segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

FORA DO CÉU

Caim
Apesar de Caim haver merecido a sentença de morte pelos seus crimes, um Criador misericordioso ainda lhe poupou a vida, e concedeu-lhe oportunidade para o arrependimento. Mas Caim viveu apenas para endurecer o coração, para incentivar a rebelião contra a autoridade divina, e tornar-se o chefe de uma linhagem de pecadores ousados e perdidos. Esse único apóstata, dirigido por Satanás, tornou-se o tentador para outros; e seu exemplo e influência exerceram uma força desmoralizadora, até que a Terra se corrompeu e se encheu de violência a ponto de reclamar a sua destruição.

A mulher de Ló
Se o próprio Ló não houvesse manifestado hesitação em obedecer à advertência do anjo, antes tivesse ansiosamente fugido para as montanhas, sem uma palavra de insistência ou súplica, sua esposa teria também podido escapar. A influência de seu exemplo a teria salvo do pecado que selou a sua perdição. Mas a hesitação e demora dele fizeram com que ela considerasse levianamente a advertência divina. Ao mesmo tempo em que seu corpo estava sobre a planície, o coração apegava-se a Sodoma, e ela pereceu com Sodoma. Rebelara-se contra Deus porque Seus juízos envolviam na ruína as posses e os filhos. Posto que tão grandemente favorecida ao ser chamada da ímpia cidade, entendeu que era tratada severamente, porque a riqueza que tinha levado anos para acumular devia ser deixada para a destruição. Em vez de aceitar com gratidão o livramento, presunçosamente olhou para trás, desejando a vida daqueles que haviam rejeitado a advertência divina. Seu pecado mostrou ser ela indigna da vida, por cuja preservação tão pouca gratidão sentira.

O Rei Saul
Saul sabia que nessa última ação, de consultar a médium de Endor, estava rompendo o único fio que ainda o ligava a Deus. O que não conseguira antes, com toda a sua obstinação, era agora final e definitivo: esse ato selou a sua separação de Deus. E chegou a fazer um concerto com a morte, um acordo com o inferno. O cálice da sua iniquidade transbordou.

Judas
Deus determinou meios, para que, se nós os usarmos diligentemente e com oração, nenhuma nau sofra naufrágio, mas subsista à tempestade e à tormenta, e ancore num Céu de bem-aventuranças afinal. Mas se desprezarmos e negligenciarmos esses decretos e privilégios, Deus não realizará um milagre para salvar a qualquer um de nós, e estaremos perdidos como Judas e Satanás.

Herodes, Herodias e Pilatos 
E agora, perante a multidão agitada, revelam-se as cenas finais — o paciente Sofredor trilhando o caminho do Calvário, o Príncipe do Céu suspenso na cruz; os altivos sacerdotes e a plebe zombeteira a escarnecer de Sua agonia mortal, as trevas sobrenaturais; a Terra a palpitar, as pedras despedaçadas, as sepulturas abertas, assinalando o momento em que o Redentor do mundo rendeu a vida. O terrível espetáculo aparece exatamente como foi. Satanás, seus anjos e súditos não têm poder para se desviarem do quadro que é a sua própria obra. Cada ator relembra a parte que desempenhou. Herodes, matando as inocentes crianças de Belém, a fim de que pudesse destruir o Rei de Israel; a vil Herodias, sobre cuja alma criminosa repousa o sangue de João Batista; o fraco Pilatos, subserviente às circunstâncias; os soldados zombadores; os sacerdotes e príncipes, e a multidão furiosa que clamou: “O Seu sangue caia sobre nós e sobre nossos filhos!” — todos contemplam a enormidade de seu crime. Em vão procuram ocultar-se da majestade divina de Seu rosto, mais resplandecente que o Sol, enquanto os remidos lançam suas coroas aos pés do Salvador, exclamando: “Ele morreu por mim!”

Nero e sua mãe
Entre a multidão resgatada acham-se os apóstolos de Cristo, o heroico Paulo, o ardoroso Pedro, o amado e amante João, e seus fiéis irmãos, e com estes o vasto exército dos mártires, ao passo que, fora dos muros, com tudo o que é vil e abominável, estão aqueles pelos quais foram perseguidos, presos e mortos. Ali está Nero, aquele monstro de crueldade e vício, contemplando a alegria e exaltação daqueles que torturava, e em cujas aflições extremas encontrara deleite satânico. Sua mãe ali está para testemunhar o resultado de sua própria obra; para ver como os maus traços de caráter transmitidos a seu filho, as paixões incentivadas e desenvolvidas por sua influência e exemplo, produziram frutos nos crimes que fizeram o mundo estremecer.

Sacerdotes e Pontífices
Ali estão sacerdotes e prelados católicos, que pretendiam ser embaixadores de Cristo e, no entanto, empregaram a tortura, a masmorra, a fogueira para dominar a consciência de Seu povo. Ali estão os orgulhosos pontífices que se exaltaram acima de Deus e pretenderam mudar a lei do Altíssimo. Aqueles pretensos pais da igreja tem uma conta a prestar a Deus, da qual muitos desejariam livrar-se. Demasiado tarde chegam a ver que o Onisciente é zeloso de Sua lei, e que de nenhuma maneira terá por inocente o culpado. Aprendem agora que Cristo identifica Seu interesse com o de Seu povo sofredor; e sentem a força de Suas palavras: “Quando o fizestes a um destes Meus pequeninos irmãos, a Mim o fizestes.” Mateus 25:40.

Os ímpios de todas as gerações
Com assustadora majestade, Ele (Cristo) chama os ímpios mortos. Eles se levantam de seu longo sono. Que terrível despertar! Eles contemplam o filho de Deus em Sua austera majestade e resplendente glória. Todos, assim que O contemplam, percebem que Ele é o crucificado que morreu para os salvar, Aquele a quem desprezaram e rejeitaram. São tão numerosos quanto a areia do mar. Na primeira ressurreição, todos saíram radiantes de imortalidade, mas na segunda o que se destaca em todos são as visíveis marcas da culpa. Todos saem assim como foram para a sepultura.

Os egoístas
Ninguém suponha que possa viver vida de egoísmo, e então, tendo servido aos próprios interesses, entrar no gozo do Senhor. Não puderam participar da alegria de um amor desinteressado. Não se adaptariam às cortes celestes. Não poderiam apreciar a pura atmosfera de amor que impregna o Céu. As vozes dos anjos e a música de suas harpas não lhes agradariam. Para sua mente a ciência do Céu seria um enigma.

O espiritualmente adormecidos
Vi um anjo com balanças na mão, pesando os pensamentos e interesses do povo de Deus, especialmente dos jovens. Num prato estavam os pensamentos e interesses que tendiam para o Céu; no outro achavam-se os que se inclinavam para a Terra. E nessa balança era lançada toda leitura de romances, pensamentos acerca do vestuário e exibição, vaidade, orgulho, etc. Oh! que momento solene! Os anjos de Deus em pé com balanças, pesando os pensamentos de Seus professos filhos — aqueles que pretendem estar mortos para o mundo e vivos para Deus! O prato cheio dos pensamentos da Terra, vaidade e orgulho, desceu rapidamente, e não obstante peso após peso rolou do prato. O que continha os pensamentos e interesses que se voltavam para o Céu subiu ligeiro enquanto o outro descia e, oh! quão leve estava ele! Posso relatar isso pelo que vi, mas nunca poderei dar a impressão solene e vívida gravada em minha mente, ao ver o anjo com a balança pesando os pensamentos e interesse do povo de Deus. Disse o anjo: “Podem esses entrar no Céu? Não, não, nunca. Diga-lhes que a esperança que agora possuem é vã, e a menos que se arrependam depressa e obtenham a salvação, hão de perecer.”

Os que condescendem com o pecado
Devido ao pecado, Satanás foi expulso do Céu; e ninguém que condescenda com o pecado e o acaricie poderá ir para o Céu, pois nesse caso Satanás outra vez conseguiria firmar-se ali.

Os rebeldes
Poderiam aqueles cuja vida foi empregada em rebelião contra Deus ser subitamente transportados para o Céu, e testemunhar o estado elevado e santo de perfeição que ali sempre existe, estando toda alma cheia de amor, todo rosto irradiado de alegria, ecoando em honra de Deus e do Cordeiro uma arrebatadora música em acordes melodiosos, e fluindo da face dAquele que Se assenta sobre o trono uma incessante torrente de luz sobre os remidos; poderiam aqueles cujo coração está cheio de ódio à Deus, à verdade e santidade, unir-se a multidão celestial e participar de seus cânticos de louvor? Poderiam suportar a glória de Deus e do Cordeiro? Não, absolutamente; anos de graça lhes foram concedidos, a fim de que pudessem formar caráter para o Céu; eles, porém, nunca exercitaram a mente no amor à pureza; nunca aprenderam a linguagem do Céu, e agora é demasiado tarde. Uma vida inteira de rebeldia contra Deus os incapacitou para o Céu. A pureza, santidade e paz dali lhes seriam uma tortura; a glória de Deus seria um fogo consumidor. Almejariam fugir daquele santo lugar. Receberiam alegremente a destruição, para que pudessem esconder-se da face dAquele que morreu para os remir. O destino dos ímpios se fixa por sua própria escolha. Sua exclusão do Céu é espontânea, da sua parte, e justa e misericordiosa da parte de Deus.

