segunda-feira, 31 de maio de 2021
IMPOSTO DE RENDA
domingo, 30 de maio de 2021
TEMPOS DE PERIGO
sexta-feira, 28 de maio de 2021
M-Á-S-C-A-R-A
Quem precisa sair de casa sabe que as ruas são um campo
minado de narizes descobertos. E, caso você lance um olhar de protesto, se
duvidar o sujeito sem um pedaço de pano nem vergonha na cara irá reagir.
Cuidado, alguns explodem. Mas outros apenas disparam provas de sincera
ignorância do que a ciência tem a lhes dizer para tapar-lhes a boca — e as
narinas junto, claro.
Contra cada disparate que a gente ouve por aí, existe um bom
argumento. Saiba o que você pode falar para tentar desarmar a arapuca dos
sem-máscara em diversas situações.
"Parabéns pela vacina! Mas você pode continuar pegando
e passando covid-19.”
Esclareça aquela pessoa que, ao notar o seu desconforto,
tenta tranquilizá-lo avisando que tudo bem, porque ela já foi vacinada. Tudo
bem para quem, cara pálida sem máscara? Ora, para nenhum dos dois!
"O que as
vacinas atuais prometem é reduzir as formas graves da infecção pelo novo
coronavírus e não fazer quem as tomou deixar de pegar a doença", explica o
infectologista Wladimir Queiroz, que é professor da Faculdade de Ciências
Médicas de Santos, no litoral paulista, e consultor da Sociedade Brasileira de
Infectologia.
Vamos reconhecer que essa não é uma promessa pequena, a de
manter a população vacinada longe dos hospitais, com quadros brandos ou
assintomáticos depois de contrair o Sars-CoV 2.
Só que esse vírus seguirá o trecho inicial de seu roteiro
pelo nosso corpo. Ou seja, ele irá se instalar e se multiplicar nas mucosas do
nariz e da garganta para que suas réplicas voem em gotículas lançadas no ar até
aterrissarem em uma nova vítima. Portanto, quem foi vacinado pode continuar
transmitindo a doença, sim.
"E, mesmo que tivéssemos um imunizante capaz de evitar
completamente a infecção, inclusive os casos assintomáticos, a gente deve se
lembrar que nenhuma vacina contra qualquer tipo de doença é eficaz em 100% das
pessoas", completa o professor Queiroz. "Uma minoria sempre poderá
adoecer, mesmo depois da injeção."
Nem vou falar de variantes... Só guarde então: sair sem
máscara é um risco também para a própria pessoa vacinada que, talvez por
desconhecimento, se sentiu livre dessa obrigação.
"Estamos ao ar livre, mas não estamos sozinhos."
Em locais abertos e ventilados, o risco de transmissão é
menor, mas não é bacana brincar de roleta-russa com o coronavírus, se passam
pessoas a menos de 2 metros de distância de você. Fale isso para quem não vê
problema em abandonar o acessório ao ar livre.
"Tem problema, sim", rebate o médico João Viola,
presidente do Comitê Científico da Sociedade Brasileira de Imunologia.
"Comparo com o cinto de segurança. Devemos usá-lo sempre, não importa se
estamos em um engarrafamento rodando a 20 quilômetros por hora ou acelerando a
mais de 120 em uma estrada.”
Em outras palavras, até em uma situação aparentemente mais
segura, às vezes, desastres acontecem. "Na pandemia, devemos usar máscara
ao sair de casa e ponto, sem dar espaço para interpretações se, nessa ou
naquela condição, o risco seria menor."
"Será que não poderia dar suas baforadas admirando o
trânsito?”
É uma sugestão aos fumantes pelo caminho. Não quero aqui
discutir os malefícios do cigarro, mas se alguém não resiste e vai fumar na
rua, então o ideal seria que ao menos tomasse o cuidado de soltar a fumaça de
costas para o fluxo de pessoas, de preferência parado no meio-fio, olhando os
carros que passam.
"Aí, aumenta um pouco a chance de uma rajada de ar
dispersar o vírus antes de ele contaminar os outros", observa a
infectologista Andyane Tetila, médica do Hospital Universitário da UFGD
(Universidade Federal da Grande Dourados), no Mato Grosso do Sul, e também
consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia.
"Se comer, não dirija palavras."
Hora do almoço e, apesar da pandemia, as calçadas ficam
cheias de gente mordiscando ou bebendo algo enquanto caminham. Lógico, não dá
para engolir nada usando máscara. "Mas, então, é a mesma coisa que penso
para os fumantes: o certo é procurar locais mais reservados, com pouquíssima
passagem de gente", opina o doutor João Viola.
