terça-feira, 18 de abril de 2023

O INFERNO EXISTE?

Há séculos, cristãos têm pregado sobre um inferno de fogo queimando continuamente e alguns têm uma imaginação fértil ao retratar horríveis descrições de pessoas sofrendo enorme dor sem terem, ao menos, a misericordiosa possibilidade de morrer. O resultado é que alguns ficam apavorados e seguem a Deus por medo, enquanto outros se afastam dEle completamente. 

Ellen G. White afirma: “Quão repugnante a todo sentimento de amor e misericórdia, e mesmo ao nosso senso de justiça, é a doutrina de que os ímpios mortos são atormentados com fogo e enxofre num inferno eternamente a arder; que pelos pecados de uma breve vida terrestre sofrerão tortura enquanto Deus existir! Contudo esta doutrina tem sido largamente ensinada, e ainda se acha incorporada em muitos credos da cristandade” (O Grande Conflito, p. 535).

O que a Bíblia realmente ensina sobre o inferno?

Primeiro, as Escrituras falam sobre o inferno. Porém, precisamos ouvir as Escrituras em seus próprios termos. Quando Jesus falou sobre o inferno, estava Se referindo à punição para pecadores não arrependidos. Uma punição que terminará em fogo eterno e destruição (João 3:16; Mateus 7:13, 14; 25:31, 32, 41). Destruição/fogo eterno é um evento futuro relacionado com a segunda vinda de Cristo. Então “inferno” é algo que ainda está por vir.

Segundo, alguns tradutores da Bíblia têm traduzido várias palavras, que possuem na realidade outros significados, como sendo “inferno”.

O termo hebraico sheol e seu correlativo no grego hades significam o lugar dos mortos que estão na sepultura. Veja o uso do termo nos seguintes casos. Jacó esperava descer ao sheol – sepultura –,junto com seu filho José. Ele não esperava que seu amado filho estivesse no inferno, ou que ele mesmo fosse para lá (Gênesis 37:35). Deus faz descer à sepultura e faz subir de lá (1 Samuel 2:6). Isto não se encaixa com o pensamento cristão popular sobre o inferno. No sheol – sepultura – não há atividade, planos e nenhum conhecimento (Eclesiastes 9:10). Não há fogo nem tormento. O justo e o injusto são encontrados lá. No hades há deterioração. Jesus foi a exceção (Atos 2:27, 31). Sheol e hades são, portanto, o lugar dos mortos e não o inferno.

“Lançar no tártaro” aparece somente em 2 Pedro 2:4 e se refere ao domicílio dos anjos caídos. O termo não é usado para descrever o lugar dos mortos ou um inferno no qual pessoas são lançadas após a morte.

*Gehenna é o inferno sobre o qual Jesus falou. Esse é o lugar de punição do injusto, também associado com fogo (Marcos 9:43). Esse fogo virá no fim dos tempos com um juízo divino contra o pecado, pecadores e Satanás (Mateus 25:41). Ate lá, os mortos “dormem” em suas sepulturas. Apocalipse 20:9, 10 e 15 fala sobre o lago de fogo no qual, depois do milênio, os injustos são queimados. Considerando que gehenna está relacionado com fogo e é um evento futuro associado com um julgamento, o melhor é entender o inferno no contexto de Apocalipse 20. Este é o inferno do qual Jesus nos advertiu.

Terceiro, durará o futuro inferno “para todo o sempre?” (Apocalipse 20:10 – NVI). O significado do termo para sempre/eterno/eternidade usado nas Escrituras é muito mais amplo do que entendemos. Pode descrever: (a) alguma coisa ou alguém existindo sem um início ou sem um fim (em conexão com Deus); (b) alguma coisa ou alguém com um início, mas sem um fim (a vida eterna dos redimidos, ver João 5:24; Apocalipse 21:3, 4); e (c) alguma coisa ou alguém com início e com um fim no sentido de “por algum tempo” (Êxodo 21:5, 6; Jonas 1:17; 2:6). Em relação ao termo inferno, a expressão para todo o sempre deve ser compreendida de acordo com o terceiro caso. Por quê? Embora o injusto sofra o inferno por um limitado período de tempo, seu resultado é eterno. O fogo os “devora” (Apocalipse 10:9). Essa é a segunda morte (Apocalipse 20:14, 15). O inextinguível fogo de Mateus 3:12 não pode ser extinto até que seu trabalho esteja completo e tudo seja queimado (Mateus 13:40-42; Jeremias 17:27).

