terça-feira, 4 de março de 2025

O ÚLTIMO SOBREVIVENTE

Mais de meio século havia passado desde a organização da igreja cristã. Durante esse tempo, a mensagem do evangelho tinha sofrido constante oposição. Seus inimigos jamais afrouxaram os esforços, e afinal alcançaram êxito em arregimentar o poder do imperador romano contra os cristãos.

O império romano havia declarado os cristãos como uma ameaça à sua segurança. Eles eram tidos como insubordinados, uma vez que se recusavam a participar do culto ao imperador e, embora eles fossem cidadãos exemplares, Roma desconfiava que sua existência era perigosa. Por causa disso, muitos seguidores de Jesus foram queimados vivos, entregues às feras, mortos na arena do Coliseu. Os líderes do movimento, conhecidos como apóstolos, foram brutalmente executados. Houve apenas uma exceção: João, também conhecido como o discípulo amado.

Ellen G. White nos conta: "João alcançou avançada idade. Testemunhou a destruição de Jerusalém e a ruína do majestoso templo. Último sobrevivente dos discípulos que haviam privado intimamente com o Salvador, sua mensagem teve grande influência em estabelecer o fato de que Jesus é o Messias, o Redentor do mundo. Ninguém poderia duvidar de sua sinceridade, e através de seus ensinos muitos foram levados a deixar a incredulidade" (Ato dos Apóstolos, p. 294).

Os príncipes dos judeus encheram-se de ódio atroz contra João por sua inamovível fidelidade à causa de Cristo. Declararam que de nada valeriam seus esforços contra os cristãos enquanto o testemunho de João soasse aos ouvidos do povo. Para que os milagres e ensinos de Cristo fossem esquecidos, a voz da ousada testemunha teria de ser silenciada. 

João foi por conseguinte convocado a Roma para ser julgado por sua fé. Aqui perante as autoridades, as doutrinas do apóstolo foram deturpadas. Falsas testemunhas acusaram-no de ensinar sediciosas heresias. Por essas acusações esperavam seus inimigos levar em breve o discípulo à morte. 

João respondeu por si de maneira clara e convincente, e com tal simplicidade e candura que suas palavras tiveram efeito poderoso. Seus ouvintes ficaram atônitos com sua sabedoria e eloquência. Porém, quanto mais convincente seu testemunho, mais profundo era o ódio de seus opositores. O imperador Domiciano estava cheio de ira. Não podia contrafazer as razões do fiel advogado de Cristo, nem disputar o poder que lhe acompanhava a exposição da verdade; determinou, contudo, fazer silenciar sua voz. 

Ellen G. White relata: "João foi lançado dentro de um caldeirão de óleo fervente; mas o Senhor preservou a vida de Seu fiel servo, da mesma maneira como preservara a dos três hebreus na fornalha ardente. Ao serem pronunciadas as palavras: 'Assim pereçam todos os que crêem nesse enganador, Jesus Cristo de Nazaré', João declarou: Meu Mestre Se submeteu pacientemente a tudo quanto Satanás e seus anjos puderam inventar para humilhá-Lo e torturá-Lo. Ele deu a vida para salvar o mundo. Considero uma honra o ser-me permitido sofrer por Seu amor. Sou um homem pecador e fraco. Cristo era santo, inocente, incontaminado. Não pecou nem se achou engano em Sua boca" (Idem, p. 294).

Estas palavras exerceram sua influência, e João foi retirado do caldeirão pelos mesmos homens que ali o haviam lançado. E de novo a mão da perseguição caiu pesadamente sobre o apóstolo. Por decreto do imperador, João foi sentenciado a viver em Patmos, uma ilha localizada no Mar Egeu que se tornou uma prisão de segurança máxima, condenado “por causa da Palavra de Deus, e pelo testemunho de Jesus Cristo” (Ap 1:9). Aqui, pensavam seus inimigos, sua influência não mais seria sentida, e ele morreria, afinal, pelas privações e sofrimentos. Ellen G. White diz: “Patmos, uma ilha árida e rochosa no mar Egeu, havia sido escolhida pelo governo romano para banimento de criminosos; mas para o servo de Deus, sua solitária habitação tornou-se a porta do Céu” (Idem, p. 295). 

O coração do escritor do Apocalipse estava entristecido pelo martírio de seus companheiros, cheio de nostalgia por sua terra natal e por sua igreja local. Seu desejo de reencontrar seus queridos era tão grande quanto a sua solidão na ilha-prisão. Embora João estivesse isolado em uma ilha, as dores da igreja no continente o incomodavam mais que a sua própria. Contudo, foi em Patmos que João compreendeu que todo o planeta Terra está ilhado do universo e que todos nós somos prisioneiros de um governo tirânico e maléfico. Seu exílio mostrava o isolamento que a raça humana enfrentava distante do seu Criador e do resto da sua criação.

A situação de João não era nada fácil. Ele estava velho, separado das igrejas que havia fundado, era o último sobrevivente entre os apóstolos e estava em uma prisão de segurança máxima. Todavia, ele enxerga a sua própria condição como uma peça de uma obra maior. Ele é um “companheiro na tribulação”. Só aqueles que sofreram verdadeiramente sabem como confortar os que sofrem.

Ellen G. White diz que "na experiência do apóstolo João sob a perseguição, há para o cristão uma lição de maravilhosa fortaleza e conforto. Deus não impede a trama dos ímpios, mas faz que suas armadilhas contribuam para o bem daqueles que em prova e conflito mantêm sua fé e lealdade" (Idem, p. 297).

João encarava seu exílio e sua condição de isolamento como sendo muito mais que um mero problema. Aquele era o seu testemunho. Ele utilizava a própria dor para aliviar os sofrimentos da igreja. Ele não era apenas “companheiro na tribulação”, ele também era um “companheiro na perseverança”. Em sua experiência de aflição e solidão, ele tinha autoridade para dizer: “Aguentem firmes! Estamos juntos nessa!”

Ellen G. White finaliza: "Podem os ímpios torturar e matar o corpo, mas não podem tocar na vida que está escondida com Cristo em Deus. Podem encerrar homens e mulheres nas prisões, mas não lhes podem encerrar o espírito. Mediante provas e perseguições, a glória - o caráter - de Deus se revela em Seus escolhidos. Os crentes em Cristo, odiados e perseguidos pelo mundo, são educados e disciplinados na escola de Cristo. Na Terra andam em caminhos estreitos; são purificados na fornalha da aflição (Is 48:10). Seguem a Cristo através de penosos conflitos; suportam a abnegação e passam por amargos desapontamentos; mas deste modo aprendem o que significam a culpa e os ais do pecado, e olham para ele com repulsa. Tendo sido participantes das aflições de Cristo, podem contemplar a glória além da obscuridade, dizendo: 'Tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada' (Rm 8:18)" (Idem, p. 298).

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