sexta-feira, 17 de janeiro de 2025

LISTA MUNDIAL DE PERSEGUIÇÃO 2025

A perseguição aos cristãos é definida como qualquer hostilidade às pessoas que se identificam como cristãs, de todas as denominações e também que não pertencem a uma denominação específica. A perseguição pode incluir atitudes hostis, palavras e ações contra cristãos. 

A cada ano, a perseguição aos cristãos se intensifica no mundo todo. O número de cristãos com medo de ir à igreja, que não têm uma igreja para ir e precisam escolher entre permanecer fiel a Deus ou manter os filhos seguros só aumenta. Houve crescimento também no número de vítimas da violência extrema, que perderam familiares, casa, bens e a liberdade apenas por compartilhar a fé em Jesus Cristo.

Na compreensão clássica, a perseguição religiosa é realizada ou permitida pelo Estado. A realidade, porém, mostra que não é isso o que geralmente acontece. Nos dias de hoje, o papel de outros agentes está cada vez mais evidente — um exemplo disso são os grupos extremistas, tais como Estado Islâmico, Boko Haram, Al-Qaeda e Al-Shabaab.

Além desses, também podem ser mencionados: oficiais do governo, líderes de grupos étnicos, líderes religiosos não cristãos, líderes religiosos cristãos, grupos religiosos violentos, cidadãos e quadrilhas, parentes, partidos políticos, grupos paramilitares, redes criminosas, organizações multilaterais e grupos de pressão ideológica.

Lista Mundial de Perseguição 2025
O relatório da Lista Mundial de Perseguição 2025 da Portas Abertas (organização cristã internacional fundada em 1955) garante que mais de 380 milhões de cristãos enfrentam perseguição no mundo. Isso quer dizer que um em cada sete cristãos é hostilizado por seguir a Cristo.

A pesquisa realizada entre 1 de outubro de 2023 e 30 de setembro de 2024 revelou também que a perseguição aos cristãos cresceu mais entre os países da Ásia Central e África Subsaariana.

Há mais de 30 anos, a Portas Abertas monitora casos de perseguição e publica, anualmente, a lista com os 50 países onde os cristãos são mais perseguidos. A partir desses dados, é possível saber onde os seguidores de Jesus estão e como apoiá-los em suas diferentes necessidades como alimentação, moradia, cuidados médicos, distribuição de Bíblias, treinamentos, cuidados pós-trauma etc.

O país mais perigoso do mundo
O aumento da violência contra os cristãos contribuiu para que Coreia do Norte continuasse pela 23ª vez na primeira colocação. Cristãos foram descobertos, detidos e enviados para campos de trabalho forçado, onde vivem em condições precárias. Qualquer influência externa está sendo punida rigidamente pelo governo norte-coreano.

Perseguição extrema
Mianmar saiu da 17ª posição na LMP 2024 para a 13ª posição na LMP 2025 e está entre os países onde a perseguição é extrema. A guerra civil no país chegou ao quarto ano e foi um pretexto para destruição de igrejas, casas e comunidades inteiras de cristãos. Por consequência, milhares de seguidores de Jesus foram forçados a fugir e agora vivem como deslocados internos.

O Iêmen passou do 5º lugar para o 3º, devido ao aumento da violência contra os cristãos. Os dados foram consequência do aumento do poder houthi – movimento político religioso islâmico – e de maior radicalização dos muçulmanos. Dezenas de igrejas não puderam se reunir em segurança e um cristão convertido foi morto em razão da nova fé.

Os demais países onde a perseguição é extrema continuam os mesmos, mas com variações nas posições. São eles: Coreia do Norte (1º), Somália (2º), Líbia (4º), Sudão (5º), Eritreia (6º), Nigéria (7º), Paquistão (8º), Irã (9º), Afeganistão (10º), Índia (11º), Arábia Saudita (12º) e Mianmar (13º).

Igrejas fantasmas
A Portas Abertas destaca também a explosão de um fenômeno que está crescendo sem medida: o dos cristãos que, para escapar aos conflitos e da fome, mudam de cidade ou de país, tornando-se refugiados, esvaziando assim as Igrejas locais: "Por exemplo, no Oriente Médio, berço do cristianismo, há uma instabilidade cada vez maior e muitas comunidades cristãs estão se perdendo."

Violência contra as mulheres
A tendência de abuso contra mulheres, especialmente cristãs, também é assustadora. Os dados do relatório são implacáveis. Embora a Portas Abertas repita que é difícil reunir confirmações precisas sobre o número de vítimas de estupro e violência sexual por causa da fé, porque em muitos países os relatos são raros, sabe-se que, no ano passado, a violência contra as mulheres que a organização humanitária conseguiu descobrir chega a 3.944 casos, um aumento acentuado. Os casamentos forçados de jovens cristãs também estão aumentando: 821 casos foram registrados até agora, mas esses também, infelizmente, são números subestimados.

Ellen White e a perseguição ao povo de Deus
"Em todas as épocas as testemunhas designadas por Deus se têm exposto às perseguições e ao desprezo por amor à verdade. José foi caluniado e perseguido por haver preservado sua virtude e integridade. Davi, o mensageiro escolhido de Deus, foi caçado como um animal feroz por seus inimigos. Daniel foi lançado na cova dos leões por ser leal ao seu concerto com o Céu. Jó foi destituído de suas posses terrestres e ferido no corpo de tal maneira que o desprezaram os próprios parentes e amigos; contudo manteve sua integridade. Jeremias não pôde ser impedido de falar as palavras que Deus lhe ordenara; e seu testemunho de tal maneira enfureceu o rei e os príncipes que o atiraram num poço asqueroso. Estêvão foi apedrejado por haver pregado a Cristo, e Este crucificado. Paulo foi encarcerado, açoitado, apedrejado e finalmente entregue à morte por ter sido fiel mensageiro de Deus aos gentios. E João foi banido para a ilha de Patmos 'por causa da Palavra de Deus, e pelo testemunho de Jesus Cristo' (Ap 1:9).

Esses exemplos de humana firmeza dão testemunho da fidelidade das promessas de Deus - de Sua permanente presença e mantenedora graça. Testificam do poder da fé para enfrentar os poderes do mundo. É obra de fé repousar em Deus na hora mais escura, sentir, embora dolorosamente provado e sacudido pela tempestade, que nosso Pai está ao leme. Somente os olhos da fé podem ver para além das coisas temporais e apreciar com acerto o valor das riquezas eternas.

Jesus não oferece a Seus seguidores a esperança de alcançar glórias e riquezas terrestres, de viver uma vida livre de provações. Ao contrário, chama-os para segui-Lo no caminho da abnegação e ignomínia. Aquele que veio para redimir o mundo sofreu a oposição das arregimentadas forças do mal. Numa impiedosa confederação, homens e anjos maus se aliaram contra o Príncipe da paz. Cada um de Seus atos e palavras revelava divina compaixão, e Sua inconformidade com o mundo provocou a mais acérrima hostilidade.

Assim será com todos os que se dispuserem a viver piamente em Cristo Jesus. A perseguição e o descrédito esperam todos os que se imbuírem do Espírito de Cristo. O caráter da perseguição muda com o tempo, mas o princípio - o espírito que a anima - é o mesmo que tem dado a morte aos escolhidos do Senhor desde os dias de Abel.

Em todos os séculos, Satanás tem perseguido o povo de Deus. Tem-no torturado e lhe dado a morte, porém tornaram-se eles conquistadores ao morrer. Deram testemunho do poder de Alguém que é mais forte que Satanás. Podem os ímpios torturar e matar o corpo, mas não podem tocar na vida que está escondida com Cristo em Deus. Podem encerrar homens e mulheres nas prisões, mas não lhes podem encerrar o espírito.

Mediante provas e perseguições, a glória - o caráter - de Deus se revela em Seus escolhidos. Os crentes em Cristo, odiados e perseguidos pelo mundo, são educados e disciplinados na escola de Cristo. Na Terra andam em caminhos estreitos; são purificados na fornalha da aflição (Is 48:10).

