Na vida real, porém, será que é possível lidar com tanto sentimento negativo quando precisamos conviver com aquele ou aquela que se tornou alvo do nosso ranço? A verdade é que dá, sim. Porém, é necessário colocar em prática o sentido real de duas outras palavrinhas: empatia e empenho.
Segundo a psicóloga Livia Marques, do Rio de Janeiro (RJ), é possível saber lidar com emoções como nojo, raiva, frustração, medo e angústia de forma mais funcional, ou seja, sem desrespeitar ou despejar a ira em cima dos outros. "Precisamos pensar que é importante rever nossas atitudes em relação às situações. Afinal, temos a chance de aprender algo em cada situação de nossas vidas", diz. Ellen G. White orienta: "Cumpre submetermos um temperamento impulsivo, e dominar nossas palavras; e a esse respeito conseguiremos grandes vitórias" (O Lar Adventista, p. 437).
Um ponto importante em qualquer circunstância (profissional, social ou familiar) é avaliar se a convivência com a pessoa que provoca "ranço" é mesmo necessária. Se for, vale ponderar os termos dessa convivência: ela se baseia em bate-papos aleatórios ou exige um relacionamento mais estreito? O que puder evitar, evite, mas, se não puder escapar, o segredo está em fugir de assuntos controversos e de conversas em que o objetivo nunca é a troca de ideias, e, sim, expressar opiniões fechadas. Ellen G. White aconselha: "Devemos escolher a convivência mais favorável ao nosso progresso espiritual, aproveitando-nos de todo auxílio ao nosso alcance, pois Satanás colocará muitos obstáculos para tornar nossa marcha em direção ao Céu o mais difícil possível" (Mensagens aos Jovens, p. 419).
Já Mônica Bayeh, psicóloga clínica e psicoterapeuta que também atua na capital do Rio, destaca que uma das maneiras de reverter o ranço é puxar da memória as boas lembranças. "Liste os favores que essas pessoas já fizeram para você, as viagens felizes que tiveram, os momentos especiais que compartilharam. Esforce-se para realimentar essas relações. Se são pessoas boas, sempre vale a pena. Tente entendê-las e lembre-se que você, vista com outros olhos, também não deve ser muito fácil de lidar em alguns aspectos, não é mesmo?", declara.
Ellen G. White observa: "Cultivai o hábito de falar bem do próximo. Detende-vos sobre as boas qualidades daqueles com quem estais associados, e olhai o menos possível para seus erros e fraquezas. Quando sois tentados a queixar-vos do que alguém disse ou fez, louvai alguma coisa na vida ou caráter dessa pessoa. Cultivai a gratidão" (A Ciência do Bom Viver, p. 492). E também declara: "O inimigo que mais carecemos temer é o próprio eu. Nenhuma vitória que possamos ganhar será tão preciosa como a vitória sobre nós mesmos" (Idem, p. 485)
Esse exercício simples de autoconhecimento é a chave para modificar a situação. De acordo com Mara Lúcia Madureira, psicóloga especializada em terapia cognitivo-comportamental, de São José do Rio Preto (SP), ranço também tem a ver com a intolerância à diversidade e à liberdade de expressão. "Como diria Caetano Veloso, 'é que Narciso acha feio o que não é espelho'. Cada um de nós percebe e lida com a realidade de modo único, com base em nossas características e experiências pessoais. Por conta disso, é natural volta e meia sentir dificuldade em compreender e resistência em aceitar o que difere do nosso modelo perceptivo", explica.
Ellen G. White aconselha: "Todas as relações sociais exigem o exercício do domínio próprio, paciência e simpatia. Diferimos tanto uns dos outros em disposições, hábitos e educação, que variam entre si nossas maneiras de ver as coisas. Julgamos diferentemente" (Idem, p. 483).
Mara reforça que é possível mudar nossos pensamentos, sentimentos e comportamentos e, desse modo, melhorarmos as relações contaminadas por desafetos. "Uma consulta à nossa consciência para reconhecer e aceitar a nossa intolerância é o primeiro passo na transformação do ranço em empatia. Se assumirmos a responsabilidade por nossas emoções, podemos modificá-las, mas se culparmos os outros nada há a se fazer, a não sofrer os efeitos do ódio tratado, com eufemismo, de ranço", diz.
Isso não significa incorporar valores ou assumir posturas incompatíveis com nosso sistema de crenças, mas se esforçar em compreender como as outras pessoas pensam e agem. "A partir daí, podemos até influenciar novas ideias e modificar atitudes alheias. Porém, a mudança sempre deve começar em nós", ressalta Mara.
Ellen G. White complementa: "Tão fraca, ignorante e sujeita ao erro é a natureza humana que todos devemos ser cautelosos na maneira de julgar o próximo. Pouco sabemos da influência de nossos atos sobre a experiência dos outros. O que fazemos ou dizemos pode parecer-nos de pouca importância, quando, se nossos olhos se abrissem, veríamos que daí resultam as mais importantes consequências para o bem ou para o mal" (Idem, p. 483).
Encerro com esta maravilhosa mensagem do apóstolo Paulo:
"Por isso eu, que estou preso porque sirvo o Senhor Jesus Cristo, peço a vocês que vivam de uma maneira que esteja de acordo com o que Deus quis quando chamou vocês. Sejam sempre humildes, bem-educados e pacientes, suportando uns aos outros com amor. Façam tudo para conservar, por meio da paz que une vocês, a união que o Espírito dá. Há um só corpo, e um só Espírito, e uma só esperança, para a qual Deus chamou vocês" (Efésios 4:1-4 NTLH).
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