sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

JARDINS

Algumas das principais histórias da Bíblia aconteceram em jardins. De fato, o destino da humanidade foi definido neles. 

O primeiro foi o Éden. Tudo que existe de mais belo hoje em nosso planeta não passaria de uma pálida recordação do que foi o jardim original. Tudo estava bem até que o inimigo entrou pela porta dos fundos, disfarçou-se de serpente e tentou atrapalhar o plano original. Usando meias-verdades, ele enganou o primeiro casal e os fez comer do fruto proibido. Satanás ficou satisfeito. Para ele, essa era a prova de que Deus era um ser tirano e de que Suas exigências não eram razoáveis. Ou o Criador eliminaria a humanidade, revelando-Se cruel, ou teria que desconsiderar a desobediência, sendo forçado a readmitir no Céu Satanás e os anjos caídos.

Mas, quando o diabo estava prestes a dar seu grito de vitória, Deus disse: “Ainda não acabou.” Uma nova batalha seria travada em outro jardim. No Getsêmani, Aquele a quem Paulo se refere como o segundo Adão seria tentado e testado pelo diabo (Rm 5:19). Se, fazendo Adão e Eva pecarem, o inimigo não pôde se declarar vitorioso, fazer Jesus fracassar significaria pôr fim às esperanças humanas.

O maligno usou sua melhor estratégia. Deixou Jesus aparentemente abandonado. Fez cair sobre os discípulos um tipo de sono sobrenatural, para que, ao olhar para eles, Jesus Se questionasse se valia mesmo a pena entregar a vida para salvar a humanidade. Além disso, o diabo usou Judas, um dos discípulos, para trair Jesus e entregá-Lo aos romanos. Cristo estava só. Suava gotas de sangue. Estando cercado por um exército que tinha como missão prendê-Lo e levá-Lo a julgamento, Jesus Se levantou e disse: “Sou Eu.” Quando fez isso, toda a estratégia do mal foi ao chão. Observe um interessante contraste: No Éden, Adão cai. No Getsêmani, Jesus Se levanta. No Éden, Deus tem uma palavra que dá origem a tudo que existe de bom. No Getsêmani, Jesus tem uma palavra que é capaz de derrotar todo o mal.

No Éden e no Getsêmani, pecado e salvação se encontram. Nossa salvação vem de Deus, um Pai que nos ama tanto a ponto de não poupar nenhum esforço para nos trazer de volta para Seus braços. O relato de Sua ação salvadora na luta entre o bem e o mal é a maior história jamais contada. É o drama das eras.

Nesta história, dois jardins compõem o palco para acontecimentos cruciais. Do primeiro jardim vêm pecado, perda, vergonha e morte. Do segundo, fluem esperança, alegria e vida.

Os dois jardins nos convidam a contemplar, em espírito de oração, o preço de nossa salvação. Neles vemos não só o quanto Cristo sofreu por nós, mas também quão grande é a graça de nosso maravilhoso Deus. Ellen G. White diz: "O Jardim do Éden, com sua pútrida mancha de desobediência, deve ser cuidadosamente estudado e comparado com o Jardim do Getsêmani, onde o Redentor do mundo sofreu agonia sobre-humana quando os pecados do mundo todo foram depostos sobre Ele" (Cristo Triunfante, p. 21).

Satanás não venceu no Éden. Também não pôde vencer no Getsêmani. Mas continua tentando vencer no “jardim do coração humano”. O segredo da vitória neste jardim é ter Jesus no centro. Abra a porta e permita que Ele reine em sua vida.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

FUTEBOL, POLÍTICA E RELIGIÃO

“Política, futebol e religião não se discutem. Se quiser ser meu amigo, não me fale de seu partido político, de seu time de futebol ou de sua religião. Cada um que vote em quem quiser, torça para quem quiser e escolha a religião que quiser”.

Certamente essas frases (ou suas variantes) já foram usadas inúmeras vezes para tentar aplacar ou prevenir uma discussão entre dois ou mais dialogantes. Em nosso país, onde a fragmentação política é grande, a paixão futebolesca arrebata e a diversidade religiosa cresce, as pessoas tendem a ficar cada vez mais divididas por esses temas tão pessoais. As preferências são formadas geralmente mais com os sentimentos que com a inteligência. Em consequência da defesa inflamada de um favoritismo pessoal, a violência não é rara quando as divergências estão ladeadas, como em comícios, eleições e jogos. Também as inimizades e discussões muitas vezes brotam quando as pessoas apresentam suas crenças religiosas.

No ano que vem ocorrerá o mais repercutido evento esportivo do mundo. Milhões de pessoas em nosso país interromperão suas atividades para, de forma entusiasmada, acompanhar as partidas de futebol da Copa do Mundo. Poucos meses depois, serão realizadas as eleições gerais no Brasil. Apesar da natureza distinta desses dois eventos, a torcida pelos candidatos não costuma ser muito diferente da torcida pelos times de futebol. Frequentemente os eleitores torcem pelos seus candidatos preferidos com muita paixão, substituindo a racionalidade adequada a uma escolha eleitoral por uma devoção impensada.

