Há exatos 25 anos, o físico britânico Tim Berners-Lee publicava o primeiro website. Batizado com o nome de World Wide Web (daí o www), o projeto nasceu no Centro Europeu de Pesquisa Nuclear (CERN) com o objetivo de mostrar como a informação podia ser facilmente divulgada e conectada por meio dehiperlinks. Inicialmente, não passava de uma ferramenta de comunicação interna, cujo objetivo era conectar os computadores pessoais dos físicos do CERN, possibilitando a troca de informações sobre pesquisas científicas. Porém, ela revolucionaria a internet, tornando a navegação na rede mais agradável.
Talvez, o “pai da web” não imaginasse como a rede mundial seria usada para encurtar distâncias, promover o acesso à informação rápida e democrática e mesmo facilitar a pregação do evangelho ao redor do globo. Por mais otimista que fosse, possivelmente ele também não tivesse previsto um crescimento tão expressivo. Hoje o número de websites já passa de 1 bilhão, de acordo com dados do site Internet Live Stats.
O poder das novas tecnologias da comunicação de veicular informações em tempo real e de conectar pessoas provocou uma verdadeira revolução não apenas no universo da comunicação, mas na própria cultura. Desde meados da década de 1990, quando começou a se popularizar, a internet tem modificado o cotidiano, a forma de pensar e até mesmo a relação das pessoas com a religião.
Mundo conectado
O número de pessoas conectadas cresceu em ritmo acelerado nos últimos anos, embora 57% da população mundial ainda não tenha acesso à rede, de acordo com relatório da União Internacional de Telecomunicações, divulgado em 2015. Se em 1995 havia cerca de 16 milhões de usuários, em 2000 esse número saltou para 400 milhões, 6,5% da população mundial. No entanto, hoje são mais de 3,4 bilhões, ou 43% dos habitantes do planeta.
Também chamam a atenção os indicadores do segmento de internet móvel, que se configura como uma das grandes tendências atuais. Dos 738 milhões de assinaturas em todo o mundo no ano 2000, estima-se que o salto tenha sido para 7 bilhões em 2015, segundo o mesmo relatório.
Sem dúvida, o progresso tecnológico abre novas possibilidades para a missão que os cristãos têm de proclamar o evangelho “a cada nação, e tribo, e língua e povo” (Ap 14:6). É bem verdade que a internet não suplantou os meios de comunicação anteriores, inclusive os livros, que continuam sendo objeto de campanhas de evangelização em massa. Porém, é inegável que essa tecnologia passou a exercer um papel de protagonista no cenário religioso atual, potencializando o alcance dos demais meios de comunicação, inclusive da literatura impressa que, cada vez mais, ganha projeção no segmento de e-books.
A presença adventista no ciberespaço
Atenta a esse fenômeno, a Igreja Adventista começou a marcar presença na internet desde o início da década de 1990. No Brasil, acredita-se que o primeiro site adventista tenha surgido em 1994, a partir de uma iniciativa voluntária. Vinculado ao “Ministério Cristo Vai Voltar”, o cvvnet.org também foi o primeiro de que se tem notícia a disponibilizar uma série de estudos bíblicos on-line, evidenciando, assim, sua natureza evangelística.
Em seus estudos para o programa de doutorado em Teologia no Unasp, o pastor Jobson Dornelles Santos dividiu a história do evangelismo virtual adventista no Brasil em quatro fases: (1) período de pioneirismo (1994-1995); (2) período de sites institucionais (1996-1997); (3) período de diversificação (1998-2001); e (4) período de especialização (a partir de 2002).
Na tese, defendida em 2009, Santos identificou cerca de 800 sites e blogs, em português, mantidos por voluntários, igrejas e instituições adventistas. Ele observou que 81% desses afirmaram que usavam a rede com finalidade evangelística.
Foi a partir da segunda metade dos anos 2000 que a comunicação adventista na internet ganhou força, passando a ter um caráter mais estratégico. Em fevereiro de 2006 uma importante decisão tomada pela igreja mundial contribuiu para maior ênfase nessa área: a criação da Comissão Coordenadora de Ministérios Internéticos (CCMI). No contexto brasileiro, um dos reflexos disso foi o estabelecimento do departamento de Web na Rede Novo Tempo de Comunicação, em 2008.
“Criado com o intuito de alcançar o público não adventista, jovem e conectado, o departamento procurava transformar em bytes tudo que se produzia na TV e no rádio, bem como na Escola Bíblica da Novo Tempo”, relata Carlos Magalhães, que coordenou o setor durante oito anos. Entretanto, como ele conta, a equipe também sentiu a necessidade de gerar conteúdos exclusivos para as plataformas virtuais e diversificar as portas de saída de suas produções.
