quinta-feira, 26 de maio de 2022

NAMORO NO PARAÍSO

Foi o “namoro” mais rápido da história. Depois de um pesado sono de Adão, posso imaginá-lo se beliscando para ter a certeza de que não era delírio. De repente, um agudo frio na barriga e um ritmo novo e mais rápido das batidas do coração agitaram seu corpo como resultado de um bombardeio de adrenalina na corrente sanguínea. O primeiro homem não havia sentido nada daquilo até que o jardim, antes habitado apenas por ele e por uma infinidade de bichos sem nome, recebesse um refinado toque do gênio criativo divino: a mulher. Adão não pôde se conter e explodiu em poesia no poema inaugural do lirismo humano: “Osso dos meus ossos e carne da minha carne.”

Mesmo que o relacionamento pré-matrimonial relâmpago de Adão e Eva não se enquadre de forma plena na definição de namoro, é possível extrair da primeira história de amor da humanidade lições importantes para orientar o relacionamento de jovens cristãos com seus pretendentes.

NAMORO OU AMIZADE?
Adão estava se sentido só e incompleto. Enquanto todos os bichos formavam pares compostos por sexos diferentes, Adão estava isolado, sem alguém igual e diferente o suficiente para compartilhar a maravilha de estar vivo no espetáculo que era o mundo pré-pecado.

Acima de Adão, havia os anjos e Deus, que, embora lhe conferissem amor e pudessem se comunicar por meio da linguagem falada, são diferentes do ser humano em essência e natureza. Abaixo, estavam os animais, que, obviamente, não podiam se relacionar com o homem em igualdade, por mais belos, amáveis e úteis que fossem. Adão tinha “Chefe”, “sub-chefes” e “subordinados”, mas não podia contar com alguém com quem pudesse abrir o coração de igual para igual.

No namoro cristão, a amizade precisa ser um dos pontos centrais de motivação para o início da relação. O namoro é o momento em que o casal deve construir e estreitar laços de companheirismo. Como fase preparatória para a vida a dois, o namoro deve ser um período para o casal “treinar” o que vai fazer até que a morte os separe, a saber, conversar, conversar e conversar.

Além disso, o namoro é o momento para conhecer o outro e avaliar a possibilidade de compartilhar para sempre a vida. A amizade nos expõe e vulnerabiliza ao revelar virtudes e defeitos reais. Portanto, um namoro que valorize a amizade produz os subsídios necessários para a tomada de decisão sobre a evolução ou não da relação até o casamento.

Namoros que iniciam logo depois de o casal se conhecer, e portanto sem tempo para a amizade prévia, têm maior propensão de usar a aparência como critério fundamental para o estabelecimento do relacionamento, o que não é a melhor maneira de avaliar um pretendente. Porém, segundo os pesquisadores Lucy Hunt, da Universidad do Texas, e Eli Finkel, da Universidade Northwestern, nos Estados Unidos, “ter mais tempo para se familiarizar [um com o outro] pode permitir que outros fatores, como a compatibilidade do casal, assumam uma importância maior no namoro do que características externas, como a atração física. Ou talvez a outra pessoa pode realmente se tornar mais atraente aos olhos de quem vê virtude nesses outros fatores”. A amizade faz com que a capa da beleza caia para revelar as características interiores do outro, as quais, de fato, serão importantes para a manutenção de um futuro casamento.

Namoros movidos prioritariamente pela atração física tendem a ser mais sucetíveis à impureza sexual. Eletrizada pela efervescência hormonal, a paixão impede que um juízo adequado noção hollywoodiana de amor faz os namorados desconsiderarem aspectos fundamentais para o sucesso da relação matrimonial.

O termo bíblico usado para definir a companheira de quem Adão sentia falta é “auxiliadora idônea” (do hebraico ‘êzer, “que ajuda”, cognato do verbo ‘âzar, usado muitas vezes na Bíblia para se referir ao papel proativo de Deus em relação ao ser humano). Mais do que revelar certa hierarquização entre os gêneros no contexto matrimonial, a expressão enfatiza o fato de Eva ter sido criada para ser uma pessoa atuante e não apenas um mero item decorativo para embalar a paixão do esposo.

A reação de Adão ao ver pela primeira vez aquela que seria sua esposa também é reveladora em relação ao tipo não atrapalhar, em todos os aspectos da vida. O jovem cristão precisa analisar as características marcantes do comportamento do pretendente, as quais podem ser reveladoras do caráter, e não deve permitir que as emoções amorosas anuviem sua compreensão da realidade, impedindo-o de perceber o que todo mundo está vendo, em especial os pais.

Poucas coisas atrapalham mais a vida de alguém do que um casamento falido. Para evitar isso, é fundamental estar atento a posturas potencializadoras de divórcio apresentadas pelo futuro cônjuge, as quais, em geral, as paixões avassaladoras não permitem percepção prévia. Nesse ponto, vamos enfatizar elementos que podem revelar a possibilidade de infidelidade matrimonial, causa de muitas separações e o único motivo previsto nas Escrituras.

Um artigo de Tila M. Pronk, Johan C. Karremans e Daniel Wigboldus publicado no Journal of Personality and Social Psychology, em maio de 2011, apresenta o domínio próprio como característica fundamental de alguém que se revelará um companheiro fiel no futuro. O estudo mostrou que namorados com bons níveis de autocontrole em aspectos cotidianos têm mais chance de manter os votos matrimoniais, mesmo em face de fortes tentações sexuais. O desejo imediatista de autogratificação, por exemplo na alimentação, nas compras e nos prazeres em geral, pode ser um indicativo de uma personalidade com dificuldade em manter compromissos importantes, como os que são feitos no altar.

