O missionário americano John Allen Chau foi morto a flechadas ao tentar se aproximar de um dos povos mais isolados do mundo. |
Fazia tempo que as missões cristãs evangelizadoras não obtinham tanto destaque na mídia. Infelizmente, o fato que foi noticiado nos principais meios de comunicação do mundo foi a morte do jovem missionário John Allen Chau, de 27 anos, enquanto entrava em contato com uma tribo isolada da ilha Sentinela do Norte, na Índia.
Num contexto social marcado pela individualização da espiritualidade e pela visão pejorativa a respeito do proselitismo, missionários não são vistos com bons olhos. Alguns ainda apontam equívocos históricos como o colonialismo, a transmissão de doenças para grupos sem imunidade e certa arrogância combinada com ignorância sobre culturas. Há quem diga que Chau tenha sido um vilão criminoso que colocou os seus interesses acima dos interesses do povo sentinela.
Na semana passada, Ed Stetzer uma das principais vozes da missiologia atual, destacou em um artigo no The Washington Post a coragem de Chau. Ele tem sido comparado a Jim Elliot, mártir moderno que, em 1956, foi morto numa abordagem missionária aos Huaorani, no Equador. O lema de Elliot era que “não é tolo aquele que dá o que não pode guardar para ganhar o que não pode perder”. Semelhantemente, na última carta-diário enviada aos pais, Chau escreveu: “Vocês podem pensar que eu sou louco pelo que está acontecendo… Mas acho que vale a pena anunciar Jesus para essas pessoas … Senhor, eu não quero morrer! Quem ocupará o meu lugar se isso acontecer?”
Apesar de Chau ter passado por treinamentos linguísticos e médicos; ter recebido as vacinas necessárias; ter sido orientado como facilitar a aproximação e de ter planejado a missão por anos, algumas autoridades indianas, mais familiarizadas com os sentinelas, consideraram que ele desconhecia aspectos fundamentais dos costumes locais. Um representante da The Anthropological Survey of India, que teve contato prévio com a tribo, apontou que eles não tiveram o mesmo fim porque são peritos e conhecem, literalmente, “o pulso do povo”, suas atividades, símbolos, história, etc. “Não é somente o risco das doenças. Você precisa pensar em como se portar, o que dizer e o que compartilhar com eles. Para eles, qualquer um que chegar vem do mundo exterior, um novo mundo”, afirmou o representante do órgão do governo indiano a um site de notícias.
Nem todos os detalhes da experiência de Chau são conhecidos e o caso ainda é complexo para os missiólogos. No entanto, o debate está formado em torno de dois elementos: coragem e preparo. Coragem porque o dever cristão inclui os grupos étnicos mais negligenciados do mundo, de perto e dos confins da Terra. Preparo porque o testemunho é parte da mordomia confiada aos seres humanos e merece o nosso melhor.
A identidade histórica do povo de Deus é a de um movimento missionário. Durante os séculos, missionários deram grandes contribuições, sendo responsáveis pela construção de escolas e hospitais, estudando e sistematizando idiomas, compartilhando conhecimento sobre saúde. Segundo o Centro para o Estudo do Cristianismo Global, há 440 mil missionários cristãos atuando em outros países. Desses, 15 mil são brasileiros, de acordo com dados de 2017 divulgados pela Associação de Missões Transculturais Brasileiras (AMTB). Muitos são cristãos que “gritam” através de palavras e ações para pessoas de algum dos 7 mil grupos étnicos não alcançados pelo evangelho. Assim como Chau disse aos habitantes daquela ilha, eles declaram que amam essas pessoas assim como Jesus.
Em pleno século 21, com acesso aos estudos de missiologia e o histórico das missões cristãs, bem como muitas pesquisas sociológicas e antropológicas que servem de apoio, não há desculpas para tomar atalhos e ser negligente na tarefa missionária. Coragem e preparo não se anulam: ao contrário, é necessário ser corajoso para se preparar e ser preparado para viver essa coragem.
Marcelo Dias (via Revista Adventista)
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