segunda-feira, 31 de agosto de 2020

Igreja tem dono?

Você é um líder em sua igreja? O que isso significa? Você pensa em liderança em termos de um cargo? 

Muitos pensam em liderança em termos da habilidade de alcançar uma posição. Portanto, vivem permanentemente em busca de status, de cargos de chefia ou títulos. Pensam que uma vez lá, isso faz deles líderes. Dentre os tópicos de suas fixações, o poder é um dos mais fortes. Pensam que ele os tornará importantes. Junto ao poder estão os seus “primos” sucesso e fama, que pensam farão deles seguros e felizes. 

O pastor Amin Rodor, em seu livro Meditações Diárias - Encontros com Deus, cita o que ocorreu depois que uma comissão de nomeações havia escolhido os oficiais para o novo período na igreja em que ele servia como pastor: 

"Domingo pela manhã, recebi uma ligação irada. 'Eu pensava que você era meu amigo', dizia a voz alterada do outro lado da linha. 'Por dez anos, servi como ancião nessa igreja, e você não me reelegeu.' Respondi, então, com a voz mais calma que pude encontrar: 'Caro irmão, você está confuso em dois aspectos. Primeiramente, a escolha de oficiais para a igreja é feita pela comissão de nomeações, que você certamente ajudou a escolher, e não pelo pastor. Em segundo lugar, você está se esquecendo de que na igreja não temos cargos vitalícios.'"

Encontramos igrejas divididas por lutas internas por posições. Tenho pensado muitas vezes sobre o que realmente leva alguns a agir como “donos” da igreja, ou proprietários de cargos nela. Certamente, quando agimos assim, não estamos seguindo a Jesus Cristo, que modelou outro tipo de grandeza. É um privilégio servir a Deus em algumas funções, mas realmente não precisamos de cargo algum para servir a Ele. Liderança nada tem que ver com “títulos”, mas com desempenho real. Lembra-se da princesa Diana, da Inglaterra? Quando divorciou-se, ela não perdeu em nada a capacidade de influenciar. Seu ex-marido tinha o título, mas era ela que tinha o poder da liderança.

O supremo exemplo de liderança baseada no serviço, contudo, é encontrado em Jesus Cristo. Sua breve visita ao planeta Terra marcou a vida de milhões de pessoas. Seu estilo de vida revolucionou para sempre nossa percepção de grandeza. Em apenas três anos e meio de vida pública, Ele encarnou os princípios vitais de liderança, que transcendem tempo, espaço e cultura, e que representam um desafio extraordinário para Seus seguidores. Jesus nos ensinou que a liderança autêntica é baseada em integridade e serviço em benefício dos outros. Como Ele responde à questão da grandeza em Seu reino? Por meio do princípio da humildade.

O princípio pelo qual somos admitidos no reino de Deus continua em operação no serviço que prestamos a Ele. Arrogância, egoísmo e pretensões humanas nos desqualificam tanto para a entrada como para o serviço no reino dos Céus.

Segue abaixo 10 importantíssimos recados para os nossos líderes extraídos do livro Liderança Cristã de Ellen G. White:

1. O Senhor nada tem a ver com os métodos de trabalho em que se permitem a homens finitos dominar sobre seus semelhantes. Ele apela para que uma decisiva mudança seja feita. A voz de comando não mais deve ser ouvida. O Senhor tem, entre Seus obreiros, homens humildes e discretos; deve-se escolher entre estes, homens que conduzirão a obra no temor do Senhor.

2. Seria muito bom se aqueles que ocupam posições de confiança em nossas instituições se lembrassem de que são representantes de Jesus. Verdadeira bondade, santidade, amor e compaixão pelos que são tentados devem revelar-se em sua vida.

3. São necessários homens fiéis e escolhidos na liderança da obra. Aqueles que não têm, e não desejam ter, experiência em assumir responsabilidades, não devem de forma alguma estar ali.

4. Que todos os servos de Deus, desde os que ocupam as mais elevadas posições aos que fazem os trabalhos mais modestos, andem humildemente diante de Deus.

5. Mas a posição não faz o homem. É a integridade de caráter, o Espírito de Cristo, que o torna grato, nada interesseiro, sem parcialidade e sem hipocrisia; e, para Deus, isto é que tem valor.

6. O homem que se acha na liderança de qualquer trabalho na causa de Deus deve ser inteligente, capaz de administrar grandes negócios com sucesso, de temperamento calmo, paciência semelhante à de Cristo, de perfeito domínio próprio.

7. Nenhum homem foi feito um senhor, para governar a mente e consciência de um seu semelhante. Sejamos bem cuidadosos quanto à maneira com que lidamos com a herança de Deus comprada por sangue. O líder não deve sequer permitir-se pensamentos indelicados em relação a seus irmãos, muito menos tomar o lugar de juiz e censurá-los e condená-los, quando você mesmo, em muitos aspectos, merece mais censura do que eles. Seu trabalho está sendo inspecionado por Deus.

8. Às vezes um homem que foi colocado em posição de responsabilidade, como líder, concebe a ideia de que está numa posição de suprema autoridade, e que todos os seus irmãos, antes de fazerem qualquer movimento de avanço, devem primeiro dirigir-se a ele pedindo permissão para fazer aquilo que eles sentem que se deve fazer. Tal homem está numa posição perigosa. Perdeu de vista a obra do verdadeiro Líder do povo de Deus.

9. Há sempre alguns que, quando seus irmãos estão empurrando para diante, pensam ser seu dever puxar para trás. Fazem objeções a tudo que é proposto, e combatem todo plano que não partiu deles próprios. Nunca aprenderam na escola de Cristo a preciosa e todo-importante lição de se tornar manso e humilde. Não há nada mais difícil para os que são dotados de vontade forte do que desistir de suas idéias e submeter-se ao juízo dos outros.

10. Aqueles que se assemelham a Deus no caráter, em bondade, misericórdia e lealdade dedicada à Sua causa e obra são os mais adequados para assumir responsabilidades e liderar.

domingo, 30 de agosto de 2020

Falta de empatia: a doença do mundo

Talvez uma das palavras mais utilizadas no contexto atual do mundo em que uma pandemia provocou profundas mudanças em nossas rotinas e grandes prejuízos às populações. A empatia está “em alta”. O dicionário Michaelis apresenta, em sua versão on-line, as seguintes definições para a palavra: “habilidade de imaginar-se no lugar de outra pessoa”, “compreensão dos sentimentos, desejos, ideias e ações de outrem”. Dessas duas concepções, compreende-se o porquê de se falar tanto em empatia: é uma habilidade essencial que precisamos desenvolver, em especial em um momento em que tantas pessoas estão sofrendo pelos mais diversos motivos. Mas como colocar a empatia em prática sem ficar apenas no discurso?

Por um mundo de empatia
Sabe aqueles dias em que você não está bem, ou quando você analisa a sua vida e percebe que as coisas não estão nem um pingo do jeito que você gostaria? Ou, ainda, quando acontece algo que tira o nosso chão e nos deixa sem rumo? Nesses momentos, a tristeza é inevitável, assim como o sentimento de impotência diante da vida, de tal maneira que a chama que nos mantém firmes enfraquece. Precisamos, então, de pessoas capazes de se colocar no nosso lugar e, de algum modo, sentir a nossa dor. Ou seja, precisaremos da empatia dos que nos cercam, para que percebamos que não estamos sozinhos e que, por mais dolorosa que seja a caminhada, chegaremos ao final.

Em uma sociedade tão individualista e egoísta como a nossa, torna-se extremamente difícil encontrar pessoas empáticas. Cada um pensa na sua satisfação pessoal e na resolução dos problemas que unicamente o incomodam, de forma que não há um olhar contemplativo em relação ao todo, para que possamos enxergar que a vida não se circunscreve apenas à nossa existência e que as outras pessoas também têm problemas e dores, já que são seres humanos como nós também somos.

Dessa forma, para que se possa ter empatia, antes é necessário fugir do senso comum, que prega apenas valores individualistas voltados para o próprio umbigo. Em outras palavras, jamais conseguiremos possuir empatia se o nosso mundo se circunscrever somente a nós, de modo que o outro seja algo totalmente inóspito e sem as mesmas constituições emocionais que as nossas.

Para ter empatia, é indubitável que o indivíduo permita ser tocado por um dor que não é sua e esteja aberto àquele novo mundo à sua frente. É preciso permitir ter as suas veias e artérias invadidas por um corpo estranho, com pensamentos diferentes dos seus, problemas diferentes dos seus e monstros diferentes dos seus. É preciso estar aberto a um ser que, mesmo diferente, precisa de um olhar e de um afago que o faça sentir que não está atravessando aquela tormenta sozinho.

No entanto, em uma sociedade em que o egoísmo predomina, é difícil encontrar pessoas que realmente possuem a capacidade de colocar-se no lugar do outro. Pessoas que vão além da simpatia, que é importante, mas não supre de modo algum a falta da empatia. Quando estamos tristes, não precisamos apenas de alguém que só saiba contar piadas e nos queira levar pra sair. Precisamos de alguém que entenda a nossa dor, que respeite o nosso luto e que demonstre que, apesar de incômoda, aquela é uma situação que faz parte da vida e que devemos enfrentá-la, por mais que seja difícil.