IDOLATRIA POLÍTICA

Uma boa definição para a mentalidade da sociedade moderna é o que a Bíblia chama de idolatria, que os profetas descrevem melhor do que ninguém: fazer um deus sob medida, algo ou alguém que construo com os meus pensamentos, atos e palavras, que venero incondicionalmente e dou um valor absoluto.

Quando a gente lê o Velho Testamento, e percebe a infidelidade que marcou a história dos reinos de Judá e Israel - começamos a nos perguntar como é que este povo foi capaz de abandonar a lei, os sinais maravilhosos e os ensinos do Senhor, e se prostituir alegremente atrás de outros deuses, período após período, com raras exceções.

Os antigos livros históricos estão recheados de líderes (patriarcas, juízes, reis e até alguns profetas) que permitiram que seu rebanho se desviasse após divindades estrangeiras como Baal e Astarote.

Ellen G. White relata: "Sob a danosa influência do reinado de Acabe, Israel afastou-se do Deus vivo, e corrompeu seus caminhos perante Ele. Por muitos anos tinham estado a perder o senso de reverência e piedoso temor; e agora parecia não haver ninguém que ousasse expor a vida colocando-se abertamente em oposição à predominante blasfêmia. A escura sombra da apostasia cobria toda a terra. Imagens de Baal e Astarote estavam em todo lugar para serem vistas" (Profetas e Reis, p. 55).

Nós, cristãos do século XXI, sempre olhamos com um certo desdém para o povo bíblico daquela era, nos considerando, por assim dizer, imunes ao paganismo e à idolatria. Entretanto, a realidade da modernidade nos pegou de calças curtas, e nos mostrou - na nossa meninice vaidosa - que a antiguidade não tem nada de diferente dos tempos atuais.

Ellen G. White observa: "Há entre nós um afastamento de Deus, e ainda não se fez a zelosa obra do arrependimento e volta ao primeiro amor essencial à restituição a Deus e à regeneração do coração. A infidelidade está fazendo suas incursões em nossas fileiras; pois é moda apartar-se de Cristo e dar lugar ao ceticismo. Para muitos, o clamor do coração tem sido: 'Não queremos que Este reine sobre nós.' Baal, Baal, é a escolha. A religião de muitos dentre nós será a religião do Israel apostatado, porque amam a seus próprios caminhos, e abandonam o caminho do Senhor" (Testemunhos para Ministros e Obreiros Evangélicos, p. 467)

A pandemia reforçou o comportamento de muitos "evangélicos" que preferiram dobrar seus joelhos a um poste-ídolo em nome de uma "ideolatria", uma adoração da ideologia que - felizes e gozosos - abraçam e defendem com unhas e dentes.

Um fanatismo inaudito invadiu muitas denominações que se dizem "cristãs", já que não se pode mais chamá-las de "igrejas" visto que funcionam como comitês eleitorais e partidos políticos. Tudo isto aceito com a mais absoluta normalidade.

Ellen G. White adverte: "O Senhor quer que Seu povo enterre as questões políticas. Sobre esses assuntos, o silêncio é eloquência. Cristo convida Seus seguidores a chegarem à unidade nos puros princípios evangélicos que são positivamente revelados na Palavra de Deus. Não podemos, com segurança, votar por partidos políticos; pois não sabemos em quem votamos. Não podemos, com segurança, tomar parte em nenhum plano político. Deus emprega as mais vigorosas imagens para mostrar que não deve haver união entre partidos mundanos e aqueles que estão buscando a justiça de Cristo" (Fundamentos da Educação Cristã, pp. 475-476).

A igreja, como instituição, não deve se envolver na política, quando o faz, ela e os seus líderes se tornam vulneráveis a todas as contingências do mundo político. Também serve de alerta os perigos de dar corda aos políticos que se julgam salvadores da pátria. Há líderes e membros de igrejas com uma expectativa ‘messiânica’ que um determinado político canalize automaticamente as bênçãos de Deus sobre o Brasil, resolvendo todos os problemas que nos afligem. Esse messianismo é muito perigoso, para o país e para a igreja.

O resultado da idolatria política para a teologia cristã bíblica é catastrófica. Não só Cristo é destituído de seu trono no coração do crente, como a Bíblia e o cristianismo passam a ser usados como meros objetos úteis para a luta política. Da mesma maneira, os políticos e ideólogos alvos da idolatria de seus seguidores passam a usar a Bíblia e o cristianismo como meros objetos úteis para se manterem na posição de divinos profetas ou até Messias.

Não há mal em defender uma posição política e saber o que está acontecendo no atual cenário. Mas o cristão deve zelar, acima de tudo, por princípios bíblicos. Fazer de ideologias, movimentos, partidos, políticos e ideólogos elementos de um evangelho terreno, não passa de idolatria. E fazer uso da Bíblia para defender qualquer tipo de messianismo político é uma clara afronta a Cristo.

Ellen G. White orienta: "O povo de Deus não deve ter ligação alguma com a idolatria em qualquer de suas formas. Eles devem atingir uma norma mais elevada. Por que se dá tanta atenção a instrumentos humanos, ao passo que há tão pouco esforço mental em direção ao Deus eterno? Por que os que pretendem ser filhos do Rei celestial se acham tão absorvidos nas coisas deste mundo? Que o Senhor seja exaltado! Que a Palavra do Senhor seja engrandecida! Sejam os seres humanos colocados em posição inferior, e que o Senhor seja exaltado! Lembrai-vos de que reinos, nações, reis, estadistas, conselheiros e grandes exércitos terrestres, e toda a magnificência e glória mundanas, são como o pó da balança. Deus tem a fazer um ajuste de contas com todas as nações. Todo reino tem que ser abatido. A autoridade humana deve tornar-se como nada. Cristo é o Rei do mundo, e Seu reino deve ser exaltado" (Fundamentos da Educação Cristã, pp. 481-482).

Quando Deus nos livrar das idolatrias de um projeto político, de uma ideologia, de um líder, ou da idolatria de nós mesmos, poderemos renovar a esperança de dialogar e atuar melhor em meio às nossas diferenças. Assim, estaremos livres para servir em qualquer lugar ao Deus que traz vida, justiça e paz para todos, em especial àqueles pequenos e anônimos que permanecem fiéis diante dos poderes desse mundo.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

MAU HUMOR

Em circunstâncias normais, o mau humor já tende a se manifestar de tempos em tempos. A incerteza, o estresse e a ansiedade geradas pela pandemia, porém, fazem com que o mau humor se manifeste de maneira mais constante. A própria medicina considera o mau humor crônico uma enfermidade. Ela se chama distimia e pode ser definida como “a falta de prazer ou divertimento na vida, seguida por um constante sentimento de negatividade”.

Embora para muitos possa parecer algo banal – sem repercussões além da própria cara feia e do incômodo sentido por quem está por perto –, esse estado de espírito traz muito mais prejuízos à saúde e à vida espiritual em geral do que se imagina. O mau humor se instala em sua mente, de forma que você fica remoendo todas as formas em que foi injustiçado. Você se torna irritável e impaciente. Você explode com os outros e se justifica. Há uma categoria de ira justa (“Irai-vos, mas não pequeis”, diz Efésios 4:26), mas nunca há um mal humor justo.

Vejamos algumas dicas de Ellen G. White e da Bíblia para combater o mau humor que pode nos acometer nestes tempos de pandemia:

1. Devemos olhar o lado brilhante das coisas
"Não permitais que as perplexidades e tristezas da vida diária aflijam vosso espírito e vos entristeçam o semblante. Se o permitirdes, tereis sempre alguma coisa que vos atormente e aborreça. A vida é o que dela fazemos, e encontraremos o que buscarmos. Se olharmos as tristezas e perplexidades, se estamos de mau humor de molde a ampliar pequenas dificuldades, encontraremos quantidades delas para nos absorver os pensamentos e a conversação. Mas se olhamos o lado brilhante das coisas, encontraremos o suficiente para nos fazer alegres e felizes. Se dermos sorrisos, eles nos serão devolvidos; se falarmos palavras prazerosas e alegres, assim nos falarão" (LA, 430).

“Não se associe com quem vive de mau humor, nem ande em companhia de quem facilmente se ira; do contrário você acabará imitando essa conduta e cairá em armadilha mortal” (Provérbios 22:24-25 NVI).

2. Devemos carregar a alegria do Céu
"Quando os cristãos se mostram sombrios e deprimidos, dão uma impressão errônea da religião. Em alguns casos tem sido nutrida a ideia de que a alegria não é condizente com a dignidade do caráter cristão, mas isto é um erro. O Céu é todo alegria; e se carregamos para nossa alma a alegria do Céu e, tanto quanto possível o expressamos em palavras e no comportamento, seremos mais agradáveis a nosso Pai celestial do que nos mostrando deprimidos e tristes" (LA, 430).

