segunda-feira, 5 de junho de 2023

TRIBUNAL INTERIOR

A consciência é considerada a habilidade humana de fazer julgamentos morais pessoais, distinguindo entre o que é certo e errado. Apresentarei algumas passagens bíblicas que podem nos ajudar a ter uma compreensão mais clara do assunto.

1. A consciência e as decisões morais. A capacidade humana de tomar decisões morais é universal e pressupõe a existência de normas e princípios morais que a pessoa, como parte de um grupo, aceitou. A consciência não forma os princípios morais, mas os utiliza na tomada de decisões. Os princípios vêm da cultura, religião e família, entre outras fontes. A universalidade do fenômeno indica que os seres humanos foram criados como agentes morais e que em todas as sociedades são encontrados traços da lei de Deus (Rm 2:14-16). No entanto, o pecado distorceu a percepção moral da humanidade, tornando necessário esclarecê-la no que se refere à vida moral (1Co 10:25, 26; 2Co 4:1-4; Tt 1:15).

Para o cristão, os valores morais mais elevados são encontrados na vontade revelada de Deus, Sua lei e sua expressão na vida, ensinos e amor de Jesus (1Tm 1:5; cf. 1Co 2:16; 1Pe 2:18). Esses valores fornecem a base moral e religiosa necessária à consciência para fazer avaliações morais corretas que se expressam em viver “de maneira honrosa em tudo” (Hb 13:18, NIV). A tendência universal da consciência de escolher o que é certo indica o trabalho do Espírito no coração humano, levando-o a buscar o que é bom (Rm 9:1).

2. A consciência boa e a má. A consciência tem outra função que ocorre após ser tomada uma decisão moral. Ela avalia a decisão e a aprova ou desaprova. Quando agimos contra ela, a consciência é contaminada (1Co 8:7), criando um sentimento de impureza espiritual e de culpa. Ter a consciência limpa/ boa significa que, após a avaliação do julgamento moral, a consciência não repreende a pessoa (At 23:1; 24:16; 1Tm 1:5). Nesses casos, a consciência testemunha, junto com o Espírito Santo, que proclamamos o que é verdade (Rm 9:1). Frases como servir a Deus “com a consciência limpa” (2Tm 1:3) significam que a integridade das decisões religiosas e morais tomadas são posteriormente confirmadas no tribunal da consciência, que não as condena. Paulo expressou a ideia muito claramente: “A nossa consciência dá testemunho de que nos temos conduzido no mundo, especialmente em nosso relacionamento com vocês, com santidade e sinceridade” (2Co 1:12a, NVI).

3. A limpeza da consciência. Saber o que é bom e fazer o contrário deixa a alma em um estado de inquietação e dor interior que pode ser insuportável. Com o tempo, e como mecanismo de defesa psicológica, a consciência finalmente fica indiferente e é silenciada (1Tm 1:19; 2Tm 1:15). O lado positivo é que a consciência que nos acusa pode ser limpa ou purificada. É claro que o sacrifício de animais não podia limpar os pecadores, pois “não podiam dar ao adorador uma consciência perfeitamente limpa” (Hb 9:9, NVI). Agora, o sangue de Cristo “purificará a nossa consciência de atos que levam à morte, para que sirvamos ao Deus vivo” (Hb 9:14, NVI; cf. 1Co 10:29). Isso é expresso plenamente por meio do batismo, que é o dom da graça perdoadora de Deus (Hb 10:22; 1Pe 3:21).

4. A voz da consciência
Ellen White define consciência como “a voz de Deus ouvida em meio ao conflito das paixões humanas. Quando resistida, o Espírito de Deus é entristecido” (Testemunhos para a Igreja 5, p. 120). Ela aconselha: “O Senhor requer que obedeçamos a voz do dever... e ouçamos a voz da consciência sem negociação ou compromisso, para que seus apelos não cessem” (Idem, p. 69). Ellen White afirma: “A maior necessidade do mundo é a de homens; homens que não se comprem nem se vendam; homens que no íntimo da alma sejam verdadeiros e honestos; homens que não temam chamar o pecado pelo seu nome exato; homens cuja consciência seja tão fiel ao dever como a bússola o é ao pólo; homens que permaneçam firmes pelo que é reto, ainda que caiam os céus” (Patriarcas e Profetas, pp. 97, 98).