Seguem a Cristo através de penosos conflitos; suportam a abnegação e passam por amargos desapontamentos; mas deste modo aprendem o que significam a culpa e os ais do pecado, e olham para ele com repulsa. Tendo sido participantes das aflições de Cristo, podem contemplar a glória além da obscuridade, dizendo: 'Tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada' (Rm 8:18)" (Atos dos Apóstolos, p. 297).

quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

OS ADVENTISTAS E O FOGO EM LOS ANGELES

Após o devastador Incêndio Palisades, as igrejas adventistas do sétimo dia em Los Angeles, Califórnia, nos Estados Unidos, estão se unindo para fornecer ajuda e apoio àqueles que foram desalojados e afetados. “Estou vendo a cidade se unir de uma maneira linda”, disse Manuel Arteaga, pastor da Igreja Adventista do Sétimo Dia White Memorial.

Localizada no centro da cidade de Los Angeles, a proximidade da White Memorial dos incêndios levou as igrejas de áreas suburbanas canalizarem recursos através dela.

“Estamos vendo membros e igrejas dos subúrbios trazerem recursos para nós, a igreja do centro da cidade”, disse Arteaga.

Voluntário da IASD White Memorial organiza doações de roupas (Foto: Divulgação)

Uma dessas igrejas é a Igreja Adventista do Sétimo Dia Adonai, localizada em Norwalk, uma cidade no condado de Los Angeles. Em 11 de janeiro de 2025, a igreja cancelou o culto noturno para levar as doações coletadas para os voluntários e vítimas dos incêndios em Palisades e outras regiões da cidade.

“Tivemos uma grande participação de voluntários e abundantes itens para distribuir, incluindo cobertores e remédios”, disse Daniel Castanaza, pastor da Igreja Adventista do Sétimo Dia Adonai. “Conseguimos deixar alguns voluntários na pista de corrida de Santa Anita, enquanto outro grupo de voluntários foi deixar o resto dos itens na Igreja White Memorial”.

Os Incêndios Palisades, considerado o mais mortal da história de Los Angeles, começou em 7 de janeiro no meio da manhã, de acordo com o Corpo de Bombeiros de Los Angeles. 

De acordo com os últimos relatórios, o incêndio permanece incontido, queimando mais de 39.000 acres em várias áreas atingidas. Mais de 12.000 estruturas foram destruídas, incluindo casas e empresas, e pelo menos 13 pessoas perderam a vida tragicamente. Mais de 180.000 moradores foram forçados a evacuar e muitas pessoas estão desaparecidas. São esperados mais avisos de evacuação, e o número de mortos pode continuar a aumentar à medida que a avaliação dos danos acontece.

Outra igreja que oferece ajuda e abrigo é a Igreja Adventista do Sétimo Dia de Valley Crossroads. “Estamos mudando nossa experiência de adoração ao sentar na igreja, para realmente ajudar as pessoas em nossa comunidade”, disse Roscoe Shields, pastor da Igreja Adventista do Sétimo Dia de Valley Crossroad.

 
IASD de Valley Crossroad reúne suprimentos e mobiliza membros para oferecer ajuda às famílias desalojadas na região sul da Califórnia (Foto: Divulgação)

Em vez de realizar o culto de adoração no sábado, Valley Crossroads distribuiu panfletos pedindo aos membros da igreja e da comunidade para se mobilizarem juntos.

Embora centenas de membros de igreja tenham se unido para apoiar aqueles que precisam, não foram somente os adventistas que responderam ao chamado de Valley Crossroads.

“Temos pessoas que nem mesmo estão associadas à igreja adventista se juntando a nós porque eles desejam ajudar os outros”, disse Shields. Todas essas igrejas estão distribuindo itens essenciais, incluindo fraldas, remédios, água, cobertores, alimentos não perecíveis, e itens de higiene pessoal. Em 11 de janeiro, Valley Crossroads ofereceu mais de 500 refeições para as pessoas necessitadas.

 
Em 11 de janeiro de 2025, a IASD de Valley Crossroad ofereceu refeições às pessoas necessitadas (Foto: Divulgação)

Arteaga e Shields falaram sobre como os incêndios estão impactando a comunidade adventista, destacando a unidade que eles promoveram, e ao mesmo tempo reconhecem que eles também são vítimas do desastre.

“Sabíamos que teríamos membros da igreja que provavelmente estariam desalojados”, disse Shields. “Temos pastores e professores que perderam suas casas e propriedades”, disse Arteaga.

John Cress, presidente da Associação do Sul da Califórnia, é um dos evacuados entre a população adventista. “Este é um momento desafiador para todos nós no sul da Califórnia”, disse Cress em um reel do Instagram, postado na quinta-feira, 9 de janeiro de 2025. “Eu também precisei evacuar, então entendo profundamente a incerteza que muitos de vocês estão enfrentando. Meu coração está com aqueles que perderam suas casas. Eu sei que é extremamente difícil para todos nós neste momento. Por favor, sabia que vocês estão em minhas orações”.

A Igreja Adventista do Sétimo Dia de Normandie Avenue, outra igreja que está oferecendo abrigo e aceitando doações, está experimentando uma grande onda de apoio da comunidade.

“Recebemos uma resposta grandiosa!”, disse Deon Chatman, pastor da Igreja Adventista do Sétimo Dia de Normandie Avenue. “O telefone tem tocado sem parar com pessoas da comunidade dispostas a ajudar”.

Voluntários se reúnem para apoiar as vítimas dos incêndios Palisade 

Ted Wilson, presidente da Igreja Adventista para o mundo, falou sobre os incêndios em um recente post no Facebook. “Estamos tão chocados quanto todos em relação à devastação quase surreal que ocorreu na área de Los Angeles e no sul da Califórnia”, escreveu Wilson. “Nossos corações estão com aqueles que perderam familiares e propriedades durante os horrendos incêndios. Somos gratos pelo apoio e cuidado prestado pelas Igrejas da Associação do Sul da Califórnia e pelos Serviços Comunitários Adventistas”.

Wilson continuou fazendo um apelo à ação entre os membros adventistas do sétimo dia: “Este e outros acontecimentos recentes são sinais da urgência que todos nós devemos sentir ao vermos esses o que está ocorrendo ao nosso redor, como foi predito pela Bíblia e o Espírito de Profecia, que acontecerão antes da segunda vinda de Cristo, quando o Senhor colocará fim no resultado do pecado e suas forças destrutivas. Por favor, junte se a nossa família mundial da igreja em oração por aqueles que estão passando por essa tragédia terrível”, escreveu.

 
Igreja está recebendo e distribuindo itens de primeira necessidade em Los Angeles (Foto: IASD de Valley Crossroad)

Arteaga está positivo, apesar da dor que isso tem causado. “A dor unifica as pessoas”, disse Arteaga. “Estamos vendo um belo influxo de liderança, e acredito que este é o ponto da virada para nossa congregação, em particular, porque estamos unidos em propósito e missão”.

Em resposta aos incêndios, a Associação do Sul da Califórnia criou o Fundo de Incêndios da Califórnia no site AdventistGiving para os adventistas realizarem doações financeiras para apoiar a causa. Os fundos serão usados para abrigo, suprimentos de emergência e cartões presente.

Adventist Community Services (ACS), o ministério oficial de abrangência comunitária da Igreja Adventista do Sétimo Dia na América do Norte (Divisão Norte-Americana - DNA), continua monitorando a situação enquanto trabalham para oferecer apoio em parceria com a DNA. ADRA, a Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais, também está oferecendo um subsídio de emergência para a ACS da União do Pacífico para apoiar o alívio imediato e a recuperação a longo prazo.

A versão original desta matéria foi publicada pela Adventist News Network. (via Notícias Adventistas)

quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

PODEMOS APRESSAR A SEGUNDA VINDA DE JESUS?

