terça-feira, 17 de março de 2015

Eu tenho ótimos argumentos


Eu tenho ótimos argumentos.

Por exemplo, se eu tenho 120 anos e Deus me pede para sacrificar meu único filho de 20 anos, que nasceu em cumprimento a uma promessa dEle, eu posso falar assim: “essa voz não é de Deus porque Deus não gosta de assassinato. Eu devo estar esquizofrênico”. E aí eu não vou.

Por exemplo, se eu estou no meio duma multidão em frente a uma estátua enorme com a cara do rei e ele avisa que quando a orquestra tocar todo mundo tem que se ajoelhar e adorar a estátua como se ela fosse um deus se não vai ser jogado numa fornalha ardente, eu posso falar assim: “bom, no meu coração eu sei que isso aí não é deus nenhum, é só um monte de ouro. Eu posso muito bem ajoelhar aqui e orar no meu coração ao Deus verdadeiro. Ele vai entender”. E aí eu ajoelho.

Por exemplo, se Deus pede para eu ir até o meio da favela, chegar na boca de fumo mais escondida e gritar que se aqueles traficantes não se arrependerem em 40 dias Ele vai fazer descer fogo do Céu, eu digo assim: “Eu tenho mulher e quatro filhos pra criar. Se aqueles caras realmente merecem ouvir essa mensagem, Deus pode muito bem mandar alguém que tem menos a perder lá, ou quem sabe trazer os caras pruma situação em que eu não vou certamente sair num saco preto”. E eu não vou.

Por exemplo, se Deus me pede pra ser puro e fiel o tempo todo, eu posso dizer que “ninguém é de ferro”. 

Se Deus me pede pra honrar o sábado, eu posso dizer que “Ele certamente não quer que eu perca o emprego porque assim eu não poderia mais dar as ofertas lá na igreja”.

“Deus é amor e Ele vai entender”.

“É só uma fase”.

“Quando Ele diz não faça isso, Ele na verdade quer dizer não faça aquilo”.

“Eu sou melhor que a maioria”.

“Deus não leva as coisas assim a ferro e fogo”.

“Ninguém é perfeito mesmo”.

“Meu casamento está uma droga mesmo, eu estou carente”.

“Deus sabe que isso eu herdei do meu sangue [espanhol/latino/italiano/alemão/russo/etc] e não dá pra mudar”.

E aí por diante.

Eu tenho ótimos argumentos.

E, pensando bem, eles nem precisariam ser tão ótimos pra me convencer a fazer algo diferente daquilo que Deus pede. Desde que seja exatamente isso que eu queira. Desde que o que Ele pede não seja o mais conveniente e confortável.

Eu tenho ótimos argumentos e sou um grande perito em me enganar.

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