"É dever de cada um cultivar a alegria em vez de ruminar tristezas e pesares. Muitos não somente se fazem muito infelizes por este procedimento, mas sacrificam a saúde e felicidade por uma imaginação mórbida. Há ao seu redor coisas que não apreciam, e sua fisionomia mostra uma sombra contínua que, mais que palavras, expressam seu descontentamento. Essas emoções depressivas causam-lhes grande dano à saúde, pois embaraçando o processo digestivo, interferem com a nutrição. Ao passo que a preocupação e ansiedade não remediam um simples mal, podem produzir grande dano; mas alegria e esperança, ao mesmo tempo que iluminam o caminho de outros, 'são vida para os que as acham e saúde, para o seu corpo' (Provérbios 4:22)" (LA, 431).

“O coração alegre aformoseia o rosto, mas com a tristeza do coração o espírito se abate” (Provérbios 15:13).

3. Devemos cuidar da alimentação
"Açúcar não é bom para o estômago. Causa fermentação, e isto obscurece o cérebro e ocasiona mau humor" (CSRA, 327).

"Podemos ter variedade de comida boa e saudável, preparada de maneira saudável, de maneira que seja aprazível a todos. É de importância vital saber cozinhar bem. A cozinha deficiente causa doenças e mau humor; o organismo fica desarranjado, e não se podem perceber as coisas celestiais. Há mais religião na boa cozinha do que podeis imaginar" (CSRA, 256).

4. Devemos praticar a paciência
"Jesus não nos abandonou dando-nos razão para ficarmos espantados diante das provações e dificuldades. A respeito delas Ele tudo nos falou, e também nos disse que não ficássemos acabrunhados nem abatidos quando sobreviessem as provações. Olhemos para Jesus, nosso Redentor, alegremo-nos e nos regozijemos. As provações mais difíceis de suportar são as causadas por nossos irmãos, nossos próprios amigos íntimos; mas até essas provas podem ser suportadas com paciência" (CI, 55).

"Precisa-se de homens nesta obra que não murmurem nem se queixem por causa de dificuldades ou provações, sabendo que isso é parte do legado que Jesus lhes deixou. Devem estar dispostos a sair do acampamento e sofrer afronta e carregar fardos como bons soldados de Cristo. A paciência é uma virtude que deves praticar. Carregarão a cruz de Cristo sem queixas, sem murmuração ou mau humor e serão “pacientes na tribulação" (TI3, 423).

5. Devemos ter cuidado com as palavras e atos
"Não permitais que escape de vossos lábios nenhuma palavra de mau humor, aspereza ou ira. A graça de Cristo espera vosso pedido. Seu Espírito dominar-vos-á o coração e a consciência, presidindo vossas palavras e atos" (OC, 219).

"Lembremo-nos de que quando estamos de mau humor e pensamos ser nosso dever chamar à ordem toda pessoa que de nós se aproxima, jamais estamos em terreno vantajoso. Se cedermos à tentação de criticar os demais, apontar-lhes as faltas e demolir o que fazem, podemos estar certos de que não estamos fazendo a nossa parte de forma nobre e correta" (TI9, 184).

“Livrem-se de toda amargura, indignação e ira, gritaria e calúnia, bem como de toda maldade” (Efésios 4:31).

“Sejam todos prontos para ouvir, tardios para falar e tardios para irar-se” (Tg 1:19).

6. Devemos praticar a gratidão e cortesia
"Muitos anseiam intensamente por amizade e simpatia. Devemos ser abnegados, procurando sempre oportunidades, mesmo nas pequenas coisas, para mostrar gratidão pelos favores que temos recebido de outros e procurando ocasião de alegrar a outros e aliviar-lhes as tristezas e as cargas por atos de amável bondade e pequenos atos de amor. Esses atenciosos atos de cortesia que, começando na família se estendem fora de seu círculo, ajudam na soma do que faz feliz a vida; e a negligência dessas pequenas coisas ajudam na soma do que torna a vida amarga e triste" (TI3, 539, 540).

“Não retribuam mal com mal, nem insulto com insulto; ao contrário, bendigam” (1Pe 3:9).

7. Devemos servir com alegria
"Que todos quantos professam haver encontrado a Cristo, sirvam, como Ele fez ao bem dos homens. Nunca deveríamos dar ao mundo a falsa impressão de que os cristãos são uma gente triste, descontente" (DTN, 152).

8. Devemos possuir o amor da pureza e simplicidade
"Guarda-te da irritabilidade e do mau humor, e de um espírito atormentador. Busca a piedade de coração. Sê cristão coerente. Possui o amor da pureza e humilde simplicidade, e sejam estas inseridas em tua vida" (TI2, 314).

9. Devemos ter mais de Cristo e menos do mundo
"O serviço feito de boa vontade e de coração a Jesus, produz uma religião radiante. Os que seguem a Cristo bem de perto não se mostram sombrios. Em Cristo há luz, paz e alegria permanentes. Necessitamos mais de Cristo e menos do mundo, mais de Cristo e menos do próprio eu" (Manuscrito 1, 1867).

10. Devemos viver um cristianismo genuíno
"Viu-me alguma vez triste, acabrunhada, queixosa? Eu tenho uma crença que me impede isto. É uma concepção errônea do verdadeiro ideal do caráter e do serviço cristãos que leva a essa conclusão. É a falta de genuína religião que produz acabrunhamento, desalento, tristeza. O cristão fervoroso procura imitar a Jesus, pois ser cristão é ser semelhante a Cristo. É realmente essencial ter correta compreensão da vida de Cristo, dos hábitos de Cristo, para que Seus princípios possam ser reproduzidos em nós que desejamos ser semelhantes a Cristo" (LA, 431).

Conclusão
Jesus convida os cansados, mal-humorados e acabrunhados filhos e filhas de Adão a virem ter com Ele e a lançarem sobre Ele os seus pesados fardos. Muitos, porém, que ouvem esse convite, embora anseiem por descanso, prosseguem no áspero caminho, aconchegando os seus fardos ao coração. Jesus os ama e almeja levar-lhes os fardos e a eles mesmos em Seus fortes braços. Quer remover os temores e as incertezas que lhes arrebatam a paz e o descanso; mas primeiro precisam ir ter com Ele, e contar-Lhe os secretos dissabores do coração. Solicita a confiança de Seu povo como prova de seu amor por Ele.

Que não vivamos e nem fiquemos mal-humorados, se bem que muitas vezes fatigados, tristes, cheios de pesar; o inverno não há de perdurar para sempre. O estio da paz, da alegria e do prazer eterno está prestes a vir. Então Cristo habitará conosco e nos guiará às fontes de águas vivas, e enxugará toda lágrima de nossos olhos.

Que possamos guardar as palavras de Jesus, pois elas são fonte de alegria: “Tenho lhes dito estas palavras para que a minha alegria esteja em vocês e a alegria de vocês seja completa” (Jo 15:11).

quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

A IDADE DA TERRA

Mas isso não é bíblico!”, exclamou o aluno. Aquilo era demais para mim. Ali estava eu, bacharel em Teologia e mestre em Ciências da Religião, pastor pertencente a uma família de quatro gerações de ministros e professor de religião para turmas de ensino superior, sendo acusado publicamente de manter uma posição equivocada. “Quanta ousadia!”, pensei. “Eles não podem estar certos! Ou podem?”

A razão de tanta polêmica foi a pergunta da prova que eu havia acabado de aplicar: “Quando Deus criou a água?”. Eu esperava que eles tivessem respondido que foi “no segundo dia da semana da criação”. No entanto, quase a metade da turma argumentou que havia sido “antes da semana da criação”. Tomando como base aquilo que aprendi sobre a origem da Terra na minha infância, risquei a resposta e atribui nota zero para aquele aluno. Porém, fui surpreendido pela reação dos demais estudantes quando receberam a avaliação. Eu estava convicto de minha posição, mas, diante de tantos questionamentos, resolvi recolher as provas e reavaliar a questão.

Nos dias seguintes, dediquei-me inteiramente a pesquisar sobre esse assunto. Aceitar que a matéria existia antes da semana da criação soava para mim um flerte com o evolucionismo, uma posição para a qual eu não estava disposto a dar a mínima consideração. Mas aquela reação inesperada do grupo fez com que eu considerasse outra interpretação possível.

O texto de Gênesis 1:2 afirma que “o Espírito de Deus pairava por sobre as águas”, dando a entender que, antes do primeiro dia da criação, havia água. Portanto, o que foi exatamente que Deus criou na semana da criação? Poderia Ele ter criado o Universo antes de formar a Terra e preenchê-la de seres viventes? Creio que minha dúvida seja a de muitos adventistas.

Por serem criacionistas, os adventistas defendem arduamente que o relato da criação é histórico e descreve o que ocorreu numa semana literal de sete dias com 24 horas, há aproximadamente 10 mil anos. Para muitos, não apenas a Terra, mas todo o Universo foi criado durante aquela semana. Essa posição, no entanto, enfrenta sérias dificuldades quando comparada com a ciência e a própria Bíblia, como veremos neste artigo.

Evidências na Bíblia
A interpretação de que a vida na Terra foi criada num momento distinto e posterior à criação do Universo e do próprio planeta parece estar em harmonia com uma das crenças mais importantes do adventismo: o grande conflito entre Cristo e Satanás. Esse embate surgiu no Céu, com a rebelião de Lúcifer e seus anjos. Conforme afirmaram vários teólogos adventistas, o grande conflito serve de moldura para interpretarmos as Escrituras. É a chave hermenêutica para a compreensão da Bíblia.