Como o cristão, que busca a paz, deve se posicionar diante de divergências que envolvem convicções pessoais? Num passado relativamente recente, os evangélicos brasileiros mantinham-se um tanto alheios e indiferentes à coisa mundana que era considerada a política, e as igrejas reprimiam as paixões esportivas. Mas o crescimento das denominações cristãs coincidiu com as maiores oportunidades de participação política dos diversos setores da sociedade (incluindo as igrejas), e as recreações esportivas deixaram de ser condenadas, a ponto de os novos conversos nem saberem que um dia o futebol foi censurado nos sermões.

Hoje as denominações evangélicas contam com um número de adeptos na casa dos milhões. Os candidatos se dirigem esfomeados às igrejas buscando eleitores entre os fiéis, reescrevendo com linguagem bíblica suas agendas políticas. E, como as ideologias sociais contém tanto elementos convergentes quanto divergentes à fé cristã, há cristãos que passam a aceitar ou rejeitar determinadas ideologias com um fervor religioso, como se uma doutrina política específica fosse parte de sua doutrina cristã.

Surpreendentemente, existe agora a figura do cristão politizado. A ideologia é uma doutrina a mais no seu credo de fé. Assim, a cristandade está sendo dividida não somente pelas diferentes interpretações doutrinárias, mas também pelo sincretismo entre cristianismo e política. Essa situação leva à pergunta: “O ativismo partidário enriquece ou corrompe o cristianismo?”

É indiscutível que a pregação do evangelho resulta em transformação social. Mas a mensagem de Cristo vai além. Seu foco é a redenção espiritual: um ser humano perdido em pecado sendo salvo após o arrependimento por meio da fé em Cristo. Salvo do pecado e da morte eterna. Salvo para uma vida renovada, com pensamentos e atitudes alinhados com a revelação da vontade de Deus encontrada na Bíblia. Mudanças sociais podem ser um caminho para tocar o coração de uma pessoa quanto à necessidade de redenção espiritual, ou são consequências dessa redenção. Não combina com o discurso de Cristo substituir a redenção espiritual pela redenção social.

Nem Jesus nem os primeiros cristãos tiveram como meta mudar as estruturas sociais e políticas de seu tempo. João Batista, por exemplo, esteve mais preocupado com a condição espiritual de seu governante que com suas políticas públicas (Mt 14:3, 4). O apóstolo Paulo orientou os fiéis que a mudança de condição social é questão secundária (1Co 7:20-24), e Cristo recusou Se aproveitar de qualquer posição de liderança política para favorecer Sua missão (Jo 6:15).

Nenhuma ideologia política leva em conta a realidade espiritual, a condição do pecado e o plano da redenção. Respostas mais ou menos satisfatórias para os problemas sociais podem ser dadas, mas a política não apresenta a saída para o mais profundo dilema humano: o pecado, mal que verdadeiramente rouba a dignidade pessoal. Ideais políticos podem traçar caminhos para tirar pessoas da pobreza, da violência, dos vícios, da incultura e da doença, mas são incapazes de oferecer contentamento, paz interior, temperança, conhecimento da Verdade e cura para a alma. Podem melhorar o mundo, mas não melhorar as pessoas. Isso só Cristo faz.

Em vista disso, é irrazoável que o cristão aplique ao ativismo partidário o mesmo fervor que deveria devotar à Grande Comissão de Cristo (Mt 28:19, 20). Pode, e deve até certo ponto, se interessar pelas questões da sociedade, mas seu interesse e sua atuação sempre serão secundárias e subordinadas à missão maior de apresentar Cristo como única esperança para os problemas humanos. Mesmo se trabalhar na política, nenhuma agenda partidária substitui os valores do Reino de Deus. Davi, acima de ser rei, era um homem segundo o coração de Deus. Daniel, antes de ser um estadista, era um profeta do Altíssimo. José, além de ser o governador de uma nação, era principalmente um homem que sonhava os sonhos de Deus. Ester, adiante das preocupações da corte medo-persa, preocupava-se com o povo de Deus.

Numa sociedade polarizada, o cristão não tem a missão de acentuar as diferenças, mas a tarefa de convidar todas as pessoas a uma convergência em torno do Rei Jesus. Só assim as soluções humanas que dividem serão substituídas pela solução divina que une.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2025

JAULAS

A morte do jovem Vaqueirinho atravessou nossa alma feito lâmina fria. Rasgou sem pedir licença. Tem tragédias que estilhaçam ao extremo este mundo tão quebrado. Esta foi uma delas. Um menino de dezenove anos, ferido desde seu berço de espinhos, entrou na jaula da leoa buscando uma miragem. Sonho, desafio, fuga, pedido de socorro. A leoa reagiu como a natureza reage. Ele se moveu como a dor se move. E o fim chegou rápido e silencioso. Terrível. Neste planeta que perdeu outro filho sem nunca saber o que foi colo.

Ali na jaula não havia culpados. Ambos presos. A fera cercada por ferro, rotina e instinto. O rapaz cercado por abandono, diagnósticos tardios, violência, invisibilidade. Dois seres encarcerados por razões diferentes, e empurrados por forças maiores que seus desejos. Em algum ponto desta história, nasce a pergunta que arde sem resposta: quem poderia ter visto ele antes da jaula virar destino? Quantas oportunidades de cuidado se perderam?