João Huss estava pronto a morrer antes que violar sua consciência. “A que erros”, disse ele, “renunciarei eu? Não me julgo culpado de nenhum. Invoco a Deus para testemunhar que tudo que escrevi e preguei foi feito com o fim de livrar almas do pecado e perdição; e, portanto, muito alegremente confirmarei com meu sangue a verdade que escrevi e preguei” (O Grande Conflito, p. 109).

Martinho Lutero demonstrou a força da consciência na Dieta de Worms. As autoridades, com todo o seu poder e pompa, formularam uma simples pergunta a Lutero: “Retratar-te-ás ou não?” A resposta do reformador foi um apelo à Palavra de Deus e à sua própria consciência: “A menos que assim submetam minha consciência pela Palavra de Deus, não posso retratar-me e não me retratarei, pois é perigoso a um cristão falar contra a consciência. Aqui permaneço, não posso fazer outra coisa; Deus queira ajudar-me. Amém” (O Grande Conflito, p. 160). A assembléia toda ficou em suspense por um momento. Não podiam crer que uma pessoa estivesse disposta a arriscar sua vida para enfrentar os poderosos da igreja e do estado. Mais tarde, muitos líderes vieram ver Lutero em sua câmara. “Muitos havia que não faziam qualquer tentativa de ocultar sua simpatia por Lutero. Ele era visitado por príncipes, condes, barões e outras pessoas de distinção, tanto leigas como eclesiásticas... Mesmo os que não tinham fé em suas doutrinas, não podiam deixar de admirar aquela altiva integridade que o levou a afrontar a morte de preferência a violar a consciência” (Idem, p. 165).

Os Pais Peregrinos não vieram dar às costas da América buscando riqueza ou fama. “Foi o desejo de liberdade de consciência que inspirou os peregrinos a suportar as agruras e riscos das selvas e lançar, com a bênção de Deus, nas praias da América, o fundamento de uma poderosa nação” (Idem, p. 292).

Mais recentemente, Martin Luther King Jr. tornou-se o guardião da consciência de nossos tempos, ao sustentar o princípio bíblico da dignidade humana e realizar o sonho abrigado pela constituição dos Estados Unidos, de que todas as pessoas foram criadas iguais. Por que Martin Luther King Jr. será lembrado? Pelas marchas que dirigiu para garantir os direitos civis dos oprimidos? Pela linguagem de não-violência que utilizava para com aqueles que violavam os direitos civis de seu povo? Por sua famosa marcha sobre Washington e o discurso famoso: “Eu tenho um sonho”? Pelo Prêmio Nobel que ganhou? Todos esses são acontecimentos notáveis, mas em minha opinião, Martin Luther King Jr. foi um grande homem porque sua consciência foi despertada e temperada pela devoção às Escrituras. No dia anterior de sua morte, ele disse em Memphis, Tennessee:

“Bem, não sei o que vai acontecer a seguir. Temos alguns dias difíceis pela frente. Mas isso não me importa agora. Porque subi ao alto da montanha e não me preocupo. Como qualquer um, eu gostaria de viver uma vida longa. A longevidade tem seu lugar. Porém, não estou inquieto por isso. Somente quero fazer a vontade de Deus. Ele me permitiu subir a montanha e eu contemplei a terra prometida. Posso não chegar lá com vocês, mas quero que saibam, hoje à noite, que nós, como um povo, chegaremos à terra prometida. Sinto-me feliz. Nada me aflige; não temo homem algum. Meus olhos viram a glória do Senhor vindouro” (A Testament of Hope: The Essential Writings of Martin Luther King Jr., publicado por James M. Washington). Com aquela glória ainda brilhando em sua face, ele morreu no dia seguinte. King foi leal à sua consciência.

A voz de Deus falando à nossa consciência não deve ser silenciada, mas obedecida.

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