Parece que Jesus está sempre na contramão dos nossos métodos. Sua atitude é sempre “politicamente incorreta”, contrariando aquilo que nós esperaríamos. Ele nunca “dourou a pílula” para seduzir, persuadir ou aliciar pessoas. Os que desejam segui-Lo, devem, de forma consciente e voluntária, tomar a cruz, símbolo de morte e crucifixão do eu.
Ao morrer, com grande brado, Jesus proclamou que Sua missão estava consumada. Em apenas três anos e meio, Ele realizou a maior obra de resgate do Universo. E, surpreendentemente, nós nunca O encontramos apressado ou afobado. Nas narrativas dos Evangelhos, Cristo Se move com extraordinária majestade e compostura. Ele Se move com extraordinário controle do tempo e das circunstâncias. Frequentemente Ele detém o Seu caminho, oferecendo-Se para curar e ouvir pessoas necessitadas. Nunca importante demais, nunca “graduado”, nunca afetado ou “superior”, para o contato com aqueles que O buscam: cegos, aleijados, enfermos, leprosos, pessoas possessas, mulheres e crianças, todos estes marginalizados dentro do sistema social e religioso dos judeus.
O método de que Jesus usou para cumprir Sua missão foi inovador e revolucionário. Ele não usou a propaganda para criar sentimento público positivo ou para Se promover. Não estabeleceu um exército para impor Suas ideias. Ele cumpriu o propósito de Sua visita ao planeta Terra sem depender de força, organizações, cultura, educação ou reforma. Dependeu apenas de um elemento intangível chamado “verdade”. Sua única credencial era Ele próprio.
Seus ensinos e Sua ética são verdadeiros paradoxos para nós: “Os primeiros serão os últimos”; “os mansos herdarão a terra”; “vivemos quando morremos”; “bem aventurados os pobres”; “grande é aquele que serve”. Nos ensinamentos de Jesus, a pirâmide do poder se encontra invertida, uma vez que, para a maioria de nós, os grandes são aqueles que se assentam no topo do poder, usualmente obtendo-o e conservando-o por manobras fisiologistas e esquemas políticos cujo objetivo é a imposição de sua vontade aos outros. Jesus viveu e ensinou algo diferente. Grande é aquele que coloca o seu ombro na base da pirâmide, para ajudar servir e ministrar aos mais fracos. Que rei se deixaria crucificar por seu povo? Os reis e todos aqueles que são dominados pela sedução do poder sacrificam os seus súditos. Que tipo de rei lavaria os pés dos seus servos, como fez Jesus? Que governante livremente se associaria com os mais humildes membros da sociedade? Pessoas em posição de poder secular ou religioso geralmente mantêm a mística da liderança, que, na compreensão deles, significa manter-se afastado daqueles a quem governam. A noção secular de grandeza parece impor a tais líderes o afastamento, a distância. E os conselheiros que normalmente eles escolhem os tornam duplamente cegos. Jesus não exibiu nenhuma dessas características exteriores do poder.
Aproximou-Se dos pobres e humildes. Partilhou de refeições com eles. No Evangelho de Lucas várias vezes O encontramos à mesa com os menos prováveis. Não é de surpreender que isso tenha escandalizado a muitos (Lucas 15:1). Jesus partiu o pão (berit) com os “déclassès”, símbolo de aceitação e do concerto que Ele veio estabelecer com aqueles que O recebem. Conversou com aqueles com quem ninguém falava. Tocou os intocáveis, alienados e marginalizados dos Seus dias. Reis, presidentes e governantes se cercam de toda sorte de servidores, prontos a atender às suas ordens e caprichos, mas Jesus não partilhou dessa mentalidade. Ele não tinha trono. Não tinha servos, mas amigos (João 15:15). Afirmou que a liderança verdadeira tem por base a amizade e o amor voluntário. Significativamente, no episódio em que João Batista mandou Lhe perguntar se era o Messias (Lucas 7:18-22), a credencial por Ele apresentada foi o serviço em favor dos necessitados.
A vida e a pessoa de Cristo, bem como Seu estilo paradoxal, são irresistíveis. Qualquer um que conversasse com Ele, saía coçando a cabeça, consideravelmente perturbado por Sua lógica desafiadora e perspectiva das coisas. Na maioria das vezes, os evangelhos O retratam fazendo em Seu ministério precisamente o oposto do que esperaríamos.
Em Seu encontro noturno com Nicodemos, registrado no Evangelho de João, Ele o surpreendeu ao desfazer com um só golpe todo o castelo da teologia farisaica desse importante líder judaico. Jesus não exibiu diante de Nicodemos aquela atitude de servilismo tão comum quando se tratava com pessoas importantes. Ele o tratou como um descrente, com uma necessidade fundamental, e exigiu dele o inesperado: “Você precisa nascer de novo” (ver João 3:7). O velho fariseu inicialmente se apresenta como “sabendo” (João 3:2), mas a partir do verso 4 começa a revelar sua ignorância, e do verso 10 em diante já está em completo silêncio, sendo Jesus quem realmente sabe (João 3:11).
No capítulo 4 desse mesmo Evangelho, Cristo tem Seu encontro com a mulher samaritana, uma figura ao mesmo tempo antiga e atual. No início da narrativa, é ela quem tem a água, e Jesus, quem tem a sede (João 4:7). No final, a mesa se inverte e é Jesus quem tem a água, e ela, a sede (João 4:13-14). Que mestre é esse?