Embora o Gênesis tenha como ponto de partida de sua narrativa a criação da Terra e da humanidade, fica evidente, mais adiante nas Escrituras, que Adão e Eva não foram os primeiros seres criados no Universo. Satanás, por exemplo, é mencionado no relato da tentação (Gn 3:1; Ap 12:9) sem que haja qualquer referência à sua origem, sugerindo que ele já existia naquela semana inicial. O livro de Ezequiel descreve Satanás no jardim do Éden como coberto de pedras preciosas (Ez 28:13).

O capítulo 14 de Isaías, por sua vez, completa esse quadro nos informando que, quando Lúcifer se rebelou contra Deus, alguns elementos cósmicos já existiam: ele desejava subir “acima das estrelas de Deus” (v. 13) e “acima das mais altas nuvens” (v. 14). O texto também menciona o “monte da congregação” (v. 13), dando a entender um local físico em que se congregam seres criados. Na Bíblia, a frequente menção aos anjos e espíritos caídos é um lembrete de que não estamos a sós nesta vasta criação. Essas evidências nos indicam que o Universo, com seus elementos básicos (tempo, matéria e vida), já existiam antes da semana da criação.

O livro de Jó também aponta nessa direção. Ali encontramos dois textos que claramente sugerem a existência de outros seres criados além de nós. Em primeiro lugar, quando Satanás compareceu perante o Senhor (Jó 1:6, 7), o texto faz referência a outros “filhos de Deus”, dando a entender que nosso planeta não era o único habitado. Embora seja possível supor que esses seres vieram à existência depois da criação da Terra, Jó 38:4 a 7 volta a mencionar os “filhos de Deus” cantando e se rejubilando enquanto Deus “lançava os fundamentos da Terra”. Essa passagem deixa claro que, ao formar o planeta Terra, Deus era observado por uma plateia de admiradores. Crer que todo o Universo passou a existir a partir da semana da criação traz sérias dificuldades para o intérprete desses textos.

Além do mais, o próprio relato de Gênesis 1:1-3 deixa claro que, quando Deus criou a luz, no primeiro dia, o Espírito de Deus “pairava por sobre as águas”. O teólogo William H. Shea, ao comentar essa passagem no Tratado de Teologia Adventista do Sétimo Dia, reconhece “o fato de que a Terra inerte se achava em um estado aquoso antes dos acontecimentos da semana da criação” (p. 469).

Outro argumento interessante levantado pelo teólogo John Hartley, em seu comentário Gênesis, é que “o padrão repetitivo empregado para cada dia da criação nos mostra que os versos 1 e 2 não fazem parte do primeiro dia da criação (v. 3-5)”. Cada período é introduzido com a expressão “e disse Deus”, e concluído com “houve tarde e a manhã: o dia [x]”. Portanto, conclui Hartley, “esses dois primeiros versos [Gn 1:1, 2] se distinguem do restante do relato daquilo que Deus fez no primeiro dia da criação” (p. 41). Sendo assim, embora os eventos ocorridos na semana da criação tenham acontecido entre 6 e 10 mil anos, a Bíblia fornece várias evidências de que o Universo, assim como a própria Terra em seu estado físico, é muito mais antigo que isso.

Evidências nas estrelas
Quando nos voltamos para a ciência, percebemos que a astronomia também aponta para um Universo mais antigo que poucos milhares de anos. Ao lermos sobre estrelas e galáxias distantes, somos informados de que elas se encontram a “milhões de anos-luz” de nós, uma medida popularmente empregada para facilitar nossa compreensão das vastas distâncias que nos separam dos elementos cósmicos. Um ano-luz equivale à distância que a luz de uma estrela percorre durante um ano: cerca de 9,5 trilhões de quilômetros. Isso significa, por exemplo, que a Grande Nuvem de Magalhães, uma galáxia anã que está a aproximadamente 170 mil anos-luz da Terra, existe há pelo menos 170 mil anos. Esse cálculo é um desafio para os que defendem a interpretação de que o Universo é jovem.Alguns argumentam que Deus poderia ter criado o Universo em um tempo recente, mas lhe dado a aparência de antigo. Seria como no caso de Adão e Eva, que, apesar de recém-criados, saíram adultos das mãos do Criador. Dessa forma, defende esse grupo, o Universo poderia ser cronologicamente jovem, porém esteticamente antigo.

Contudo, essa linha de interpretação deixa de considerar que as galáxias, estrelas e nebulosas que observamos não são estáticas, mas estão em constante movimentação e passam por processos que podem ser acompanhados pelos nossos telescópios. Em 24 de fevereiro de 1987, por exemplo, o astrônomo Ian Shelton, da Universidade de Toronto, no Canadá, estava observando a Grande Nuvem de Magalhães quando identificou uma supernova. Ou seja, a explosão de uma estrela cuja luminosidade pode ultrapassar a de sua própria galáxia. Devido à sua distância, a luz dessa supernova teria começado sua jornada há 170 mil anos, sendo capturada por nossos telescópios somente em 1987.

Em fevereiro, representantes do projeto LIGO (Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferômetro Laser) anunciaram a descoberta de ondas gravitacionais originadas a 1,3 bilhão de anos-luz. A fusão de dois buracos negros provocou ondulações na estrutura do Universo, que foram detectadas pelo observatório americano no segundo semestre de 2015. Se Deus, de fato, criou o Universo com a aparência de antigo, qual teria sido seu propósito ao nos iludir com esses fenômenos? Estaria mentindo para nós, realizando uma ilusão ótica, um truque de mágica? Muitos teólogos se preocupam com as implicações que essa posição pode ter para a compreensão do caráter de Deus. Nesse caso, Bíblia e ciência apontam para uma solução menos problemática: o Universo é mais antigo do que muitos cristãos imaginam.

Criação em dois momentos
Entretanto, um texto bíblico parece contradizer frontalmente a ideia da criação em dois momentos. Gênesis 1:14-19 descreve Deus criando o Sol e a Lua para governar o dia e a noite. No verso 16, a Bíblia acrescenta a informação de que Deus “fez também as estrelas”, dando a entender que elas não existiam antes do quarto dia. Essa interpretação, porém, apresenta sérios problemas. O Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, ao comentar o livro de Gênesis, ressalta que a expressão “fez também” é, na verdade, um acréscimo dos tradutores da Bíblia (p. 194). O texto original do verso 16 diz literalmente: “…e o menor para governar a noite e as estrelas”.

Num capítulo do livro He Spoke and It Was, o teólogo adventista Richard Davidson, professor de Antigo Testamento na Universidade Andrews, argumenta que “a sintaxe do verso 16 não aponta para a criação das estrelas no quarto dia. Inclusive, por não atribuir qualquer função às estrelas, como ao Sol e à Lua, elas [as estrelas] podem ser tidas como uma declaração parentética [ou seja, entre parênteses] acrescentada ao verso para completar a descrição dos corpos celestiais” (p. 53).

Num artigo na revista Andrews University Seminary Studies, número 25, Colin House concorda com essa posição e mostra que a partícula hebraica traduzida como “e também” subentende que a estrelas já existiam por ocasião do quarto dia. Sendo assim, ele propõe que a melhor tradução do texto seria: “A luz menor para governar a noite junto com as estrelas” (p. 245).

Portanto, o relato da criação apresenta a ação de Deus em dois estágios: o primeiro, criando a matéria (Gn 1:1, 2); e o segundo, dando forma a essa matéria e trazendo à existência seres viventes (Gn 1:3-31). Richard Davidson argumenta que essa estratégia não é estranha ao Criador. Por ocasião da criação do homem, Deus usou o pó (matéria pré-criada) para dar forma a Adão e lhe soprar o fôlego de vida. Com Eva, ele usou a costela de Adão. Deus, nesses casos, é retratado como um oleiro ou arquiteto, que faz uso de material existente para modelar a obra que tem em mente.

Esse processo criativo em duas etapas é mencionado em diversos momentos nas Escrituras: a criação de um “novo coração” (Sl 51:10), de uma “nova aliança” (Jr 31:33), ou do “novo céu e nova Terra” (Is 65:17; 66:22; Ap 21-22). “Todos pressupõem algo que já existia”, afirma Davidson. Se cremos que Deus realizará uma criação escatológica envolvendo duas etapas, usando matéria já existente para criar os renovados céus e Terra, “não seria anormal Deus ter seguido a mesma estratégia em Gênesis 1 e 2” (p. 53).

No entanto, resta ainda um esclarecimento. O Sol e a Lua, também mencionados no quarto dia da criação, teriam sido criados nesse dia ou já existiam e passaram a ter a função de fazer a “separação entre o dia e a noite” e sinalizar as “estações, dias e anos” (Gn 1:14)? Essas duas interpretações são discutidas há alguns séculos, e ambas podem ser aceitas sem afetar nossa teologia criacionista.