A Bíblia revela um Deus que vê o que o mundo ignora. Ele recolhe cada lágrima em um odre, como quem guarda tesouros que ninguém valoriza (Sl 56:8). Nada escapa ao Seu olhar. Por isso, o milênio será o tempo para mostrar o que agora não entendemos. A justiça que não enxergamos. O coração que desconhecemos. E as correntes invisíveis prendendo um menino que sonhava com leões.

Ellen White escreveu: “O amor de Deus é tão vasto, profundo e completo que envolve todo ser humano” (CC, p.9). Se o amor do Pai é mais forte que a morte (Ct 8:6), nenhuma história terminará no portão lacrado da jaula. A memória divina não esquece anônimos, nem descarta biografias confusas. Aliás, nenhuma história se resume ao seu último ato. Só se for para redimir e perdoar. Diante desse amor, a breve vida do Vaqueirinho não foi só notícia, ele foi um filho sofrido visto do Céu.

Que esta tragédia devore nossa indiferença. Que nos torne atentos aos jovens engatinhando à beira dos precipícios emocionais. Que nos aproxime de quem vive esmagado por dentro. E que, enquanto o milênio não chega, sejamos testemunhas da misericórdia de Deus. Até que tudo se faça novo para cada vida neste mundo de grades visíveis e invisíveis.

Até quando?

Odailson Fonseca (via instagram)

terça-feira, 2 de dezembro de 2025

JUDAS BOM

Poucos notam. Menos ainda lêem. Mas o livro de Judas, escondido entre as cortinas do Novo Testamento, brilha como um vitral à luz do entardecer: breve, misterioso, explosivo. É o último portal antes do Apocalipse. Um prefácio invisível da guerra espiritual final. Judas, servo de Jesus e irmão de Tiago (Jd 1), NÃO é o traidor, é o resistente. Seu nome carrega o peso do escárnio, mas da sua pena escorre advertência, clamor e glória em só 25 versículos.

Ele denuncia infiltrados com palavras cortantes, como espadas afiadas na noite da fé. Falsos mestres se esgueiravam entre os santos como sereias traiçoeiras, armadilhas ideológicas, estrelas errantes, nuvens sem água (Jd 12-13). Judas não escreve com tinta suave. Ele alerta, suplica. Convoca. Lembra Sodoma, cita Caim, menciona Balaão e até revela a disputa de Miguel e Satanás pelo corpo de Moisés (Jd 9). É um livro de bastidores eternos. Revelações intensas. E chamado urgente.

É a carta do fim antes do fim. Judas fala aos que vivem entre o engano e o advento. Como nós. Profetiza escarnecedores zombando da verdade com seus desejos torpes (Jd 18). Fala do agora. Atual! Das vozes relativizando o pecado, dos púlpitos trocando convicção por curtidas. Ele clama por vigilância, por oração no Espírito, por edificação mútua, por compaixão ativa (Jd 20-23). É o livro do confronto com a mornidão disfarçada de sabedoria.

E o autor? Judas, o fiel. Discípulo do Cordeiro. Chamado também Tadeu. Segundo historicistas, pregou na Síria, curou e foi martirizado por sua fé. A tradição aponta que morreu leal à cruz, degolado por se recusar a negar o Senhor. Seu ministério foi discreto, mas sua carta ecoa feito trovão contido entre sussurros proféticos. Judas é o último vigia da estação antes do trem do Apocalipse partir.

Jesus está voltando. E a fé precisa de guardiões. Judas não pede popularidade, clama por pureza. Ele termina exaltando o Único que pode nos guardar de tropeçar (Jd 24). E nos chama à glória com alegria indescritível. “Agora é o tempo de desenvolver energicamente toda faculdade para a honra de Deus” (Ellen White, CBV, p. 401). Chegou a hora. Prepare-se. Avise outros. Lute pela fé. Como Judas.

O Judas bom.

Odailson Fonseca (via instagram)

sexta-feira, 28 de novembro de 2025

AMANHÃ

As palavras de Jesus têm uma força incomum. O pouco que Ele escreveu na areia, o vento apagou, mas o que disse está gravado na mente e no coração de seus seguidores até hoje. No entanto, há algumas frases suas que soam de maneira estranha. Não têm fácil explicação. Uma delas me chama a atenção.

Jesus ressuscitara ao nascer do dia. E uma pessoa especial se encontrava chorando, sozinha, na entrada do túmulo vazio. Seu nome: Maria Madalena. Ela não estava ali por acaso. Tinha bons motivos para chorar a perda de Jesus. Não era sem explicação sua coragem de estar ao pé da cruz nas horas finais de seu mestre, enquanto os outros discípulos se escondiam pelos cantos da noite. Sua vida fora marcada pelas palavras de Jesus. Deve haver algo incrível por trás da experiência de alguém que é liberto de "sete demônios" pela própria palavra de Cristo. De qualquer maneira, a vida de Maria estava intimamente ligada à vida dAquele que morrera.

De repente, Jesus quebra o roteiro triste da história e aparece vivo. Maria é a primeira a vê-Lo ressurreto e eu imagino o porquê.

