quinta-feira, 30 de março de 2023

VAIDADE

Você já deve ter percebido que, com o tempo, nossas palavras vão sendo ressignificadas. É interessante notar que algumas palavras que anteriormente tinham um significado negativo, hoje assumem um teor positivo. Por exemplo, será que a vaidade ainda carrega um significado negativo? Será que o orgulho ainda é considerado o maior dos pecados?

Babilônia
Na arte ocidental, a vaidade é frequentemente representada por um pavão. Na Bíblia, ela é simbolizada por uma prostituta, Babilônia, pesadamente coberta de joias e adornos (ver ao lado). Na alegoria secular, a vaidade é entendida como um dos vícios humanos. Na Renascença, a vaidade foi representada por uma mulher reclinada num sofá, com um espelho, penteando os cabelos. Outros símbolos da vaidade incluem joias, moedas de ouro, uma carteira e frequentemente a figura da própria morte.

Arte de Hyeronymus Bosch
Em sentido bíblico original, a “vaidade” não se referia primariamente à obsessão pela aparência, mas à falta final de significado dos esforços humanos. Omnia Vanitas, tudo é vaidade, tornou-se, contudo, um objeto da arte. Em sua lista dos Sete Pecados Mortais, Hyeronymus Bosch representa a vaidade como uma mulher da burguesia se admirando num espelho, sustentado pelo próprio diabo (ilustração ao lado). Por trás dela, encontra-se uma caixa de joias aberta. A famosa pintura de Vermeer, A Garota com um Brinco de Pérola (ilustração abaixo), também é considerada um símbolo do pecado da vaidade, com uma jovem se adornando diante de um espelho, sem qualquer outro atributo alegórico positivo.

Arte de C. Allan Gilbert
Talvez a mais impressionante peça de arte retratando a vaidade humana seja o quadro de C. Allan Gilbert (ilustração ao lado). Uma bela e bem vestida mulher da nobreza está assentada em seu toucador, repleto de objetos ligados à luxúria, perfumes e cosméticos, iluminada por uma vela à direita. Mas o quadro é no fundo uma ilusão de ótica. Bem observado, ele é uma caveira, que reflete a moça, aparentemente enamorada de sua figura no espelho. No filme O Advogado do Diabo, Satanás, representado por Al Pacino, observa que “a vaidade é seu pecado favorito”.

Arte de Vermeer
Todas essas obras artísticas servem para advertir seus observadores sobre a natureza efêmera da juventude e da beleza, bem como da brevidade da vida humana e da inevitabilidade da morte. Vale lembrar também que os conselhos bíblicos, inclusive os relacionados à vaidade, foram escritos para ambos os sexos. A vaidade está sim impregnada no universo feminino, mas não isenta o masculino em momento algum!

Depois de Salomão mencionar seus grandes feitos e sua busca hedonista pelo prazer, concluiu: “E eis que tudo era vaidade e correr atrás do vento, e nenhum proveito havia debaixo do sol” (Ec 2:11). Nesse verso, ele resumiu o conceito de fugacidade existencial na palavra “vaidade”. O trocadilho é evidente, considerando o fato de que o termo hebraico hevel, traduzido como “vaidade”, significa literalmente “sopro”, “vapor”. Tudo é vaidade porque tudo é transitório, uma concepção materializada na breve e angustiante existência de Abel, cujo nome hebraico também é hevel (ver Gn 4:1-11).

No que você pensa na maior parte do tempo? Uma vez me falaram que este é o seu deus. Se você pensa em moda e beleza na maior parte do tempo, elas são o seu deus. Se você pensa mais que tudo em trabalho, ele é o seu deus. Se você pensa em você mesmo na maior parte do dia, você é o seu próprio deus. Tudo isso é vaidade. Mas se seus pensamentos são dominados primeiramente pelo amor e pela missão, fique feliz: seu deus é o Deus do Céu. E isso não é, nem de longe, como correr atrás do vento.

Os cristãos são convidados a remar contra a maré, a mostrar essa nobreza superior acima das determinações sociais e do espírito da época: “E não vos desvieis; pois seguiríeis as vaidades, que nada aproveitam, e tampouco vos livrarão, porque vaidades são” (1Sm 12:20, ARC). Sabemos que todos os troféus e conquistas humanos, todos os deuses pessoais e sociais não passam de vaidade. O texto bíblico nos diz: “Nossos pais herdaram só mentiras e vaidade, em que não havia proveito. Porventura fará um homem deuses para si, que contudo não são deuses?” (Jr 16:19, 20, ACF).

Se do ponto de vista humano a vida parece fútil, por outro lado, resgatada por Deus, ela pode ter um extraordinário significado, servindo aos Seus propósitos e exaltando Sua glória. A escolha desse significado, somos nós que fazemos.

Veja esta importante advertência de Ellen G. White: "A vaidade e a presunção estão matando a vida espiritual. O eu é exaltado; fala-se sobre o eu. Oh! se morresse esse eu! 'Cada dia morro' (1Co 15:31), disse o apóstolo Paulo. Quando esta orgulhosa, jactanciosa presunção, e esta complacente justiça própria permeiam a alma, não há lugar para Jesus. É-Lhe dado um lugar inferior, ao passo que o eu incha em importância, e enche todo o templo da alma. Eis a razão por que o Senhor pode fazer tão pouco por nós. Quando o eu estiver escondido em Cristo, não será tantas vezes trazido à tona" (Testemunhos Seletos vol. 2, p. 210).

Ao olharmos para nossa sociedade, em uma concorrência de vaidades, vemos que onde há separação de Deus, há a divinização do “eu”. O mundo entrou de tal forma em um fervor de vaidades que pode-se procurar com lupa uma classe nobre que não seja vítima dessa realidade. Parece que todos caíram dentro da mesma fogueira das vaidades.

Qual é a alternativa? Para quem correremos então? Para Deus, o único que pode nos conceder nobreza espiritual e uma vida espiritual capaz de resistir às tentações vaidosas de nosso tempo. Se ouvirmos Sua voz, haverá uma decisão voluntária a favor do que é eterno e uma indiferença diante das vaidades humanas.

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