A Igreja Adventista do Sétimo dia surgiu em 1863 como movimento escatológico, enfatizando claramente a segunda vinda de Cristo. Passados quase 160 anos proclamando esse evento, continuamos esperando a concretização dele; e isso tem suscitado algumas interrogações: “Está demorando?” “Podemos apressar a segunda vinda de Jesus?” Na tentativa de responder a tais perguntas, têm sido sugeridas basicamente duas respostas. Alguns creem que Jesus ainda não veio porque está esperando que Seu povo se consagre e testemunhe diligentemente; ou seja, o povo é responsável pela demora. Em contraposição, outros sugerem que Cristo voltará somente de acordo com Sua determinação, e que nada podemos fazer para apressar ou retardar o momento estabelecido para Sua vinda.1

Deus no controle
Na defesa dessa posição, entre outros teólogos, Arnold Wallenkampf parece ressaltar a soberania absoluta de Deus, com respeito à parousia. Nesse sentido, a providência e a onisciência divinas parecem desempenhar papel fundamental. “Deus, por meio de Sua providência, preparará o momento da segunda vinda de Cristo… Nem por um instante devemos pensar que podemos mudar o que Ele planejou e estabeleceu.”2 Imaginar que “seres humanos pecadores sejam capazes de atar as mãos do Onipotente, ao ponto de Lhe impedir de levar a cabo Seus planos” é “o cúmulo da arrogância”. Crer que o ser humano pode desempenhar algum papel importante nesse sentido seria “blasfêmia”.3

Dentro desse pensamento, a concepção da demora é ilógica. Demora é um prolongamento de tempo além do previsto, o que supõe que houve fracasso no cumprimento do prazo antecipadamente estipulado. Percebe-se claramente que Wallenkampf parte de uma concepção atemporal de Deus. Para ele, “Deus é maior que o tempo. O tempo existe em Deus; não é que Deus vive no tempo…”4 Ele considera que, ainda que o ser humano fracione sua existência em tempos verbais: passado, presente e futuro, “não ocorre o mesmo com Deus. Para Deus, não há diferença entre passado, presente e futuro”.5

Esse pensamento conduz Wallenkampf a um conceito de soberania absoluta de Deus, em relação com os eventos do mundo.6 Ainda comentando a defesa da ideia de que Deus retarda a segunda vinda por causa do homem, ele assegura que “negamos com um golpe tanto Sua presciência como Sua onisciência. Ao refletir desse modo, rebaixamos nosso onisciente Deus a nosso próprio nível”.7 Ou seja, a segunda vinda tem que acontecer porque Deus, em Sua onisciência, a previu. Temos aqui um futuro fixo, fechado e invariável, determinado pela onisciência e providência de um Deus atemporal.

Essa postura tem graves consequências para a missão da igreja. Porém, Wallenkampf responde a esse questionamento, ao dizer que “às vezes damos a impressão de que a comissão evangélica é uma responsabilidade unicamente nossa”. Para ele, isso está longe de ser verdade. “A proclamaçãodo evangelho a todo o mundo é responsabilidade do Senhor”, ele diz.8 Aqui, a ênfase na providência absoluta de Deus desmerece a ação humana no cumprimento da missão.

Participação humana
No extremo oposto à posição de Wallenkampf, Herbert Douglass considera que tem havido realmente uma demora na “colheita” do mundo; mas tal demora não é causada por qualquer mudança de planos da parte de Deus. Se dependesse dEle, a colheita já teria acontecido décadas atrás.9 Essa posição está fundamentada na seguinte afirmação de Ellen White: “Cristo aguarda com fremente desejo a manifestação de Si mesmo em Sua igreja. Quando o caráter de Cristo se reproduzir perfeitamente em Seu povo, então virá para reclamá-lo como Seu.”10 Douglass aceita que o homem desempenha papel ativo na missão. Contudo, a principal preocupação dele não focaliza tanto a tarefa que o povo de Deus deve cumprir, mas o caráter que deve refletir.11 Nesse sentido, ele parece ter interesse secundário na missão que a igreja deve cumprir; ou seja, a ação da igreja nos acontecimentos do fim estaria relacionada com a condição que deve ter; não com a missão que deve cumprir.

Resumindo, a partir de uma pressuposição atemporal para o ser de Deus, Wallenkampf desemboca no conceito de soberania absoluta, na qual Deus é responsável por todo passo dado na execução de Seu plano. Isso leva a desmerecer a participação humana no plano da salvação. Sendo Deus o único responsável pela pregação do evangelho, não é importante o que o ser humano possa fazer em relação à missão.

Por outro lado, Douglass enfatiza o elemento humano. Deus espera, durante gerações, que Seu povo alcance o padrão imposto pela vida de Jesus enquanto esteve na Terra. Essa postura tampouco enfatiza o papel que o povo de Deus deve desempenhar no cumprimento da missão. Isso lhe interessa apenas indiretamente, a título de uma motivação a mais para alcançar o caráter de Cristo.

Limite da temporalidade
Na Bíblia, as palavras traduzidas como “eternidade” (‘olãm no Antigo Testamento e aiõn no Novo) têm claro significado temporal, e basicamente se referem a um período limitado ou ininterrupto. Além disso, é preciso esclarecer que, mesmo que a eternidade seja concebida em termos temporais, isso não significa que a Bíblia a identifique com o tempo que o ser humano experimenta como limite de seu ser finito. Deus experimenta o tempo de modo qualitativa e quantitativamente distinto da maneira do homem. Ele não nega o tempo, mas o integra e ultrapassa (Sl 103:15-17; Jó 36:26). Essa visão temporal de Deus considera que Ele pode Se relacionar direta e pessoalmente com o homem dentro da história humana, de tal maneira que tanto Deus como os seres humanos partilham a mesma história.

De acordo com a Bíblia, o conhecimento de Deus é perfeito (Jó 37:16). O conhecimento prévio se refere à capacidade que Ele tem de incluir em Sua onisciência não apenas as realidades passadas e presentes, mas também as futuras; mesmo aquelas que são livres ações dos seres humanos (At 2:33; Rm 8:29; 11:2). A afirmação da presciência de Deus não é nem contraditória nem logicamente incompatível com a liberdade humana. Aqueles que percebem uma contradição insuperável implicitamente assumem que Deus conhece da mesma forma que nós conhecemos.

A concepção bíblica não identifica predestinação com presciência, como se Deus predestinasse cada coisa que conhece. Ele não predetermina o destino humano. Paulo diferencia entre presciência e predestinação (Rm 8:29). Nessa visão, o destino do ser humano não apenas implica os planos e as obras de salvação, mas também a livre resposta de fé ao chamado do Espírito Santo.

Em relação com a providência, Deus não controla a história humana no sentido de que planeja e executa tudo o que nela sucede. Ele Se relaciona pessoalmente e dirige a história humana para seu objetivo. Deus não força os seres humanos, muito menos o curso da História. Se considerarmos que a força não somente é incompatível com a liberdade, mas também com o amor, os objetivos de Deus na História não são alcançados forçando a liberdade humana.

Ao contrário disso, ao participar ativamente na História, Deus trabalha pela salvação em diferentes níveis: individual, social e cósmico. Então, se pensarmos dentro do limite da temporalidade (que implica contingência), os resultados não estão predeterminados.12 Contudo, não estamos na incerteza quanto ao futuro da História. A vitória de Cristo na cruz é o fundamento da certeza acerca do futuro.

Podemos dizer que, de acordo com as Escrituras, Deus dirige a história humana, dentro do seu fluxo e complexidade; não desde o Céu, por meio de decretos eternos e irresistíveis. Ele decide trabalhar temporalmente na História, por meio de Sua igreja e com a cooperação dela.13

Podemos apressar?
Se considerarmos seriamente o contexto temporal das Escrituras, além do conceito de presciência e providência divinas, devemos reconhecer que Deus decide trabalhar com o ser humano, dentro da história humana, para alcançar alguns dos Seus objetivos. Nesse sentido, existem alguns propósitos que devem ser cumpridos em relação com a segunda vinda de Jesus; propósitos nos quais Deus decidiu trabalhar em cooperação com o ser humano. A pregação do evangelho (Mt 24:14) é um deles.