Seguindo o impulso natural, Maria corre para abraçá-Lo, mas algo estranho acontece. Jesus simplesmente se afasta, dizendo: "Mulher, não me segure!" (João 20:17). Em outras palavras, "Mulher, me solte!" Como entender tais palavras vindas da boca de quem só tinha palavras de convite e aceitação? Como entender Jesus aqui? As palavras seguintes dão nova luz a Maria e podem dar a nós também: "Vá... e conte aos outros o que ainda irá acontecer".

Na caminhada espiritual, corremos o grande perigo de nos apegar ao que já passou, ao que Deus já fez por nós no passado e até ao que nós já fizemos por Ele ontem. Mas as palavras "estranhas" de Jesus acendem uma luz, mostram uma nova direção. O mais importante não é o que Deus já fez por nós, mas o que Ele ainda promete fazer. Quem vive agarrado ao que foi ontem, não tem espaço nas mãos para receber o amanhã. Não devemos deixar que as grandes coisas que Deus fez ontem em nossa vida nos ceguem para as que Ele promete fazer amanhã.

Ouvi tempos atrás, a história de um menino que tinha um pai muito ocupado. Os melhores momentos de sua infância ele vivera sem a presença do pai. Tudo o que ele mais queria era ter o pai perto, estar com ele, mas isso quase nunca era possível. Um belo dia - um dia desses em que a gente sente que alguma coisa precisa mudar - o pai resolveu adiar todos os compromissos e passar um dia com o filho, só com ele. Seria um acampamento. Ele disse: "Filho, prepare-se, pois amanhã nós vamos passar o dia juntos. Só você e eu. Nós vamos viajar e vai ser muito legal!". Essas eram palavras mágicas para um garoto pequeno. Já era noite. Assim, ele correu para o quarto, escovou os dentes, pulou na cama, puxou a coberta e fechou os olhos com toda a força que podia. Mal podia esperar chegar o amanhã. Acontece que ele não conseguia pegar no sono. Sua imaginação passeava, seu hoje era como que invadido pelo amanhã e isso não o deixava dormir.

No meio da noite, o garoto vai até o quarto do pai e bate à porta. O pai fica assustado ao ver o menino acordado àquela hora. "O que aconteceu, filho?", pergunta. Ao que o menino responde: "É que eu não consigo dormir." O pai continua: "Filho, você precisa dormir. Lembra? Amanhã é o nosso dia. Vai ser um dia cheio. Você precisa descansar!" O menino junta toda a alegria que o impedia de dormir e diz: "Pai, é sobre isso que eu quero falar. Pai, obrigado pelo amanhã!"

Com Jesus, o melhor ainda está por vir. Se no passado Ele nos ofereceu perdão e salvação através de sua morte, no amanhã Ele nos promete o abraço da eternidade, quando de sua segunda vinda. Às vezes eu me sinto como um garoto pequeno num quarto escuro, esperando a noite dessa vida passar. Não sei se você já sentiu assim.

A promessa mais bonita da Bíblia está escondida nas palavras de Jesus. Logo logo a luz do sol de Sua vinda vai brilhar, acabando com as trevas do pecado nesse mundo. Que seu coração marque ansioso cada momento da espera.

Eu mal posso esperar esse dia amanhecer.

"Nós estamos ainda em meio às sombras e tumultos das atividades terrenas. Consideremos com todo o empenho o bendito porvir. Atravesse a nossa fé toda nuvem de escuridão, e contemplemos Aquele que morreu pelos pecados do mundo. Sejamos animados pelo pensamento de que o Senhor logo virá. Alegre-nos o coração esta esperança. 'Porque, ainda dentro de pouco tempo, Aquele que vem virá e não tardará' (Hebreus 10:37)” (Ellen G. White - Testemunhos Para a Igreja, v. 9, p. 287).

terça-feira, 25 de novembro de 2025

ESCATOLOGIA DESFOCADA

Vivemos em um mundo obcecado pelo fim. De filmes apocalípticos a relatórios científicos, a ideia do colapso final da civilização ocupa cada vez mais espaço na cultura contemporânea. No entanto, nem todas as formas de pensar o fim do mundo são iguais. A maneira como concebemos o futuro revela muito sobre como entendemos o presente – e é por isso que a escatologia, a doutrina bíblica sobre os últimos acontecimentos, não é um assunto secundário. Em especial, é vital distinguir entre uma escatologia centrada na Bíblia e outra que perdeu o rumo, seja por um excesso de confiança na ciência, por uma leitura alarmista do presente ou por interpretações equivocadas do texto profético.

Por um lado, encontramos o que poderíamos chamar de escatologia secular. Ela não se baseia na Bíblia, mas em uma visão de mundo que antecipa um colapso por causas naturais ou humanas: mudanças climáticas, uma pandemia global, uma catástrofe nuclear ou o impacto de um asteroide. Até mesmo agências governamentais como a Nasa têm destinado milhões de dólares a projetos voltados para prevenir ou minimizar esse tipo de ameaça, como sistemas para desviar objetos próximos à Terra ou a exploração planetária. Nesse tipo de perspectiva, a esperança está depositada no desenvolvimento científico e tecnológico supostamente capaz de garantir a sobrevivência humana.