Precisamos de pessoas que sejam capazes de também mostrar a suas feridas, revelar os seus medos e confessar as suas fraquezas, para que percebamos que não somos os únicos que choramos e, às vezes, temos vontade de desistir. Não se trata de provocar “felicidade” em função de uma tristeza alheia, mas de demonstrar a humanidade que há em nós, que faz coisas belas e grandiosas e também tem fraquezas, dores e angústias. Isto é, demonstrar que todos nós caímos e precisamos de ajuda e que a dor, que agora sentimos, outros já sentiram e sentem, de modo que não há motivo para desespero, pois o fardo que parece insuportável, outros já suportaram, bem como não é necessário carregá-lo sozinho, pois há alguém para dividir esse fardo e ajudá-lo a sair dessa situação.

Assim, ter empatia é ter o coração aberto para outra vida que precisa de nós naquele momento. É saber que, naquele lugar, poderia ser eu, você ou qualquer um. É ter a sensibilidade para perceber que não é porque uma determinada situação não mexe conosco, que não mexe com o outro; que não é porque algo não aperta o nosso peito, que o outro não possa sentir o seu peito esmagado.

Ter empatia é entender que as pessoas são diferentes, sofrem por coisas diferentes, reagem às situações internas e externas de modo diferente, mas que, acima de tudo, são seres humanos que, em meio a divergências, fazem a mesma coisa: sentem. E, assim, precisam ser ouvidas, compreendidas e acarinhadas, pois o que há de mais nobre na empatia é essa capacidade de sentir uma dor que talvez jamais nos incomodasse, mas que nos incomoda pelo outro, em razão do outro e por isso é, ao mesmo tempo, tão pesada e bela e faz com que sintamos o âmago de outro ser ecoando dentro de nós.

Como diz Kundera: “Não existe nada mais pesado que a compaixão. Mesmo nossa própria dor não é tão pesada quanto a dor co-sentida com outro, por outro, no lugar de outro, multiplicada pela imaginação, prolongada por centenas de ecos.”

Falta de empatia
Sem empatia há corruptos, traidores, violentos, assassinos, aproveitadores, charlatões, enrolões, abusadores, perversos, impacientes, intolerantes, presunçosos, folgados, procrastinadores, indiferentes.

Sem empatia, há contratos quebrados, acordos não cumpridos, identidades roubadas, lares destruídos, milhões desviados, trabalhos mal feitos, filas cortadas, favorecimentos ilícitos, chutes nos carros, cortadas no trânsito.

Sem empatia, alguns acreditam ser mais merecedores que outros e, portanto, se dão à comodidade de serem cegos, surdos e mudos para qualquer necessidade que não seja a sua própria. Sem empatia há o “venha a nós, mas ao vosso reino, NADA”.

A falta de empatia é o câncer do mundo, mas sua presença, a cura dele.

Falta de empatia na igreja
A nossa igreja parece estar cheia de pessoas simpáticas e pouco empáticas. Receber alguém na minha igreja com um sorriso e a paz do Senhor é ser simpático, o que é muito legal, mas ir à rua, ouvir as pessoas, entender o que elas vivem e sentem é ser empático, o que é melhor ainda.

Um evangelho vivido apenas de púlpito não me parece empático. Ele dita apenas as regras para você se enquadrar no time. Já o evangelho vivido no trabalho, na faculdade, na vizinhança pode se tornar empático, pois as chances são maiores de entender o dilemas vivido pelas pessoas em seu contexto social. A palavra empatia não está na Bíblia, mas ser empático é ser misericordioso, e feliz é aquele que tem misericórdia, pois serão também tratados com misericórdia. Vejamos estes dois pensamentos de Ellen G. White:

"Aprendam acerca das necessidades dos outros! Esse conhecimento desperta empatia, que é a base para um ministério eficaz. Ao tentarem aprender acerca das tremendas necessidades das pessoas... vocês tornar-se-ão menos egocêntricos e mais capazes de simpatizar com a situação desesperada de milhões" (Um Convite à Diferença, p. 91).

"Que maravilhoso pensamento este, de que Jesus tudo sabe acerca das dores e aflições que sofremos! Em todas as nossas aflições foi Ele aflito. Alguns dentre nossos amigos nada sabem da miséria humana e da dor física. Nunca ficam doentes, e portanto não podem penetrar plenamente nos sentimentos daqueles que se acham doentes. Jesus, porém, Se comove com o sentimento de nossa enfermidade. Ele é o grande missionário médico. Tomou sobre Si a humanidade e colocou-Se à cabeceira de uma nova dispensação, a fim de que possa reconciliar justiça e compaixão" (Manuscrito 19, 1892).

Através de Seu exemplo amoroso, Jesus nos ensina a ter empatia.

sábado, 29 de agosto de 2020

Testando um profeta

Jesus Cristo predisse que nos últimos dias se levantariam muitos falsos profetas e enganariam a muitos (Mt 24:11). O Inimigo busca falsificar tudo o que Deus fez em benefício de Seu povo. Assim, uma das maiores bênçãos de Deus, o dom profético, tem se transformado num fator de destruição para muitas pessoas. Tais aspectos nos levam a indagar: como podemos afirmar que um profeta é verdadeiro, ou seja, que ele é um porta-voz de Deus? Há critérios que podem testar sua credibilidade bem como comprovar a veracidade de suas mensagens?

Se analisarmos o assunto cuidadosamente não seremos jamais enganados, pois a Bíblia estabelece critérios que permitem responder a essas questões. Se os testes bíblicos forem aplicados de maneira correta, eles revelarão a fonte da revelação. Neste sentido, destaco quatro critérios apresentados na Palavra de Deus.

Concordância com a Bíblia
“À lei e ao testemunho! Se eles não falarem segundo esta palavra, nunca verão a alva” (Is 8:20). Se qualquer ensino ou conteúdo registrado por um profeta se desvia do padrão da verdade bíblica, deve ser reconhecido como vindo do reino das trevas. Os profetas falam movidos pelo Espírito Santo e nunca devem contradizer o padrão bíblico de instrução. Assim sendo, todos os ensinos devem estar em harmonia com o que já foi revelado.

Bons frutos
“Portanto, pelos seus frutos os conhecereis” (Mt 7:20). Jesus também alertou Seus discípulos dizendo: “Acautelai-vos dos falsos profetas” (Mt 7:15). Partindo do princípio de que toda árvore boa produz bons frutos, e que uma árvore má produz frutos maus, Jesus apresenta outro teste para ser aplicado aos profetas. Que tipo de fruto está sendo produzido na vida deles? Que influência seus ensinos têm sobre a vida de outros? Que resultados são vistos na vida de sua comunidade como um todo?

A vida do profeta deve ser digna de um representante de Deus. Não deve haver nenhuma dúvida com relação ao curso de suas ações e ideias. Seu exemplo e suas mensagens devem levar as pessoas a uma vida de genuína piedade cristã.

Cumprimento das predições
“O profeta que profetizar paz, somente quando se cumprir a palavra desse profeta é que será conhecido como aquele a quem o SENHOR, na verdade, enviou” (Jr 28:9). A confiança que possuímos na palavra de Deus é comprovada também pelo cumprimento das profecias nela contidas. O profeta Moisés afirmou: “Sabe que, quando esse profeta falar em nome do SENHOR, e a palavra dele se não cumprir, nem suceder, como profetizou, esta é palavra que o SENHOR não disse” (Dt 18:21,22). São inúmeros os exemplos deixados em toda a Bíblia a respeito de predições que se cumpriram. Em alguns casos, as profecias não se cumpriram nos tempos bíblicos, mas encontramos o seu cumprimento registrado na história ou ocorrendo em nossos próprios dias. A maioria dos livros do Antigo Testamento fala sobre a vinda do Messias e o Novo Testamento comprova a exatidão dessas profecias. Vale destacar que, em algumas circunstâncias, Deus revelou aos seus profetas algumas profecias condicionais e estas se cumpriram ou não com base na aceitação ou rejeição das condições estabelecidas por Deus, como no caso do profeta Jonas.

Reconhecimento da divindade de Cristo
“Amados, não deis crédito a qualquer espírito: antes, provai os espíritos se procedem de Deus, porque muitos falsos profetas têm saído pelo mundo afora. Nisto reconhecereis o espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus” (1Jo 4:1,2).

Ao apresentar este teste, João está tratando diretamente com a questão daqueles que declaram ser profetas. Este teste é mais amplo do que simplesmente afirmar crer que Jesus Cristo viveu. Em seu sentido completo, ele envolve tudo o que a Bíblia ensina com relação à pessoa de Cristo. É o reconhecimento de que “o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade, e vimos a sua glória, glória como do unigênito do Pai” (Jo 1:14). Tudo isso deve ser reconhecido e ensinado por aquele que foi aceito como profeta verdadeiro. E este não deve ser um mero reconhecimento teórico.

Se formos sinceros à revelação desses ensinos, jamais seremos enganados por aqueles que se levantam para trazer mensagens, mas quando provados por esses testes, não passam de falsos profetas. 

