Foi-me mostrada esta Terra, escura e triste. Disse o anjo: "Olha atentamente!" Então foi-me mostrado o povo sobre a Terra. Alguns estavam rodeados de anjos de Deus, outros se achavam em completas trevas, cercados de anjos maus. Vi um braço estendido do céu, segurando um cetro de ouro. Na extremidade superior do cetro havia uma coroa, cravejada de brilhantes. Cada brilhante emitia luz, fulgurante clara e bela. Inscritas na coroa havia estas palavras: "Todos os que me conquistam são felizes, e terão vida eterna."
Embaixo dessa coroa havia outro cetro, e sobre ele também outra coroa, em cujo centro havia jóias, ouro e prata refletindo alguma luz. A inscrição sobre a coroa era: "Tesouros terrestres. Riqueza é poder. Todos os que me conquistam têm honra e fama." Vi uma vasta multidão que porfiava por alcançar essa coroa. Faziam grande rumor. Alguns, em sua avidez, pareciam privados da razão. Empurravam-se uns aos outros, deixando para trás os mais fracos, pisando sobre os que, na pressa, caíam. Muitos avidamente se apoderavam dos tesouros que estavam na coroa, e os seguravam firmemente. A cabeça de alguns era branca como a prata, e seu rosto estava enrugado pelos cuidados e ansiedade. Não tomavam em consideração seus próprios parentes, ossos de seus ossos e carne da sua carne; mas, enquanto para eles eram lançados olhares súplices, mais firmemente seguravam seus tesouros, como se estivessem receosos de que num momento de descuido perdessem um pouco, ou fossem induzidos a reparti-los com eles. Seus olhares ávidos muitas vezes se fixavam na coroa terrestre, e contavam e recontavam seus tesouros.
Vultos que exprimiam necessidade e miséria, apareciam naquela multidão, olhavam cobiçosos os tesouros, e voltavam sem esperanças, visto que os mais fortes sobrepujavam e afastavam os mais fracos. Contudo não podiam assim desistir; mas, com uma multidão de deformados, doentes, idosos, procuravam avançar para a coroa terrestre. Alguns morriam ao tentar alcançá-la; outros sucumbiam precisamente no ato de se apoderarem dela. Muitos morriam, pouco depois que se haviam dela apossado. Cadáveres juncavam o solo; todavia a multidão avançava, pisando os que estavam caídos e o cadáver de seus companheiros. Cada um que atingia a coroa, adquiria parte nela, e era ruidosamente aplaudido pela multidão interessada que se achava em redor.
Uma grande multidão de anjos maus estava ocupadíssima. Satanás estava no meio deles, e todos olhavam com a maior satisfação para a multidão que lutava pela coroa. Ele parecia lançar um encanto particular sobre os que avidamente a buscavam.
Muitos que procuravam essa coroa terrestre eram cristãos professos. Alguns pareciam ter alguma luz. Olhavam interessados para a coroa celestial, e pareciam muitas vezes encantar-se com sua beleza, contudo não tinham o verdadeiro senso de seu valor e glória. Enquanto timidamente estendiam uma das mãos à coroa celeste, a outra estendiam-na avidamente à terrestre, decididos a possuí-la; e na sua diligência ansiosa por obter a terrestre, perdiam de vista a celeste. Ficavam em trevas, e mesmo assim andavam às apalpadelas, com ansiedade, buscando conseguir a coroa terrestre.
Alguns se desgostavam da multidão que a procurava tão veementemente; pareciam ter intuição de seu perigo, e dele se desviavam, e diligentemente buscavam a coroa celestial. O rosto desses logo mudava de escuro para claro, de triste para prazenteiro e cheio de santa alegria.