No outro extremo, encontramos dentro do cristianismo o que chamarei de escatologia desfocada. Esse enfoque, embora invoque a Bíblia, deslocou seu centro de gravidade. Já não interpreta a história a partir da Palavra de Deus, mas interpreta as Escrituras a partir de notícias, teorias conspiratórias, especulações científicas ou informações de procedência duvidosa. Trata-se de uma abordagem que perdeu de vista o princípio sola Scriptura, subordinando a mensagem profética a uma série de interesses ou agendas que nada têm que ver com o propósito pelo qual Deus revelou o futuro.

A escatologia desfocada costuma apresentar-se com aparente zelo doutrinário, mas, na prática, caracteriza-se por retirar textos do seu contexto e por conectar versículos como peças de um quebra-cabeça, sem respeitar seu enquadramento literário, histórico ou teológico. Essa abordagem frequentemente sugere que, para compreender verdadeiramente a profecia bíblica, é preciso tornar-se especialista em sociedades secretas, astronomia, política internacional, ciências ocultas ou história medieval. Seu fundamento não é o estudo sério da Palavra, mas a acumulação de dados externos usados para interpretar a Escritura, em vez de permitir que a Escritura interprete os acontecimentos do mundo.

Os que abraçam esse tipo de pensamento muitas vezes desenvolvem uma fascinação doentia por descobrir indícios de conspirações mundiais, enxergando conexões ocultas por trás de cada notícia ou evento global – ou até mesmo dentro da própria igreja. Com o tempo, muitas dessas interpretações acabam gerando uma atitude crítica, desconfiada e desdenhosa em relação à organização da igreja, a qual acusam de cumplicidade e cegueira espiritual. Esse tipo de pensamento, longe de edificar, corrói a comunhão, enfraquece o testemunho coletivo e pode acabar isolando o crente em um caminho espiritual construído mais sobre o medo e a suspeita do que sobre a verdade revelada. Quando a interpretação profética se afasta da Palavra e da comunidade de fé, o resultado não é maior fidelidade, mas um perigoso desvio.

Um dos sinais mais claros de uma escatologia desfocada é a obsessão em “ler os jornais” como se fossem o comentário autorizado de Apocalipse ou Daniel. Esse enfoque inverte a ordem correta: a Bíblia não deve ser interpretada à luz das notícias, mas é a Palavra de Deus que nos dá discernimento para compreender o tempo em que vivemos. Outra manifestação desse desalinhamento é a ideia de que o estudo das profecias exige reconstruir o cumprimento de cada símbolo ou detalhe do passado ou do presente, como se o valor da profecia residisse unicamente em sua capacidade de coincidir com eventos documentados. Isso não apenas esgota o texto bíblico, como também exclui o seu poder transformador.

Corrigindo o foco
Diante dessas distorções, precisamos promover uma escatologia que se caracterize por ser bíblica, cristocêntrica e edificante; que reconheça, antes de tudo, que Cristo é o centro de toda profecia. Como declara Apocalipse 19:10, “o testemunho de Jesus é o espírito da profecia”. As profecias não foram dadas para revelar segredos do Universo nem para alimentar a ansiedade com previsões detalhadas, mas para nos levar a conhecer melhor a Cristo, confiar em Sua vitória final e viver sob Seu senhorio. Quando a escatologia deixa de nos falar de Cristo, ela perde o rumo.

Além disso, uma escatologia focada afirma que a Escritura é a fonte segura e suficiente. Como escreveu o apóstolo Pedro: “Assim, temos ainda mais segura a palavra profética, e vocês fazem bem em dar atenção a ela, como a uma luz que brilha em lugar escuro” (2Pe 1:19). Não devemos recorrer ao ocultismo, a vazamentos digitais ou a conferências geopolíticas para encontrar luz sobre o futuro. Deus já revelou em Sua Palavra tudo o que é necessário para confiar, viver e esperar. A escatologia bíblica não se fundamenta em suposições externas, mas no testemunho fiel das Escrituras, interpretadas com reverência, estudo sério e dependência do Espírito Santo.

Uma escatologia focada também compreende que o objetivo da profecia não é satisfazer a curiosidade sobre o futuro, mas preparar o coração para a vinda do Senhor. Jesus foi claro em Seu aviso: “Tenham cuidado para não acontecer que o coração de vocês fique sobrecarregado […], e para que aquele dia não venha sobre vocês repentinamente” (Lc 21:34). O propósito dos sinais do fim não é nos levar a elaborar cronogramas detalhados, mas a vigiar em oração e viver em santidade. A profecia é um chamado constante à fidelidade, não à especulação.

Por fim, uma escatologia centrada na Bíblia afirma que a esperança do retorno de Cristo exerce um poder transformador no presente. O apóstolo João expressou essa convicção dizendo: “E todo o que tem essa esperança Nele purifica a si mesmo, assim como Ele é puro” (1Jo 3:3). A escatologia não nos fala apenas do fim, mas também de como viver até esse dia. Ela nos chama a viver com propósito, paciência, responsabilidade e alegria. Em vez de nos paralisar pelo medo, ela nos mobiliza pela esperança.

A verdadeira profecia não deve ser vista como um espetáculo nem como uma arma. Sua função é fortalecer a fé do povo de Deus, como disse Jesus: “Isso Eu falei agora, antes que aconteça, para que, quando acontecer, vocês creiam” (Jo 14:29). Retornar a uma escatologia focada é, em última análise, voltar a Cristo, voltar à Palavra e viver como aqueles que esperam não um desastre inevitável, mas uma gloriosa redenção.