Renato Stencel (via Revista Adventista)

Imagem: The Devil whispers to the Antichrist; detalhe de Sermons and Deeds of the Antichrist, Luca Signorelli, 1501, Orvieto Cathedral

"Somos advertidos de que haveria nos últimos dias falsos profetas, e a Bíblia nos dá uma prova pela qual reconhecer os seus ensinos a fim de podermos distinguir entre o falso e o verdadeiro. O grande teste é a lei de Deus, que se aplica tanto às profecias como ao caráter moral dos profetas. Se não devesse haver profecias verdadeiras nos últimos dias, quão mais fácil teria sido declarar o fato, e assim cortar de vez toda oportunidade de engano, em vez de dar um teste pelo qual prová-los, como se devesse haver tanto o genuíno como o falso" (Ellen G. White - Primeiros Escritos, pp. 138).

sexta-feira, 28 de agosto de 2020

Os adventistas e as tensões raciais nos EUA

A violência contra Jacob Blake, um homem negro que levou sete tiros pelas costas da polícia em Kenosha, no Wisconsin, nos Estados Unidos, desencadeou uma nova onda de protestos antirracistas e indignação no país.

Um vídeo gravado no momento da abordagem mostra o homem negro indo até seu carro, acompanhado de perto por dois policiais com armas em punho. Ao abrir a porta do veículo em que estavam seus três filhos, Blake, de 29 anos, é atingido por sete disparos. Ele está internado, mas ficou paralisado da cintura para baixo, de acordo com sua família.

Em meio ao aumento das tensões raciais, a Divisão Norte-Americana da IASD emitiu uma declaração convocando os membros a servirem de canais de paz. Leia abaixo:

"As tensões raciais nos Estados Unidos aumentaram ainda mais após o recente assassinato de Jacob Blake, um homem negro de 29 anos, por policiais em Wisconsin. Este evento, como inúmeros outros, amplificou as vozes de negros americanos e outros, enquanto clamam por justiça pelos atos de violência perpetrados contra sua comunidade.

A Igreja Adventista do Sétimo Dia na América do Norte ouve suas vozes e convida nossas igrejas e membros a servirem como canais de paz e esperança para nossos irmãos e irmãs negros. Reconhecemos sua dor e a injustiça que enfrentam e nos esforçamos para servir de voz quando são silenciados por aqueles que procuram acalmá-los. Vamos clamar por mudanças na forma como a comunidade negra é tratada por aqueles que são colocados em posições de confiança e proteção.

Quando atos de racismo e violência ferem a comunidade negra, todos nós somos impactados. Como filhos de Deus, podemos e devemos agir melhor na maneira como tratamos uns aos outros de maneira igualitária. Jesus Cristo proclamou: “O país que se divide em grupos que lutam entre si certamente será destruído. E a cidade ou a família que se divide em grupos que lutam entre si também será destruída” (Mateus 12:25)."

A versão original deste comunicado foi postada no site de notícias da Divisão Norte-Americana da IASD.

Ao longo da história, o racismo tem levantado um muro de separação entre pessoas que, humanamente e aos olhos de Deus, são iguais. Além de causar prejuízos físicos, emocionais e sociais, a crença de que existe superioridade entre raças lança por terra a própria missão de Cristo: salvar a todos, sem distinção. Sua morte na cruz como ato de amor incondicional pelo ser humano não foi limitado a nenhum grupo de pessoas. Isso fica evidente nas palavras registadas pelo apóstolo João em um dos textos mais profundos encontrados na Bíblia: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu seu filho unigênito, para que todo aquele que Nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3:16).

Foi para reforçar essa verdade que a Igreja Adventista do Sétimo Dia, hoje presente em mais de 200 países, com culturas distintas e singulares, votou uma declaração oficial em que assegura que o racismo está desvinculado da essência do cristianismo e deve ser condenado e combatido.

Leia o texto na íntegra:

Um dos males mais odiosos de nossos dias é o racismo, a crença ou prática que vê ou trata certos grupos étnicos como inferiores e, portanto, objeto de dominação, discriminação e segregação.

Embora o pecado do racismo seja um fenômeno antiquíssimo baseado na ignorância, no medo, na alienação e no falso orgulho, algumas de suas mais hediondas manifestações têm ocorrido em nosso tempo. O racismo e os preconceitos irracionais operam em um círculo vicioso. O racismo está entre os piores dos arraigados preconceitos que caracterizam seres humanos pecaminosos. Suas consequências são geralmente devastadoras, porque o racismo facilmente torna-se permanentemente institucionalizado e legalizado. Em suas manifestações extremas, ele pode levar à perseguição sistemática e até mesmo ao genocídio.

A Igreja Adventista condena todas as formas de racismo, inclusive a atuação política do apartheid, com sua segregação forçada e discriminação legalizada.

Os adventistas querem ser fiéis ao ministério reconciliador designado à igreja cristã. Como uma comunidade mundial de fé, a Igreja Adventista deseja testemunhar e exibir em suas próprias fileiras a unidade e o amor que transcendem as diferenças raciais e sobrepujam a alienação do passado entre os povos.

As Escrituras ensinam claramente que todas as pessoas foram criadas à imagem de Deus, que “de um só fez toda a raça humana para habitar sobre toda a face da Terra” (At 17:26). A discriminação racial é uma ofensa contra seres humanos iguais, criados à imagem de Deus. Em Cristo, “não há judeu nem grego” (Gl 3:28). Portanto, o racismo é realmente uma heresia e em essência uma forma de idolatria, pois limita a paternidade de Deus, negando a irmandade de toda a espécie humana e exaltando a superioridade racial de alguém.

A norma para os adventistas está reconhecida na Crença Fundamental nº 14 da igreja, “Unidade no Corpo de Cristo”, baseada na Bíblia. Ali é salientado: “Em Cristo somos uma nova criação. Distinções de raça, cultura e nacionalidade, e diferenças entre altos e baixos, ricos e pobres, homens e mulheres, não devem ser motivo de dissensões entre nós. Todos somos iguais em Cristo, o qual por um só Espírito nos uniu numa comunhão com Ele e uns com os outros. Devemos servir e ser servidos sem parcialidade ou restrição.” Qualquer outra abordagem destrói o âmago do evangelho cristão.

Esta declaração foi apresentada por Neal C. Wilson, então presidente da Associação Geral, após consulta com os 16 vice-presidentes mundiais da Igreja Adventista, em 27 de junho de 1985, durante a assembleia da Associação Geral realizada em Nova Orleans, Louisiana.

quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Especial Dia do Psicólogo

No dia 27 de agosto é comemorado no Brasil o Dia do Psicólogo. Nesta mesma data, no ano de 1964, a profissão foi regulamentada através da Lei 4.119/64.

Terapia divina
Inicialmente vista com desconfiança pela religião, a psicologia cresceu com certo ar de rebeldia contra ela, mas hoje se aproxima da espiritualidade (outro nome da religião) como uma aliada. Com o crescente diálogo entre essas duas áreas, e sendo que estamos vivendo na época das terapias, quero convidá-lo a ver Deus como um Psicólogo que pode tratar seus traumas de maneira eficaz. Mais do que uma figura de apego, Deus não é uma simples ferramenta psicológica; Ele é a fonte da cura. Nessa perspectiva, destaco sete aspectos sobre quem Deus é e o que Ele faz:

Título: o Psicólogo dos psicólogos
Ainda no começo da Bíblia, Deus Se apresenta como o Médico que nos cura (Êx 15:26), título que poderia ser parafraseado como o Psicólogo que nos restaura. Além disso, o verbo grego sozo, usado cerca de cem vezes no Novo Testamento, significa tanto “salvar” quanto “curar”. A cura divina é integral.

Capacitação: empatia infinita
Se Deus fosse indiferente, como ensinavam algumas correntes filosóficas e teológicas, então Ele não poderia sentir nem amar. Mas na Bíblia, Deus é retratado como tendo emoções e sentimentos. O próprio Deus Se apresenta assim (Êx 34:6-7). Além disso, Jesus entende nossas fraquezas e pode Se compadecer de nós (Hb 4:15-16), o que implica empatia. O melhor é que Deus tem uma capacidade infinita de esquadrinhar nossa mente e nossa história (Sl 139:1-2). Só de olhar para nós, Ele sabe o que sentimos.

Equipe: dois assistentes
Deus trabalha em equipe e tem dois ajudantes altamente habilitados: Jesus e o Espírito Santo. Assim como o Pai é o “Deus de toda consolação” (2Co 1:3), ambos também recebem o título de “Consolador” (Jo 14:16, 26; 16:7). Jesus foi ungido para curar os corações partidos, consolar os tristes e libertar os oprimidos (Is 61:1-3; Lc 4:18).

Atendimento: 24 horas
Deus está sempre disponível e nos incentiva a buscá-Lo de todo o coração (Jr 29:11-13). Ele não apenas espera você no “consultório”, mas envia o Espírito Santo para fazer terapia em sua casa. E você pode também contar com atendimento on-line gratuito o tempo todo.

Linha terapêutica: psicologia positiva
Esquecendo os erros do passado (Mq 7:18-19; Hb 10:17), Deus aconselha você a concentrar-se no que é bom, positivo, verdadeiro, nobre, correto, puro, amável, excelente (Fp 4:8). Em outras palavras, coloque o foco na felicidade, e não na infelicidade.

Especialidade: todos os traumas
Por exemplo, para reduzir a ansiedade, um dos problemas psicológicos mais comuns da atualidade, Jesus apresenta o cuidado amoroso de Deus (Mt 6:25-34). Sobre Ele podemos lançar todas as nossas preocupações (1Pe 5:7).

Técnica favorita: diálogo
A oração é o meio de compartilharmos nossas inquietudes com Deus. Em Salmos, mais do que hinos, encontramos corações que se abriram ao grande Psicólogo da alma. Esses relatos (às vezes alegres, ora angustiados) retratam verdadeiras “terapias” no divã de Deus.

