“Crise”. Com que frequência você tem ouvido essa palavra? Uma simples busca do termo no Google revela que, dos mais de 100 milhões de ocorrências, uma quantidade significativa se refere ao momento atual que o Brasil e o mundo enfrentam.
De fato, vivemos dias difíceis. Nem é preciso acompanhar os noticiários para perceber isso. Basta olhar ao redor. Em casa, na rua, no comércio e nas rodas de amigos, o clima é de apreensão e, nas igrejas, os pedidos desesperados de oração se avolumam. E não é somente a crise política e econômica que têm causado tanto transtorno. Paralelamente, continuamos convivendo com outras antigas conhecidas, como a crise na saúde, na educação e na segurança públicas; a crise moral da sociedade; e ainda outras de caráter mais pessoal, como crises familiares, psicológicas e emocionais. Em resumo, vivemos em crise!
Definição
Crise é sinônimo de dificuldade, adversidade, tensão, complicação, conflito, etc. A palavra praticamente não aparece na Bíblia, mas o conceito está presente do começo ao fim. Desde a rebelião de Lúcifer no Céu e a queda da humanidade no Éden (Ap 12:7-9; Gn 1-3), passando por toda a história do grande conflito e a cruz, até a vitória final de Deus sobre o pecado e o mal (Ap 19-22), as Escrituras apresentam os altos e baixos de um mundo em constante crise. Além do conceito, a Bíblia também contém a etimologia da palavra. “Crise” deriva do vocábulo grego krisis, que ocorre oito vezes no texto original do Novo Testamento, sempre com o sentido de juízo, julgamento ou decisão.
Nos escritos de Ellen White, o termo crisis, em inglês, aparece cerca de 50 vezes e é utilizado para definir diferentes situações, desde problemas circunstanciais na vida pessoal até momentos decisivos da história da redenção. Alguns exemplos do que Ellen White considerava crise:
- A luta e a agonia de Cristo no Getsêmani diante do fato de que estava em jogo o futuro da humanidade (O Desejado de Todas as Nações, p. 693).
- Os desafios enfrentados pela igreja primitiva em seu período formativo (Atos dos Apóstolos, p. 88, 405).
- Os momentos difíceis através dos quais Deus conduziu, conduz e conduzirá sua igreja (Review and Herald, 20 de setembro de 1892).
- O tempo atual, na iminência do fechamento da porta da graça, em que é urgente advertir as pessoas (Testemunhos Seletos, v. 2, p. 371).
- Os acontecimentos finais da história; o tempo de angústia; a futura perseguição do povo de Deus e a última batalha entre as forças do bem e do mal (Testemunhos Seletos, v. 2, p. 318-320; v. 3, p. 280; Profetas e Reis, p. 536).
- Lutas pessoais; provações e problemas em geral (Carta 47, 1889; Carta 70, 1894; Ciência do Bom Viver, p. 119).
- Crises financeiras (Conselhos Sobre Mordomia, p. 97).
Tanto na Bíblia quanto nas obras de Ellen White, a crise representa um momento crucial da vida ou da história, em que as decisões tomadas determinam o futuro, de forma positiva ou negativa.
Convivendo com a crise
Tempos críticos não são “privilégios” desta geração. A história da humanidade está pontilhada de momentos conturbados e angustiantes, sobretudo na trajetória da igreja. Jesus, que enfrentou as crises mais difíceis, foi quem previu que, neste mundo, teríamos aflições (Jo 16:33). Os heróis da fé tiveram que aprender a lidar com as intempéries da vida. Paulo, por exemplo, declarou: “Aprendi a adaptar-me a toda e qualquer circunstância. Sei o que é passar necessidade e sei o que é ter fartura. Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação, seja bem alimentado, seja com fome, tendo muito, ou passando necessidade. Tudo posso naquele que me fortalece” (Fp 4:11-13, NVI).