A contagem de um período formado por parte escura (noite) e parte clara (dia) foi estabelecida por Deus no primeiro dia da semana da criação, quando o Sol não é mencionado (Gn 1:3-5). Moisés não se ateve a explicar a natureza dessa luz. Porém, em Salmo 104, um texto que também relata a criação, a luz é definida como a própria manifestação física de Deus: “coberto de luz como de um manto” (v. 2).

Esse é um maravilhoso paralelo com a posterior manifestação física da presença divina no santuário terrestre, a chamada shekiná (Êx 40:34). Da mesma forma que, durante a travessia do mar Vermelho, Deus foi luz para os hebreus e escuridão para os egípcios (Êx 14:19, 20), o Criador serviu de luz e escuridão para a contagem dos três primeiros dias. Isaías 45:7 (NTLH) acrescenta que Deus é “o Criador da luz e da escuridão”.

Portanto, duas hipóteses podem ser mantidas sobre o que ocorreu no quarto dia: o Sol e a Lua podem ter sido criados ou passaram a ter a função de luminares da noite e do dia e marcadores de tempo para a contagem das estações.

A ideia não é nova
A teoria de que a Terra poderia ter sido criada em um estado aquoso, sem forma e vazia antes da semana da criação não é totalmente nova. Segundo o Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, várias pessoas, desde os tempos do pioneiro adventista Uriah Smith, advogavam essa posição (verso 1, p. 24). Ao contrário do que alguns possam achar, não é uma posição que deriva do pensamento científico, muito menos evolucionista, mas que está fundamentada em argumentos bíblicos e de acordo com a cosmovisão adventista. Conforme ponderou John Lennox, declarado criacionista e professor de matemática da Universidade de Oxford, no livro Seven Days That Divide the World, “é logicamente possível crer nos dias de Gênesis como de 24 horas (ou uma semana terrestre) e crer que o Universo é antigo. […] Isso não tem nada que ver com ciência. Tem que ver com o que o texto está de fato nos dizendo” (p. 53).

Vale destacar o seguinte: dizer que o Universo é antigo não significa endossar as datações geológicas de milhões de anos adotadas pelos evolucionistas. Essa é outra questão que pode ser discutida em outra ocasião. Crer que as camadas geológicas e os fósseis ali contidos datam de milhões de anos enfrenta vários obstáculos na Bíblia e compromete toda a teologia adventista. No entanto, o conceito de que o Universo é muito mais antigo que a vida na Terra está em pleno acordo com as Escrituras, e nos mostra que ciência e religião, quando bem fundamentadas, podem andar de mãos dadas.

Glauber Araújo (via Revista Adventista)

CRISTIANISMO ANTIFASCISTA

Todos os anos, no dia 27 de janeiro, celebra-se o Dia Internacional em Memória das Vítimas do Holocausto. A data faz referência à liberação, pelas tropas soviéticas, do Campo de Concentração e Extermínio Nazista Alemão de Auschwitz-Birkenau em 1945 e foi definida pela Assembleia Geral das Nações Unidas. Registra-se que mais de 1,1 milhão de pessoas foram exterminadas pelo regime nazista só ali naquele lugar. Apenas por volta de 7 mil judeus, entre eles, cerca de 500 crianças, sobreviveram em condições precárias em Auschwitz.

Nos horrores do Holocausto, entre o extermínio de milhares de pessoas, encontramos o mundialmente conhecido mártir-teólogo e pastor luterano Dietrich Bonhoeffer (1906-1945), que foi executado devido a sua resistência ao sistema nazista. Bonhoeffer, certamente foi um dos raros homens da igreja que resistiu a maldade instituída por Adolf Hitler.

Desde cedo, Bonhoeffer decidiu ser teólogo e com isso se tornou um dos mais profícuos e renomados teólogos do século 20. Quando jovem decidiu-se seguir a carreira pastoral na Igreja Luterana, doutorou-se em teologia na Universidade de Berlim e fez um ano de estudos no Union Theological Seminary em Nova York. Retornou à Alemanha em 1931. Aos 27 anos assumiu o pastorado em uma congregação de Londres na Inglaterra; dois anos depois retornou à Alemanha para dirigir o Seminário Teológico da Igreja Confessante. Em seguida, tomou a importante decisão de ingressar-se no movimento de resistência. Tornando-se um militante contra o sistema de opressão nazista, teve a sua habilitação à docência na Universidade de Berlim cassada, assim como a proibição de palestrar e escrever.

Bonhoeffer se tornou muito ativo na luta entre a Igreja Confessante (ala da igreja evangélica contrária à política nazista) e a Igreja dos "Deutsche Christen" (alemães cristãos defensores do nacional-socialismo). Peter Ciaccio, pastor, em artigo publicado por Riforma, em 09/04/2015, escreveu:

"Se hoje na Europa ainda podemos dizer-nos cristãos sem ter vergonha é graças a um jovem pastor luterano que num momento entendeu tudo. Enquanto milhões de cristãos na Europa fascista aderiam à ditadura, poucos milhares entenderam que o fascismo não era somente uma ideia política, mas uma operação criminal."

Bonhoeffer foi um dos mentores e signatários da Declaração de Bremen, quando em 1934 diversos pastores luteranos e reformados, formaram a Bekennende Kirche, Igreja Confessante, rejeitando desafiadoramente o nazismo:

"Jesus Cristo, e não homem algum ou o Estado, é o nosso único Salvador."

Obviamente o movimento foi posto em ilegalidade e em Abril de 1943 foi preso por ajudar judeus a fugirem para a Suíça. Levado de uma prisão para outra, em 9 de Abril de 1945, três semanas antes que as tropas aliadas libertassem o campo, foi enforcado, junto com seu irmão Klaus, e cunhados Hans von Dohnanyi e Rüdiger Schleicher, no campo de concentração de Flossenbürg.

Sua obra mais famosa, escrita no período de ascensão do nazismo foi "Discipulado" (Nachfolge) na qual desenvolve a polêmica acerca da teologia da graça, fundamento da obra de Lutero. O livro opõe-se a ênfase dada à "justificação pela graça sem obras da lei", afirmando que:

“A graça barata é inimiga mortal de nossa Igreja. A nossa luta trava-se hoje em torno da graça preciosa que é um tesouro oculto no campo, por amor do qual o homem sai e vende tudo que tem (...) o chamado de Jesus Cristo, ao ouvir do qual o discípulo larga suas redes e segue (...) o dom pelo qual se tem que orar, a porta a qual se tem que bater.”

Destas linhas já se denota o profundo "fazer teológico poético" que tanto caracteriza a obra de Bonhoeffer.

Quando já estava sendo perseguido pelo nazismo, Bonhoeffer escreveu um tratado considerado por muitos uma das maiores obras primas do protestantismo, que denominou simplesmente "Ética". É nesta obra que ele justifica, em parte, seu engajamento na resistência alemã anti-nazista e seu envolvimento na luta contra Adolf Hitler, dizendo que:

“É melhor fazer um mal do que ser mau.”

Suas cartas da prisão são um exemplo de martírio e também um tesouro para a Teologia Cristã do século 20.

Em sua biografia consta que ele atuou como agente secreto tramando inclusive o assassinato do líder nazista. Com um espírito democrático, chegou a estar a salvo nos EUA, mas aceitou o convite de se infiltrar na Alemanha na intenção de restabelecer a paz mundial.

O papel de Bonhoeffer como agente contrário ao nazismo era o de passar mensagens sigilosas ao bispo britânico George Bell, que as direcionava ao primeiro-ministro da Inglaterra, Winston Churchill. Assim o pastor luterano participou do planejamento de diversas ações para salvar judeus, além, é claro, das tentativas de assassinar Hitler. Quando se deu a "Operação Valquíria" (1944), o mais famoso dos golpes para eliminar o "Fuhrer", Bonhoeffer já estava preso pela polícia secreta alemã. E foi justamente pela falha da Operação Valquíria que os nazistas descobriram o seu papel como agente duplo que culminou em seu enforcamento.

Um médico, testemunha dos últimos instantes de vida de Bonhoeffer, deixou por escrito palavras capazes de nos comover:

"Através da porta entreaberta em uma sala dos barracos, eu vi o pastor Bonhoeffer, antes de vestir o seu uniforme da prisão, ajoelhar-se no chão para orar a Deus com fervor. Fiquei profundamente tocado pelo modo com que esse amável homem orava, tão devoto e seguro de que Deus ouvia a sua oração. [...]. Nos quase 50 anos de profissão médica, eu nunca tinha visto um homem morrer tão totalmente submisso à vontade de Deus".

Milhares foram as vítimas de todo o sistema nazista. Pesquisadores estimam 11 milhões de mortos; além de mais da metade serem judeus, ainda tinham padres, pastores, ciganos, portadores de deficiências mentais ou físicas, comunistas, sindicalistas, testemunhas de Jeová, anarquistas, gays, poloneses, povos eslavos e combatentes da resistência. Ao relembrar esta história de horror, biografias como a de Dietrich Bonhoeffer são imprescindíveis para o aprendizado das novas gerações, para que ditaduras deste tipo não aconteçam nunca mais.

