Existem muitas dúvidas sobre as motivações que impulsionaram e, por fim, levaram Judas a entregar Jesus aos líderes judeus. Podemos destacar algumas questões, mas é complicado oferecer uma resposta definitiva para essa pergunta.
1. Processo longo. Temos que admitir que Judas se uniu aos discípulos motivado pelo caráter amoroso de Cristo e pelo poder que Ele demonstrou durante Seu ministério (Mt 10:4). Assim como os outros discípulos, Judas veio a Jesus com suas imperfeições, mas nunca as dominou. A mais perniciosa delas era a avareza, que o cegou para a verdadeira natureza da obra de Cristo (Jo 12:6; cf. Mt 26:15). Depois de permanecer com Jesus cerca de um ano, é provável que Judas tenha expressado suas frustrações aos discípulos e talvez tenha criticado, pelas costas, o trabalho de Jesus. Isso levou o Mestre a fazer uma pergunta retórica aos discípulos: “Não é fato que Eu escolhi vocês, os doze? Mas um de vocês é um diabo [diabolos, caluniador, adversário]” (Jo 6:70, NAA). Nesse ponto, Judas ainda não estava pensando em traí-Lo (v. 71; cf. Lc 6:16).
A frustração de Judas com a direção do trabalho de Jesus atingiu um ponto crucial após Maria tê-Lo ungido com um perfume tão valioso. Ele escondeu sua verdadeira oposição, mas seu egoísmo foi exposto, e Jesus o repreendeu com delicadeza (Jo 12:5-8). Desta vez, Judas buscou os líderes judeus com o propósito de trair o Mestre (Mc 14:10; Mt 26:14). No momento da Última Ceia, o inimigo já havia colocado no coração de Judas a ideia de trair Jesus (Jo 13:2). O ponto de não retorno foi alcançado durante a Ceia, quando Jesus o identificou como traidor, dizendo que Satanás havia entrado nele (v. 27). O texto bíblico relata que “Judas logo saiu. E era noite” (v. 30).
2. A motivação. É seguro afirmar que Judas era dominado pelo egoísmo e pela avareza, o que o levou a trair Jesus. Em primeiro lugar, podemos presumir que Judas, assim como os outros discípulos, acreditava que Jesus era um Messias político destinado a libertar Seu povo dos romanos. Unir-se a Ele poderia assegurar-lhe uma posição proeminente no reino de Cristo. Em segundo lugar, Judas logo começou a perceber que a visão de Jesus para Seu reino era de natureza espiritual, não militar, e isso o frustrou. Ao que parece, após a tentativa fracassada do povo de coroar Jesus como rei à força, Judas começou a questionar se deveria manter sua lealdade a Ele (Jo 6:14, 15, 70, 71). Em terceiro lugar, é provável que Judas não tenha gostado da ideia de Jesus estar prevendo Sua própria morte, algo incompatível com o conceito de Messias militar que ele tinha em mente (cf. Mc 14:8, 10). Em quarto lugar, sabemos que, ao entregar Jesus, Judas esperava que, como em ocasiões anteriores, Ele escapasse (Mt 27:3), talvez antecipando uma demonstração de Jesus como um Messias militar.
Durante a prisão do Salvador, tornou-se evidente que Ele poderia ter escapado, mas optou por não fazê-lo (Jo 18:5-8). Ficou claro que Jesus, e não os soldados ou Judas, estava no controle de Seu destino. Quando Judas percebeu que Jesus estava prestes a ser morto, tentou interromper o que pensava ter desencadeado (Mt 27:3, 4), porém era tarde demais; Jesus tinha vindo para morrer. Impelido por um profundo sentimento de culpa, Judas saiu e tirou sua própria vida (v. 5). Sim, Judas ansiava por um lugar no reino militar de Cristo visando ao benefício pessoal, mas não no Seu reino espiritual. Judas jamais compreendeu que a missão de Jesus era oferecer Sua vida em favor daqueles que integrariam Seu reino eterno.
Ángel Manuel Rodríguez (via Revista Adventista)
Ilustração: O beijo mais famoso nas páginas do NT e, possivelmente em toda a Bíblia, é o beijo traidor dado por Judas a Cristo. Pv 27:6 diz que “fiéis são as feridas feitas pelos que ama, mas os beijos do que aborrece são enganosos”. Dos quatro Evangelistas, três deles mencionam a cena do beijo traidor. João a silencia. O texto de Lucas o conta assim: “E, estando ele ainda a falar, surgiu uma multidão; e um dos doze, que se chamava Judas, ia adiante dela, e chegou-se a Jesus para o beijar. E Jesus lhe disse: Judas, com um beijo trais o Filho do homem?” (Lc 22:47-48). Ellen White comenta: "Cristo não recusou o beijo do traidor. Nisso, Ele nos deu exemplo de tolerância, amor e simpatia. Se somos Seus discípulos, devemos tratar nossos inimigos como Ele tratou Judas" (Vida de Jesus, p. 86).
Ellen White diz que "a história de Judas apresenta o triste fim de uma vida que poderia ter sido honrada por Deus. Judas tinha naturalmente grande amor ao dinheiro. Alimentara o mau espírito de avareza até que se lhe tornara o motivo dominante na vida. O amor de Mamom sobrepujara o amor de Cristo. Tornando-se escravo de um vício, entregou-se a Satanás, para ser impelido a toda extensão do pecado" (O Desejado de Todas as Nações, p. 504).
Sem rendição incondicional e completa a Jesus, não há caráter que possa ser transformado, fraquezas que possam ser vencidas, más tendências que possam ser redirecionadas. Só existe um meio pelo qual podemos ser desviados do caminho do espírito crítico e insubmisso, autossuficiência, vaidade, hipocrisia, desonestidade, avareza e de interesse egoísta, que caracterizou Judas. Esse meio é o reconhecimento de nossa vulnerabilidade e a entrega sincera e diária do controle da vida a Ele, que conhece os verdadeiros motivos e intenções do coração.
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