Não é novidade que os irlandeses são muito bem representados na literatura mundial. Ora vejam lá: Joyce, Wilde, Beckett… Terras tão cristãs que a sua doutrina influenciou não somente a literatura de um homem, como também todo o seu curso em vida. Não se trata de religiosidade, mas sim de um homem cujo espírito era inquieto. Não se trata de fé cega, mas sim de um homem que quis entender essa fé que insistiu em bater-lhe ao peito e cravar-se-lhe na mente. E partilhou suas questões e visões do mundo a partir da rocha doutrinária que um dia apeteceu seu coração. Este é um retrato possível do irlandês C. S. Lewis.
Se os céticos julgam C. S. Lewis pela sua insistência em revirar o cristianismo em suas linhas, culpem outro gênio: J. R. R. Tolkien, autor de O Senhor dos Anéis (The Lord of the Rings). Pois foi ele quem converteu Lewis – seu amigo íntimo – à fé cristã. Os dois se conheceram na University College, em Oxford, e tornaram-se inseparáveis, influenciando um ao outro ao longo de suas vidas.
Há quem muito se incomode com a preferência espiritual de alguns autores. Cá entre nós, isso não tem a menor importância quando se trata da competência literária desses autores. Uma pena, no entanto, que Lewis foi ofuscado por seu querido amigo. E sabia que assim seria ao se arriscar na esfera religiosa, ainda que de maneira abstêmia e serena. No caso de C. S. Lewis, competência é um termo tímido ao referir-se ao legado que nos deixou. Pensamentos, estudos, ensaios e uma rica literatura que trata de forma brilhante as questões mais complexas: as relações do homem com o próximo, com Deus, com a natureza e consigo mesmo.
Um homem inteligente como C. S. Lewis tinha de ter uma imaginação monstruosa. E foi com ela que conseguiu unir dois universos de maneira sutil e inesperada, ao escrever a série As Crônicas de Nárnia (The Chronicles of Narnia) – baseada na doutrina cristã. Não se trata de literatura cristã, mas contém referências bíblicas ao longo de toda a narrativa da terra mágica de Nárnia.
As histórias são tão sensacionais – não somente pela criatividade do autor, como também pela sua propriedade literária – que renderam a Lewis o título de um dos maiores escritores do século XX. Obtiveram sucesso desde o lançamento do primeiro de sete volumes, em 1950. Da série já se venderam 100 milhões de cópias, em mais de 40 idiomas, ao redor de todo o mundo.
O que chama a atenção em Lewis é a serenidade e seriedade com a qual trata a espiritualidade. Mesmo sendo ávido por entender sua própria fé, e o Deus no qual acreditava, Lewis não usava sua pena para a pregação, mas sim para dialogar acerca de suas particulares impressões e crenças à luz bíblica. E, obviamente, compartilhou seus entendimentos e dúvidas não somente com os cristãos, mas com um público além dos limites do cristianismo.
Dizia que não se pode acreditar em algo que não se conhece; não se pode adorar a um Deus se dEle nada se sabe. Da mesma forma que afirmava ser incoerente criticar e negar a um Deus se, do mesmo modo, nada se sabia sobre Ele. E, desse modo, com o estudo bíblico fundamentou todos os argumentos de uma vida admirável. Sua célebre frase: “Você não tem uma alma. Você é uma alma. Você tem um corpo.” fundamentou sua obstinação por entender sua fé e, assim, cuidar de seu espírito.
Mas sua influência foi além da fronteira religiosa e espiritual, como um notável intelectual da teologia. Dedicou-se à crítica literária e aos estudos acadêmicos, ocupando a cadeira de Literatura Medieval e Renascentista na Universidade de Cambridge, com uma respeitável carreira.
Dos livros, a imaginação de Lewis foi parar nos cinemas, com a série As Crônicas de Nárnia, sendo o primeiro volume o fantástico O Leão, o Guarda-Roupa e a Feiticeira. Também para o cinema, em 1993, o ator Anthony Hopkins interpretou C. S. Lewis no longa britânico Shadowlands.
Suas obras continuam a atingir um vasto público. Seus principais escritos incluem Fora do Planeta Silencioso, Os Quatro Amores, As Cartas do Inferno, e Cristianismo Puro e Simples.
Lewis morreu em novembro de 1963. Seu túmulo está no pátio da Igreja da Santíssima Trindade, em Headington Quarry, Oxford. Em seu túmulo está escrito: “Os homens devem suportar as partidas”.
C. S. Lewis passou de um convicto ateu a um dos escritores cristãos mais influentes do século XX. Enfrentava suas próprias guerras espirituais com distinta coragem, desafiou uma fé que excede toda a compreensão, foi generoso com seu conhecimento, partilhando-o num legado de sabedoria. E, mais espetacular, frequentava pubs ao lado de Tolkien. Foi, de fato, uma bela caminhada: “Eu pensava que nós seguíamos caminhos já feitos, mas parece que não os há. O nosso ir faz o caminho.” (C. S. Lewis)
Assista ao documentário > C. S. Lewis - Do ateísmo ao teísmo
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