A psicologia tem seu lugar e pode ser efetiva. Mas, como sugere esta miniteoria, Deus é o maior de todos os psicólogos.

Marcos de Benedicto (via Revista Adventista)

A opinião de Ellen White sobre a psicologia
Três escolas de cura prevaleciam no tempo de Ellen White – mesmerismo, frenologia e a cura pelo descanso – que influenciaram seus comentários sobre questões psicológicas e de saúde mental. White se opôs firmemente a todas as três. Em 1886, escreveu: “As ciências da frenologia, da psicologia e mesmerismo são os condutos pelos quais ele [Satanás] chega mais diretamente a esta geração e atua com esse poder que deve caracterizar seus esforços próximo do fim do tempo da graça.”1

Mesmerismo. Durante os primeiros anos de ministério, Ellen White foi repetidamente forçada a confrontar o mesmerismo e seus métodos de manipulação da mente. Nos Estados Unidos, em meados do século 19, o magnetismo animal era uma filosofia de cura popular. Originada pelo médico Franz Anton Mesmer (1734-1815), ensinava que um fluido magnético invisível permeou o universo. Mesmer teorizou que a doença produziu um desequilíbrio desse fluido dentro do corpo humano, o que poderia ser curado através do uso de ímãs e de corrente elétrica. Eventualmente, ele abandonou o uso de ímãs e propôs que o “corpo do curandeiro”, permeado com magnetismo animal, podia redirecionar o fluido magnético do paciente sem a utilização de ímãs. O objetivo era o de induzir a uma ‘crise’, alterando o estado mental do indivíduo, por meio de febre, delírio, convulsões, choro descontrolado, contrações musculares nervosas. Mesmer viu essas manifestações como sintomas saudáveis de cura. Sugestionabilidade e dominância foram utilizados para produzir um transe e, assim, realinhar o corpo.2 Mais tarde, James Braid redefiniu o termo “mesmerismo” como hipnotismo, e Mesmer ficou conhecido como o pai da moderna hipnose.3

Em 1845, Ellen White foi forçada a confrontar Joseph Turner, um proeminente ministro adventista milerita no Maine. Turner estava usando o mesmerismo. Ele ainda tentou mesmerizar ou hipnotizar White. Em uma ocasião, ela estava em uma reunião onde ele tentou manipulá-la. “Ele tinha os olhos voltados diretamente de seus dedos, e os olhos dele pareciam serpentes, o mal.”4 Suas experiências ao confrontar esse homem, juntamente com sua orientação visionária, a colocaram em oposição às modalidades de controle hipnótico da mente que eliminavam de uma pessoa a independência mental e liberdade dadas por Deus. Ela escreveu muito direta e especificamente sobre esse tópico. “Não é desígnio de Deus que nenhuma criatura humana submeta a mente e a vontade ao domínio de outra, tornando-se um instrumento passivo em suas mãos […]. Não deve considerar nenhum ser humano como fonte de cura. Sua confiança deve estar em Deus.”5 Em cartas durante 1901 e 1902 para A. J. Sanderson e sua esposa, que foram diretores médicos do Sanatório Santa Helena, Ellen White advertiu para os perigos do hipnotismo. “Mantenham-se afastados de tudo o que tenha sabor a hipnotismo, a ciência pela qual as agências satânicas trabalham.”6 Ela identificou a característica do hipnotismo que mais a preocupava e revelou um dos seus valores fundamentais na cura mental. “A teoria de mente controlar mente é originada por Satanás para introduzir-se como o trabalhador-chefe para colocar filosofia humana onde deveria estar filosofia divina […]. O médico deve educar o povo a olhar do humano para o divino.”7

Frenologia. Foi uma teoria popularizada na América durante os meados do século 19 por Orson S. Fowler e seu irmão Lorenzo N. Fowler. A frenologia sustentou que a forma da cabeça de uma pessoa determinava o seu caráter e personalidade. Embora baseada em uma premissa falaciosa, foi amplamente aceita como autêntica na época. Ellen White se opôs a essa modalidade. Em 1893, escreveu sobre a frenologia como “vã filosofia, se gloriando em coisas que não entendem, pressupondo um conhecimento da natureza humana que é falso”.8

Cura pelo descanso. A modalidade “cura pelo descanso” foi defendida por Silas Weir Mitchell como resposta a distúrbios nervosos. Mitchell defendeu o descanso completo e a ausência de todos os estímulos sensoriais. Esse método exigia que o sujeito não tivesse visitas, cartas, leituras, escritos, banhos, exercícios, ou mesmo a presença de luz ou som. O descanso era para ser aplicado sem interrupção e prolongadamente. Ellen White contradisse essa opinião: “[…] E ao doente [mental] deveria ser ensinado que é errado suspender todo trabalho físico para recuperar a saúde.”9

As bases filosóficas dessas três modalidades do século 19, embora populares na época, têm-se mostrado fraudulentas. Quando Ellen White usou os termos “psicologia” e “ciência”, estava falando desses falsos e errôneos movimentos, e não das modernas definições desses termos. Em uma ocasião, escreveu positivamente quando usou o termo “psicologia” em um sentido mais geral. “Os verdadeiros princípios da psicologia encontram-se nas Sagradas Escrituras. O homem desconhece o seu próprio valor. Age de acordo com o seu inconfesso temperamento do caráter, porque não olha para Jesus, Autor e Consumador de sua fé.”10 Para Ellen White, a correta “psicologia” tem uma visão elevada dos seres humanos, como é entendida à luz do dom de Jesus e do amor de Deus. Para ela, o objetivo dos estudos psicológicos foi como reconectar a pessoa com Deus como o grande médico da mente e da alma.

Recebendo orientação psicológica
Embora tenha sido demonstrado que Ellen White centrou a sua filosofia de saúde mental e cura em Deus, ela não excluiu o papel dos seres humanos em cooperação com Deus. Ela deixa claro que Deus pode usar conselheiros para ajudar a levar à cura aqueles com doenças mental e emocional. “Os servos de Cristo são Seus representantes, instrumentos pelos quais opera. Ele deseja, por intermédio dos mesmos, exercer o Seu poder de curar.”11 Em outra declaração semelhante, escreveu: “Por intermédio de Seus servos, designa Deus que os doentes, os desafortunados e os possessos de espíritos maus hão de escutar Sua voz. Por meio dos instrumentos humanos, Ele deseja ser um Consolador como o mundo desconhece.”12 Ela ainda foi imperativa no aconselhamento. “Quando surge uma crise na vida de qualquer pessoa. […] É a vida consistente, a revelação de um sincero interesse como de Cristo pela a pessoa em perigo, que fará o aconselhamento eficaz para convencer e vencer em caminhos seguros.” Aqueles que negligenciam este trabalho “terão de dar conta por sua negligência por aqueles que poderiam ter abençoado, reforçado, apoiado, e curado.”13

A própria experiência de Ellen White como uma conselheira é uma aplicação da presente declaração. Embora não fosse formada em psicologia, ajudou muitas pessoas a conquistar melhor saúde emocional e mental durante a sua vida. Para esses dias, seus escritos fornecem um quadro filosófico e teológico útil que apoia a atividade “médico missionária”, assim como chamou as áreas de psiquiatria e psicologia.

Alguns bem intencionados cristãos têm sido relutantes em falar com profissionais de saúde mental temendo que Deus não queira que contem a outro ser humano seus pecados ou fraquezas. Pensam que procurando ajuda psicológica traem a fé, porque estão procurando a ajuda de seres humanos em vez da de Deus, mas Ellen White é clara de que há situações em que é correto e adequado confiar em outros.14 Ela foi uma frequente ouvinte e conselheira para as pessoas com dores e perplexidades. Ela escreveu as seguintes palavras de conforto para um homem na Austrália. “Se os agentes humanos, de quem nós poderíamos ser levados a esperar ajuda, faltam para fazer a sua parte, somos confortados no pensamento de que as inteligências celestiais não deixarão de fazer a sua parte. Elas passarão por aqueles cujos corações não são tenros e dignos de compaixão, gentis e amáveis, e prontos para aliviarem as desgraças dos outros, e vão usar qualquer agente humano, que será tocado com as enfermidades, as necessidades, os problemas, as perplexidades das pessoas por quem Cristo morreu.”15 Suas declarações sobre o papel dos conselheiros humanos mostram que Ellen White permaneceu confiante em que Jesus era o último ajudante e médico. Mas os humanos conselheiros, amigo, mãe, pastor, médico ou psicólogo são para ajudar a pessoa como Jesus – “[…] um Amigo que nunca falha, ao qual podemos confiar todos os segredos do coração.”16 A cura mental e emocional como a cura física é um processo que leva tempo. Ellen White revela um notável grau de sensibilidade para com, por vezes demorado, processo psicológico que requer apoio.