Curso bíblico on-line
Entre as diversas frentes de atuação da Novo Tempo no ambiente on-line, destaca-se o site da Escola Bíblica. Lançado em 2012, ele ampliou o trabalho que já vinha sendo feito mediante o bibliaonline.net (embrião do biblia.com.br), que nasceu em 1999 por iniciativa de voluntários, sendo o primeiro de que se tem notícia a disponibilizar estudos bíblicos com correção automática via internet no Brasil. Cerca de sete anos depois, o site foi adotado pela Novo Tempo.
Os números registrados pelo biblia.com.br atestam sua importância para a pregação do evangelho no ciberespaço. De 2012 a 2015, foram registrados mais de 191 mil alunos, somente na modalidade on-line, além dos milhares que se cadastraram, também pela internet, para receber o curso impresso. Do total de alunos virtuais, 46 mil concluíram cursos bíblicos no período. Isso foi possível por meio de uma estrutura que, em 2015, chegou a contar com a participação de mais de 1,4 mil instrutores bíblicos dando suporte aos alunos via internet.
É difícil estimar quantas pessoas já foram levadas ao batismo desde que o serviço começou a ser oferecido, mas há dezenas de testemunhos registrados pelo programa Anjos da Esperança que confirmam o impacto da ferramenta. A fim de contextualizar a mensagem para diferentes públicos, a Rede Novo Tempo também passou a manter diversos sites. Segundo dados do departamento de Web da instituição, de 2009 a 2015, essas páginas em português e espanhol registraram 126,9 milhões de acessos. Além disso, a instituição fortaleceu sua presença nas redes sociais.
Mudanças estratégicas
Mobilidade, alcance, interação, conteúdo diferenciado, custo de produção. São várias as vantagens da internet para a evangelização quando comparadas a outras mídias tradicionais. Reconhecendo as inúmeras oportunidades do ciberespaço para a missão, em 2010 a sede sul-americana da igreja criou o núcleo de Estratégias Digitais, vinculado ao departamento de comunicação.
Além da presença adventista no ciberespaço ter se multiplicado numa velocidade quase cibernética, a igreja aperfeiçoou seus métodos evangelísticos nas plataformas virtuais. Vale lembrar que as primeiras experiências nessa área feitas pela sede sul-americana se restringiram à retransmissão das programações veiculadas pelo canal executivo da TV Novo Tempo. Entretanto, com o tempo, foram implementadas formas mais eficazes de atrair o público e interagir com os internautas.
Em 2009, por exemplo, o programa “Futuro com Esperança” foi o primeiro da série a contar com um site. A campanha do ano seguinte, intitulada “Tempo de Esperança”, teve maior alcance. “Começamos a acrescentar a ideia do uso de um chat, bem como do Twitter, além da produção de conteúdos exclusivos para a internet. Trazíamos o pastor Luís Gonçalves, o quarteto Arautos do Rei, e outros participantes, para um cantinho onde colocamos um sofá, uma cadeira, um banner de fundo e uma câmera e fazíamos perguntas que eram enviadas pelos internautas. Nascia aí o nosso primeiro videochat”, relata Rogério Ferraz, que trabalhou como gerente de Estratégias Digitais da sede sul-americana da igreja de 2010 a 2015.
Séries exclusivas
Na tentativa de oferecer respostas a algumas das necessidades identificadas nos anos anteriores, a partir de 2012, o evangelismo virtual no contexto sul-americano entrou em uma nova fase, com a organização de eventos exclusivos que passaram a ser coordenados pelo Ministério Jovem. Entre eles, o programa “Contagem Regressiva”, em 2012 e 2013, a série “O Último Império”, em 2015, que abriu a possibilidade, inclusive, para que os internautas participassem da escolha dos temas, além do Evangelibras, considerado o primeiro evangelismo via web do mundo na Língua Brasileira de Sinais (Libras). No ano passado, a igreja decidiu aprimorar seus métodos. Desde então, tem atuado principalmente por meio do Facebook.
Evangelização nas redes sociais
O brasileiro passa, em média, 4h59 por dia conectado à internet, segundo a Pesquisa Brasileira de Mídia (2015). Os dados também revelam que 65% dos jovens com até 25 anos acessam a internet diariamente. O uso de redes sociais exerce forte influência nesses indicadores. Como mostra a pesquisa, dos quase 100 milhões de internautas brasileiros, 92% estão conectados às redes sociais, sendo mais utilizadas o Facebook (83%), o WhatsApp (58%), o YouTube (17%) e o Instagram (12%).
A rede social mais popular entre os brasileiros tornou-se um forte canal de comunicação da Igreja Adventista no Brasil com os públicos interno e externo. Sua página oficial em língua portuguesa no Facebook já registra mais de 1,1 milhão de seguidores. Uma das estratégias da denominação consiste em acompanhar os internautas que entram em contato por meio da rede social. Esse “novo método” evangelístico acontece o tempo todo e não somente em um momento específico no ano.