"Os ímpios erram o caminho desde o ventre; desviam-se os mentirosos desde que nascem. [...]. Mas, de fato, os justos têm a sua recompensa; com certeza há um Deus que faz justiça na terra" (Sl 58:3,11).

quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

CAUSAS DA APOSTASIA

O nome é fictício, mas a história que relatarei é real. Aconteceu assim. No início, passamos a sentir a falta do irmão Silva em algumas reuniões e programações da igreja. Com o passar do tempo, sua ausência se tornou mais frequente, até que ele se afastou totalmente. Eu o conhecia havia muitos anos e sabia de sua história de envolvimento, serviço e dedicação às atividades na igreja. Sabia também que muitas pessoas abraçaram a fé pela influência e testemunho dele. Por isso, sempre considerei com simpatia suas orientações e sua opinião, marcadas pelo equilíbrio e pela ponderação. Decidi ir visitá-lo. Porém, fiz isso sozinho para evitar algum constrangimento.

O irmão Silva me recebeu com o mesmo sorriso e simpatia de sempre. Conversamos sobre os desafios do dia a dia, a família e os planos, até que finalmente chegamos ao momento da pergunta inevitável:

– Diga-me, irmão Silva, por que depois de tantos anos na fé e de dedicação à igreja o senhor decidiu abandonar os caminhos de Deus?

Ele me olhou com surpresa e até espanto:

– Abandonar os caminhos de Deus? Isso não passou pela minha cabeça.

O irmão Silva reconheceu a importância da comunhão, mas explicou que estar ausente do templo não significava estar afastado do corpo de Cristo. Segundo ele, o local de adoração não é o que mais importa para Deus, mas sim adorá-Lo em espírito e em verdade (Jo 4:20-24). O irmão Silva enfatizou que só Deus pode avaliar o coração daqueles que são Seus filhos e filhas sinceros, e que uma pessoa pode estar presente fisicamente, mas afastada de Deus espiritualmente ou vice-versa. Ressaltou que podemos fazer parte da igreja de Cristo em qualquer lugar do mundo, desde que permaneçamos ligados a Ele. Admitiu, porém, que para confirmarmos nossa unidade e nossa fé é importante que cada membro permaneça ligado ao corpo quando este se reúne.

– Mas, então, por que o senhor perdeu o vigor eclesiástico e decidiu se afastar do nosso meio? – eu insisti.

O irmão Silva sentou-se e decidiu abrir o coração:

– Já estou há muitos anos na caminhada cristã. Enfrentei com perseverança as lutas, provas e desapontamentos, mas sempre procurei prezar pela fé e me pautar pela prudência. No entanto, em todos esses anos também consegui perceber e avaliar diversos fatores e variáveis que foram sutilmente ocorrendo em algumas denominações, levando alguns a abandonar a comunhão com a igreja.

– E quais são eles? – indaguei.

Então ele me apresentou as seguintes razões:

1. Institucionalização. O grande problema é quando as doutrinas e os dogmas acabam se tornando um fim em si mesmos. Assim como as coisas podem ser mais valorizadas do que pessoas, algumas “verdades” e dogmas também podem. Algumas doutrinas e verdades bíblicas, mesmo não sendo ponto de salvação, podem ser defendidas com tanto zelo e preciosismo que acabam se convertendo mais em barreiras e muralhas de divisão e separação do que em pontes de empatia e aproximação (Mt 15:6, 20). Verdades defendidas sem sabedoria e equilíbrio podem dividir tanto quanto as heresias (Mt 12:2-5).

2. Dependência excessiva dos meios de comunicação. Não podemos ignorar que o uso das mídias trouxe grande benefício à pregação do evangelho. Porém, uma dependência excessiva dos meios de comunicação tende a limitar a participação, o envolvimento e a utilidade das pessoas. Corremos o risco de depender tanto da mídia a ponto de menosprezarmos ou até mesmo esquecermos da necessidade da atuação e controle do Espírito Santo. Além disso, não podemos ter relacionamentos pessoais sinceros, profundos e confiáveis apenas por meio das redes, plataformas e grupos de internet. Jesus e a igreja apostólica apreciavam o contato presencial com as pessoas e a oportunidade de estar junto com a multidão (Mc 10:1).

3. Relacionamentos superficiais. Uma das maiores causas de afastamento da igreja na atualidade é a perda do elemento relacional e da interação entre líderes e liderados. A formação de vínculos sociais é um fator básico para a saúde mental e espiritual. Alguns pastores tendem a ser mais gerenciadores eclesiásticos do que cuidadores. Aliás, a visita pessoal de um líder se tornou algo distante da realidade de muitos membros, o que não costuma ocorrer por indiferença ou falta de amor, mas principalmente pelo acúmulo de responsabilidades da liderança. Relacionamentos construídos sobre a formalidade não favorecem o amadurecimento, a confiabilidade e a firmeza da fé. Por isso, muitos que não têm facilidade para interagir e se integrar ao grupo vão naturalmente se excluindo da igreja, até se afastarem definitivamente.

4. Ênfase no crescimento numérico. Grandes investimentos são feitos em campanhas evangelísticas, a fim de ganhar seguidores e batizar pessoas. No entanto, em muitos casos esse trabalho não é seguido de um acompanhamento mais significativo aos novos na fé. O apóstolo Paulo é um bom exemplo da preocupação com a instrução e conservação dos novos conversos. Apesar das viagens missionárias e da distância física, ele se preocupava em enviar cartas ensinando e exortando aqueles que haviam abraçado a verdade (Gl 1:6-8).

5. Carência de inovação e criatividade. Muitas denominações mantêm práticas e liturgias de um século atrás. Embora os rituais tenham um papel importante, a repetição automática deles e a falta de criatividade podem ser fatais para a sustentação e o crescimento de uma igreja. A falta de inovação e de criatividade é ainda mais frustrante para os jovens. Não se trata apenas de priorizar conteúdos diferentes e excitantes, produzir incentivos visuais e sonoros ou evocar megaeventos religiosos, mas de apresentar o evangelho eterno de maneira atraente e inovadora.

6. Mensagens superficiais e sem aprofundamento. Os novos membros precisam de cuidado e também de alimento nutritivo. Mensagens superficiais e sem poder espiritual tendem a produzir pessoas com os mesmos atributos. Às vezes, elas preferem os sermões da TV ou da internet a aqueles que são proferidos dos púlpitos das igrejas.

7. Falta de envolvimento. Não é novidade o fato de que as pessoas precisam estar ativas para se manter no corpo de Cristo. Infelizmente, muitas denominações falham nesse sentido. Não basta enfatizar a necessidade de envolvimento. É preciso criar condições para que os membros participem da missão.

8. Conflitos. A maior parte daqueles que abandonam a igreja o fazem também por alguma frustração. Os conflitos são parte da convivência. Inclusive, muitas vezes magoamos, ofendemos e excluímos sem querer. Porém, uma pessoa ressentida e magoada é uma forte candidata à apostasia. E como diz a Bíblia, “O irmão ofendido resiste mais do que uma fortaleza” (Pv 18:19). Por isso, aquele que feriu ou ofendeu, mesmo sem ter essa intenção, deveria imediatamente buscar a reconciliação. Na prática, porém, não é o que acontece. Desse modo o ressentimento tende a se cristalizar.

Então o irmão Silva me relatou um fato do qual eu já desconfiava. Ele se sentia triste e magoado por ter sido profundamente ferido por alguém de sua denominação e desprezado por seu líder espiritual. O irmão Silva associou aquele desencanto pessoal à igreja como um todo e decidiu se afastar.

Depois de ter conversado e orado com o irmão Silva passei a reconsiderar toda a minha teologia sobre o afastamento da igreja e a apostasia.

Eronides Nicolas (via Revista Adventista)

terça-feira, 25 de janeiro de 2022

NEGACIONISMO

O escritor e auto-intitulado filósofo Olavo de Carvalho, considerado o guru do bolsonarismo e da extrema-direita brasileira, morreu na noite desta segunda-feira (24), aos 74 anos, na região de Richmond, estado da Virgínia (EUA), onde estava internado. Olavo era um negacionista da pandemia de covid-19 e militante anti-vacina. No dia 12 de maio de 2020, por exemplo, ele escreveu: “O medo de um suposto vírus mortífero não passa de historinha de terror para acovardar a população e fazê-la aceitar a escravidão como um presente de Papai Noel”.

Termo popularizado durante a pandemia, o negacionismo se refere à recusa a aceitar fatos que são evidentes ou foram cientificamente comprovados. Atualmente, vivemos uma crise da verdade. O negacionismo ganha novamente espaço dentro da sociedade e coloca em xeque preceitos básicos e já sedimentados pela ciência no mundo. Esse movimento se apresenta travestido de “polêmicas”, por isso, é importante tomar cuidado com ele.

A problemática da veracidade é irrigada por ingredientes presentes nas estratégias dos “mercadores da dúvida”. Dessa forma, tais agentes procuram uma falsa simetria na argumentação científica e criam teorias conspiratórias para explicar o inexplicável.

O negacionismo e as teorias da conspiração não são um fenômeno novo, mas ganharam um alcance inédito em razão da internet, em especial as redes sociais e os aplicativos de mensagens instantâneas. As fake news, que são mentiras ou meias verdades travestidas de notícias sérias, conseguem dar a volta ao mundo em questão de segundos.