Vi então um grupo, comprimindo-se por entre a multidão, tendo os olhos atentamente fixos na coroa celestial. Enquanto com esforço procuravam caminho por entre a multidão desordenada, ajudavam-nos anjos, que abriam caminho para que avançassem. Aproximando-se eles da coroa celestial, a luz que dela provinha resplandecia sobre eles e em redor deles; afugentava as trevas, e tornava-se mais clara e brilhante, até que eles pareciam transformar-se e assemelhar-se aos anjos. Não se detinham em olhar para a coroa terrestre. Os que estavam se empenhando na conquista da coroa terrestre, escarneciam deles, e atiravam-lhes bolas pretas pelas costas. Essas não lhes faziam mal contanto que seus olhos se mantivessem fixos na coroa celestial; aqueles, porém, que volviam a atenção para as bolas negras, eram por elas manchados. Foi-me apresentado o seguinte texto:
"Não ajunteis tesouros na Terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam; mas ajuntai tesouros no Céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração. A candeia do corpo são os olhos; de sorte que, se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo terá luz; se, porém, os teus olhos forem maus, o teu corpo será tenebroso. Se, portanto, a luz que em ti há são trevas, quão grandes serão tais trevas! Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de odiar um e amar o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e a Mamom" (Mt 6:19-24).
Então o que eu vira me foi explicado como segue:
A multidão que tão avidamente se esforçava por alcançar a coroa terrestre, eram os que amam os tesouros deste mundo e se deixam enganar e lisonjear por suas efêmeras atrações. Alguns vi que, embora professem ser seguidores de Jesus, têm tanta ambição de obter os tesouros terrestres, que perdem o amor ao Céu, agem como o mundo, e por Deus são considerados mundanos. Professam buscar uma coroa imortal, um tesouro nos Céus; mas seu interesse e principal empenho é adquirir tesouros terrestres. Aqueles que têm seus tesouros neste mundo e amam suas riquezas, não podem amar a Jesus. Poderão supor que são justas e, ainda que com garras de avarento se apeguem a suas posses, não poderão ser levados a enxergar isso ou compreender que amam o dinheiro mais do que a causa da verdade ou o tesouro celeste.
"Se, porém, os teus olhos forem maus, o teu corpo será tenebroso" (Mt 6:23). Houve um momento na experiência de tais pessoas, em que a luz que lhes fora dada não foi mantida, e se tornou em trevas. Disse o anjo: "Não podeis amar e adorar os tesouros da Terra, e ter as verdadeiras riquezas."
Quando aquele jovem foi ter com Jesus e Lhe disse: "Bom Mestre, que farei para herdar a vida eterna?" (Mc 10:17). Jesus lhe ofereceu esta escolha: Desfazer-se de suas posses e ter a vida eterna, ou reter aquelas e perder estas.
Suas riquezas lhe eram de maior valor do que o tesouro celeste. A condição de desfazer-se de seus tesouros e dá-los aos pobres a fim de se tornar seguidor de Cristo e ter a vida eterna, esfriou-lhe o desejo, e ele se retirou, triste.
Aqueles que me foram apresentados como estando sequiosos pela coroa terrestre, são os que recorrerão a todos os meios para adquirir propriedades. Tornam-se doidos neste sentido. Todos os seus pensamentos e energias se dirigem para a aquisição de riquezas terrestres. Pisam os direitos de outrem, oprimem os pobres, e o jornaleiro em seu salário. Se podem ter vantagem sobre os que são mais pobres e menos sagazes, e assim agir de maneira a aumentar suas riquezas, não hesitarão um momento em oprimi-los, e mesmo vê-los levados à mendicidade.
Os homens encanecidos pela idade, e de rosto enrugado pelos cuidados, e que no entanto avidamente agarravam os tesouros de dentro da coroa, eram homens idosos, que poucos anos tinham diante de si. Contudo eram inflexíveis na defesa de seus tesouros terrestres. Quanto mais se aproximavam do túmulo, tanto mais ansiosos ficavam em apegar-se a eles.
Seus próprios parentes não eram beneficiados. Para economizar um pouco de dinheiro, consentiam que os membros de sua própria família trabalhassem além de suas forças. Não o empregavam para o bem dos outros, nem para o seu próprio bem. Bastava-lhes saber que o possuíam. Ao ser-lhes apresentado o dever de suprir as necessidades dos pobres e de sustentar a causa de Deus, ficavam desgostosos. Alegremente aceitariam o dom da vida eterna, mas não quereriam que lhes custasse coisa alguma. As condições são muito penosas. Mas Abraão, para tal fim não recusou o seu único filho. Em obediência a Deus, sacrificaria esse filho da promessa, mais facilmente do que muitos sacrificariam algumas de suas possessões terrestres.