Deus confiou essa missão à igreja, capacitando-a para cumpri-la. Nesse contexto, tem sentido a declaração de Ellen White: “Dando o evangelho ao mundo, está em nosso poder apressar a volta de nosso Senhor. Não nos cabe apenas aguardar, mas apressar o dia de Deus.”14 Então, o desfecho da missão é uma tarefa que Deus decidiu realizar em conjunto com Seu povo.

Se o Senhor deseja trabalhar com Seu povo para alcançar alguns objetivos relacionados com a segunda vinda de Jesus, é claro que o homem também pode impedir ou retardar essa tarefa. Essa visão está em concordância com outras declarações de Ellen White: “Houvesse a igreja de Cristo feito a obra que lhe era designada, como Ele ordenou, o mundo inteiro haveria sido antes advertido, e o Senhor Jesus teria vindo à Terra em poder e grande glória.”15 “Quando o caráter de Cristo se reproduzir perfeitamente em Seu povo, então virá para reclamá-lo como Seu.”16

Ao compreendermos a maneira pela qual Deus decidiu realizar Seu plano de salvação, podemos perceber o papel que o homem desempenha na terminação da obra. Ele decidiu trabalhar com o ser humano em relação com Seus objetivos para a Sua segunda vinda, capacitando Seu povo para a tarefa que lhe compete desempenhar.

Apesar disso, Ellen White nos dá a garantia de que “o mundo não está sem um governante. O programa dos sucessos futuros está nas mãos do Senhor. A Majestade do Céu tem sob Sua direção o destino das nações e os negócios de Sua igreja”17 Deus atuará com todo poder através do ser humano e respeitando sua liberdade, para alcançar Seus objetivos. Isso deve animar a igreja, considerando que Deus lhe tem dado o privilégio de participar no plano da salvação. Por meio de nossa fidelidade no cumprimento da missão, a igreja pode apressar seu encontro com o Salvador.

Marcos Blanco (Artigo publicado na Revista Ministério, jan-fev 2012, pp. 22-24)

Referências:
1 Ver Carlos A. Steger, La ‘demora’ de la segunda venida, Logos, anos 3, 4 (1999-2000), p. 10-15.
2 Arnold Wallenkampf, La Demora Aparente (Buenos Aires, Aces, 1997), p. 140.
3 Ibid., p. 136.
4 Ibid., p. 53.
5 Ibid.
6 Ibid., p. 121.
7 Ibid., p. 120, 121.
8 Ibid., p. 105.
9 Herbert Douglass, Man of Faith – the showcase of God’s grace, em: Perfection: The Impossible Possibility (Nashville, Tennessee: Southern Publishing Association, 1975), p. 20.
10 Ellen G. White, Parábolas de Jesus, p. 69.
11 Herbert Douglass, The End: The Unique Voice for Adventist About the Return of Jesus (Mountain View, Califórnia: Pacific Press Publishing Association, 1979), p. 74.
12 Deus não podia salvar o homem por um decreto de Sua soberania. Pelo contrário, devia produzir a salvação do homem no tempo e na História. A salvação não apenas ocorre por meio da encarnação e morte de Cristo, que incluem o tempo e o risco total, tudo no limite da contingência temporal: “Mas nosso Salvador Se revestiu da humanidade com todas as contingências da mesma. Tomou a natureza do homem com a possibilidade de ceder à tentação” (Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, p. 95).
13 Ver Canale, Hacia el fundamento teológico de la misión Cristiana, em Werner Vyhmeister (editor) Misión de la Iglesia Adventista, (Entre Rios: Editorial CAP, 1980), p. 182-210.
14 Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, p. 633, 634.
15 Ibid., p. 634.
16 Ellen G. White, Parábolas de Jesus, p. 69.
17 _________, Testemunhos Seletos, v. 2, p. 352.

terça-feira, 14 de janeiro de 2025

TEOLOGIA DO DOMÍNIO

Religião e política se misturam o tempo todo. Um dos movimentos mais recentes nesse sentido é a teologia do domínio, que defende que o cristianismo ultraconservador deve liderar todo o planeta. A teologia do domínio ou o dominionismo nasceu nos EUA por volta dos anos 70 num contexto do reconstrucionismo cristão calvinista. Com é sabido, Calvino no século XVI instaurara em Genebra um governo religioso extremamente rigoroso e violento até com pena de morte. Seria um modelo para o mundo todo.

A teologia do domínio segue a Doutrina dos Sete Montes, que acredita que o cristianismo deve estar presente nas sete principais áreas da sociedade: o governo, a educação, a religião, a família, a economia, as artes e o entretenimento.

É importante ressaltar que a teologia do domínio não é vivenciada da mesma forma entre os diferentes grupos evangélicos. Os presbiterianos, por exemplo, defendem um projeto de poder contínuo, discreto, que deve ser realizado através de um conjunto de influências. Já os grupos pentecostais e neopentecostais gostam da visibilidade, perseguem os que identificam como inimigos desse projeto e fazem o enfrentamento público do que chamam de “mal”. As igrejas neopentecostais são as que mais empregam essa teologia, porque adaptam a batalha espiritual para uma batalha cultural: de um lado, colocam figuras políticas, artistas e organizações que acreditam querer acabaram com os princípios cristãos; de outro ficariam os cristãos responsáveis por proteger a família, a moral e os fiéis. As igrejas brasileiras marcadas por essa teologia são a Igreja Universal do Reino de Deus (fundada por Edir Macedo), a Igreja Internacional da Graça de Deus (criada por R. R. Soares) e a Igreja Batista Lagoinha (liderada pela família Valadão).

A teologia do domínio agrupa várias tendências cristãs fundamentalistas, inclusive integralistas católicos que postulam uma política exclusivamente religiosa, de base bíblica, a ser aplicada em toda a humanidade com a exclusão de qualquer outra expressão, tida como falsa e, por isso, sem direito de existir. É a ideologia totalizadora central para a direita cristã no campo da política e dos costumes.

Mas a Bíblia fala de uma teologia do domínio que difere de maneira consistente do que tem sido ensinado popularmente. Segue abaixo artigo de Flavio Prestes Neto publicado em Notícias Adventistas que trata dos problemas bíblicos com a teologia popular do domínio:

A versão bíblica da teologia do domínio, assim como a teologia popular do domínio, possuem sua origem nos textos de Gênesis 1:26-28. Mas a leitura bíblica contextual desse texto fundamental de Gênesis difere da leitura da teologia popular. No contexto da criação original, a fala de Deus “dominem eles … sobre toda a terra” (versículo 26)[1] refere-se à incumbência de cuidar do planeta, uma delegação que incluía a natureza (o meio ambiente e os animais).

Os conceitos de “domínio” (radah e kavash) presentes nestes textos podem ter conotações negativas em nossos dias (de dominação pela força ou política, como na teologia popular do domínio). Mas o termo aparece em alguns textos bíblicos, no contexto do capítulo 1 de Gênesis, associados a uma perspectiva completamente positiva. Em Gênesis 1, o ser humano recebeu a incumbência de cuidar/administrar a terra, preservando-a no bom estado em que foi criada.

Domínio com limites
Somente uma administração benevolente em harmonia com o caráter benigno do Criador poderia ser exercida. Qualquer outro tipo de domínio (insensível, abusivo, opressivo ou ditatorial) não seria uma fiel execução da delegação real recebida de Deus. Além disso, ainda que positivo, o domínio dado ao ser humano originalmente tinha limites. Por exemplo, a impossibilidade de exercer domínio sobre outros seres humanos. Essa limitação foi reafirmada no Novo Testamento por Jesus, que ensinou aos Seus discípulos a não exercerem domínio uns sobre os outros, mas a servirem uns aos outros (Mateus 20:25-26).

