Creio ser excelente este pensamento de Ellen G. White para iniciar uma das mais deprimentes histórias bíblicas que encontramos em Números 22: “Nenhum de nós pode permitir-se pecar. É um negócio demasiado caro. O pecado cega os olhos de tal modo que o mal não é discernido, e mediante procedimento irrefletido, os que assim ficam cegados tornam-se instrumentos para difundir a injustiça em favor de Satanás” (Medicina e Salvação, p. 217).
Preparando-se para invadir Canaã o mais rápido possível, os israelitas acamparam ao lado do Jordão acima do local em que esse rio deságua no Mar Morto, exatamente na margem oposta à planície de Jericó, nas fronteiras de Moabe. Os moabitas não tinham sido incomodados por Israel, embora tivessem observado com grande apreensão tudo o que havia acontecido nos países vizinhos. Os moabitas eram descendentes da relação incestuosa de Ló com uma de suas filhas (ver Gn 19.37-38).
Os amorreus, que os tinham forçado a baterem retirada, haviam sido conquistados pelos hebreus. Israel agora dominava o território que os amorreus haviam tomado de Moabe. Os exércitos de Basã tinham caído diante do misterioso poder envolto na coluna de nuvem, e os hebreus ocupavam as gigantescas fortalezas.
Os moabitas não ousavam arriscar um ataque contra Israel, mas assim como fez Faraó, decidiram usar de feitiçaria para combater a obra de Deus. O povo de Moabe tinha forte ligação com os midianitas, e Balaque, o rei de Moabe, garantiu a cooperação deles contra Israel por meio da mensagem: “Essa multidão devorará tudo o que há ao nosso redor, como o boi devora o capim do pasto” (Nm 22:4).
Balaão, o midianita, era conhecido por ter poderes sobrenaturais, e sua fama chegou à terra de Moabe. Assim, mensageiros foram enviados para conseguirem que lançasse seus encantamentos e adivinhações contra Israel.
Os embaixadores logo deram início à longa viagem. Ao encontrarem Balaão, transmitiram a ele a mensagem do rei: “Um povo que saiu do Egito cobre a face da terra e se estabeleceu perto de mim. Venha agora lançar uma maldição contra ele, pois é forte demais para mim. Talvez então eu tenha condições de derrotá-lo e de expulsá-lo da terra. Pois sei que aquele que você abençoa é abençoado, e aquele que você amaldiçoa é amaldiçoado” (Nm 22:5, 6).
No passado, Balaão tinha sido um profeta de Deus, mas havia apostatado e se entregado à cobiça. Quando os mensageiros lhe transmitiram a mensagem, ele sabia muito bem que seu dever era recusar as recompensas de Balaque e dispensar os embaixadores. Mesmo assim, ele se arriscou ao não se afastar da tentação e insistiu para que os embaixadores ficassem com ele aquela noite, declarando que não poderia dar resposta até que pedisse o conselho do Senhor.
Balaão sabia que sua conduta não poderia prejudicar Israel, mas seu orgulho foi exaltado com as palavras: “Aquele que você abençoa é abençoado, e aquele que você amaldiçoa é amaldiçoado” (Nm 22:6). A sedução pelos valiosos presentes provocaram a cobiça e, ao mesmo tempo em que professava obedecer à vontade de Deus, procurava satisfazer os desejos de Balaque.
À noite, o anjo do Senhor apareceu a Balaão com a mensagem: “Não vá com eles. Você não poderá amaldiçoar este povo, porque é povo abençoado” (Nm 22:12).
Pela manhã, Balaão despediu os mensageiros, mas não contou a eles o que o Senhor tinha dito. Irado por suas visões de riqueza e honra desaparecerem, exclamou: “Voltem para a sua terra, pois o Senhor não permitiu que eu os acompanhe” (Nm 22:13).
Balaão amava “o salário da injustiça” (2Pe 2:15). O pecado da cobiça tinha destruído sua integridade. Por meio desse único pecado, Satanás conquistou o controle completo sobre ele. O tentador apresenta lucros e honras mundanas para desviar as pessoas do serviço de Deus. Assim, muitos são convencidos a deixar o caminho da integridade completa. Um passo errado torna o próximo mais fácil, e eles se tornam cada vez mais imprudentes. Farão as coisas mais terríveis ao se entregarem ao domínio da cobiça e à sede por poder. Muitos se gabam de serem capazes de deixar de lado a integridade completa por um tempo e mudar de atitude quando bem quiserem. Eles estão se emaranhando na armadilha de Satanás, e raramente escapam.