Para piorar, as pessoas tendem a sair comendo e batendo papo
com quem está ao lado. Aprenda: se um indivíduo está infectado pelo Sars-CoV2,
ele sempre lança o vírus quando expira o ar. Mas lança uma quantidade maior
enquanto fala e mais vírus ainda se fala alto — por exemplo, conversando
animadamente em uma rua movimentada, concorrendo com o barulho ao seu redor. Ou
seja, se é para tirar a máscara a fim de matar a fome na rua — o que já não é o
correto —, coma quieto.
"Preserve a sua imagem fitness.”
Este é o recado aos legítimos defensores de um estilo de
vida saudável. Se alguém calça o seu tênis sem pegar a máscara — sim, hoje já
existem modelos especiais para esportistas —, essa pessoa na realidade só faz
pose.
"Diversos estudos mostram que indivíduos infectados
expelem mais vírus durante exercícios físicos", diz o professor Wladimir
Queiroz. "Daí que, se não é possível manter um distanciamento de 1,5 a 2
metros — no caso de quem sai para pedalar em grupo ou que escolhe correr em
pistas, por exemplo —, o perigo de fato existe. Hoje sabemos que, para se
infectar, basta uma única respirada naquele instante em que o outro soltou
gotículas lotadas do vírus, passando por você.”
Não fale nada, saia cantarolando Chico Buarque
"Chego a
mudar de calçada, quando aparece uma flor.., "— claro, aqui na versão
"quando aparece um desmascarado", seja fumando, comendo ou, pior do
que tudo, formando grupinhos em portas de restaurantes ou descansando em
intervalos de trabalho.
Passar bem no meio de uma pequena aglomeração de pessoas sem
máscara é como atravessar um corredor polonês envolto em uma nuvem de
coronavírus. "Basta uma única respirada...", insiste o professor
Queiroz. E o doutor João Viola completa: "Melhor alguém olhando feio ao
perceber sua atitude ao desviar do que você pegar covid-19.”
"Já é tão fofa essa criança, imagine se ela usasse máscara então!"
Entendo: eu mesma só teria coragem de dizer isso em
pensamento. "Até porque, dependendo da idade, não tem como: a criança
acaba tirando a máscara", reconhece o professor Queiroz. Mas, no mundo
ideal, seria o certo usá-la a partir dos 2 anos.
"Crianças sempre foram ótimos reservatórios de vírus em
geral", lembra a infectologista Andyane Tetila. "Mesmo que não
manifestem a covid-19, elas são capazes de transmitir para o amiguinho que, por
sua vez, irá infectar cuidadores e familiares ao voltar para casa. Sem contar
que, até por conta da alta circulação do Sars-CoV 2, hoje já vemos casos graves
na pediatria, inclusive com óbito."
Para o doutor João Viola, os adultos deveriam orientar a
meninada a vestir o acessório e a escola também poderia ajudar: "Ela não
deve se restringir à educação formal, mas ensinar a criança a ter respeito pelo
bem-estar de toda a sociedade", acredita.
"Chamem o síndico!”
É o que você deve pedir se encontrar alguém que deixou para
vestir a máscara bem naquele instante em que a porta do elevador se abriu.
"Não é paranoia", garante o professor Wladimir Queiroz. "O ar
precisaria trocar de cinco a doze vezes para um ambiente se tornar propício na
pandemia. Não há tempo para um elevador ventilar desse jeito entre essa pessoa
sem máscara sair e você entrar", diz ele.
O melhor é só subir ou descer com aqueles que moram com
você. E, ainda em nome da boa vizinhança, não vale ficar sem máscara no hall
entre apartamentos, cujo ar também não costuma ser renovado com tanta
facilidade.
"Eu estou cuidando da minha vida."
É o que você pode devolver ao ouvir um desaforo clássico do
povo sem máscara — o tal do "vá cuidar da sua vida". Segundo o
professor Queiroz, as máscaras protegem muito pouco quem as usa, mas protegem
um bocado quem está ao seu redor. A exceção seria o modelo N95 — o qual, além
de caro, é tão difícil de usar direito que os próprios médicos em hospitais só
vestem quando vão lidar diretamente com pacientes com covid-19.
Portanto, digo eu, quando alguém sai sem máscara por aí,
está escrito em sua testa que ele pouco se dana com a vida dos outros. Não há
nem sequer a empatia, que o sistema nervoso dos seres vivos manifesta quando
pressente que indivíduos da sua espécie estão sendo ameaçados por outra.
É como se os sem-máscara se excluíssem dessa humanidade tão
terrena, vindos de um planeta sem pandemia e plano. Mais de 450 mil brasileiros
morreram porque provavelmente cruzaram com alguém assim.
Lúcia Helena (via Viva Bem)