O enredo da guerra entre a Rússia e a Ucrânia vinha sendo escrito há um bom tempo. Nas relações internacionais, o lado mais forte impõe as regras. Por possuir um enorme arsenal nuclear e ter se fortalecido nos últimos anos, a Rússia achou que poderia fazer valer seus interesses. A agressão do país a uma nação livre, interrompendo vidas e destruindo sonhos, é uma tentativa de ampliar seu status, recuperar a influência perdida e resgatar uma glória que desvaneceu. É claro que o Ocidente poderia ter feito mais pela Ucrânia quando ela se tornou independente em 1991, renunciou a seu arsenal nuclear e quis entrar para a Otan.
A Otan, o tratado militar mais bem-sucedido da história, é uma enorme pedra no caminho da Rússia. Por isso, o país teme e ao mesmo tempo desafia essa aliança atlântica criada em 1949. A narrativa russa para a invasão inclui a estratégia de evitar o ingresso da Ucrânia na Otan. Mas a Rússia, encarnada pelo presidente, reverenciado pela cúpula como um czar contemporâneo, tem outras ambições. E o mundo ficou entre dois personagens com o mesmo nome, um vilão e um herói: Vladimir Putin e Volodymyr Zelensky (em russo, Volodymir é Vladimir; em ucraniano, Vladimir é Volodymyr).
Com isso, além das terríveis perdas humanas e dos danos materiais, o risco da Terceira Guerra Mundial voltou a assombrar a humanidade. Mesmo que o conflito atual acabe logo, ele já afetou a ordem da segurança europeia e tem potencial para mudar a geopolítica mundial. Só o fato de que vários analistas estão discutindo a possibilidade de um ataque nuclear já é inquietante. A história se acelerou novamente.
Depois da Segunda Guerra Mundial, o mundo entrou num período de bipolaridade liderada por duas superpotências: os Estados Unidos e seus aliados e a União Soviética e seus satélites. Foi a fase da Guerra Fria. A partir dos anos 1970, surgiu uma espécie de multipolaridade. Com o fim da União Soviética em 1991, a ordem mundial mudou novamente. Os Estados Unidos reafirmaram seu papel, buscando uma ordem monopolar. Porém, os desafios não desapareceram.
Recentemente, com a globalização, a guerra por hegemonia entre Estados Unidos, Europa e China complicou ainda mais o tabuleiro. Essa relação trilateral tem implicações significativas em áreas como segurança, economia e clima. Agora a Rússia, com a simpatia da própria China, tem mostrado a ambição de aumentar seu poder global. “Uma Rússia fora-da-lei tenta redefinir a ordem mundial”, escreveu Walter Russell Mead no The Wall Street Journal em 24 de fevereiro. Para ele, “teria sido fácil deter Putin 20 anos ou mesmo uma década atrás; hoje isso exigirá um esforço muito maior em um mundo muito mais sombrio”.
O que vai surgir desse cenário: uma nova ordem, nenhuma ordem ou uma desordem? O mundo será bipolar novamente? Tripolar? Multipolar? Vencerão Estados democráticos ou autocráticos? Países democráticos mudarão seu perfil? Qual será a implicação de uma união maior entre os países europeus? A paz global foi um importante valor nas últimas décadas do século 20. Porém, o cenário começa a ficar tenso de novo. E isso assombra o mundo e põe em alerta os cristãos, que conhecem o roteiro. “Quando andarem dizendo: ‘Paz e segurança’, eis que lhes sobrevirá repentina destruição”, advertiu o apóstolo Paulo (1Ts 5:3).
Antes de surgir no horizonte um reino eterno de paz e justiça, muitas coisas ruins vão acontecer. Um invasor autoritário do planeta fará guerra contra um povo inocente. Mas jamais percamos de vista que estamos resistindo e lutando pela nossa terra, nossa liberdade e nossa vida. Uma nova ordem global digna do nome em breve surgirá.
Marcos De Benedicto (Editorial da edição de março de 2022 da Revista Adventista)
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