Conclusão
A abordagem terapêutica de Ellen White para o tratamento do doente mental centrou-se em uma aplicação de princípios. Ela apoiou o aconselhamento e os métodos de cura natural. Sua abrangente rejeição às drogas está baseada em errôneas filosofias de cura que eram atuais em seus dias e de produtos químicos perigosos de drogas que eram usadas. Suas declarações contra a “psicologia” e a “ciência” estão relacionadas a sua oposição ao mesmerismo, frenologia, e à “cura pelo descanso”. Como conselheira, Ellen White teve extensa interação com as pessoas ao longo de sua vida e tratou com diferentes tipos de disfunção psicológica. Permaneceu simpática e redentora, mesmo quando a condição foi particularmente censurável. Ela não tinha qualquer formação em saúde mental e viveu em uma época em que essa ciência era ainda rudimentar. No entanto, foi capaz de ser extraordinariamente eficaz em ajudar muitas pessoas. Compreendeu que a devastação emocional e mental não era curada instantaneamente e que uma pessoa poderia estar andando com Deus, mas ainda assim necessitava de apoio e orientação. Acreditava na necessidade de intervenção direta por outros que eram capazes de aconselhar e orientar. Embora não tenha escrito sobre o papel dos psiquiatras e psicólogos, escreveu positivamente sobre o tipo de ajuda que pode ser prestada por essas áreas. Não podemos dizer exatamente qual seria a sua reação à prática moderna dessas áreas, mas um estudo da sua vida, escritos e atividades sugerem que ela teria apoiado a prática psicológica cristã que estava em harmonia com uma filosofia bíblica de cura.

Merlin D. Burt (Ph.D., Universidade Andrews) é diretor do Centro de Pesquisa Adventista Ellen G. White Estate Branch Office, Universidade Andrews, Berrien Springs, Michigan, EUA. E-mail: burt@andres.ed. Uma parte deste artigo for originalmente apresentada no Simpósio sobre a Cosmovisão Cristã e Saúde Mental: Perspectivas dos Adventistas do Sétimo Dia, de 28 de agosto a 2 de setembro de 2008, Rancho Palos Verdes, Califórnia. (via adventistas.org)

Referências
1 Testemunhos para a Igreja. 1. ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2000. v. 1. p. 290. ↑
2 Irving Kirsch, Steven Jay Lynn, e Judith W. Rhue. “Introduction to Clinical Hypnosis”. In Handbook of Clinical Hypnosis. Washington, DC: American Psychological Association, 1993, 5; John C. Burnham. “Franz Anton Mesmer”, International Encyclopedia of Psychiatry, Psychology, Psychoanalysis, and Neurology, ed. Benjamin B. Wolman. New York: Aesculapius Publishers, 1977. v. 7, p. 213. ↑
3 Henry Alan Skinner. The Origin of Medical Terms. Baltimore, MD: Williams & Wilkins, 1949. p. 186.↑
4 Ellen G. White. Manuscrito. 131, 1906. ↑
5 Conselhos Sobre Saúde. 2. ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1991. p. 345. ↑
6 Ellen G. White para Artur e Emma Sanderson, 16 de Fev. 1902 (datilografada), Carta 20, 1902, EGWE. ↑
7 Ellen G. White para A. Sanderson, 12 de Setembro de 1901 (datilografada), Carta 121, 1901, EGWE. ↑
8 Ellen G. White para E. J. Waggoner, 22 de Janeiro de 1893, Carta 78, 1893, EGWE. ↑
9 Ellen G. White. Testemunhos Para a Igreja. 1. ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2000. p. 555. ↑
10 Mente, Caráter e Personalidade. 3. ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1990. v.1. p. 10. ↑
11 O Desejado de Todas as Nações. 22. ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2004. p .824. ↑
12 Ciência do Bom Viver. 10. ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2004. p. 10. ↑
13 Ellen G. White para “Os irmãos em posição de responsabilidade no Escritório da Review and Herald”, 13 de jan. 1894, Carta 70, 1894, EGWE. ↑
14 Veja Mente, Caráter e Personalidade. 3. ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1990. v. 2, p. 763-788. ↑
15 Ellen G. White para J. R. Buster, 3 de Agosto de 1894, Carta 4, 1894, EGWE. ↑
16 Ellen G. White. Testemunhos Para a Igreja. 1. ed. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2000. v. 1, p. 502. ↑

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Tire suas dúvidas sobre o divórcio

O Brasil inteiro está escandalizado com a fala atribuída à pastora, cantora e deputada federal Flordelis dos Santos Souza para se justificar como a mandante do assassinato de seu esposo pastor Anderson do Carmo em frente à sua casa: "Fazer o quê? Separar não posso, ia escandalizar o nome de Deus." Será que um divórcio seria mais escandaloso que um assassinato?

A Bíblia menciona as orientações divinas sobre casamento e divórcio. O assunto costuma gerar discussões entre cristãos. O Manual da Igreja Adventista (2015) traz alguns capítulos sobre o divórcio, com conselhos e princípios que norteiam a temática. Vejamos alguns deles:

O divórcio é contrário ao propósito original de Deus ao instituir o matrimônio (Mt 19:3-8; Mc 10:2-9), mas a Bíblia não é silenciosa a esse respeito. Visto que o divórcio ocorreu como parte da experiência humana caída, uma regulamentação bíblica foi dada para limitar o dano que ele tem causado (Dt 24:1-4). A Bíblia procura consistentemente enaltecer o matrimônio e desencorajar o divórcio descrevendo as alegrias do amor e da fidelidade conjugal (Pv 5:18-20; Ct 2:16; 4:9; 5:1), referindo-se ao relacionamento de Deus com seu povo comparando-o com o casamento (Is 54:5; Jr 3:1), enfocando as possibilidades de perdão e restauração matrimonial (Os 3:1-3), e indicando a aversão de Deus pelo divórcio e a miséria que ele causa (Ml 2:15, 16).

Jesus restaurou o conceito original do casamento como um compromisso vitalício entre um homem e uma mulher e entre o casal e Deus (Mt 19:4-6; Mc 10:6-9). Muitas instruções bíblicas confirmam o casamento e procuram corrigir os problemas que tendem a enfraquecer ou destruir o seu fundamento (Ef 5:21-33; Hb 13:4; 1Pe 3:7). O casamento baseia-se nos princípios do amor, lealdade, exclusividade, confiança e amparo mantidos por ambos os cônjuges em obediência a Deus (Gn 2:24; Mt 19:6; 1Co 13; Ef 5:21-29; 1Ts 4:1-7). Quando esses princípios são violados, as Escrituras reconhecem que trágicas circunstâncias podem destruir o casamento.

A graça divina é o único remédio para os males do divórcio. Quando o casamento falha, os ex-cônjuges devem ser encorajados a examinar sua experiência e procurar conhecer a vontade de Deus para sua vida. Deus provê conforto para os que foram feridos. O Senhor também aceita o arrependimento de pessoas que cometeram os mais destrutivos pecados, mesmo aqueles que trazem consigo consequências irreparáveis (2Sm 11; 12; Sl 34:18; 86:5; Jl 2:12, 13; Jo 8:2-11; 1Jo 1:9). As Escrituras reconhecem o adultério e a fornicação (Mt 5:32) e o abandono por parte de um cônjuge incrédulo (1Co 7:10-15) como motivos para o divórcio.

Não há na Escritura nenhum ensinamento direto sobre novo casamento após o divórcio. Existe, no entanto, uma forte implicação nas palavras de Jesus em Mateus 19:9 no sentido de permitir o novo casamento de uma pessoa que permaneceu fiel, cujo cônjuge foi infiel ao voto matrimonial.

Ellen G. White e o divórcio
Ellen G. White deu a única razão para o divórcio: “Nada senão a violação do leito conjugal pode quebrar ou anular o voto conjugal” (O Lar Adventista, p. 341). “Só há uma razão pela qual o marido pode legitimamente separar-se de sua esposa ou a esposa de seu marido: o adultério” (Ibid., p. 345). Ela salientou que Jesus aprovou a dissolução do casamento apenas em caso de adultério (Ibid., p. 340). Em seu Sermão do Monte, Cristo declarou “plenamente” que havia uma única razão para o fim do casamento: infidelidade ao voto conjugal (O Maior Discurso de Cristo, p. 63). “O divórcio é uma eterna e sincera mágoa. O casamento deveria ser muito bem considerado antes de ser contraído”, escreveram Tiago e Ellen G. White em 1868, referindo-se a uma mulher que tinha que viver com um adúltero (The Review and Herald, 24/03/1868, p. 236). Ela ainda acrescenta que os casados deveriam possuir a têmpera do aço em relação a seus votos conjugais (Carta 321, 1903).

Posição da Igreja Adventista sobre divórcio e novo casamento
Reconhecendo os ensinos bíblicos acerca do casamento, a Igreja está ciente de que as relações matrimoniais ficam, em muitos casos, abaixo do ideal. O problema do divórcio e do novo casamento só poderá ser visto em sua verdadeira luz se for observado do ponto de vista do Céu, tendo como pano de fundo o Jardim do Éden.

Central no plano sagrado de Deus para o nosso mundo foi a criação de seres feitos à sua imagem, que se multiplicassem e enchessem a terra e vivessem juntos em pureza, harmonia e felicidade. Ele criou Eva do lado de Adão e a deu a ele como sua esposa. Assim foi instituído o matrimônio. Deus, o Autor da instituição, também foi o Oficiante do primeiro casamento. Depois de o Senhor ter revelado a Adão que Eva era verdadeiramente osso de seus ossos e carne de sua carne, nunca poderia lhe surgir na mente dúvida de que os dois fossem uma só carne. Nem deveria surgir dúvida na mente de nenhum dos dois no santo par que Deus queria que seu lar durasse para sempre.