“Não podemos pensar nisso somente como uma campanha específica porque uma semana de contato com o internauta no ano é realmente um tempo que fica perdido no calendário”, afirma o pastor Rafael Rossi, líder do departamento de Comunicação da sede sul-americana. Desse modo, a semana de ênfase especial no evangelismo web, realizada no mês de setembro, passou a ser vista como um momento de celebração do trabalho feito ao longo de todo o ano. “É a ocasião em que convidamos as pessoas que estão recebendo estudos bíblicos pela internet ou participando de classes bíblicas virtuais para acompanhar esse momento especial”, esclarece.
Missionários virtuais
Por entender que o evangelismo on-line é um processo, Rossi acredita que uma das características essenciais para melhor aproveitar as redes sociais é ter a moderação e a interação de maneira contínua. “O Facebook da igreja na América do Sul, tanto em português quanto em espanhol, conta com voluntários que nos auxiliam durante todo o tempo. Eles moderam, oferecem estudos bíblicos, direcionam para a Novo Tempo, dão respostas por e-mail”, explica.
Entre esses colaboradores, o paulista Roberto Roberti se destaca pelo trabalho que tem feito. Ele gerencia os contatos recebidos por meio do Facebook oficial da denominação em língua portuguesa, interage e estuda a Bíblia com os internautas e tenta inseri-los nas comunidades presenciais. No decorrer do estudo, o voluntário convida o interessado a visitar a igreja.
De acordo com Roberti, os resultados dessa mudança de paradigma já começaram a aparecer. “Através dos contatos feitos no Facebook oficial da IASD, iniciamos estudos bíblicos virtuais com 1.398 pessoas, resultando em 54 batismos no período de um ano. Mas creio que esse número de batizados seja muito maior”, afirma.
Foi por meio do Facebook que Milena Souza, de São Luís (MA), encontrou a mensagem adventista. Mesmo tendo frequentado uma denominação pentecostal durante 14 anos, ela sentia necessidade de aprofundar seus conhecimentos sobre a Bíblia. A maranhense encontrou a página oficial da igreja e começou a interagir. “Um missionário virtual me convidou para estudar a Bíblia e, na mesma hora, eu já passei meu e-mail para ele”, comenta. Como resultado dessa experiência, em setembro de 2015, Milena decidiu ser batizada (assista aqui).
O pastor Rossi informa que somente neste ano foram contabilizados outros 36 batismos em todo o Brasil, fruto do trabalho por meio da rede social. “São pessoas que chegaram até nós pela primeira vez por meio da rede social e que, a partir de então, passaram a uma igreja física. Essa é uma iniciativa interessante e importante, que desejamos fortalecer cada vez mais”, Rossi ressalta.
Ciente do potencial evangelístico desses canais de comunicação, a sede sul-americana também passou a investir no Instagram e YouTube.
Conexão com igrejas reais
Em meio ao universo de possibilidades de evangelização que surgem na era virtual, há também desafios. Para Carlos Magalhães, que atualmente exerce a função de gerente de Marketing Digital da igreja na América do Sul, hoje muitas pessoas aceitam o evangelho, mas não as igrejas. “Isso é uma tendência crescente no pensamento atual. Daí a importância de desenvolvermos estratégias para ajudar as pessoas que têm essa opinião. Existem aqueles que estão em busca apenas do conhecimento bíblico teórico ou filosófico de Deus, mas que não sentem a necessidade de participar de uma comunidade religiosa. Faz parte de nossa missão ajudar a esclarecer os benefícios do vínculo comunitário”, enfatiza.
Conforme acrescenta o pastor Rafael Rossi, Jesus fundou o cristianismo com base na ideia da comunhão e da comunidade, e isso não pode ser esquecido. Ele ressalta que os meios de comunicação digitais devem ser usados para alcançar as pessoas e levá-las aos templos físicos. “Pensando nisso, temos fortalecido o site Encontre uma Igreja, que é um meio de conduzirmos as pessoas a um templo mais próximo da casa delas. Corremos o risco de ter pessoas que terão contato conosco somente pelos meios digitais, e que não vão desejar um contato presencial. Mas o que procuramos mostrar é que a igreja oferece instrução e adoração. O que elas recebem através dos meios digitais é a apenas a instrução. A adoração irá acontecer numa igreja local, quando elas estiverem em comunhão com outras pessoas no templo”, enfatiza.
Ao reforçar que o objetivo da denominação é fortalecer a igreja real sem criar uma igreja virtual, ele acrescenta outro aspecto que considera fundamental: a necessidade de preparar os membros das igrejas locais para receber um público que, na maioria dos casos, não teve contato prévio com comunidades presenciais.
Márcio Tonetti (via Revista Adventista) - Créditos da imagem: Fotolia e Eduardo Olszewski
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