É muito desagradável estar diante de um grande talento quando este vem acompanhado de um grande ego. Mas pior do que o talentoso vaidoso é o que não tem talento e acha que tem muito:
“Se alguém julga ser alguma coisa, não sendo nada, a si mesmo se engana” (Gl 6:3).
O músico cristão não precisa se depreciar, rastejar num deserto de autocomiseração. No entanto, ele precisa se conhecer, saber seus limites e ser grato a Deus por isso:
“Pela graça de Deus, sou o que sou” (1Co 15:10).
Tenha uma visão realista e humilde de quem é você. Você não será diminuído ao admitir: “Eu ainda não consigo fazer solos tão rápidos na guitarra, me deixe fazer a harmonia nesse trecho.”
Chega a ser engraçado ver um músico que se acha o ‘bonzão’ diante de uma música além de suas capacidades técnicas: ele sempre tem justificativas. Ele põe a culpa no andamento, no arranjo, no instrumento, no ar-condicionado, na água que tomou, no horário do ensaio, inventa uma doença repentina, mas nunca reconhece que é limitado. Se ele tiver algum talento, improvisa uma alternativa mais fácil e convence todo o grupo que “fica melhor assim”.
Não seja esse tipo de arrogante convencido.
“... digo a cada um dentre vós que não pense de si mesmo além do que convém; antes, pense com moderação, segundo a medida de fé que Deus repartiu a cada um” (Rm 12:3).
Dizer “eu ainda não sei” não é falta de fé, nem fracasso e nem pessimismo. É um reconhecimento que economiza o tempo de todo mundo e abre portas para o aprendizado. Assuma o seu limite. Esse pode ser o primeiro passo para superá-lo.
A vaidade é traiçoeira, e nem sempre se traduz em discurso. O ‘metidão’ nem sempre fala bem de si mesmo. Algumas vezes ele tem palavras humildes, mas atitudes e posturas de estrela. Todos nós conhecemos músicos com a tal postura “eu sou o fera e cheguei para abalar”. Se você não se lembra agora de nenhum, procure no espelho...
“... para que nenhum mortal se glorie na presença de Deus” (1Co 1:29).
Em vez de ficar tentando impressionar a igreja maquiando suas deficiências, reconheça suas limitações e sirva a Deus com gratidão e excelência:
“Concedeu-nos Deus a preciosa graça da vida, não para ser empregada em satisfação egoísta. Nossa obra é demasiado solene, demasiado curto o tempo de servir a Deus e a nossos semelhantes, para ser gasto em busca de fama. Oh! se os homens se detivessem, em suas aspirações, justamente onde Deus estabeleceu os limites, quão diverso seria o serviço prestado ao Senhor!” (Conselhos aos Pais, Professores e Estudantes, p. 476).
Certamente, como diz o antigo gospel, “não existe montanha alta demais”. No entanto, na vida cristã, nem todas as montanhas existem para serem escaladas por todos. Tentar escalar a montanha da fama quando a ordem divina é “fique embaixo”, fatalmente resultará numa queda pública e vergonhosa. Não busque fama. Busque reconhecer diariamente quão frágil você é.
“Dá-me a conhecer, Senhor, o meu fim e qual a soma dos meus dias, para que eu reconheça a minha fragilidade” (Sl 39:4).
A Síndrome de Lúcifer
Alguém pode perguntar: “Mas e se tiver uma visão real de mim mesmo, e essa visão for: ‘cara, você canta/toca muito!’? E se eu realmente for muito bom? Devo ser hipócrita e fingir que não sou isso tudo?”
É um perigo sutil. Foi o que aconteceu com Lúcifer. A questão não é que ele se achava perfeito. Ele ERA perfeito e tinha consciência disso. O que o corrompeu foi o sentimento de independência de Deus, o Autor da sua perfeição.
Talento e fama podem corromper facilmente:
"E correu a tua fama entre as nações, por causa da tua formosura, pois era perfeita, por causa da Minha glória que Eu tinha posto sobre ti. ... Mas confiaste na tua formosura, e te corrompeste por causa da tua fama" (Ez 16:14 e 15).
Quando um músico talentoso alimenta o desejo de reconhecimento, ele pode tentar cobrir a vaidade com um manto de santidade, gerando o que chamamos de “orgulho espiritual”. Um dos sintomas é perder a simplicidade e começar a agir como estrela:
“O desejo de promoção e de louvor dos homens desvia o povo da simplicidade da verdadeira piedade. Não há orgulho tão perigoso como o orgulho espiritual” (Testemunhos para Ministros e Obreiros Evangélicos, p. 109).
Eu mereço “ser alguém”
Na obra do Senhor, desejar reconhecimento não é necessariamente pecado. É natural. O pecado está em ter o reconhecimento como única ou maior ambição. Revoltar-se com a falta de reconhecimento também. Desistir de servir por falta de reconhecimento é o atestado final: você só queria aparecer.
“Mas eu estou aqui há tanto tempo, e a igreja nunca me deu nem um ‘obrigado’. Então chega esse cantorzinho aí e eles já dão o departamento de música pra ele... Agora eu não ajudo mais!”
Acostume-se amigo: você verá gente subindo no seu talento e esforço, você verá pessoas sendo reconhecidas e elogiadas no seu lugar quando na verdade foi você quem se matou no serviço.
E o pior: você verá gente com menos talento que você conseguindo muito mais visibilidade. Por vezes, gente má intencionada estará diante dos holofotes, enquanto você desaparece nos bastidores. Na vida, às vezes as coisas funcionam como feijão na água: o podre é que sobe.
Se isso acontecer, “não te irrites por causa do homem que prospera em seu caminho, por causa do que leva a cabo os seus maus desígnios” (Sl 37:1).
No Reino de Deus a coisa é invertida: “... quem quiser ser o maior, seja aquele que sirva...” (Mc 10:43-44). O músico cristão deve ser como o Lombardi, famoso narrador do programa Silvio Santos. Ele fazia o que o patrão pedia, mas não aparecia. Quem ficava em evidência era sempre o patrão.
O músico talentoso precisa repetir e viver diariamente a afirmação de João Batista:
“Convém que ele cresça, e eu diminua” (Jo 3:30).
Não é fácil sair da frente dos holofotes, recusar-se a dividir a glória com o Senhor, especialmente se quem nos bajula é um grupo de queridos irmãos piedosos. Mas não brinque com isso:
- A finalidade do serviço cristão não é a glória de Deus e a minha (de carona).
- A finalidade de todo serviço cristão é SOMENTE a glória de Deus.
“Cada um exerça o dom que recebeu para servir os outros, administrando fielmente a graça de Deus em suas múltiplas formas. Se alguém fala, faça-o como quem transmite a palavra de Deus. Se alguém serve, faça-o com a força que Deus provê, de forma que em todas as coisas Deus seja glorificado mediante Jesus Cristo, a quem sejam a glória e o poder para todo o sempre. Amém” (1Pe 4:10-11).
A Deus seja a glória!
Isaac Malheiros (via Adoração Adventista)
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