A Verdade saindo do poço armada do seu chicote para castigar a humanidade (no original: La Vérité sortant du puits armée de son martinet pour châtier l'humanité)
A pintura acima, de 1806, é de autoria do artista francês
Jean-Léon Gérôme, e pertence às coleções do museu
Anne-de-Beaujeu, em Moulins, na França. A obra está ligada ao texto abaixo
que é atribuído a uma parábola judaica sobre a Verdade e a Mentira. Por
certo, reproduz muitas das situações que diariamente enfrentamos em nosso
cotidiano, em que os cenários que se nos apresentam nem sempre são
aquilo que aparentam ser. Ei-la, pois!
Certa vez, a Mentira e a Verdade se encontraram.
A Mentira, dirigindo-se à Verdade, disse-lhe:
– “Bom dia, dona Verdade!”
Zelosa de seu caráter, a Verdade,
ouvindo tal saudação, foi conferir se realmente era um bom dia. Olhou
para o alto, não havia nuvens de chuva; os pássaros cantavam; não havia
cheiro de fumaça na mata; tudo parecia perfeito.
Tendo se assegurado de que realmente era um bom dia, respondeu:
– “Bom dia, dona Mentira!”
– “Está muito calor hoje, não é mesmo”, disse a Mentira.
Realmente o dia estava quente demais.
Desse modo, vendo que a Mentira estava sendo sincera, começou a relaxar,
a “baixar a guarda”. Por qual razão haveria de desconfiar, se a Mentira
parecia tão cordial e “verdadeira”?
Diante do calor insuportável, a Mentira, num gesto de aparente amizade, convidou a Verdade para juntas banharem-se no rio.
Como não havia mais ninguém por perto, a
Mentira despiu-se de suas vestes, pulou na água e, dirigindo-se à
Verdade, disse-lhe, insistentemente:
– “Vem, dona Verdade, a água está uma delícia, simplesmente maravilhosa.”
O convite parecia irrecusável. Assim
sendo, dona Verdade, sem duvidar da Mentira, despiu-se de suas vestes,
pulou na água e deu um bom mergulho.
Ao ver que a Verdade havia saltado na
água, rapidamente a Mentira pulou para fora, em segundos vestiu-se com
as roupas da Verdade que estavam à margem e se mandou sorrateira.
Tendo suas roupas furtadas, a Verdade
saiu da água e, por sua vez – ciosa de sua reputação -, recusou-se a
vestir-se com as roupas da Mentira, deixadas para trás.
Certa de sua pureza e inocência, nada
tendo do que se envergonhar e não tendo outra opção que lhe fosse
coerente, saiu nua a caminhar na rua.
Desde então, aos olhos das pessoas,
ficou mais fácil aceitar a Mentira vestida com as roupas da Verdade do
que aceitar a Verdade nua e crua.
Nietzsche escreveu: “(...) o homem também quer apenas a verdade. Ele
quer as consequências agradáveis da verdade, que conservam a vida; (...)
frente às verdades possivelmente prejudiciais e destruidoras ele se
indispõe com hostilidade, inclusive.” Parece absurdo. Entretanto a
observação nos faz concordar com o filósofo. A verdade preferida é a que
supre a necessidade emocional e/ou espiritual. A verdade que fere,
magoa e entristece não é essencial e, inclusive é evitada (“o que os
olhos não vêm o coração não sente”, “fulano não está preparado para
ouvir a verdade”, “a verdade dói”). Isso é bem visível nas relações
diárias.
Suprimir a verdade acaba gerando a superficialidade. Comentários
superficiais, relações humanas superficiais, religião superficial. Falar
o que é preciso ser dito é fundamental para estabelecer uma relação de
confiança. O que se vê, no entanto, são relações baseadas em
meias-verdades. Diz-se o agradável, suprime-se o desagradável. Assim é
que colocamos nossas ‘máscaras’. Na Bíblia, no entanto, a verdade é dita
doa quem doer. Por mais politicamente incorreto que possa ser, dizer a
verdade é a única forma de libertação do ser humano.
Jesus não apenas dizia a verdade (de maneiras distintas – ora exaltado
com um chicote na mão e chamando certas pessoas de ladrões, ora
conversando tranquilamente de madrugada com um rico medroso), Ele vivia a
verdade, Ele é a verdade. “Eu Sou o Caminho, a Verdade e a Vida” (João
14:6). “Conhecereis a Verdade e ela vos libertará” (João 8:32).
Uma realidade é que ao passarmos a viver com e na Verdade, nossas
máscaras tendem a cair, a superficialidade dos nossos relacionamentos
tendem a sumir, não porque saímos a apontar erros e defeitos verdadeiros
nos outros, mas porque a Verdade falará por nós e em nós.
Dê um fim na superficialidade dos seus relacionamentos e nas
meias-verdades que conduzem sua vida. Busque a Verdade, ainda que doa no
início.
"Quantas vezes o orgulho, a paixão, o ressentimento pessoal, dão cores à
impressão transmitida! Um olhar, uma palavra, a própria entonação da
voz, podem estar cheios de mentira. Mesmo os fatos podem ser declarados
de modo a dar uma falsa impressão. E o que passa da verdade é de
procedência maligna. Tudo quanto os cristãos fazem deve ser tão
transparente como a luz do Sol. A verdade é de Deus; o engano, em todas
as suas múltiplas formas, é de Satanás; e quem quer que, de alguma
maneira, se desvia da reta linha da verdade, está-se entregando ao poder
do maligno. Não é, todavia, coisa leve ou fácil falar a exata verdade; e
quantas vezes opiniões preconcebidas, peculiares disposições mentais,
imperfeito conhecimento, erros de juízo, impedem uma justa compreensão
das questões com que temos de lidar! Não podemos falar a verdade, a
menos que nossa mente seja continuamente dirigida por Aquele que é a
verdade" (Ellen G. White - O Maior Discurso de Cristo, p. 68).
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