Quando os mensageiros contaram a Balaque sobre a resposta negativa do profeta, eles não deram a entender que Deus o tinha proibido. Supondo que a demora de Balaão significava apenas conseguir uma recompensa mais valiosa, o rei enviou príncipes em maior número e mais dignos do que os primeiros, com a autoridade de aceitar quaisquer condições que Balaão exigisse. A mensagem urgente de Balaque foi: “Que nada o impeça de vir a mim, porque o recompensarei generosamente e farei tudo o que você me disser. Venha, por favor, e lance para mim uma maldição contra este povo” (Nm 22:16, 17).
Em resposta, Balaão declarou ser muito honesto, íntegro e que nenhuma quantia de ouro ou prata poderia convencê-lo a agir contra a vontade de Deus. No entanto, desejava atender ao pedido do rei. Embora Deus já tivesse revelado a Sua vontade, ele insistiu que os mensageiros ficassem para que ele pudesse consultar a Deus mais uma vez.
À noite, o Senhor apareceu a Balaão e disse: “Visto que esses homens vieram chamá-lo, vá com eles, mas faça apenas o que Eu lhe disser” (Nm 22:20). Até esse ponto o Senhor permitiria que Balaão seguisse a própria vontade, pois estava determinado em assim fazer. Ele escolheu o próprio caminho e então tentou conseguir a aprovação do Senhor.
Hoje, milhares seguem um caminho semelhante. Seu dever está revelado de forma clara na Bíblia ou indicado pelas circunstânciase pela razão; mas, como as evidências são contrárias aos seus desejos, eles as colocam de lado e apenas parecem buscar a Deus para saber o seu dever. Fazem orações longas e fervorosas para receber luz. Entretanto, com Deus não se brinca. Ele muitas vezes permite que tais pessoas sigam os próprios desejos e sofram o resultado. “O Meu povo não quis ouvir-Me[...]. Por isso osentreguei ao seu coração obstinado, para seguirem os seus próprios planos” (Sl 81:11, 12). Quando alguém vê claramente o dever, não tome a liberdade de ir a Deu sem oração para ser dispensado de o cumprir.
Incomodados com a demora de Balaão e na expectativa de outra resposta negativa, os mensageiros de Moabe deram início à viagem de volta para seu país sem mais consultá-lo. Toda desculpa para atender ao pedido de Balaque tinha sido removida. Balaão estava decidido a conseguir a recompensa. Com a jumenta que costumava montar, partiu com pressa, ansioso para conquistar o cobiçado prêmio.
Jumentos eram veículos para todos os usos utilizados para transporte, carregar cargas, moer grãos e arar campos. Eram usualmente totalmente dependentes, o que explica por quê Balaão ficou tão irado quando sua jumenta se recusou a se mover (Life Applications Study Bible Kingsway).
No entanto, “o Anjo do Senhor pôs-se no caminho para impedi-lo de prosseguir” (Nm 22:22). Balaão não viu o mensageiro divino, mas o animal viu e se desviou da estrada para o campo. Com pancadas cruéis, Balaão trouxe a jumenta de volta para o caminho. Outra vez, em um lugar estreito entre duas paredes, o anjo apareceu. A jumenta, procurando evitar a figura ameaçadora, apertou o pé de seu dono contra a parede. Balaão não sabia que Deus estava bloqueando o caminho. Ficou furioso e surrou sem dó o animal, forçando-o a continuar.
Novamente, “num lugar estreito, onde não havia espaço para desviar-se, nem para a direita nem para a esquerda” (Nm 22:26), o anjo apareceu, e a pobre jumenta, tremendo de terror, deitou-se debaixo de Balaão. A raiva de Balaão não teve limites, e com uma vara ele espancou o animal com mais crueldade ainda do que antes. Deus abriu então a boca do animal, e “por uma jumenta [...] que falou com voz humana” Ele “refreou a insensatez do profeta” (2Pe 2:16). “Que foi que eu lhe fiz”, disse a jumenta, “para você bater em mim três vezes?” (Nm 22:28).
Furioso, Balaão respondeu ao animal como se falasse com um ser racional: “Você me fez detolo! Quem dera eu tivesse uma espada na mão; eu a mataria agora mesmo” (Nm 22:29).