Temos o privilégio e a responsabilidade de ensinar, pregar e guiar o povo de Deus. Também nos é confiada a tarefa de cuidar do enfoque escatológico com o qual comunicamos a esperança cristã. Em tempos marcados pela ansiedade global e pelo sensacionalismo religioso, é vital que nosso ministério promova uma escatologia centrada na Palavra, enraizada em Cristo e orientada para a fidelidade. Não somos chamados a alimentar temores nem a levantar teorias de base duvidosa, mas a anunciar com clareza e convicção a segura esperança da vinda do Senhor. Que em nossas igrejas, salas de aula e púlpitos se ouça uma escatologia que console, exorte e edifique, para que o povo de Deus caminhe com confiança rumo ao dia glorioso do encontro com seu Salvador.

Karl Boskamp (via Ministério)

segunda-feira, 24 de novembro de 2025

DINOSSAUROS

Neste fim de semana resolvi conferir a obra mais recente sobre dinossauros pela Netflix. O filme "65: Ameaça Pré-Histórica" segue o piloto Mills (Adam Driver), que sofre um acidente e cai em uma Terra 65 milhões de anos atrás, na suposta era dos dinossauros. Ele descobre que não está sozinho, pois a única outra sobrevivente é Koa (Ariana Greenblatt), uma jovem que não fala sua língua. Juntos, eles precisam lutar contra criaturas pré-históricas para atravessar o terreno perigoso e chegar a uma cápsula de escape.

Como criacionista, me veio à mente algumas perguntas enquanto assistia o filme: Como podemos encaixar os dinossauros no relato bíblico da criação? Será que a Bíblia e os escritos de Ellen G. White oferecem alguma base para a crença na existência desses estranhos animais?

Etimologia
O termo "Dinosauria" foi proposto em 1842 por Richard Owen para classificar os grandes esqueletos de animais extintos, que haviam sido recém-descobertos no Reino Unido. A palavra, em latim, deriva do grego δεινός σαῦρος, que significa "lagarto terrível", apesar de esses animais serem ornitodiros, e, portanto, taxonomicamente distantes dos lagartos.

Esses animais, assim como todos os demais seres vivos, existentes ou extintos, foram batizados de acordo com a nomenclatura binomial, promulgada por Carlos Lineu no século XVIII, que estabelecia que todos os animais deviam ser nomeados usando termos das línguas grega ou latina, como foi o caso do primeiro gênero de dinossauro não aviário catalogado, o megalossauro (que vem do grego μεγάλο σαύρος), cujo nome significa "lagarto grande". No entanto, no decorrer dos anos, muitos dinossauros foram classificados com termos vindos de outros idiomas, como o Dilong, que vem da língua chinesa, significando "dragão imperador", e também o Mapusaurus, que vem da língua indígena mapuche, significando lagarto da terra.

No museu e na TV
Se você já visitou um museu de história natural, provavelmente viu grandes esqueletos de dinossauros. Também pode ter visto reproduções animadas em que, no caso de documentários, filmes e séries da televisão, eles parecem vivos e reais. Ao assistir a tais animações, o espectador deve considerar alguns detalhes. Primeiramente, devemos aceitar que os dinossauros existiram por um período de tempo na Terra e que, em certos lugares, eles pareciam numerosos. Paleontólogos têm encontrado evidências de sua existência em todos os continentes, incluindo Antártica. Essas evidências incluem ossos, ovos, tocas e pegadas. Rastros e pegadas são abundantes e não podem ser associados a nenhuma outra criatura fora do que conhecemos como dinossauros.

Em segundo lugar, devemos saber que os esqueletos encontrados em museus não são tipicamente reais, mas réplicas. Os ossos originais são muito valiosos e delicados para ser expostos ao público; portanto, são armazenados em lugares mais seguros. Além disso, os esqueletos dos museus são ajuntamentos de réplicas de ossos de várias espécies oriundas de lugares distantes. Os paleontólogos são capazes de compor a arquitetura do corpo dos dinossauros, embora não possam ter todos os elementos da mesma criatura. Assim, as réplicas encontradas nos museus são razoavelmente confiáveis. Entretanto, animações vistas na TV são mais especulativas, especialmente no que tange à cor, fisiologia, comportamento e assim por diante.

Desaparecimento
Na coluna geológica, vestígios de dinossauros aparecem em camadas de rochas que os paleontólogos chamam de Triássico, Jurássico e Cretáceo. Essas camadas sedimentadas, amontoadas uma sobre a outra, mostram características específicas, incluindo as de certas espécies fósseis como moluscos, répteis, peixes, dinossauros e organismos microscópicos (diatomácea, algas) que habitaram os oceanos. Alguns paleontólogos creem que os dinossauros, bem como outros grupos de animais e plantas, desapareceram subitamente em consequência do impacto de um meteorito gigante 65 milhões de anos atrás. Outros duvidam disso, por várias razões.