A Igreja adota, sem reserva, esse conceito do casamento e do lar, crendo que qualquer diminuição dessa elevada visão é, na mesma medida, uma diminuição do ideal celestial. A crença de que o casamento é uma instituição divina se baseia nas Sagradas Escrituras. Por conseguinte, todo pensamento e argumento no intrincado campo do divórcio e novo casamento deve ser constantemente harmonizado com aquele santo ideal revelado no Éden. A Igreja crê na lei de Deus e também na misericórdia perdoadora de Deus. Crê que vitória e salvação podem ser seguramente encontradas por aqueles que transgrediram nesse assunto de divórcio e novo casamento da mesma forma que por aqueles que falharam em quaisquer outras sagradas normas de Deus. Nada do que é apresentado aqui tem a intenção de minimizar a misericórdia de Deus ou do seu perdão.

No temor do Senhor, a Igreja estabelece aqui os princípios e práticas que se devem aplicar nessa matéria de casamento, divórcio e novo casamento. Embora o casamento tenha sido realizado primeiramente por Deus só, sabe-se que as pessoas hoje vivem sob governos civis; portanto, o casamento tem dois aspectos: o divino e o civil. O aspecto divino é regido pelas leis de Deus; o civil, pelas leis do Estado. Em harmonia com esses princípios, as seguintes declarações estabelecem a posição da Igreja:

1. Quando Jesus disse: “Não o separe o homem”, Ele estabeleceu uma regra de conduta para a Igreja sob a dispensação da graça, a qual deve transcender todas as legislações civis que vão além de sua interpretação da divina lei que governa as relações de casamento. Aqui Ele dá uma norma à qual seus seguidores devem aderir mesmo quando as leis civis ou os costumes prevalecentes permitam maior liberdade. “No Sermão do Monte, Jesus declarou plenamente que não podia haver dissolução do laço matrimonial, a não ser por infidelidade do voto conjugal” (O Maior Discurso de Cristo, p. 63; ver Mt 5:32; 19:9). 

2. A infidelidade ao voto matrimonial geralmente tem sido considerada alusão ao adultério ou fornicação. No entanto, a palavra do Novo Testamento usada para fornicação inclui algumas outras irregularidades sexuais (1Co 6:9; 1Tm 1:9, 10; Rm 1:24-27). Portanto, perversões sexuais, incluindo incesto, abuso sexual de criança e práticas homossexuais, são também reconhecidas como um abuso das faculdades sexuais e uma violação do plano divino no casamento. Como tais, essas práticas são uma causa justa para separação e divórcio. Se bem que as Escrituras permitam o divórcio pelas razões mencionadas acima, bem como por abandono por parte do cônjuge incrédulo (1Co 7:10-15), a igreja e as pessoas envolvidas devem fazer esforços diligentes para a reconciliação, apelando aos cônjuges que manifestem um ao outro um espírito de perdão e restauração. A igreja é instada a tratar amorável e redentivamente o casal a fim de auxiliar no processo de reconciliação. 

3. Na eventualidade de não se conseguir a reconciliação, o cônjuge que permaneceu fiel ao consorte que violou o voto matrimonial tem o direito bíblico de obter o divórcio e também de se casar novamente. 

4. O cônjuge que violou o voto matrimonial (ver itens 1 e 2) estará sujeito à disciplina pela igreja local (ver p. 64-70). Se se arrependeu genuinamente, poderá ser posto sob censura por um tempo determinado em vez de ser removido do rol de membros da igreja. Se não deu evidências de completo e sincero arrependimento, deve ser removido do rol de membros. Em caso de violações que tenham trazido vergonha pública sobre a causa de Deus, a igreja, a fim de manter suas elevadas normas e seu bom nome, pode remover o indivíduo da lista de membros. Qualquer dessas formas de disciplina deve ser aplicada pela igreja de uma maneira que procure alcançar os dois objetivos da disciplina: corrigir e redimir. No evangelho de Cristo, o lado redentivo da disciplina sempre está vinculado a uma transformação autêntica do pecador em uma nova criatura em Jesus Cristo. 

5. Um cônjuge que tenha violado o voto matrimonial e se tenha divorciado não tem o direito moral de casar-se com outra pessoa enquanto o cônjuge que permaneceu fiel ao voto ainda vive e permanece sem casar-se e casto. Se ele se casar, deverá ser removido do rol de membros. A pessoa com quem se casar, se for membro da igreja, também deverá ser removida do rol de membros. 

6. Reconhece-se que algumas vezes as relações matrimoniais se deterioram a tal ponto que é melhor para marido e mulher que se separem. “Ora, aos casados, ordeno, não eu, mas o Senhor, que a mulher não se separe do marido (se, porém, ela vier a separar-se, que não se case ou que se reconcilie com seu marido); e que o marido não se aparte de sua mulher” (1Co 7:10, 11). Em muitos desses casos, a guarda dos filhos, o ajuste dos direitos de propriedade ou mesmo a proteção pessoal, podem tornar necessária uma mudança no status matrimonial. Em tais casos, em alguns países, pode ser permissível obter o que é conhecido como separação legal. Contudo, em algumas jurisdições essa separação só pode ser obtida por meio do divórcio. Uma separação ou divórcio que resulta de fatores como violência física ou em que não está envolvida a “infidelidade ao voto matrimonial” (ver itens 1 e 2) não dá a nenhum dos cônjuges o direito bíblico de se casar novamente, a menos que no ínterim a outra parte se tenha casado novamente, haja cometido adultério ou fornicação ou tenha morrido. Se um membro da igreja que se tenha assim divorciado se casar novamente sem essas bases bíblicas, deve ser removido do rol de membros; e a pessoa com quem se casar, se for membro da igreja, também deverá ser removida (ver p. 64-70). 

7. O cônjuge que tenha quebrado o voto matrimonial e se tenha divorciado e sido removido do rol de membros e tenha se casado novamente, ou quem se tenha divorciado por outros motivos que não as bases apresentadas nos itens 1 e 2 e se tenha casado novamente e sido removido do rol de membros, deve ser considerado inelegível à qualidade de membro, exceto nos casos previstos a seguir: 

8. O vínculo do casamento é não apenas sagrado, mas também possivelmente mais complexo quando, por exemplo, envolve filhos. Assim, em um pedido para readmissão à qualidade de membro, as opções disponíveis à pessoa arrependida podem ser severamente limitadas. Antes que a decisão final seja tomada pela igreja, o pedido de readmissão deve ser submetido pela igreja, por meio do pastor ou líder distrital, à Comissão Diretiva da Associação para conselho e recomendação quanto aos passos que a pessoa ou as pessoas arrependidas podem dar para obter tal readmissão. 

9. A readmissão ao rol de membros da igreja daqueles que tenham sido removidos pelas razões dadas nos parágrafos anteriores, se dá normalmente com base no rebatismo (ver p. 51, 69, 70). 

10. Quando uma pessoa que tenha sido removida do rol de membros for readmitida, conforme estabelece o parágrafo 8, todo cuidado deve ser exercido para salvaguardar a unidade e harmonia da igreja, não se concedendo à pessoa responsabilidade como líder, especialmente em um ofício que requeira o rito da ordenação, a não ser com cuidadosa consideração junto à administração da Associação. 

11. Nenhum pastor tem o direito de oficiar em uma cerimônia de novas núpcias de uma pessoa que, sob a estipulação dos parágrafos precedentes, não tenha o direito bíblico para o novo casamento.

Entrevista com o pastor Alacy Barbosa
Saiba mais sobre divórcio e novo casamento nesta conversa com o pastor Alacy Barbosa.



terça-feira, 25 de agosto de 2020

Em nome de Deus...

Está ficando cada vez mais comum aparecerem líderes religiosos nas páginas policiais dos jornais, envolvidos em fraudes financeiras e fiscais, assassinatos, abusos, falsos milagres... Eles trazem escândalo para o evangelho e desviam muitas pessoas sinceras do caminho da fé. Confira essas recentes histórias:

Flordelis
A deputada federal Flordelis dos Santos, de 59 anos, foi acusada formalmente nesta segunda-feira (24) de ser a mandante do assassinato de seu marido, alvejado ano passado na casa de Niterói onde o casal morava com seus 55 filhos, quatro deles biológicos e os demais adotivos. A polícia afirma que a parlamentar, que também é pastora evangélica, ordenou que seus filhos matassem o pai em meio à disputa por poder e dinheiro na Igreja que ambos fundaram. Segundo o promotor Sergio Lopes Pereira, numa troca de mensagens com um dos filhos, Flordelis diz que não poderia se separar do marido por questões religiosas, e, portanto, segundo o promotor, decidiu matá-lo: “Fazer o quê? Separar dele não posso, porque senão ia escandalizar o nome de Deus”.

Padre Robson
Um dos religiosos mais populares da Igreja Católica no Brasil, o padre Robson de Oliveira Pereira, reitor do Santuário Basílica do Divino Pai Eterno, em Trindade (GO), até semana passada, foi proibido temporariamente de realizar celebrações. Ele é investigado pelo Ministério Público de Goiás pelo suposto desvio de R$ 120 milhões em doações de fiéis. O dinheiro teria sido usado na aquisição de imóveis, entre os quais uma fazenda de R$ 6 milhões em Abadiânia (GO), e uma casa de praia, no valor de R$ 3 milhões, em Guarajuba, na Bahia. Os promotores apuram os crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro, apropriação indébita, falsificação de documentos e sonegação fiscal.