Na sequência, em Gênesis 3, lemos o triste relato da rebelião humana contra o Criador. Neste episódio, os seres humanos, que haviam sido criados para reinar sobre a terra sob a soberania de Deus (o Rei do universo), infelizmente deram ouvidos à serpente (instrumento utilizado pelo inimigo de Deus e da humanidade conforme Apocalipse 12:9 e 20:2). Na mentalidade bíblica, quando a humanidade ouviu um inferior, um animal/uma besta (a serpente) ao invés do Criador, isso representou não apenas a queda moral da humanidade, mas também a inversão da ordem natural da criação. É que os humanos, criados para reinar sobre os animais, estavam surpreendentemente sendo guiados por uma besta.

Desde então, o planeta vive parcialmente sob o domínio/administração do mal. Isso está sugerido pela árvore do “conhecimento do bem e do mal” (Gênesis 2:9, 17). Tal dinâmica é reafirmada no Novo Testamento no diálogo entre Jesus e o diabo onde o último sugere que poderia dar a “autoridade” (exousia = domínio)[2] deste mundo a quem quisesse, pois ela lhe havia sido entregue (Lucas 4:6), em uma clara alusão à rebelião humana descrita em Gênesis 3:6.

Mudança de domínio
O restante da narrativa bíblica mostra as graves consequências desta mudança de domínio. Ao mesmo tempo, descreve a esperança bíblica na restauração do domínio, quando o reino de Deus voltará a ser pleno sobre a terra. Essas descrições são elaboradas especialmente nos textos de Daniel 7 e Apocalipse 13-14. Essas passagens descrevem os reinos deste mundo como governados por bestas ferozes—uma representação simbólica de um mundo caído, onde os animais estão no controle. A solução para esse mundo, de acordo com esses textos, é a conclusão do juízo celestial sobre essas bestas.

O juízo retirará o domínio das bestas sobre o mundo (Daniel 7:12, 26) e o devolverá à humanidade (Daniel 7:18, 22, 27) na pessoa do seu Rei legítimo, o Filho do Homem (Daniel 7:13-14), isto é, Jesus Cristo (Mateus 16:13). Assim que o juízo celestial (Apocalipse 14:7) for concluído, Jesus voltará para buscar o Seu povo (Apocalipse 14:14-16). Em seguida, quando a terra for restaurada, os seres humanos voltarão a reinar sobre ela (Apocalipse 22:5; conforme 5:10) como deveriam ter feito no princípio, de maneira benevolente, não sujeitos às bestas, mas em fidelidade ao Criador.[3]

Teologia bíblica x teologia popular
A teologia bíblica do domínio, portanto, não permite imaginar que seres humanos exerçam pleno domínio sobre a terra hoje. Somos seres caídos em um mundo caído e convivemos com poderosas forças espirituais malévolas (Efésios 6:11-12) que atuam por meio das bestas apocalípticas (Apocalipse 13:2).

Certamente os filhos de Deus podem exercer uma influência positiva sobre a terra. É o caso das expressões “sal” e “luz” (Mateus 5:13-16). Mas seres humanos não conseguem domar ou subverter essas bestas. Pelo contrário, o relato bíblico é explicito em descrever o povo de Deus sendo perseguido por estas bestas (Daniel 7:21, 25; Apocalipse 12:13, 17; 13:7, 10, 15). Somente Deus pode vencer as bestas deste mundo. O processo de livramento requer a intervenção divina. A plena restauração do domínio para a humanidade ocorrerá somente no mundo porvir, depois que o mal for destruído (Apocalipse 20). Naquele ambiente perfeito e livre de perigos, novamente os filhos de Deus poderão reinar em segurança sobre a terra (Apocalipse 21-22).

Referências
[1] Tradução literal do hebraico, a qual requer o uso do plural “dominem eles”.

[2] Ver o uso de exousia no texto grego de Daniel 7:12, 14, 26, 27.

[3] Flavio Prestes III, “Dominion Shifts in Biblical Apocalyptic Literature: A Narrative Reading of Daniel 7 and Revelation 12–14 vis-à-vis Genesis 1–3” (ThD diss., Andrews University, 2023).

sexta-feira, 10 de janeiro de 2025

APODRECIMENTO CEREBRAL

Estragado, deteriorado, fétido, catinguento, corrompido, fedorento, putrefacto, pestilento, nojento, degradado, pútrido e decomposto. A lista é grande para explicar uma palavra que é impossível ter qualquer referência boa.⁣⁣

PODRE. ⁣
Por esta razão, foi surpreendente e alarmante a escolha do Dicionário de Oxford para a expressão do ano 2024: brain rot. Ampliando a discussão urgente sobre o impacto do mundo digital na mente real, estas palavras juntas nos despertam a uma obrigatória e vital revolução. ⁣
CÉREBRO PODRE.⁣
Ou seja, atrofia cerebral, neblina mental, letargia cognitiva e redução na capacidade de atenção. Assustou? Nada mais adequado para descrever hábitos comunicacionais que apodreceram em vícios de consumo digital descontrolado, irresponsável e patológico. Quer alguns exemplos? Navegar incessantemente em meio a notícias ruins, dependência tóxica das redes sociais, sensação de vazio ao contemplar vidas postadas, isto é, uma degeneração mental causada pela ingestão de lixo virtual. ⁣
“Tenha cuidado com o que você pensa, pois a sua vida é dirigida pelos seus pensamentos” (Pv 4:23). Como a mente é alimentada? “Acima de tudo, guarde as entradas do seu coração, pois dele depende toda a sua vida” (em outra tradução). E o texto mais forte: “os olhos são a candeia do corpo. Se os seus olhos forem bons, todo o seu corpo será cheio de luz. Mas, se os seus olhos forem maus, todo o seu corpo será cheio de trevas” (Mt 6:22).⁣
Exterminemos a tecnologia e a internet quebrando todas as telas? Jamais! Não demonize o veículo pelo uso irresponsável dos motoristas bêbados. Apenas sugiro usar as mesmas letras da palavra PODRE em uma outra ordem.⁣
PODER. ⁣
É isso. É possível. Quem decide controla. Quem se protege amadurece. E aquele que usa com sabedoria a informação não será usado pela mentira tenebrosa das trevas. Pois esta decadência digital se cura com uma independência saudável. Preparado? Que venham horizontes de oportunidades para quem faz da prudência o seu consumo inteligente. Com Deus, sempre. ⁣
E como está o seu cérebro?⁣

[Odailson Fonseca via instagram]

Vejamos o que Ellen G. White no livro O Lar Adventista (pp. 401-404) nos diz sobre o cuidado que devemos ter com o que alimentamos nossa mente:

"Sabes que nosso corpo é composto do alimento que assimila. Ora dá-se o mesmo com a nossa mente. 

Todos devem vigiar os sentidos, do contrário Satanás alcançará vitória sobre eles; pois essas são as avenidas da alma. Deves tornar-te fiel sentinela de teus olhos, ouvidos e todos os sentidos, se quiseres dominar a mente e impedir que vãos e corruptos pensamentos te manchem a alma. Só o poder da graça pode realizar esta tão desejável obra.

Satanás e seus anjos estão ativos, criando uma espécie de paralisia dos sentidos, de modo a não serem ouvidas as admoestações, advertências e repreensões, ou, se ouvidas, não terem efeito sobre o coração, transformando a vida.

Meus irmãos, Deus vos convida, como seguidores Seus, a que andeis na luz. Importa que vos alarmeis. Há pecado entre vós, e não é considerado excessivamente pecaminoso. Os sentidos de muitos acham-se inativos pela familiaridade com o pecado. Precisamos avançar para mais perto do Céu.

Quem pode prever, no momento da tentação, as terríveis consequências que resultarão de um passo errado e apressado! Nossa única segurança é abrigarmo-nos na graça de Deus cada momento, não confiando em nossa própria visão espiritual, para que não chamemos ao mal bem, e ao bem chamemos mal. Sem hesitação ou discussão precisamos cerrar e guardar as entradas da alma contra o mal.