Finalmente, a vida eterna está disponível somente para os que pertencem a Jesus, e não para aqueles que fizeram uma decisão contra Ele e Deus. Além disso, Satanás também será destruído e eliminado completamente no fogo do inferno (Mateus 25:41; Apocalipse 20:10).

Assim, as Escrituras falam sobre o inferno, mas isto está ainda no futuro e terá duração limitada. Deus não é tirano. Pelo contrário, Ele é um Deus de amor e justiça e em Seu reino não haverá mais sofrimento, dor, tristeza ou morte (Apocalipse 21:3, 4).

Ekkehardt Mueller (via Diálogo)

*Nota: Confira a seguir, Ángel Manuel Rodríguez explanando sobre a trajetória do uso do substantivo Gehenna que nos mostra como um termo geográfico passou a designar um lugar de julgamento dos ímpios:

1. Gehenna como um termo geográfico. O termo grego geenna, do qual veio Gehenna, é uma transliteração do termo hebraico gê hannôm, que significa “Vale de Ben-Hinom”. Esse era um vale literal localizado na região sul de Jerusalém que servia de fronteira entre o território de Judá e Benjamim. Nesse vale os israelitas construíram um local de adoração chamado Tophet, onde deuses pagãos eram adorados e onde Acaz e Manassés adoravam os baalins canaanitas e sacrificavam crianças a Moloque (2Cr 28:2, 3; 33:6; cf. Jr 32:35). O vale estava associado à rebelião contra Deus e aos sacrifícios queimando crianças. Jeremias anunciou que o Vale de Ben-Hinon se transformaria no “Vale da Matança”, lugar de castigo para o povo rebelde de Deus, um cemitério (Jr 7:30-34; 19:1-9). Embora não tenha mencionado o vale especificamente, Isaías usa o conceito associado a ele, referindo-se ao dia do julgamento universal de Deus contra os ímpios. Deus vem com fogo para julgar “toda a humanidade” (Is 66:16). Ao saírem da cidade, os israelitas veriam cadáveres: “o seu verme nunca morrerá, nem o seu fogo se apagará” (v. 24).

2. Gehenna como o destino final dos ímpios. Jesus une as mensagens de Jeremias e de Isaías ao falar sobre a destruição dos ímpios no julgamento final, ao qual chamou de “condenação do inferno”, literalmente “julgamento de Gehenna”, que quer dizer os condenados ao Gehenna (Mt 23:33; cf. 5:22), de onde os ímpios não conseguiriam escapar. Gehenna é o fogo que irá destruir total e permanentemente a vida e o corpo dos ímpios, após ressuscitarem (Mt 10:28; Lc 12:4, 5). Nos sacrifícios humanos, primeiro matavam a criança, então o corpo era jogado no fogo para que se unisse aos ímpios. De fato, Jesus frequentemente fala sobre o corpo todo ser lançado no Gehenna, o fogo do julgamento de Deus (ver Mt 5:29, 30; Mc 9:43-48). A descrição dos ímpios sendo lançados no Gehenna indica o uso de força (grego ballo, “lançar”, “colocar” [Mt 5:29; 18:8]) ou como partindo para Gehenna, enfatizando a separação (aperchomai, “ir embora”, “partir” [Mc 9:43]). A ideia de que uma alma imortal separada do corpo vai para o inferno/Gehenna para queimar para sempre não é encontrada em nenhuma das passagens onde esse substantivo é usado. Enquanto os ímpios vão para o fogo da morte eterna, os justos entram para a vida com o Senhor (Mc 9:43, 49; Mt 19:8).

3. Gehenna e o fogo inextinguível. Já observamos que o Gehenna designa julgamento pelo fogo e, consequentemente, é chamado de “inferno de fogo” (Mt 18:9). O que tem confundido algumas pessoas é esse “fogo que nunca se apaga” (Mc 9:43; cf. Lc 3:17). Essa frase simplesmente significa que os seres humanos não têm controle sobre esse fogo; ele continuará queimando até que não haja mais nada a ser queimado. Jesus explica o fato citando Isaías 66:24. O Gehenna é o lugar em que “o seu verme nunca morrerá, nem o seu fogo se apagará”. A linguagem é figurativa no sentido de que as duas descrições parecem ser incompatíveis. O cadáver está sendo comido por vermes ou queimado pelo fogo? A ideia é: está sendo totalmente aniquilado. Os vermes e o fogo continuarão vivos até que todos os resquícios sejam eliminados.

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