Muitos cientistas criacionistas acreditam que os dinossauros desapareceram junto com outras espécies, durante o dilúvio universal descrito em Gênesis. Esse cenário poderia incluir atividade de um meteorito resultando em tsunamis, atividade vulcânica e emissão de dióxido de carbono, sulfeto e outros elementos químicos prejudiciais a plantas e animais. Portanto, a ideia de um meteorito impactando a Terra não é necessariamente incompatível com o modelo bíblico do dilúvio.

Apesar da falta de consenso entre os cientistas sobre a causa do desaparecimento dos dinossauros, a mídia e a imprensa pseudocientífica decidiram que a teoria do impacto do meteoro é a única explicação válida. Isso está longe da realidade. Os dinossauros desapareceram, mas não sabemos exatamente quando nem por quê. Entretanto, a possibilidade de sua extinção durante o dilúvio do Gênesis (com ou sem impacto) pode ser vista como hipótese científica plausível e merece consideração.

Convivência com humanos
Muito tem sido escrito e falado sobre certas evidências que supostamente mostram dinossauros e seres humanos juntos. Elas incluem o que é interpretado como pegadas de humanos e dinossauros, quadros pré-históricos em cavernas e cerâmicas, em que figuras humanas aparecem junto a criaturas excepcionais muito semelhantes às atuais reconstruções desses répteis gigantes. Mas, estudos científicos têm mostrado que esses traços têm sido mal interpretados.

Analisemos, por exemplo, os alegados sinais de “humanos” e dinossauros encontrados no leito do Rio Paluxy no Texas. Poucas décadas atrás, cientistas proclamaram que essa era uma segura evidência contra a teoria da evolução e prova da ocorrência de um dilúvio universal. Intrigados por essa afirmação, vários cientistas evolucionistas e criacionistas estudaram detalhadamente as marcas encontradas nas rochas. Nesse lugar específico, o leito e a margem têm muitas marcas por causa de erosão. Através das marcas deixadas sobre a rocha, causadas pela circulação da água, podemos distinguir se o traço do dinossauro é verdadeiro ou falso.

Há também estudos feitos em laboratório. Se uma marca é autêntica, deve mostrar as camadas achatadas de sedimento rochoso sob ela, por causa do peso do animal. Para testar essa deformação característica, cientistas cortaram transversalmente a marca e não observaram presença dela. Concluíram que o molde não se tratava de real pegada humana, mas resultava de erosão pela natureza ou forjada pelo homem. Estudos posteriores mostraram que tais “marcas” e desenhos foram deliberadamente colocados por fanáticos defensores da coexistência de humanos e dinossauros, acarretando, assim, zombaria e rejeição no mundo acadêmico.

Na Bíblia
A Bíblia é clara em afirmar que Deus é o originador da vida. Ou seja, todos os seres vivos do Universo, incluindo os que vivem no planeta Terra, são obra do Criador. Paulo, em seu discurso aos sábios de Atenas, afirmou que “Deus fez o mundo e tudo o que nele existe” (Atos 17:24).

O relato da criação em Gênesis 1 fala de um Deus que criou vida marinha bem como pássaros no quinto dia; e o restante dos animais, no sexto dia. Embora os répteis sejam citados, os dinossauros não são mencionados, o que não deve nos surpreender; afinal, nos dias de Moisés, a palavra “dinossauro” não existia, nem ele estava obrigado a mencioná-los. Ele também não mencionou outros grupos de animais como, por exemplo, besouros, tubarões, estrelas-do-mar.

O fato de a Bíblia não citar os dinossauros pelo nome não prova que Deus não os tivesse criado; muito menos a estranha aparência deles. Hoje existem muitos animais tão estranhos como os dinossauros – observe o ornitorrinco e o canguru – que não atraem muito a atenção. Algumas pessoas creem que os dinossauros surgiram como resultado da maldição depois do pecado de Adão e Eva, mas a Bíblia não emite luz sobre isso, nem identifica explicitamente os animais que mudaram como resultado do pecado nem qual foi o tipo de mudança.

Muitos cientistas criacionistas acreditam que os dinossauros desapareceram durante ou logo após o dilúvio. Mas, a Bíblia também não nos dá indícios sobre o destino deles. Por causa desse silêncio bíblico, o fato de que os dinossauros desapareceram durante uma catástrofe mundial conhecida como dilúvio é uma hipótese que deve ser considerada através de pesquisa científica. A comprovação de tal hipótese deve ser feita através de dados geológicos e paleontológicos, não por forçar a Bíblia a dizer o que ela não diz.

Finalmente, há quem pense que os dinossauros sobreviveram ao dilúvio, mas logo desapareceram por não se terem adaptado ao novo ambiente. Essa é outra possibilidade, pois havia dinossauros na arca e, talvez, tenham desaparecido durante a colonização pós-diluviana. A Bíblia menciona duas estranhas criaturas: beemote (Jó 40:15-18) e leviatã (Jó 41:1), que alguns interpretam como possíveis exemplos dos dinossauros pós-diluvianos. Entretanto, a maioria dos eruditos não aceita essa explicação, e esses termos são geralmente traduzidos respectivamente como hipopótamo e crocodilo. Não estão relacionados aos dinossauros.