Todo cristão deve manter-se em guarda continuamente, vigiando cada entrada da alma por onde Satanás possa ganhar acesso. Ele precisa orar pedindo auxílio divino e ao mesmo tempo resistir resolutamente a cada inclinação ao pecado. Mediante coragem, fé, perseverante esforço, pode tornar-se um vitorioso. Mas lembre-se de que para alcançar a vitória Cristo precisa habitar nele e ele em Cristo.

O apóstolo Pedro procurou ensinar aos crentes quão importante é guardar a mente de vagar por temas proibidos, ou de gastar sua energia em assuntos triviais. Os que não querem cair presa dos enganos de Satanás, devem guardar bem as vias de acesso à alma; devem-se esquivar de ler, ver ou ouvir tudo quanto sugira pensamentos impuros. Não devem permitir que a mente se demore ao acaso em cada assunto que o inimigo das almas possa sugerir. O coração deve ser fielmente guardado, pois de outra maneira os males externos despertarão os internos, e a alma vagará em trevas.

Os que desejam ter a sabedoria que vem de Deus devem tornar-se néscios no pecaminoso conhecimento deste século, para serem sábios. Devem fechar os olhos, para não verem nem aprenderem o mal. Devem fechar os ouvidos, para que não ouçam o que é mau e não obtenham o conhecimento que lhes mancharia a pureza de pensamentos e de ação. E devem guardar a língua, para que não profira palavras corruptas e o engano se encontre em sua boca.

Não procureis saber quão perto podeis andar à beira do precipício e todavia estar seguros. Evitai a primeira aproximação ao perigo. Não se pode brincar com os interesses da alma. Vosso capital é vosso caráter. Acariciai-o, como faríeis a um áureo tesouro. A pureza moral, o respeito próprio, o forte poder de resistência, têm de ser acariciados firme e constantemente. Não deve haver um único afastamento da discrição; um ato de familiaridade, um deslize, podem pôr em perigo a alma, abrindo a porta da tentação, e tornar-se enfraquecido o poder de resistência.

Diz Paulo: “Tudo o que é verdadeiro, tudo o que é honesto, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se há alguma virtude, e se há algum louvor, nisso pensai” (Filipenses 4:8). Isto exigirá oração fervorosa e incessante vigiar. Devemos ser auxiliados pela influência permanente do Espírito Santo, que atrairá a mente para cima, e habituá-la-á a ocupar-se com coisas puras e santas. E devemos fazer estudo diligente da Palavra de Deus. “Como purificará o mancebo seu caminho? observando-o conforme a Tua Palavra.” “Escondi a Tua Palavra no meu coração”, diz o salmista, “para eu não pecar contra Ti” (Salmos 119:9-11)."

quarta-feira, 8 de janeiro de 2025

QUE AMOR É ESSE?

A humanidade não presta. Isso a gente sabe desde Adão e Eva, não é nenhuma novidade. Depois vem Caim, mata Abel e se ainda restava alguma dúvida, agora é uma certeza: ninguém presta. De lá pra cá milênios se passaram. Mudaram a ciência, a medicina, a astronomia, a física, a filosofia, a religião, a arquitetura, a moda, as estações, a camada de ozônio, o nível dos mares… mas no que tange ao ser humano, continua tudo igual. As pessoas continuam tão horríveis como sempre foram. A verdade é que com a Queda, o coração do homem tornou-se ruim. Mau. Egoísta. Malévolo. Violento. Assassino. Se quisermos colher cardos e abrolhos basta rasgarmos nossos próprios peitos e lá dentro os encontraremos.

Vibramos com massacres mascarados de “esportes” de luta. Adoramos filmes de ação, violência e com sangue sendo esparramado para todo lado. E assistimos comendo pipoca, insensíveis que somos. Os desenhos animados a que nossos filhos assistem são ratos esmurrando gatos e pica-paus batendo em leões-marinhos, as comédias que nos fazem rir são pessoas enfiando tortas na cara de outras e batendo com paus na cabeça alheia, muitos dos videogames que jogamos são um ultraje à paz, saltamos da cadeira em êxtase quando nas corridas de carro há batidas, nos programas de auditório de domingo a desgraça alheia é celebrada com gargalhadas, videocassetadas que deixariam Francisco de Assis às lágrimas. Detalhe: tudo isso ocorre com não-cristãos, mas também com cristãos.
“Alguns dos mais populares divertimentos têm se tornado escolas de brutalidade. Estão desenvolvendo as mesmas características que desenvolviam os jogos na antiga Roma. O amor ao domínio, o orgulho da mera força bruta, o descaso da vida, estão exercendo sobre a juventude um poder desmoralizador que nos aterra” (Educação, p. 500, 501).
Fazemos guerras. Criamos armas de fogo. Queimamos crianças com napalm. Inventamos instrumentos de tortura. Investimos bilhões de euros por ano na criação de fuzis, mísseis inteligentes, bazucas que explodem tanques, balas que explodem cabeças, qualquer coisa que exploda qualquer coisa. E tudo em nome da “defesa”. E é lógico que temos de nos defender, afinal o ser humano é mau e nunca sabemos o que a outra pessoa pode fazer de ruim. Há momentos em que paro e mal acredito que isso aqui que nós somos, foi criado por um Deus perfeito e que somos o que a Bíblia chama de “a coroa da criação”. A verdade, meu irmão, minha irmã, é que nós somos uma droga. Não prestamos. Faríamos um grande favor ao mundo se sumíssemos da face da Terra e a devolvêssemos aos dinossauros. Que voltem os mamutes e outras criaturas mais dignas do que nós.
"Em todo o mundo, as cidades estão se tornando viveiros de vícios. Por toda parte se vê e ouve o que é mau... Avoluma-se incessantemente a onda da corrupção e do crime. Cada dia oferece um registro de violência: roubos, assassínios, suicídios e crimes inomináveis" (A Ciência do Bom Viver, p. 363).
E, em meio ao fedor emanado pelo homem, ao horror que provocamos, ao sadismo que transpiramos, Aquele que é perfeito se faz como um de nós numa estrebaria de Belém da Judeia. Que loucura…

Você já parou para pensar com calma o que foi para Deus a encarnação? Abrir mão de sua glória para se tornar… isto que nós somos? E a glória de Deus não é uma nuvenzinha ou raios de luz brancos emanados de roupas brancas. A glória de Deus é um estado de perfeição absoluta, algo inconcebível ao homem natural, simplesmente uma realidade de tão puros amor, beleza, carinho, afeto, alegria, paz, amabilidade, bondade e outras virtudes tão cristalinas que nossa mente pateticamente limitada jamais conseguiria compreender nem de longe. Muito se fala do sacrifício de Jesus na cruz. Mas pouco se diz do sacrifício que foi para a Perfeição Absoluta trocar em sua encarnação, aquilo que é perfeitamente perfeito pelo que é rigorosamente asqueroso: nós, vermes humanos.

O Filho deixa sua habitação celestial pura e santa para habitar entre mendigos, leprosos, fedor de estrume de animais, sujeira, corações nojentos, podridão humana espalhada por todos os lados, chagas purulentas, doenças, morte. Jesus optou por ser uma ilha de brilho em meio a um oceano de terríveis trevas – externas e internas ao homem.
"Jesus poderia ter permanecido ao lado do Pai, usando a coroa e as vestes reais, mas por amor a nós trocou as riquezas do Céu pela pobreza da Terra. Ele escolheu renunciar ao posto de Supremo Comandante e a adoração dos anjos que tanto O amavam. Escolheu trocar a adoração dos seres celestes pela zombaria e desprezo de homens ímpios. Por amor a nós, aceitou uma vida de privações e uma morte vergonhosa. Cristo fez tudo isso para provar o quanto Deus nos ama. Viveu na Terra para mostrar como podemos honrar a Deus através da obediência à Sua vontade. Assim agiu para que, seguindo Seu exemplo, possamos finalmente viver com Ele no lar celestial" (Vida de Jesus, p. 10).
Mas… Jesus olha para essa humanidade enojante e consegue enxergar esperança. Consegue ver beleza. Incrível. Consegue ver resquícios da perfeição em meio a este mundo tenebroso. Jesus olha para mim e para você, ignora o odor do pecado que exalamos e diz: “Vinde a mim, vós que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei”. Meu Deus, por quê? Por quê? O Pai contempla de sua perfeição o mundo bonito que Ele criou e que o pecado deformou nesta coisa horripilante que existe hoje e consegue amá-lo de tal maneira que dá seu Filho unigênito para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna. Por quê? Por quê?
"O pensamento de que os olhos de Deus vigiam sobre nós, de que Ele nos ama e teve tanto cuidado por nós que chegou a dar Seu mui amado Filho para resgatar-nos, a fim de que não perecêssemos miseravelmente, é sublime" (Fundamentos da Educação Cristã, p. 164).
Não entendo. Confesso, eu não entendo. Que amor é esse?! Como Ele consegue amar dessa forma?! Porque, no lugar de Deus, eu destruiria tudo. Agora. Já. A começar por mim, este poço de pecado, hipocrisia e negrume de alma. Mas não. Esse Deus insondável olha para mim e para você, que, sem ofensa, mas, pelos padrões divinos, é tão péssimo ou pior do que eu… e nos ama! Como pode?! Como?! Como?!