Em vídeo postado em suas redes sociais, o padre Robson afirmou que todo o dinheiro arrecadado com doações foi utilizado em atividades religiosas e diz estar "sereno e confiante" de que tudo será esclarecido. "Sabemos que a vida é feita não somente de alegrias, mas também de provações. Meu caminho nessa missão evangelizadora nunca foi fácil. Desde o início, já testemunhei várias vezes, sempre carreguei muitas cruzes”, disse.

João de Deus
De um lado, curas milagrosas, operações espirituais e a amizade e a admiração de celebridades e poderosos do nível de Bill Clinton, Oprah Winfrey e Xuxa. De outro, centenas de acusações de abuso sexual, uma organização criminosa, um passado de homicídios. Essa é a história (uma parte) de João de Deus, médium, curandeiro e cirurgião espiritual brasileiro que foi do céu ao inferno depois de cativar milhares de pessoas em todo o mundo por cinco décadas com sua fama de milagres, enquanto abusava de mulheres e meninas aonde quer que fosse. Os mais de 18 meses de investigação jornalística que resultaram nas denúncias e na prisão do médium agora são apresentados na Globo como uma série documental de seis capítulos chamada Em Nome de Deus.

Em nome de Deus...
Confira abaixo um trecho do excelente artigo de autoria de Diego Barreto (via O Reino):

Nenhum de nós é bom (Romanos 3:10). Somos todos nascidos sob a infecção do mal (Salmos 51:5). A única coisa que nos impede de levar esse mal às últimas consequências são as circunstâncias (Provérbios 30:9). E quando falo circunstâncias me refiro a muitas coisas como o local onde você nasceu, quem foram seus pais, o ambiente que você foi criado, como você foi educado, a religião da sua família, ambiente social, experiências específicas, situações específicas e etc… Não estou dizendo que quem rouba, rouba porque passa fome, pois há muitos que passam fome sem roubar. Estou dizendo que, na natureza, somos igualmente maus. São as escolhas que fazemos, ou seja, os motivos, as justificativas que damos para tomar uma decisão que corroboram essa natureza, ou a contrariam.

E o título desse artigo revela a mais potente motivação que um ser humano pode encontrar. Também confundida como “o bem maior”, ela pode ser transformadora ou devastadora. Vimos que, em nome de Deus, muito bem foi feito, e podemos citar avanços incríveis que foram realizados em nome de Deus. Mas também podemos citar terríveis acontecimentos levados a cabo pelo mesmo nome. Por exemplo, em nome de Deus já se fizeram escravos, no mesmo nome eles foram libertos. O grande problema é que quando incluímos Deus na nossa equação pessoal de visão de mundo podemos criar um sério problema.

A compreensão de que Deus é absoluto somada à noção de que nossas opiniões pessoais e/ou devaneios são a vontade de Deus confere a nosso argumento, seja ele qual for, autorização infinita, absoluta. Assim, em nome de Deus o indefensável se torna justificável. O absurdo passa a ter motivo de existir. Muitas vezes, mais do que função em um propósito, o absurdo pode se tornar um dever do individuo. Essa compreensão também empodera os atuantes. Eles se sentem mais motivados e mais fortes para agir de maneira cada vez mais ousada. 

Paulo passou por isso, em Filipenses 3:6, onde ele explica que em seu “zelo”, ou seja, na busca de preservar sua visão de mundo, em nome de um “bem maior”, no afã de preservar sua fé, defender a Deus, atacar o mundo, ele se tornou perseguidor da igreja. Paulo lutou do lado errado da batalha, tempo suficiente para incorrer em absurdos e violência, em “nome de Deus”. Achando que Deus estava com ele, Paulo foi mais longe que todos os outros e investiu fortemente contra a igreja. Tentou justificar o injustificável do assassinato em nome de Deus. E não pense que você não incorreria no mesmo erro!

Paulo é um dos homens mais inteligentes nas escrituras, e ainda assim, foi enganado por seu próprio “zelo”. Só quando Jesus, em pessoa, aparece para ele que convencê-lo se torna possível, caso contrário, permaneceria cego em sua caçada. Isso pode acontecer facilmente comigo e contigo também. Ninguém pede para ficar cego. Nós acabamos nos cegando com “bons motivos” e, muitas vezes, no próprio “nome de Deus”.

Enfim, percebemos que o problema não está no “nome de Deus”, este é apenas um potencializador, o problema está naquilo que fazemos com o “nome de Deus”. Como podemos torná-lo uma desculpa para nossas próprias agendas de terror, ódio, intolerância, segregação, julgamento, opressão, inveja, calúnia, controle e etc… O problema não é apenas a maldade que temos em nós, mas as desculpas que criamos para elas.

Muitos estão dispostos a criar desculpas perfeitas para a ações equivocadas como, por exemplo, defender a Deus. Eva foi atraída ao pecado e árvore da qual devia se distanciar, porque ouviu uma frase mentirosa da serpente e se prontificou a defender Deus. Os caras mais errados da Bíblia foram precisamente aqueles que tentaram defender a honra de Deus: Bildade, Zofar e Elifaz. No fim do livro de Jó, Deus os repreendeu, enquanto passaram a maior parte do livro tentando defender e justificar a Deus. Será que Deus foi ingrato? Acho que não. Ele estava apenas nos ensinando a não fazer o que fazemos: Justificar nossas visões de mundo com o nome dEle.

Adventistas, cristãos, judeus, muçulmanos, enfim, todos que estiverem lendo este artigo, em nome do Deus criador de todas as coisas e do bom senso não justifiquem suas visões particulares da religião e da vida com o nome de Deus. Deus não precisa de defensores, Sua honra não está em jogo, Sua justiça não depende de agentes humanos, Sua verdade não está sujeita a nós e Seu amor não tem limites como o nosso. Cuidemos todos para que o “zelo” não corrompa as nossas ações. O Reino de Deus não é hostil. Não existe cristianismo de guerrilha, que usa a verdade como ferramenta de maus tratos. Nossas palavras não são para ferir e machucar, nossos atos não são para dividir, julgar e acusar. Nossa postura não é a do confronto, do ódio ou da intolerância. NADA JUSTIFICA ESSAS COISAS. NADA. Nem Deus.

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

O Massacre da Noite de São Bartolomeu

"Então, sereis atribulados, e vos matarão. Sereis odiados de todas as nações, por causa do Meu nome" (Mateus 24:9).

Todo cristão genuíno precisa pagar um preço por sua fé. Esse preço varia de acordo com as circunstâncias nas quais o cristão está inserido e no nível de seu compromisso com a Palavra de Deus.

Poucas pessoas pagaram um preço tão alto por sua fé quanto os huguenotes, que eram protestantes franceses calvinistas. Uma forte onda de violência católica contra os huguenotes começou na noite de 23 para 24 de agosto de 1572, a qual se tornou conhecida como o Massacre da Noite de São Bartolomeu. Começou em Paris e se espalhou para outros centros urbanos e regiões rurais, durando várias semanas. Segundo apologistas huguenotes contemporâneos, o total de executados chegou a 300 mil. Historiadores mais neutros falam em 10 mil.

Veja a descrição do Massacre da Noite de São Bartolomeu feita por Ellen G. White:

"O mais negro, porém, do negro catálogo de crimes, a mais horrível entre as ações diabólicas de todos os hediondos séculos, foi o massacre de São Bartolomeu. O mundo ainda recorda com estremecimento de horror as cenas daquele assalto covardíssimo e cruel. O rei da França, com quem sacerdotes e prelados romanos insistiram, sancionou a hedionda obra. Um sino badalando à noite dobres fúnebres, foi o sinal para o morticínio. Milhares de protestantes que dormiam tranquilamente em suas casas, confiando na honra empenhada de seu rei, eram arrastados para fora sem aviso prévio e assassinados a sangue frio. Como Cristo fora o chefe invisível de Seu povo ao ser tirado do cativeiro egípcio, assim foi Satanás o chefe invisível de seus súditos na horrível obra de multiplicar os mártires. Durante sete dias perdurou o massacre em Paris, sendo os primeiros três com inconcebível fúria. E não se limitou unicamente à cidade, mas por ordem especial do rei estendeu-se a todas as províncias e cidades onde se encontravam protestantes. Não se respeitava nem idade nem sexo. Não se poupava nem a inocente criancinha, nem o homem de cabelos brancos. Nobres e camponeses, velhos e jovens, mães e filhos, eram juntamente abatidos. Por toda a França a carnificina durou dois meses. Pereceram setenta mil da legítima flor da nação" (O Grande Conflito, p. 272).

O Edito de Nantes, de 1598, assinado pelo rei Henrique IV da França, concedeu aos huguenotes tolerância religiosa significativa. No entanto, em 1685, Luís XIV revogou o Edito, e isso aumentou a hostilidade contra os huguenotes, o que levou à fuga de até 400 mil do país, arriscando a própria vida.

Em 1730, uma jovem huguenote de 19 anos de idade foi presa e confinada na torre de Constance, na cidade de Aigues-Mortes, no sul da França. O nome dela era Marie Durand (1711-1776), e seu crime era ter um irmão pastor protestante. Tudo que ela precisava fazer para sair da cadeia era dizer: “Eu me retrato.” Em vez disso, ela entalhou em uma pedra da prisão a palavra francesa résister (“resistir”). Marie passou 38 anos (1730-1768) na prisão por causa de sua fé!