Era doloroso verem-se aqueles que deveriam estar a amadurecer para a glória e a habilitar-se diariamente para a imortalidade, aplicando todas as suas forças na retenção de tesouros terrestres. Vi que esses tais não poderiam dar valor ao tesouro celestial. Seu apego intenso às coisas terrenas, leva-os a mostrar pelas suas obras que não estimam a herança celestial o bastante para por ela fazer qualquer sacrifício. O "jovem" manifestou vontade de guardar os mandamentos, contudo nosso Senhor lhe disse faltar alguma coisa. Desejava a vida eterna, mas amava mais as suas possessões. Muitos se enganam a si mesmos. Não buscam a verdade como se fosse um tesouro escondido. Não tiram o melhor partido possível de suas faculdades. Sua mente, que poderia iluminar-se com a luz do Céu, fica perplexa e perturbada. "Os cuidados deste mundo, e os enganos das riquezas, e as ambições de outras coisas, entrando, sufocam a palavra, e fica infrutífera." "Tais pessoas", disse o anjo, "estão sem desculpa." Vi a luz desvanecendo-se delas. Não desejavam compreender as solenes e importantes verdades para este tempo, e achavam que estavam bem sem as compreender. A luz se foi deles, e ficaram às apalpadelas, em trevas.
A multidão dos deformados e doentes que se comprimia para alcançar a coroa terrestre são aqueles cujos interesses e tesouros estão neste mundo. Conquanto de todos os modos sofram desenganos, não colocarão suas afeições no Céu, nem assegurarão para si naquele lugar um tesouro e um lar. Fracassam na busca das coisas terrestres, e no entanto perdem as celestiais enquanto pelejam por aquelas. Apesar do desengano, vida infeliz e morte daqueles que puseram todo o seu empenho na obtenção de riquezas terrestres, outros seguem o mesmo caminho. Atiram-se doidamente, sem tomar em consideração o fim miserável daqueles cujo exemplo estão seguindo.
Os que alcançaram a coroa e nela obtiveram parte, tendo por isso sido aplaudidos, são aqueles que conseguem o que constitui o único objetivo de sua vida: riquezas. Recebem a honra que o mundo confere aos que são ricos. Têm influência no mundo. Satanás e seus anjos maus estão satisfeitos. Sabem que esses são certamente deles, e que enquanto viverem em rebelião contra Deus, são poderosos agentes de Satanás.
Os que se desgostaram com a multidão que clamava pela coroa terrestre, são aqueles que notaram a vida e o fim de todos os que se esforçam por conseguir riquezas terrestres. Vêem que esses tais nunca estão satisfeitos, mas são infelizes; assustam-se e se separam daquela classe infeliz, e procuram as riquezas verdadeiras e duráveis.
Quanto àqueles que forçam por passar através da multidão a fim de obter a coroa celeste, auxiliados pelos santos anjos, foi-me mostrado serem o fiel povo de Deus. Os anjos os conduzem, e eles são inspirados com zelo a fim de se esforçarem para prosseguir na aquisição do tesouro celeste.
As bolas pretas que eram atiradas às costas dos santos, eram as falsidades infamantes postas em circulação contra o povo de Deus, por aqueles que amam e praticam a mentira. Deveríamos ter o máximo cuidado em viver vida irrepreensível, e abster-nos de toda aparência do mal; e então é nosso dever avançar destemidamente, sem dar atenção às faculdades degradantes dos ímpios. Enquanto os justos mantiverem os olhares fixos no tesouro celeste e inapreciável, tornar-se-ão mais e mais semelhantes a Cristo, e assim estarão transformados e dispostos para a trasladação.
[Vidas e Ensinos, cap. 27, pp. 161-167]
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