Em minhas jornadas como palestrante, percebo que muitos membros da igreja têm dificuldade para conciliar certas passagens da Bíblia com os conselhos de Ellen White referentes ao consumo de carne. Alguns admitem que não foi propósito de Deus que os animais servissem de alimento, o que está explícito na dieta dos seres humanos (Gênesis 1:29) e na dieta dos animais (Gênesis 1:30). Eles observam que, depois do dilúvio, o Senhor permitiu o consumo de alimentos de origem animal (Gênesis 9:3), até indicando quais poderiam ser utilizados (Levítico 11). Aqui parece haver uma incontestável contradição entre a Bíblia e os escritos de Ellen White. Como resolver a tensão?
O problema na compreensão correta desse assunto está no fato de que ele sempre foi discutido do ponto de vista higiênico e dietético, o que se tornou um desvio do verdadeiro foco do debate. Em nossa época, a questão do consumo de carne transcende a questão dietética.
Muitos se esquecem de que, ao longo da história do povo de Deus, houve ocasiões em que foi necessária uma “verdade presente” para determinado tempo. Por exemplo, do dilúvio até 1863, quando foi dada a visão da reforma de saúde, as exigências para esse período se cumpriram perfeitamente mediante as orientações inseridas no Pentateuco, como saneamento básico, cuidados com a água contaminada, isolamento do enfermo contagioso, cuidado no manuseio de cadáveres, precauções com os fluidos corporais, prevenção contra enfermidades venéreas, higiene e segurança alimentar, entre outras coisas. Porém, nos últimos 150 anos, surgiram fatores adversos com relação ao consumo de alimentos de origem animal que não existiam no passado. Essa é a razão pela qual Deus deu à sua igreja luz adicional para um tempo especial – o tempo do fim.
Em meados do século 19, cem anos depois de iniciada a revolução industrial, toda a tecnologia adquirida durante aquele período começou a ser aplicada tanto na agricultura como na pecuária para a produção de alimentos em grande escala. O resultado foi a redução de nutrientes dos alimentos agrícolas por meio do processamento industrial. Ao mesmo tempo, as técnicas modernas antinaturais de engorda de animais começaram a apresentar muitos problemas para o consumo humano. A produção em alta escala tornou esses alimentos mais baratos, o que levou a população a consumi-los em grandes quantidades, abrindo as portas para uma série de enfermidades, como diabetes, hipertensão, problemas coronários e obesidade.
Outro aspecto negativo da produção de alimentos de origem animal em grande escala é o impacto na disponibilidade de alimentos para o consumo humano. Quando criamos animais para alimentar seres humanos, estamos na realidade criando competidores pelos nossos próprios alimentos. Ocorre que, para cada 10 kg de proteína vegetal que investimos na criação de um animal, recebemos apenas 1 kg de proteína animal no abate. Essa diferença representa, no mundo, 65 milhões de toneladas de grãos que poderiam ser colocados no mercado diretamente para o consumo humano, reduzindo drasticamente a fome no planeta.
Poderíamos ainda acrescentar como fatores adversos que não existiam no passado o desmatamento descontrolado, a crueldade nos processos de cria e abate e a contaminação dos lençóis freáticos.
Para o antigo Israel, a reforma de saúde com relação aos alimentos de origem animal era uma questão higiênica e dietética, mas para o Israel moderno se tornou também uma questão profética. Deus, que tudo vê e tudo sabe, deixou uma luz adicional sobre a reforma de saúde para nosso tempo, com o objetivo de proteger a igreja remanescente desses fatores adversos, preservando assim sua saúde física, mental e espiritual.
Silmar Cristo é médico, consultor e autor de vários livros sobre saúde e qualidade de vida
Fonte: Revista Adventista
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