Você estaria disposto a pagar um preço tão elevado por sua fé? Louvado seja o Senhor se sua resposta for afirmativa. De todo modo, há um imenso contraste entre a convicção inamovível de muitos mártires cristãos e as crenças ajustáveis do cristianismo pluralista que predomina atualmente. Os mártires viveram em uma época de intolerância religiosa. Para eles, a verdade era a verdade, a despeito das circunstâncias e daquilo que as autoridades políticas e eclesiásticas diziam.

Os tempos mudaram. Hoje, em muitos países do mundo, temos a bênção da liberdade religiosa. Infelizmente, porém, o efeito colateral da liberdade tende a ser a falta de comprometimento. Muitos cristãos hoje gostam de ser politicamente corretos! Desfrutemos a liberdade que temos, sem perder o compromisso com a Palavra de Deus e a disposição em pagar o preço por nossa fé.

Ilustração: O pintor Débat-Ponsan pintou a cena da rainha Catarina de Médicis saindo do Louvre depois da execução de milhares de protestantes.

Texto adaptado da Meditação Diária - Um Dia Inesquecível de Alberto R. Timm.

sábado, 22 de agosto de 2020

Imagine... se os homens respeitassem as mulheres

Numa pesquisa do Instituto DataSenado sobre violência doméstica e familiar, realizada em 2017, 51% das entrevistadas disseram que as mulheres não são tratadas com respeito no Brasil. Entre os lugares em que elas são desrespeitadas estão a rua (54%), o lar (27%) e o trabalho (16%). Para 69% delas, o Brasil é um país muito machista. 

Tão preocupante quanto esses números é a estimativa de que somente 20% dos casos de violência contra a mulher são denunciados. De fato, o silêncio ainda precisa ser quebrado. Definir o crime de homicídio de mulheres por violência doméstica e familiar ou pela condição de ser mulher foi um passo importante para uma mudança social e de mentalidade. Será que podemos começar a imaginar juntos como seria uma sociedade em que os homens respeitassem as mulheres?

SEM CANTADAS E MEDO 
A pesquisa que dá suporte à campanha “chega de fiu fiu”, realizada com cerca de 8 mil participantes, mostrou que quase 100% das mulheres já foram “cantadas” e que 83% delas não gostam desse tipo de assédio. Os casos são tão recorrentes que 90% das entrevistadas já haviam trocado de roupa alguma vez por receio de assédio e 81% delas haviam deixado de fazer algo ou ir para algum lugar por esse motivo. Muitas temem sofrer agressão verbal e física, e até morrer. No Brasil Colonial já existiam essas investidas sexuais masculinas, que eram mais explícitas quanto mais escura fosse a pele ou mais baixa a classe social da mulher. Resistir significaria assumir o risco de ser espancada. O ponto é que a “cantada” é diferente de oferecer um elogio e conversar de modo interessante e respeitoso. O que caracteriza o assédio é uma investida sem consentimento, gerando assim constrangimento, intimidação e medo na vítima. 

INTEGRIDADE GARANTIDA 
Com o assédio e a violência em potencial, as mulheres sentem que estão em risco em vários aspectos. Em 2018, por exemplo, foram registrados 14.796 casos de violência doméstica em todo o Brasil, o que inclui agressão física (67%), psicológica (47%), moral (36%) e sexual (15%). Desses casos, 60% das vítimas não denunciaram o agressor porque dependiam financeiramente dele. A violência familiar, além de gênero, também tem cor: segundo o Atlas da Violência 2019, 66% das mulheres assassinadas em 2017 eram negras. E nos dez anos anteriores à pesquisa (2007-2017), o número de homicídios de mulheres negras havia crescido bem mais (29,9%) do que o índice de assassinato das demais mulheres (4,5%). Também em 2018 foram registrados no Brasil quase 16 mil casos de violência contra a mulher que resultaram em morte, e cerca de 33 mil ocorrências de estupros. Em 70% dos casos de violência e morte, os agressores eram conhecidos da vítima.

RECONHECIMENTO PROFISSIONAL 
Por muito tempo, as mulheres foram confinadas ao ambiente privado e doméstico. A esfera pública (a rua, as reuniões, a política e o trabalho) pertencia aos homens. Havia uma distinção muito clara entre as mulheres “puras” e as “públicas” no Brasil Colonial e no mesmo período na Europa. As puras eram protegidas pelos homens da família, e seu papel era obedecer e procriar. Por sua vez, as mulheres públicas eram as que precisavam trabalhar para sobreviver. Fora do espaço privado, elas sofriam toda sorte de abusos verbais e físicos. A tentativa era controlar as mulheres por meio da dependência econômica. 

Durante séculos, ideias como as de Aristóteles, que considerava as mulheres como seres irracionais e biologicamente inferiores, influenciaram o cristianismo medieval, que já tinha uma visão negativa delas por responsabilizar Eva pelo pecado original. Porém, isso tem mudado: se na década de 1950, por exemplo, 40% dos norte-americanos achavam os homens mais inteligentes e competentes profissionalmente do que as mulheres, hoje esse número caiu para 10%. No Brasil, até 1962, elas tinham que pedir autorização ao marido para trabalhar fora. Atualmente, 56% delas estão no mercado de trabalho e representam 57% dos que cursam ensino superior no país. Não há nada biológico ou genético que indique superioridade do homem em relação à mulher.

DIREITOS RESPEITADOS 
A luta das mulheres para ter os mesmos direitos dos homens é um longo processo histórico, com ganhos e retrocessos. A Revolução Francesa proclamou a igualdade natural e de direitos universais, mas esse “universal” excluiu as mulheres, que não eram consideradas cidadãs. Por esse motivo, no século 19 começou a luta pelo direito de voto feminino, conquista que viria apenas no século 20. Depois, foram levantadas as bandeiras de direito ao trabalho, à igualdade salarial e do combate à violência de gênero. 

No Brasil, o progresso inclui conquistas legislativas mais recentes, como a Lei Maria da Penha (2006) e do Feminicídio (2015), além do estabelecimento de delegacias da mulher e de protocolos médicos de atendimento às vítimas de violência física e sexual. No entanto, há muito ainda para ser feito para mudar mentalidades e comportamentos. As mulheres conhecem pouco a respeito da legislação que as protege; muitas denunciam apenas depois de terem sofrido várias agressões. Além disso, a cada 20 inquéritos policiais abertos no Brasil, são concedidas 13 medidas protetivas e ocorre apenas uma condenação penal do agressor; e ainda há descrédito em relação ao testemunho da mulher agredida e a culpabilização da vítima. 

As mulheres são 52% da população mundial. Portanto, numericamente não são minoria, mas ainda assim sofrem com a falta de respeito aos seus direitos. Como mudar esse quadro? A Bíblia traz três conceitos revolucionários: ame o próximo como a você mesmo (Mateus 22:39), mude sua maneira de pensar (Romanos 12:2) e na família de Cristo todos são iguais (Gálatas 3:28). Mesmo vivendo numa sociedade que desvalorizava as mulheres, por meio de Seu convívio com elas, Cristo restaurou a dignidade feminina. Se esses princípios bíblicos transformadores forem colocados em prática, principalmente pelas igrejas, poderemos fazer muito mais pela proteção e expansão dos direitos humanos universais. 

JESSICA MANFRIM, mestre em História pela Universidade de São Paulo (USP), é revisora de livros (via Revista Quebrando o Silêncio)

Fontes: Atlas da Violência 2019 (ipea.gov.br); “Mulheres e Cantadas: Uma Relação de Medo”, artigo da Revista Fórum, de 12 de setembro de 2013 (bit.ly/2knpPOQ); “Chega de Fiu Fiu: Resultado da Pesquisa” (bit.ly/2C6Ng6a); Cartilha da Campanha “Chega de Fiu Fiu” em parceria com a Defensoria Pública do Estado de São Paulo (bit. ly/2lYoNZO); mapa on-line para denúncias de assédio (chegadefiufiu.com.br); Mapa da Violência de Gênero (mapadaviolenciadegenero.com.br); “Mulheres e Sexualidade no Brasil Colonial”, capítulo de Lana Lage da Gama Lima, no livro Mulheres na América e no Mundo Ibérico (Humanitas, 2011), de Eni de Mesquita Samara (org.), p. 143-189; “Mulher e Violência na América Latina e no Caribe”, capítulo de Maria Beatriz Nader, no livro Mulheres na América e no Mundo Ibérico, p. 241-285; Pesquisa “Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher”, realizada pelo Instituto DataSenado e Observatório da Mulher Contra a Violência, em junho de 2017 (bit.ly/2CQU8VJ); Panorama da violência contra as mulheres no Brasil: indicadores nacionais e estaduais, relatório do Senado Federal e Observatório da Mulher Contra a Violência (2016-2018) (bit.ly/2ztc9FB); Mapa da Violência Contra a Mulher 2018, realizado pela Câmara dos Deputados e Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher (bit.ly/2LsToep); “A Poucos Passos da Igualdade”, artigo de Sabrina Brito na revista Veja, de 24 de julho de 2019; verbete “Feminismo”, no Dicionário de Conceitos Históricos (Contexto, 2009), de Kalina Vanderlei Silva e Maciel Henrique Silva; verbete “Feminismo” no Dicionário de Nomes, Termos e Conceitos Históricos (Lexicon, 2012), de Antônio Carlos do Amaral Azevedo.