"A crença em teorias conspiratórias provoca nessas pessoas um sentimento de gratificação", diz o filósofo Pablo Ortellado, que é professor na Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação Digital. "Elas se sentem como uma espécie de vanguarda, pois estariam enxergando mais longe, vendo o que os outros não conseguiriam ver. Isso lhes traz satisfação. Mas é claro que esse elemento psicológico não é suficiente para explicar o negacionismo. Mais estudos precisam ser feitos.

Dessa forma, o negacionismo costuma se fortalecer quando a sociedade se depara com situações de instabilidade, como uma crise ou algo nunca antes presenciado. Quando em oposição a evidências científicas, o movimento encontra sustentação em teorias e discursos conspiratórios, sem aprofundamento e isolados, que acabam favorecendo disputas ideológicas, interesses políticos e religiosos.

Nesse sentido, alguns autores colocam o negacionismo como uma “pseudociência que contradiz um mundo imenso de teorias, verdades comprovadas e pesquisas sérias”. Além disso, as pessoas que seguem essa ideologia tentam propor experimentos para comprovar seus ideais na prática. Entretanto, encontram limitação teórica e de equipamentos, o que os leva a criar falácias com uma conclusão inválida.

A ideia de negação foi definida por Freud como um mecanismo psicológico, que tem a finalidade de reduzir qualquer manifestação capaz de colocar em perigo a integridade do ego dos sujeitos. Então, essas pessoas não conseguem enfrentar os fatos que julguem ameaçadores.

Dessa forma, trata-se de um mecanismo de defesa, que leva as pessoas, inconscientemente, a evitar a realidade em que vivem. Em termos psicanalíticos, a negação é um fenômeno típico de indivíduos que não querem lidar com as situações que geram incertezas.

A origem da negação é a angústia, que se recusa em reconhecer o problema que está acontecendo. Os indivíduos afetados agem como se nada tivesse acontecido, se comportando de maneira confusa e visto pelos outros como um comportamento insensato.

Nesse sentido, essa negação resulta num alto custo socioemocional a si mesmas e aos outros. Então, esse custo se traduz na prepotência e na intolerância, que, muitas vezes, leva ao obscurantismo das crenças e superstições.

Os negacionistas se consideram os “buscadores da verdade” e todos eles rejeitam/negam o conhecimento, porque isso é inconveniente para suas crenças e fantasias. No fundo, esse movimento revela posições autoritárias e preconceituosas. O mecanismo de negação, enquanto defesa inconsciente do indivíduo, é passível de tratamento terapêutico.

Um dos casos mais pitorescos de negacionismo é o dos terraplanistas, que questionam a astronomia, a geografia e até fotos e vídeos feitos no espaço e afirmam que a Terra é plana, semelhante aos velhos discos de vinil, e não redonda. Uma pesquisa feita pelo Datafolha em 2019 apontou que 7% dos brasileiros acima de 16 anos diziam acreditar na Terra plana — o equivalente a 11 milhões de pessoas.

Há, contudo, casos sérios. Os negacionistas do Holocausto garantem que o genocídio do povo judeu no tempo da 2ª Guerra Mundial não passa de invenção — apesar de os próprios nazistas terem documentado à exaustão as execuções em massa perpetradas em seus campos de concentração. Em reação a esse tipo de mentalidade, diversos países da Europa transformaram em crime a negação do Holocausto.

O cristianismo é especialmente afetado por mentiras e teorias da conspiração promovidas em mídias sociais e outros ambientes. As fake news não são engraçadas, nem uma forma de entretenimento, mas, sim, absolutamente destrutivas. Afinal, se tudo é questionado e a verdade não consegue mais ser identificada, como as bases do cristianismo podem ser exaltadas? A mentira não só desintegra nossa cultura e coexistência, como também destrói o cristianismo e a vida de cada pessoa.

Termino com este pensamento de Ellen G. White: "Tudo quanto os cristãos fazem deve ser tão transparente como a luz do Sol. A verdade é de Deus; o engano, em todas as suas múltiplas formas, é de Satanás; e quem quer que, de alguma maneira, se desvia da reta linha da verdade, está-se entregando ao poder do maligno. Não é, todavia, coisa leve ou fácil falar a exata verdade; e quantas vezes opiniões preconcebidas, peculiares disposições mentais, imperfeito conhecimento, erros de juízo, impedem uma justa compreensão das questões com que temos de lidar! Não podemos falar a verdade, a menos que nossa mente seja continuamente dirigida por Aquele que é a verdade" (O Maior Discurso de Cristo, p. 68).

segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

O ÚLTIMO DIA

A maioria das pessoas vive como se a vida nunca fosse acabar e se esquece de que o último dia pode chegar a qualquer momento. Há muitos que não gostam de tocar nesse tema com medo de que isso acabe apressando as coisas. Contudo, não podemos alimentar, de maneira nenhuma, esse tipo de superstição. Precisamos, sim, continuar confiando no Deus que tem tudo sob sua direção. Ele conhece o tempo certo e isso não depende do que falamos.

Qual seria sua atitude se soubesse que esse dia chegou? O que mudaria em seus planos, pensamentos, decisões e atitudes? Quando alguém perguntava a John Wesley, fundador do metodismo, o que ele faria se tivesse a certeza de que Jesus voltaria amanhã e esse fosse seu último dia na Terra, ele respondia que faria exatamente o que havia planejado. Qual seria sua resposta?

Jesus alertou sobre o assunto quando contou a parábola do rico néscio, que pensava em acumular riquezas, fazer investimentos e aproveitar a vida, sem considerar o dia seguinte. Ele terminou com um duro apelo: “Louco, esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para quem será?” (Lc 12:20).

Ellen White tinha a mesma preocupação: “Devemos vigiar e trabalhar e orar como se este fosse o último dia que nos fosse concedido” (Testemunhos Seletos, vol. 2, p. 60). A cada manhã, diz ela, devemos consagrar nossa vida a Deus. “Não façais cálculos para meses ou anos; eles vos não pertencem. Um curto dia é o que vos é dado. Como se fosse esse vosso último dia na Terra, trabalhai para o Mestre durante as suas horas” (Testemunhos Seletos, vol. 3, p. 93).

Quero desafiá-lo a viver cada dia como se fosse o último, estando sempre preparado para o descanso ou para o encontro com Jesus em sua vinda. Meu desafio não é apenas para que você ponha Deus em primeiro lugar, mas que O coloque no centro de sua vida. Ele deve influenciar cada detalhe de sua existência. Isso é viver cada dia na presença do Senhor. Assim, qualquer dia poder ser o último, pois você estará nas mãos daquele que é o dono do futuro.

Por outro lado, aproveite cada oportunidade para testemunhar de Jesus às pessoas com quem você tiver contato. Lembre-se disto: “Cada dia o tempo de graça de alguém se encerra. Cada hora alguns passam para além do alcance da misericórdia. E onde estão as vozes de aviso e rogo, mandando o pecador fugir desta condenação terrível? Onde estão as mãos estendidas para o fazer retroceder do caminho da morte? Onde estão os que com humildade e fé perseverante intercedem junto a Deus por ele?” (Patriarcas e Profetas, p. 140).

Se a sua vida for um exemplo, nenhuma pessoa que tiver contato com você vai viver seu último dia sem oportunidade de salvação. Afinal, 10% das pessoas leem a Bíblia e 90% leem nossa vida. Através do seu exemplo pessoal, as pessoas vão conhecer o caminho para entregar a vida ao Senhor.

Para finalizar, vejamos este maravilhoso pensamento de Ellen White: "Tudo com que temos que nos haver, é este dia de hoje. Hoje devemos ser fiéis ao nosso legado. Hoje devemos amar a Deus de todo o coração, e ao nosso próximo como a nós mesmos. Hoje é que nos cumpre resistir às tentações do inimigo, e pela graça de Cristo alcançar a vitória. Isto é vigiar e aguardar a vinda de Cristo. Devemos viver cada dia como se soubéssemos ser ele nosso último dia na Terra. Se soubéssemos que Cristo viria amanhã, não haveríamos então de comprimir no dia de hoje todas as palavras bondosas, todos os atos desinteressados que nos fosse possível? Devemos ser pacientes e amáveis, e possuídos de fervor intenso, fazendo tudo que está em nosso poder para ganhar pessoas para Cristo" (Cuidado de Deus, pp. 368-369).

Quando cuidamos de nossos valores espirituais e os compartilhamos com outras pessoas, estamos sempre preparados e podemos dizer com tranquilidade: “Quer, pois, vivamos ou morramos, somos do Senhor” (Rm 14:8).

sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

DIA NACIONAL DE COMBATE À INTOLERÂNCIA RELIGIOSA

Problema social que acompanha a humanidade há milênios, a intolerância religiosa ainda hoje limita a liberdade de milhares de pessoas em todo o mundo. Em algumas regiões, elas não têm o direito de viver livremente suas crenças, o que por vezes as obriga a deixar tudo para trás e fugir da perseguição, que, se postergada, pode resultar em morte.

