conhecimento de Cristo e de Seu amor, o reino de Deus está posto no meio de nós. Cristo nos é revelado em sermões e cantado em hinos. O banquete espiritual é-nos apresentado em farta abundância. A veste de bodas provida com infinito custo, é oferecido liberalmente a toda pessoa. Pelos mensageiros de Deus nos são expostas a justiça de Cristo, a justificação, as excelentes e preciosas promessas da Palavra de Deus, o livre acesso ao Pai por Cristo, o conforto do Espírito, e a bem-fundada certeza da vida eterna no reino de Deus. Que poderia Deus fazer por nós, que não tenha feito em prover a grande ceia, o banquete celestial?

No Céu é dito pelos anjos ministradores: Executamos a obra para que fomos enviados. Repelimos os exércitos dos anjos maus. Enviamos luz e claridade à mente dos homens, avivando-lhes a memória do amor de Deus expresso em Jesus. Atraímos-lhes os olhares para a cruz de Cristo. Seu coração foi movido profundamente pelo sentimento do pecado, que crucificou o Filho de Deus. Foram convencidos. Viram os passos que devem ser dados na conversão; sentiram o poder do evangelho; seu coração foi sensibilizado ao verem a excelência do amor de Deus. Contemplaram a beleza do caráter de Cristo. Mas com a maioria, foi tudo em vão. Não quiseram submeter seus próprios hábitos e caráter. Não quiseram depor as vestes terrenas para serem trajados com as do Céu. Seu coração era dado à avareza. Amavam mais a companhia do mundo do que a de Deus.

Solene será o dia da decisão final. Em visão profética, o apóstolo João o descreve: "Vi um grande trono branco e O que estava assentado sobre ele, de cuja presença fugiu a Terra e o Céu; e não se achou lugar para eles. E vi os mortos, grandes e pequenos, que estavam diante do trono, e abriram-se os livros. E abriu-se outro livro, que é o da vida. E os mortos foram julgados pelas coisas que estavam escritas nos livros, segundo as suas obras" (Ap 20:11 e 12).

Triste será o retrospecto naquele dia em que os homens defrontarem face a face a eternidade. Toda a vida se apresentará justamente como foi. Os prazeres, riquezas e honras do mundo não parecerão tão importantes. Os homens hão de ver que somente a justiça que desprezaram é de valor. Verão que formaram o caráter sob a sedução enganadora de Satanás. As vestes que escolheram são o estigma de sua aliança ao primeiro grande apóstata. Então hão de ver a consequência de sua escolha. Terão conhecimento do que significa transgredir os mandamentos de Deus.

Não haverá oportunidade futura em que os homens se poderão preparar para a eternidade. Nesta vida é que devemos trajar as vestes da justiça de Cristo. Esta é a nossa única oportunidade de formar caráter para o lar que Cristo preparou para os que obedecem aos Seus mandamentos.

Rapidamente, os dias de graça estão terminando. O fim está próximo. É-nos feita a advertência: "Olhai por vós, para que não aconteça que o vosso coração se carreguem de glutonaria, de embriaguez, e dos cuidados da vida, e venha sobre vós de improviso aquele dia" (Lc 21:34). Vigiai para que não vos encontre desapercebidos. Acautelai-vos para que não sejais achados na ceia do rei sem vestes nupciais.

"Porque o Filho do homem há de vir à hora em que não penseis" (Mt 24:44). "Bem-aventurado aquele que vigia e guarda as suas vestes, para que não ande nu, e não se vejam as suas vergonhas" (Ap 16:15).

[Ellen G. White - Parábolas de Jesus, pp. 307-319]

Ilustração: Eugène Burnand - The Wedding Feast