As crises também fizeram parte da rotina dos pioneiros do adventismo. Numa época em que os pastores tinham que dividir o tempo entre a pregação do evangelho e o trabalho duro no campo, Tiago e Ellen White, como outros pioneiros, lutaram contra a pobreza, as terríveis privações, enfermidades e a perda de entes queridos. A situação financeira do casal era tão precária que, certa vez, ao remendar o casaco já remendado do esposo, Ellen afirmou que era difícil identificar o pano original das mangas (Vida e Ensinos, p. 116). Diante das dificuldades, ela chegou a questionar se Deus os havia abandonado, mas acabou concluindo que “os sofrimentos e as provações nos aproximam de Jesus” (Idem, p. 115).
Atitude certa
Sem dúvida, a melhor solução para enfrentar as crises da vida é apegar-se a Deus. Como mostram Lothar C. Hoch e Susana M. Rocca no livro Sofrimento, resiliência e fé: implicações para as relações de cuidado, a psicologia tem comprovado que a fé tem um papel fundamental na superação de dificuldades e experiências traumáticas.
No entanto, em meio ao turbilhão de uma crise, é normal que as pessoas tenham atitudes diferentes em relação à religião ou à espiritualidade. Há aqueles que, nos momentos de dificuldade, simplesmente abandonam a fé. Permitem que o desemprego, as contas atrasadas, a ameaça de despejo, as doenças ou os conflitos familiares os desanimem e os afastem de Deus e da igreja. As preocupações são tantas que a leitura da Bíblia e a oração são deixadas em segundo plano, quando não totalmente esquecidas.
No outro extremo, a segunda atitude é a daqueles que, quanto mais sofrem, mais se aproximam de Deus e das coisas espirituais. A pessoa que assume essa postura entende que sua única esperança está além deste mundo e que orações mais fervorosas, mais estudo da Bíblia e mais frequência à igreja poderão trazer bons resultados, seja na solução dos problemas ou em obter a força necessária para suportá-los.
A terceira atitude frente a momentos de crise é aquela em que a pessoa não abandona completamente a fé nem recorre a ela com maior intensidade, mas acaba adotando um comportamento intermediário, semelhante à mornidão da igreja de Laodiceia (Ap 3:14-18). Quem está nessa condição tem a consciência de que não pode viver sem Deus e sem a comunhão da igreja, por isso segue com suas práticas religiosas, mas de maneira mecânica, com o brilho ofuscado pelo excesso de preocupações.
Qual desses é o seu perfil? Como você tem reagido às provações da vida? Qual é o efeito da crise sobre sua fé?
Tempo de oportunidades
Na Bíblia, a crise e o sofrimento são comparados ao fogo que purifica o metal precioso de nossa fé (1Pe 1:6, 7; 4:12, 13; Rm 5:3-5; Hb 11:35-38; Tg 1:12). Ellen White escreveu que “as provações da vida são obreiras de Deus para remover de nosso caráter impurezas e arestas.” Segundo ela, só as pedras que o Mestre considera preciosas são submetidas ao desgastante processo de lapidação e polimento, para servirem “como colunas de um palácio” (O Maior Discurso de Cristo, p. 23, 24).
Thomas DeWitt Talmage, um dos grandes pregadores do século 19, resumiu de forma poética o resultado da crise na vida dos personagens bíblicos: “Quando Davi andava em fuga pelo deserto, ele estava sendo preparado para se tornar o suave cantor de Israel. A cova e a masmorra foram as melhores escolas em que José foi diplomado. O furacão que desmantelou a tenda de Jó e matou seus filhos preparou o homem de Uz para […] o magnífico poema que tem sido o encanto de todas as épocas. Não existe outro meio de extrair da palha o trigo, senão trilhando-a. Não há outro meio de purificar o ouro senão queimando-o” (One Thousand Best Gems, p.83).
Por mais difíceis e traumáticas que sejam, as crises podem ser encaradas como ocasiões de oportunidade de aprender, crescer e se fortalecer. As crises não duram para sempre, mas os frutos de decisões tomadas em tempos difíceis podem ser eternos. É preciso lembrar que, comparados à eternidade, nossos sofrimentos nesta vida são “leves e momentâneos”. Por isso, devemos fixar os olhos “não naquilo que se vê, mas no que não se vê, pois o que se vê é transitório, mas o que não se vê é eterno” (2Co 4:17, 18, NVI).
Eduardo Rueda (via Revista Adventista)
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