Considere mais uma vez o Seu nascimento: numa manjedoura, um lugar completamente inadequado para o nascimento de um rei. Não merecia Ele algo melhor? Às vezes considero que se Cristo tivesse me consultado, eu poderia ter-lhe sugerido que fizesse uso do Seu poder, estalando os dedos e criando um hospital equipado com uma ala ultramoderna de obstetrícia. Mas Ele não me consultou, e nasceu em uma estrebaria. Ele poderia ter nascido em um grande centro, aumentado com isso a habilidade de as pessoas de se lembrarem dele. Mas, ao contrário, Ele escolheu a obscura Belém. Com isso, Ele evitou que as pessoas se intimidassem por causa de Seu local de nascimento. Fosse Ele cercado de realeza e sofisticação, isso afastaria milhões de seres humanos de Sua presença. E isso era precisamente o que Ele não queria! Observe os Seus pais. Ele escolheu nascer como um “bastardo”, marcado com o estigma da concepção fora do casamento. Se você quisesse ser reconhecido como Deus, certamente não escolheria esse tipo de origens. Entretanto, devido justamente a isso, milhões de pessoas humildes no mundo podem se aproximar dEle sem serem intimidadas.
A venerada pureza de sangue da tradição judaica foi completamente desconsiderada. Sua linha de ancestrais foi comprometida por Rute, a moabita, e por Raabe, uma cananita de baixa reputação. As pessoas em geral se orgulham de ancestrais importantes, tal como Adolph Hitler, que buscou criar a ideia de uma raça pura, formada pelos dolicocéfalos louros. Orgulho de pedigree, da força genética de ancestrais, é uma fantasia muito forte no imaginário popular. Mas esse surpreendente Jesus descartou a linhagem imaculada a fim de não intimidar a maioria das pessoas, que não pode se apresentar como o produto final de uma super-raça.
Em linguagem atual, Jesus seria um commoner, na tradição britânica de distinção de classe. Em harmonia com isso, veja ainda quem testemunha o Seu nascimento. Ele passa sobre o Templo, o Sinédrio e todas as celebridades da época, para Se anunciar a alguns pastores, pessoas não apenas simples, mas consideradas como de má reputação no judaísmo da época. Em uma palavra, Cristo não Se deixou enganar pela psicologia popular do sucesso, qualquer que fosse a área da vida. Aquilo que a maioria de nós consideramos tão importante, Ele afastou e descartou como desnecessárias, provando quão errados estamos com nossas superficialidades e deslumbramentos patéticos.
Jesus sempre viu as pessoas por um ângulo inteiramente diferente. Se Ele me tivesse consultado, provavelmente eu não aprovaria nenhum dos discípulos que Ele escolheu. Em Seu pequeno grupo, Ele reuniu um zelote (parte de um grupo de revolucionários radicais contra a presença romana), e um publicano (cobrador de impostos a serviço de Roma), uma combinação perigosíssima, com baixo ponto de ebulição. Mas isso torna evidente o profundo apelo de Cristo às pessoas, Seu magnetismo sobre elas, habilitando-as a conviver e superar as diferenças. Provavelmente eu teria demitido Pedro em sua primeira semana de trabalho, pois a vida dele indica que certamente sofria de várias disfunções psicológicas. Sua impulsividade certamente diminuía sua utilidade em, pelo menos, cinquenta por cento. Contudo, Jesus, além de o manter entre os doze, ainda lhe dá certa preeminência no grupo.
Sabe o que Jesus está dizendo a cada um de nós com esse grupo pouco encorajador? Ele está dizendo: “Se Eu posso trabalhar com estes, Eu posso trabalhar com você também”. Que encorajamento extraordinário! Na escolha dos Seus associados, Jesus não trabalhou com os critérios das grandes corporações, e não utilizou as normas de seleção das consultorias. Seu critério de escolha de pessoas está no limite de qualquer lógica, mas isso é absolutamente compatível com a Sua visão singular. O Seu grupo de associados seria motivo de riso para qualquer departamento de Recursos Humanos moderno. Um verdadeiro constrangimento. Mas, afinal, Jesus estava certo. Com esse grupo aparentemente pouco promissor transformado e habilitado (veja o Livro de Atos), Ele revolucionou o mundo. Com uma única exceção (Judas), todos se tornaram dispostos a assumir as últimas consequências do Seu compromisso com Ele.
Jesus escolhe a rota que só Ele mesmo pode entender. Sua abordagem é sempre não ameaçadora e não manipuladora. Sua estratégia está sempre na contramão dos nossos métodos. A partir do Seu tipo de critério, todos podem ter afinidade com Ele. Ele pode Se aproximar de nós, certo de que nossa resposta será honesta. Ele não utiliza nenhum método que coage as pessoas, porque Ele não aceita qualquer coisa menos que fé e dedicação genuínas. Aliás, o amor requer e aceita apenas resposta genuína. Em Seu estilo revolucionário, Jesus recusa qualquer forma de manipulação. E, devemos lembrar, a principal característica da manipulação é que ela destrói nossa habilidade de escolha.
Em geral nós tomamos pouquíssimas decisões autênticas na vida. A maioria de nossas escolhas são afetadas por forças e demandas exteriores. Mas quando nos aproximamos de Cristo, a mais importante decisão da vida, Ele busca e aceita apenas resposta autêntica. E quando Ele vem a nós, Sua abordagem desconcerta nossos preconceitos e nos liberta para tomar decisões profundamente autênticas. Nós podemos aceitá-Lo ou rejeitá-Lo, mas Ele Se recusa a violar nossa individualidade, o nosso poder de escolha. E isso é amor em sua melhor expressão, e, de fato, em sua única expressão verdadeira.
Amin Rodor (via O Incomparável Jesus Cristo, p. 108)
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