Não há resposta para isso. Não há resposta para esse que é o maior dos mistérios. E é por isso que me rio ao ver espécimens desse verme que é o homem se digladiando em debates sobre quem está certo sobre a mente de Deus. Inventam milhões de rótulos ligados ao perfeito Cristo e entram numa guerra sacra uns contra os outros sem perceber que Deus está tão, mas tão, mas tão acima de tudo isso que a discussão que – confesso – gostamos (eu gosto) de ter sobre teologia, sobre Deus, sobre os modelos e padrões de Igreja se tornam quando temos um lampejo de quem de fato é Deus… num amontoado inútil de estrume verbal.

Viver é Cristo e morrer é lucro. Ah, doce esperança de deixar para trás as guerras santas, as guerras nada santas, a mim mesmo enquanto homem não-glorificado. E que vontade de ingressar no que a Bíblia chama de “sala do trono” dAquele que é imaculado, que é perfume puro de nardo, que é a beleza que flor alguma conseguiu imitar. Ah, que vontade de entrar na doce presença, de aspirar o ar puro das esferas celestiais, de deixar para trás o lixo chamado planeta Terra, o aterro sanitário chamado vida. De deixar-me para trás enquanto aquilo imundo que sou e tornar-me alvo mais que a neve.

E poder, enfim, ouvir o Espírito e a noiva dizerem: “Vem!”. E poder beber de graça da água da vida. E escutar “Eu sou o Alfa e o Ômega, o Primeiro e o Último, o Princípio e o Fim. Felizes os que lavam as suas vestes, e assim têm direito à árvore da vida e podem entrar na cidade pelas portas”. Já não haverá maldição nenhuma. O trono de Deus e do Cordeiro estará na cidade, e os seus servos o servirão. Eles verão a sua face, e o seu nome estará em suas testas. Não haverá mais noite. Eles não precisarão de luz de candeia, nem da luz do sol, pois o Senhor Deus os iluminará; e eles reinarão para todo o sempre. “Eis que venho em breve!”. Não há mais o que dizer a não ser “Ora, vem, Senhor Jesus”.
“Este é o dia que todos os crentes devem almejar, esperar e aguardar, como cumprimento de toda a obra de sua redenção, e de todos os desejos e esforços de sua alma" (O Grande Conflito, p. 393).
Sabe… normalmente busco terminar meus textos com alguma frase que dê um belo fechamento ao que escrevo. Mas desta vez… encerro somente com lágrimas pingadas sobre um teclado de computador. Um teclado cheio de manchas de gordura e sujeira, digitado por dedos com unhas sujas e ligados a uma alma imunda. Não, não há mais o que dizer. Encerro aqui.

Paz a todos vocês que estão em Cristo.

[Maurício Zágari via Apenas

[Textos de Ellen G. White em negrito inseridos pelo blog]

terça-feira, 7 de janeiro de 2025

EGOCENTRISMO NA IGREJA?

“Não negligencieis a prática do bem e a mútua cooperação [koinonia]” (Hebreus 13.16).

A heresia do egocentrismo
O egocentrismo não tem lugar na igreja. Nem devíamos dizer isso, mas, desde o alvorecer da era apostólica até hoje, o amor próprio em todas as suas formas tem prejudicado incessantemente a comunhão dos santos. Um exemplo clássico e antigo de egocentrismo fora de controle é visto no caso de Diótrefes. Ele é mencionado em 3 João 9-10, onde o apóstolo diz: “Escrevi alguma coisa à igreja; mas Diótrefes, que gosta de exercer a primazia entre eles, não nos dá acolhida. Por isso, se eu for aí, far-lhe-ei lembradas as obras que ele pratica, proferindo contra nós palavras maliciosas. E, não satisfeito com estas coisas, nem ele mesmo acolhe os irmãos, como impede os que querem recebê-los e os expulsa da igreja”.

Diótrefes anelava ser o preeminente em sua congregação (talvez até mais do que isso). Portanto, ele via qualquer outra pessoa que tinha autoridade de ensino – incluindo o apóstolo amado – como uma ameaça ao seu poder. João havia escrito uma carta de instrução e encorajamento à igreja, mas, por causa do desejo de Diótrefes por glória pessoal, ele rejeitou o que o apóstolo tinha a dizer. Evidentemente, ele reteve da igreja a carta de João. Parece que ele manteve em segredo a própria existência da carta. Talvez ele a destruiu. Por isso, João escreveu sua terceira epístola inspirada para, em parte, falar a Gaio sobre a existência da carta anterior.

Na verdade, o egoísmo de Diótrefes o tornou culpado do mais pernicioso tipo de heresia: ele rejeitou ativamente e se opôs à doutrina apostólica. Por isso, João condenou Diótrefes em quatro atitudes: ele rejeitou o ensino apostólico; fez acusações injustas contra um apóstolo; foi inóspito para com os irmãos e excluiu aqueles que não concordavam com seu desafio a autoridade de João. Em todo sentido imaginável, Diótrefes era culpado da mais obscura heresia, e todos os seus erros eram frutos de egocentrismo.

Em nosso estado caído, estado de carnalidade, somos todos assediados por uma tendência para o egocentrismo. Isto não é uma ofensa insignificante, nem um pequeno defeito de caráter, nem uma ameaça irrelevante à saúde de nossa fé. Diótrefes ilustra a verdade de que o amor próprio é a mãe de todas as heresias. Todo falso ensino e toda rebelião contra a autoridade de Deus estão, em última análise, arraigados em um desejo carnal de ter a preeminência – de fato, um desejo de reivindicar para si mesmo aquela glória que pertence legitimamente a Cristo. Toda igreja herética que já vimos tem procurado suplantar a verdade e a autoridade de Deus com seu próprio ego pretensioso.

De fato, o egocentrismo é herético porque é a própria antítese de tudo que Jesus ensinou ou exemplificou. E produz sementes que dão origem a todas as outras heresias imagináveis.

Portanto, não há lugar para egocentrismo na igreja. Tudo no evangelho, tudo que igreja tem de ser e tudo que aprendemos do exemplo de Cristo golpeia a raiz do orgulho e do egocentrismo humano.

Koinonia
As descrições bíblicas de comunhão na igreja do Novo Testamento usam a palavra grega koinonia. O espírito gracioso que essa palavra descreve é o extremo oposto do egocentrismo. Traduzida diferentemente por “comunhão”, “compartilhamento”, “cooperação” e “contribuição”, esta palavra é derivada dekoinos, a palavra grega que significa “comum”. Ela denota as ideias de compartilhamento, comunidade, participação conjunta, sacrifício em favor de outros e dar de si para o bem comum.