Os olhos de Balaão foram então abertos, e ele viu o anjo de Deus parado empunhando uma espada pronto para o matar. Aterrorizado, “Balaão inclinou-se e prostrou-se, rosto em terra” (Nm 22:31). Disse o anjo: “Eu vim aqui para impedi-lo de prosseguir porque o seu caminho me desagrada. A jumenta me viu e se afastou de mim por três vezes. Se ela não se afastasse, certamente eu já o teria matado; mas a jumenta eu teria poupado” (Nm 22:32-33).
Balaão devia a sua vida ao pobre animal que ele tinha tratado de forma tão cruel. O homem que afirmava ser um profeta do Senhor estava tão cego pela cobiça e ambição que não pôde enxergar o anjo de Deus visível ao seu animal. “O deus desta era cegou o entendimento dos descrentes” (2Co 4:4). Quantos se apressam para caminhos proibidos, transgredindo as leis divinas, e não conseguem enxergar que Deus e Seus anjos estão contra eles! Assim como Balaão, eles ficam com raiva daqueles que querem impedir a sua ruína.
“O justo cuida bem dos seus rebanhos, mas até os atos mais bondosos dos ímpios são cruéis” (Pv 12:10). Poucos percebem como deveriam o grande pecado de maltratar os animais, ou deixá-los a sofrer pela falta de cuidados. Os animais foram criados para nos servir, mas não temos o direito de lhes causar dor com tratamento rude.
Aqueles que maltratam um animal porque ele está sob o seu domínio são ao mesmo tempo covardes e tiranos. Muitos não se dão conta de que a sua crueldade um dia será conhecida, pois os pobres animais mudos não a podem revelar. Se os olhos dessas pessoas se abrissem, elas veriam um anjo de Deus em pé como testemunha para testificar contra elas no tribunal celestial. Aproxima-se o dia em que um juízo será pronunciado contra aqueles que maltratam as criaturas de Deus.
Ao ver o mensageiro de Deus, Balaão exclamou aterrorizado: “Pequei. Não percebi que estavas parado no caminho para me impedires de prosseguir. Agora, se o que estou fazendo te desagrada, eu voltarei” (Nm 22:34). O Senhor permitiu que ele prosseguisse viagem, mas o poder divino controlaria as suas palavras. Deus daria evidências a Moabe de que os hebreus estavam sob a proteção do Céu, e Ele fez isso ao mostrar o quão impotente era Balaão para proferir uma maldição contra o povo.
O rei de Moabe, informado da chegada de Balaão, saiu para encontrá-lo. Ao expressar admiração pela demora de Balaão diante das ricas recompensas que o aguardavam, o profeta respondeu: “Seria eu capaz de dizer alguma coisa? Direi somente o que Deus puser em minha boca” (Nm 22:38). Balaão lamentou muito essa restrição, pois temia que suas intenções não se realizassem.
O rei, com os principais homens do reino, escoltou Balaão “aos lugares altos de Baal”, onde ele podia ver o acampamento hebreu. Mal sabiam os israelitas o que estava acontecendo tão perto deles! Quão pouco sabiam do cuidado de Deus, estendido sobre eles de dia e de noite!
O mesmo Deus que converteu a língua de uma jumenta em língua de erudito, é Aquele que age em defesa de Seu povo hoje. Inimigos podem até nos olhar de cima e assumirem posições mais elevadas, mas a nossa confiança deve estar em Deus: “Elevo os olhos para os montes: de onde me virá o socorro? O meu socorro vem do Senhor, que fez o céu e a terra” (Sl 121:1-2).
Nada neste mundo é mais amado por Deus do que o Seu povo. Somos alvos das bênçãos e das misericórdias divinas. Não incorramos no erro da igreja de Pérgamo, que sustentavam “a doutrina de Balaão, o qual ensinava a Balaque a armar ciladas diante dos filhos de Israel para comerem coisas sacrificadas aos ídolos e praticarem a prostituição” (Ap 2:14). No que tudo indica, Balaão prosseguiu em auxiliar o rei de Moabe em suas investidas contra Israel. Isto nos mostra que precisamos ter muito cuidado quanto àqueles que afirmam ser profetas de Deus, mas cujos corações são contaminados pela cobiça.
Este texto é uma adaptação do capítulo 40 do livro Os Escolhidos de Ellen G. White.
Olá, bom dia! Meditei e li esse texto sobre a conduta de balaão. É bem verdade que, hoje, muitos estão seguindo o caminho de balaão
ResponderExcluir