Tal situação é precedida por expressões discriminatórias, acompanhadas de ofensas e outros atos de humilhação e violência. Os adventistas do sétimo dia, presentes em mais de 200 países, defendem a liberdade religiosa como um direito humano universal e trabalham para garanti-lo a todas as pessoas. Essa é a mensagem que a denominação reforça neste 21 de janeiro, quando se celebra o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa.

Essa data serve para alertar as pessoas sobre o problema da intolerância gerado pela desrespeito às diversas crenças existentes no mundo. Diante disso, essa comemoração é considerada um marco pela luta ao respeito da diversidade religiosa, pois além de alertar para a discriminação no âmbito religioso, propõe a igualdade para professar as diferentes religiões. Vale lembrar que o preconceito e a intolerância religiosa são considerados crimes no Brasil, passíveis de punição previstas no Código Penal.

A data foi oficializada em 2007 através da Lei n.º 11.635, de 27 de dezembro, e a sua escolha feita em homenagem à Mãe Gilda, do terreiro Ilê Axé Abassá de Ogum, localizado em Salvador. Esse foi o dia em que ela, vítima do crime de intolerância religiosa, faleceu com um infarto no ano 2000. Isso aconteceu na sequência de agressões físicas e verbais, bem como de ataques à sua casa e ao seu terreiro quando Mãe Gilda foi acusada de charlatanismo por adeptos de outra religião.

Mãe Gilda tornou-se um símbolo do combate a esse tipo de intolerância, especialmente pelo fato de simbolizar religiões de matriz africana. Este grupo representa o maior número de vítimas de intolerância religiosa na atualidade. Por esse motivo, como forma de combater a intolerância religiosa, surge um dia dedicado ao tema, cujos crimes aumentaram de forma substancial nos últimos anos. 

A data de hoje deve ser de reflexão e conscientização, e destinada para renovar o compromisso de promover, proteger e defender a liberdade religiosa para todos. Precisamos defender nossa visão, postura e teologia com clareza e firmeza, mas em um ambiente de respeito para com religiões que pensam diferentemente de nós.

Temos a seguir sete princípios que nos ajudam a aprofundar essa visão:

1. Princípio da prevenção. Precisamos atuar de maneira mais preventiva nessa área, nos antecipando aos problemas e não aparecendo apenas para resolvê-los quando uma crise já está estabelecida.

2. Princípio da abrangência. Precisamos estar sempre abertos a defender liberdade religiosa inclusiva, ou seja, para todos e não apenas para nós.

3. Princípio da consequência. Precisamos atuar com clareza e habilidade em áreas que não parecem estar diretamente ligadas à liberdade religiosa, mas que podem trazer consequências sobre ela, levando à intolerância religiosa.

4. Princípio do respeito. Precisamos saber discordar; mas, ao mesmo tempo, respeitar. Podemos ter diferenças teológicas com outras denominações, mas sempre mantendo um tratamento respeitável para defendermos a liberdade religiosa.

5. Princípio da relevância. Como igreja, precisamos fortalecer projetos de serviço junto à comunidade, demonstrando nossa relevância para o bem comum. Receberemos, como resultado, respeito, visão positiva e uma reação favorável à liberdade.

6. Princípio da coerência. Antes de defender a liberdade religiosa, precisamos lutar por coerência religiosa, mantendo uma vida denominacional coerente com os princípios bíblicos.

7. Princípio da prudência. Precisamos ter cuidado especial para não misturar defesa de liberdade religiosa com militância político-partidária-eleitoral. Nossa função é espiritual e missionária.

A liberdade religiosa é um valor fundamental para a Igreja Adventista. Vamos defendê-la para que, enquanto for possível, usemos o direito de proclamar nossa esperança.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

TEMPOS INCERTOS

Em 1927, o físico alemão Werner Heisenberg criou um conceito que ficou conhecido como “princípio da incerteza”. Segundo esse pilar da mecânica quântica, é impossível calcular com precisão, ao mesmo tempo, a posição e a velocidade de um objeto. A partir daí, os físicos sempre tiveram muita certeza sobre a incerteza e incerteza sobre a certeza!

Em 1977, exatos 50 anos depois, o economista canadense John Kenetth Galbraith escreveu um livro intitulado A Era da Incerteza, nome também de uma série de TV. Nessa obra, em que analisa o pensamento econômico, ele contrastou as grandes certezas do século 19 com as incertezas do século 20. Os economistas também já não tinham tanta convicção sobre os caminhos a seguir.

Na teoria da probabilidade, o conceito de incerteza é sempre levado em conta. Por isso, palavras como “possível”, “provável” e “plausível” são muito utilizadas e, no fundo, querem dizer apenas que não há certeza absoluta. Entre as fontes de incerteza estão falta ou excesso de informação, modelo usado para a medição, evidências conflitantes, mudanças rápidas, ambiguidade e a crença do observador.

O fato é que o mundo está cada vez mais envolto em incertezas, com um novo capítulo acrescentado recentemente. Além das incertezas pessoais, temos hoje as psicológicas, sexuais, sanitárias, sociais, econômicas e políticas. Tudo ficou imprevisível. Mesmo com ferramentas mais potentes para tentar ler a realidade e decifrar o futuro, o caminho parece enevoado. A própria teologia tem sido abalada pelas incertezas. Por isso, a vida se torna mais arriscada.

No entanto, a maioria das pessoas busca certezas. Muitas delas mudam sua filiação religiosa e seus hábitos para ter mais segurança emocional. Afinal, precisamos de identidade, uma visão, um rumo. A certeza dá a sensação de controle. E, se alguns indivíduos têm certeza demais, outros têm de menos. É por isso que, no fogo cruzado da polarização, os radicais são vírus da incerteza que tentam criar certezas à força.

Hoje, mais do que no passado, as pessoas têm que viver e expressar sua fé num ambiente que mistura certeza e incerteza. Mas podemos avançar com fé, que é “a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que se não veem” (Hb 11:1). Com “a plena certeza da esperança” (Hb 6:11), “em plena certeza de fé” (Hb 10:22), nos aproximamos do trono de Deus, que controla o Universo.

Podemos ter certeza porque, mesmo em tempos de incerteza, Jesus estará conosco todos os dias até o fim (Mt 28:20). O Espírito Santo é a presença pessoal Dele em nosso coração. Em seu livro De Servo Arbitrio (A Escravidão da Vontade), escrito em 1525 em resposta a Erasmo de Rotterdam, Martinho Lutero argumentou que a religião não é uma simples questão de conjectura: “O Espírito Santo não é cético, e as coisas que escreveu em nossos corações não são dúvidas nem opiniões, mas asserções mais seguras e certas do que toda a experiência e a própria vida” (The Bondage of the Will [Baker Academic, 2012], p. 70).

E em se tratando de incertezas, deixe Deus construir convicções em você. Nossa fé não elimina a incerteza nem os riscos, mas cada um de seus ensinos e símbolos aponta para a certeza. Crer em Deus é um risco calculado para tempos de certeza, mas principalmente de incerteza.

Minha percepção é de que a chave para lidar com a incerteza está em aprender a confiar em Deus, independentemente de quanto possa parecer ruim a situação. Mais fácil falar do que fazer, não é? Lembre-se de que Deus não permite nada que não possamos suportar (1Co 10:13) e que Ele está cuidando de nós o tempo todo, seja nos guiando em abundância e tranquilidade ou nos ajudando a atravessar os vales mais escuros (Sl 23).

Deus sabe por que as coisas estão acontecendo como estão. E no futuro iremos compreender.

Dicas para lidar com a incerteza
A psicóloga Collett Smart recomenda a abordagem conhecida como CARE, acrônimo em inglês para Choices, Agenda, Resilience e Emmotional Support:

1. Escolhas. Troque sua ansiedade por uma rotina diária sobre a qual você tenha controle. Tenha uma recreação saudável. Por exemplo, você pode trocar metade do tempo que gasta com o consumo de notícias por algo de que gosta, como ler ou ouvir música.

2. Agenda. Inclua hábitos saudáveis na sua rotina, como descanso, momentos de descontração, exercício físico e relacionamento significativo com as pessoas.

3. Resiliência. Estudos apontam que nos sentimos melhor quando concentramos nossa atenção para apoiar pessoas em dificuldade. Há algum vizinho ou amigo que você possa ajudar com pequenas atitudes? Mantenha o foco no presente e pratique a gratidão a Deus e ao próximo.

4. Suporte emocional. Além de Deus, busque apoio de uma ou duas pessoas-chave para você. Comece um diário (de curto prazo) em que você escreva sobre seus medos e receios. Em seguida, certifique-se de equilibrar este último item com todos os anteriores.

"As aflições do tempo presente assumem diversas formas, mas Cristo passou por esse trajeto, e não precisamos ficar na incerteza. Ele nos convidou: 'Vinde a Mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e Eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o Meu jugo e aprendei de Mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma. Porque o Meu jugo é suave, e o Meu fardo é leve' (Mateus 11:28-30). Seja qual for nossa condição na vida, nossa ocupação, temos um Guia seguro. Seja qual for nossa condição é Ele nosso conselheiro. Seja qual for nossa solidão Ele é nosso Amigo, em quem sempre podemos confiar" (Ellen G. White - Carta 13, 1892 e Carta 80, 1906).

[Com informações de Revista Adventista]