Koinonia era uma das quatro atividades essenciais que mantinha os primeiros cristãos juntos: “E perseveravam na doutrina dos apóstolos e na comunhão [koinonia], no partir do pão e nas orações” (At 2:42). O âmago da “comunhão” na igreja do Novo Testamento era culto e sacrifício uns pelos outros, e não festividade ou funções sociais. A palavra em si mesma deixava isso claro nas culturas de fala grega. Ela foi usada em Romanos 15.26 para falar de “uma coleta em benefício dos pobres” (ver também 2Co 9:3). Em 2 Coríntios 8:4, Paulo elogiou as igrejas da Macedônia por “participarem [koinonia] da assistência aos santos”. Hebreus 13:16 diz: “Não negligencieis, igualmente, a prática do bem e a mútua cooperação [koinonia]”. Claramente, o egocentrismo é hostil à noção bíblica de comunhão cristã.

"Aquele que é egocêntrico perde inúmeras oportunidades para fazer aquilo que haveria trazido bênçãos aos outros e a ele próprio. É o dever do servo de Cristo, em toda circunstância, perguntar-se a si mesmo: 'Que posso fazer para ajudar a outros?' Havendo feito tudo a seu alcance, deve deixar as consequências com Deus" (Ellen G. White - Mensagens Escolhidas 1, p. 86).

Uns aos outros
Esse fato é ressaltado também pelos muitos “uns aos outros” que lemos no Novo Testamento. Somos ordenados: a amar “uns aos outros” (Jo 13:34-35; 15:12, 17); a não julgar “uns aos outros” e ter o propósito de não por tropeço ou escândalo ao irmão (Rm 14:13); a seguir “as coisas da paz e também as da edificação de uns para com os outros” (Rm 14:19); a ter “o mesmo sentir de uns para com os outros” e acolher “uns aos outros, como também Cristo nos acolheu para a glória de Deus” (Rm 15:5, 7). Somos instruídos a levar “as cargas uns dos outros” (Gl 6:2); a sermos benignos uns para com os outros, “perdoando… uns aos outros” (Ef 4:32); e a sujeitar-nos “uns aos outros no temor de Cristo” (Ef 5:21). Em resumo, “Nada façais por partidarismo ou vanglória, mas por humildade, considerando cada um os outros superiores a si mesmo” (Fp 2:3).

No Novo Testamento, há muitos mandamentos semelhantes que governam nossos relacionamentos mútuos na igreja. Todos eles exigem altruísmo, sacrifício e serviço aos outros. Combinados, eles excluem definitivamente toda expressão de egocentrismo na comunhão de crentes.

"A vontade de Deus, nosso Criador, deve ser feita evidente em nós, não apenas no nome que trazemos, mas em nossa vida de abnegação. Devemos dar provas de que somos influenciados e controlados por princípios altruístas. Todos os nossos propósitos e atividades devem permanecer em distinto contraste com o egocentrismo do mundo" (Ellen G. White - Beneficência Social, p. 296).

Cristo como cabeça de seu corpo, a igreja
No entanto, isso não é tudo. O apóstolo Paulo comparou a igreja com um corpo que tem muitas partes, mas uma só cabeça: Cristo. Logo depois de afirmar, enfaticamente, a deidade, a eternidade e a proeminência absoluta de Cristo, Paulo escreveu: “Ele é a cabeça do corpo, da igreja” (Cl 1.18). Deus “pôs todas as coisas debaixo dos pés, e para ser o cabeça sobre todas as coisas, o deu à igreja, a qual é o seu corpo” (Cl 1.22-23). Cristãos individuais são como partes do corpo, existem não para si mesmos, mas para o bem de todo o corpo: “Todo o corpo, bem ajustado e consolidado pelo auxílio de toda junta, segundo a justa cooperação de cada parte, efetua o seu próprio aumento para a edificação de si mesmo em amor” (Ef 4.16).

Além disso, cada parte é dependente de todas as outras, e todas estão sujeitas à Cabeça. Somente a Cabeça é preeminente, e, além disso, “se um membro sofre, todos sofrem com ele; e, se um deles é honrado, com ele todos se regozijam” (1 Co 12.26).

Até aquelas partes do corpo aparentemente insignificantes são importantes (vv. 12-20). “Deus dispôs os membros, colocando cada um deles no corpo, como lhe aprouve. Se todos, porém, fossem um só membro, onde estaria o corpo?” (vv. 18-19).

Qualquer evidência de egoísmo é uma traição de não somente o resto do corpo, mas também da Cabeça. Essa figura torna o altruísmo humilde em virtude elevada na igreja – e exclui completamente qualquer tipo de egocentrismo.

"Somos naturalmente egocêntricos e opiniosos. Mas, ao aprendermos as lições que Cristo nos deseja ensinar, tornamo-nos participantes de Sua natureza; daí em diante, vivemos a Sua vida" (Ellen G. White - A Ciência do Bom Viver, p. 157).

Escravos de Cristo
A linguagem de escravo do Novo Testamento enfatiza, igualmente, esta verdade. Os cristãos não são apenas membros de um corpo, sujeitos uns aos outros e chamados à comunhão de sacrifício. Somos também escravos de Cristo, comprados com seu sangue, propriedade dele e, por isso, sujeitos ao seu senhorio.

Há uma tendência, eu receio, de tentarmos abrandar a terminologia que a Escritura usa porque – sejamos honestos – a figura de escravo é ofensiva. Ela não era menos inquietante na época do Novo Testamento. Ninguém queria ser escravo, e a instituição da escravidão romana era notoriamente abusiva.

No entanto, em todo o Novo Testamento, o relacionamento do crente com Cristo é retratado como uma relação de senhor e escravo. Isso envolve total submissão ao senhorio dele, é claro. Também exclui toda sugestão de orgulho, egoísmo, independência ou egocentrismo. Está é simplesmente mais uma razão por que nenhum tipo de egocentrismo tem lugar na vida da igreja.

O próprio senhor Jesus ensinou claramente este princípio. Seu convite a possíveis discípulos foi uma chamada à total autorrenúncia: “Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, dia a dia tome a sua cruz e siga-me” (Lc 9:23).

Os doze não foram rápidos para aprender essa lição, e a interação deles uns com os outros foi apimentada com disputas a respeito de quem era o maior, quem poderia ocupar os principais assentos no reino e expressões semelhantes de disputas egocêntricas. Por isso, na noite de sua traição, Jesus tomou uma toalha e uma bacia e lavou os pés dos discípulos. Sua admoestação para eles, na ocasião, é um poderoso argumento contra qualquer sussurro de egocentrismo no coração de qualquer discípulo: “Ora, se eu, sendo o Senhor e o Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Porque eu vos dei o exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também” (Jo 13:14-15).

Foi um argumento do maior para o menor. Se o eterno Senhor da glória se mostrou disposto a tomar uma toalha e lavar os pés sujos de seus discípulos, então, aqueles que se chamam discípulos de Cristo não devem, de maneira alguma, buscar preeminência para si mesmos. Cristo é nosso modelo, e não Diótrefes.

Não posso terminar sem ressaltar que este princípio tem uma aplicação específica para aqueles que estão em posições de liderança na igreja. É um lembrete especialmente vital nesta era de líderes religiosos que são superestrelas e pastores jovens que agem como estrelas de rock. Se Deus chamou você para ser um presbítero ou mestre na igreja, ele o chamou não para sua própria celebridade ou engrandecimento. Deus o chamou a fazer isso para a glória dele mesmo. Nossa comissão é pregar não “a nós mesmos, mas a Cristo Jesus como Senhor e a nós mesmos como vossos servos [escravos], por amor de Jesus” (2Co 4:5).

"Aqueles que se acham ligados ao serviço de Deus precisam ser purificados de todo traço de egoísmo. Tudo deve ser feito em harmonia com a ordem: 'Quanto fizerdes por palavras ou por obras, fazei tudo' (Cl 3:17) 'para glória de Deus' (1Co 10:31). [...] A genuína conversão é uma mudança do egoísmo para santificada afeição para com Deus e uns pelos outros. Farão os adventistas do sétimo dia agora uma completa reforma, para que sua alma manchada de pecado seja purificada da lepra do egoísmo? (Ellen G. White - Mensagens Escolhidas 1, p. 114-115).