Ellen White
O termo dinossauro foi usado pela primeira vez em 1842, para nomear um grupo de fósseis répteis então descobertos. O uso do termo se expandiu enquanto novas descobertas aconteciam na Europa e América do Norte. No tempo em que Ellen White escreveu suas primeiras declarações sobre criação, dilúvio, ciência e fé (1864), o termo dinossauro já era comum nos livros e revistas. Entretanto, ela nunca usou esse termo nem qualquer outra palavra similar para se referir a esses répteis extintos.

Numa breve declaração, em 1864, ela escreveu: “Todas as espécies de animais que Deus criou foram preservadas na arca. As espécies confusas que Ele não criou, e que foram resultado de amálgama, foram destruídas no dilúvio”.[1] Essa é uma declaração favorita entre alguns adventistas para os quais ela explica os organismos extintos, incluindo dinossauros, bem como fósseis com características intermediárias, também conhecidos como fósseis em transição, ou seja, aqueles que, de acordo com a teoria da evolução, mostram mistura de características entre dois grupos de animais ou plantas considerados consecutivos no tempo. Exemplo disso são os répteis parecidos com mamíferos, considerados um degrau intermediário na evolução.

Muitas pessoas leem nessas palavras o que nós conhecemos como engenharia genética, indicando que, nos tempos antediluvianos as pessoas praticavam acasalamento híbrido, resultando em estranhas formas biológicas.

Entretanto, essa interpretação apresenta problemas. O primeiro é a dificuldade para definir o que Ellen White quis dizer com “amálgama”. Estudos mais profundos sobre a declaração não têm dado uma resposta definitiva, e concluímos que ainda não sabemos exatamente o significado desse termo.

Um segundo problema é a aplicação de “amálgama” a casos reais no registro fóssil. Se “amálgama” significa “híbrido”, como poderíamos reconhecer esse fenômeno entre os fósseis ou entre animais e plantas dos nossos dias? Como poderíamos determinar que espécies eram híbridas antes do dilúvio, se elas realmente já existiam? Alguns respondem a essa pergunta dizendo que as espécies híbridas não sobreviveram ao dilúvio, precisamente porque Deus não quis. Mas, esse raciocínio é um círculo vicioso falho porque o critério que usamos para diferenciar os híbridos (extinção) é o mesmo que usamos para definir o que gostaríamos de diferenciar (híbridos). Em outras palavras, amalgamação explica seu próprio desaparecimento, e seu desaparecimento define o que são eles.

Ellen White continua dizendo que “desde o dilúvio tem havido amalgamação de homens e bestas, como pode ser visto em variedades quase infindáveis de espécies de animais”.[2] Em primeiro lugar, é importante enfatizar que ela diz “amalgamação de”; não diz “amalgamação entre” como alguns interpretam. Em segundo lugar, se amalgamação significa formas intermediárias, híbridas ou criaturas estranhamente formadas, qual é o critério para reconhecê-las? Se essas foram formadas depois do dilúvio, provavelmente se tornaram fósseis, e outras teriam sobrevivido até agora. Como podemos diferenciá-las entre si e de outros organismos vivos que não são híbridos? Ellen White não dá indícios sobre isso.

No mesmo texto, ela estabelece que lhe foi mostrado “que animais muito grandes e poderosos existiram antes do dilúvio, e não mais existem agora”.[3] E também disse em outro texto que “houve uma classe de animais que pereceram no dilúvio. Deus sabia que a força do homem diminuiria e esses mamutes não poderiam ser controlados por homens fracos”.[4] Entre outras, essa declaração a respeito da vida antes do dilúvio sugere que a profetiza estava se referindo à existência de uma ampla variedade de animais que não sobreviveram na arca. Entretanto, não estamos seguros quanto ao significado da declaração; não sabemos o que eram esses “animais muito grandes e poderosos”. Porém, suas palavras não estão longe da descrição científica dos dinossauros. Falando biologicamente, eles são um tanto confusos, não apenas porque alguns são gigantes, mas também partes do seu corpo (pernas, pescoço, cauda, cérebro) são, em alguns casos, desproporcionais.

A verdade é que muitas pessoas têm lutado para encontrar declarações de Ellen White apoiando a ideia de que os dinossauros não foram criados por Deus, mas resultaram de amálgama antes do dilúvio, sendo, portanto, condenados ao desaparecimento na catástrofe universal. Essa pode ser uma possibilidade, mas, depois de minucioso estudo de seus escritos, não encontramos apoio inequívoco para essa conclusão.

A Escritura não menciona a existência de dinossauros, pelo menos como nós os compreendemos, nem antes nem depois do dilúvio. Ellen White também não os menciona, e não estamos absolutamente seguros quanto ao significado de sua afirmação referente a “animais muito grandes”. Porém, isso não representa evidência de que eles não existiram. Ao contrário, as evidências disso são claras: ossos, dentes, ovos, pegadas e impressões. Mas, em algum ponto da história, eles desapareceram. Sua origem e seu desaparecimento estão envolvidos num mistério que requer cuidadoso e rigoroso estudo. E isso não compromete nossa fé nos ensinamentos bíblicos.

Referências:
1 Ellen G. White, Spiritual Gifts (Battle Creek, MI: SDA Publishing, 1864), v. 3, p. 75.
2 Ibid., p. 35.
3 Ibid., p. 92.
4 Ibid., v. 4, p. 121.