Na pesquisa de James McNulty e Levi R. Baker, publicada na mesma revista, constatou-se que jovens com um senso aguçado contra a imoralidade de todo tipo são mais propensos a se manter como cônjuges fiéis, porque um deslize nessa área seria um tormento para sua consciência. Pessoas assim são mais confiáveis.

Portanto, deve-se ter cuidado em estabelecer relacionamentos com gente para quem tudo parece normal. “Pequenos” deslizes, como cola na escola, “mentirinhas” para os pais e falta de pudor em relação ao corpo do namorado podem ser uma evidência de que o pretendente tem uma consciência um tanto cauterizada e que não terá muita dificuldade em lidar com o sentimento de culpa, caso traia o cônjuge.

A pesquisa permite concluir que a fidelidade matrimonial depende mais do fator consciência do que do fator “amor”. Essa conclusão está em harmonia com o pensamento do teólogo alemão Dietrich Bonhoeffer sobre o casamento, segundo o qual “não é o amor que sustenta a aliança, mas a aliança que sustenta o amor”.

VISÃO CORRETA DO CASAMENTO
“Por isso, deixa o homem pai e mãe e se une à sua mulher” (Gn 2:24). Essa frase é o resultado do “namoro” de Adão e Eva. Ou seja, o primeiro casal “namorou” para casar. E assim deve ser com os os jovens cristãos. A cultura dos namoros casuais (“ficar”) tem resultado em casamentos casuais. Com a mente programada para trocas constantes, a pessoa tem dificuldade em manter uma relação duradoura, como o casamento deve ser.

Por outro lado, namoro e noivado constituem o período de avaliação do pretendente e não devem ser considerados definitivos. Sobre isso aconselha Ellen White: “Mesmo que você tenha chegado ao noivado sem pleno conhecimento do caráter da pessoa com quem pretende se unir, não pense que o noivado constitua uma obrigação de chegar até os votos matrimoniais e se unir por toda a vida a alguém que não possa amar e respeitar. Tenha muito cuidado antes de noivar. Porém, é melhor, muito melhor, romper com o noivado antes do casamento do que se separar depois, como muitos fazem” (Só Para Jovens, p. 87). Se o namoro e o noivado forem vivenciados da forma certa, inclusive interrompidos se necessário, a visão bíblica sobre a perenidade do casamento tenderá a prevalecer na mente de quem assim se comporta. E isso evitará muitos problemas de ordem familiar.

No filme À Prova de Fogo, o personagem Michael tenta explicar o sentido do casamento para seu colega bombeiro Caleb, que está prestes a se separar da esposa. Michael pega os vidros de sal e pimenta sobre a mesa e diz: “Sal e pimenta são completamente diferentes […], mas você sempre os vê juntos.” Então ele cola os dois vidros com uma espécie de Super Bonder. “O que está fazendo?”, pergunta Caleb. Depois de conversarem mais um pouco, Caleb tenta separar os vidros de sal e pimenta, mas Michael diz: “Não faça isso. Se você os separar, vai quebrar um dos vidros ou os dois.” A cola havia feito os dois se tornarem um.

É isso que Deus faz quando um homem e uma mulher se casam. Eles são “colados” com sua bênção. A não ser pelo triste motivo da infidelidade matrimonial, ninguém está autorizado a separar o que foi unido no altar. Quando isso é feito, sempre há sofrimento para o casal e os filhos. Não há dúvida de que a graça de Deus pode curar feridas; porém, as cicatrizes ficam.

Por isso, antes de casar, é preciso estar ciente de que o casamento é eterno e que é um passo que não pode ser dado de qualquer jeito. Ellen White escreveu: “Se homens e mulheres têm o hábito de orar duas vezes ao dia antes de pensar em casamento, devem fazer isso quatro vezes ao dia quando pensam em dar esse passo” (Só Para Jovens, p. 93).

Os jovens que desejam fazer o certo em relação ao namoro, noivado e casamento devem ouvir a voz divina lhes perguntando sobre seus pretendentes: “A maior manifestação do seu amor é para aquele que morreu por vocês? Se for assim, o amor de um para com o outro será de acordo com o plano do Céu” (Testemunhos Para a Igreja, v. 7, p. 46). Só quem ama a Deus acima de todas as coisas está pronto para amar o cônjuge para sempre.

A fim de reforçar sua convicção, o jovem cristão deve fazer a si mesmo as seguintes perguntas: “Essa união me ajudará a alcançar o Céu? Aumentará meu amor a Deus? E ampliará minha esfera de utilidade nesta vida? Se essas reflexões não apresentarem nada em contrário, então prossiga no temor a Deus” (Só Para Jovens, p. 87). Quem procura alguém como companhia na viagem para o Céu e deseja crescer na vida precisa se desviar de relacionamentos em jugo desigual. Sobre isso, a revelação é taxativa: “Unir-se a um descrente é colocar-se no terreno de Satanás. [...] Satanás sabe bem que o dia do casamento de muitos rapazes e moças marca o fim da história de sua experiência e utilidade cristãs” (ibid., p. 82, 89).

O “namoro” de Adão e Eva foi iluminado com a bênção da presença de Deus. Todo jovem cristão pode contar também com a clareza das orientações divinas e, assim, experimentar a alegria real e infinita de um grande amor.

Vinícius Mendes (via Revista Adventista)

Nenhum comentário:

Postar um comentário