Você já sentiu uma sensação ruim de medo, uma preocupação incomum sobre o futuro e o aumento das batidas do coração a ponto de achar que iria morrer? Esse mal tem nome: ansiedade.
O sentido da palavra
A palavra “ansiedade” tem origem no latim anxietas, que está ligada a um estado de “angústia”, substantivo derivado do verbo angere (“apertar”, “estreitar”, “oprimir”). Há uma teoria de que a etimologia de “angústia” remonta ao vocábulo egípcio ankh, passando pelo grego angor. Por isso, o termo é parecido em algumas línguas modernas, como alemão (angst), albanês (ankth), esloveno (anksioznot), holandês (angst) e sueco (ångest). O prefixo ang indica a opressão e o aperto que esse estado psicológico causa na pessoa. Assim, a angústia/ansiedade representa um estreitamento das perspectivas, uma diminuição dos horizontes, um constrangimento da vida.
No Novo Testamento, a palavra “ansiedade” (merimna), junto com o verbo correspondente “ser ansioso” ou “preocupar-se” (merimnaō), pode ter um sentido negativo e outro positivo. Somadas, as duas palavras ocorrem 25 vezes. Por exemplo, é bom se preocupar (memeristai) com o cônjuge (1Co 7:33-34) e ter “cuidado” (merimnōsin) uns pelos outros (1Co 12:25), interesse (merimnēsei) pelos outros (Fp 2:20) e preocupação (merimna) pela igreja (2Co 11:28). Mas não é bom ter ansiedade nem preocupação excessiva. Portanto, há uma preocupação legítima e uma ansiedade ilegítima.
De acordo com alguns lexicólogos, o substantivo merimna, que também pode ter o sentido de “distração”, é derivado do verbo merizo. Com 14 ocorrências no Novo Testamento, esse verbo significa “dividir”, no sentido de fraturar o ser da pessoa em partes e puxar em diferentes direções. Isso indica que os antigos já tinham a noção de que a ansiedade fragmenta nosso coração, desintegra nosso ser e atomiza nossa confiança.
Mentes ansiosas
Presente na sociedade desde a aurora da civilização, a ansiedade acompanha o ser humano como parte de sua própria condição pós-pecado. Ela caracteriza nossa estrutura psíquica, já que a vida é precária e não podemos controlar nossas emoções, o ambiente e o futuro. Na busca por transcendência, descobrimos nossa limitação e finitude. Porém, nos últimos anos, com a aceleração do tempo, a desconexão do espaço, a mecanização das tarefas, a fragmentação da comunidade e a desvalorização da vida, o grau de ansiedade aumentou geometricamente. O próprio Cristo profetizou que, no fim, as nações experimentariam pânico por causa dos acontecimentos, e as pessoas, apreensivas, desmaiariam de terror (Lc 21:25-26). Portanto, se você tem sido vítima da ansiedade, não está sozinho.
Há vários tipos de ansiedade que dominam as mentes religiosas e seculares, como a existencial, a inquietude que angustia os que não veem significado na vida, nem propósito na existência; posicional, o desassossego que agita os que buscam popularidade e prestígio a qualquer preço; funcional, o temor exagerado de não ser bom o suficiente para encarar as exigências do mercado; econômica, o pavor de não ter dinheiro para enfrentar as crises financeiras e as carências da vida; cognitiva, a incerteza que intranquiliza os que vivem atribulados pela dúvida; tecnológica, a ambição que impacienta os que trocam de aparelho todo ano e consultam as mídias sociais a cada momento; familiar, o receio que resulta das dificuldades de convivência com o cônjuge ou das preocupações com os filhos; soteriológica, a apreensão que paralisa os que não têm certeza da salvação; tanatológica, o medo que aterroriza os que não estão preparados para a morte e se desesperam diante da possibilidade de separar-se dos queridos; e escatológica, a tensão que domina os que pensam demais sobre o fim do mundo e veem sinais alarmantes em cada notícia de jornal.
No sentido mais profundo, Deus tem a solução para todas essas ansiedades. A Bíblia não fala muito de ansiedade; o conceito de medo é muito mais frequente. Porém, o conselho bíblico é que não devemos andar ansiosos por nada e que lancemos toda a nossa ansiedade sobre Deus, pois Ele cuida de nós (Mt 6:25-34; Fp 4:6; 1Pe 5:7). Várias passagens bíblicas podem ser resumidas numa palavra: relaxe! Não no sentido de não ter responsabilidade nem fazer as coisas malfeitas, mas de confiar em Deus e descansar Nele.
Muitos cristãos vivem assustados e estão aprisionados no círculo sem saída da ansiedade porque veem ameaças em cada esquina. Mas não precisamos temer. A religião deveria reduzir a ansiedade, e não aumentá-la. Em termos coletivos, a igreja já passou por momentos de ansiedade superlativa, em épocas de guerra, perseguição, fanatismo, mornidão e crise, e sobreviveu. Com a ajuda divina, nós também sobreviveremos.
Terapia de Cristo
Há várias terapias para a ansiedade, como a exposição ao ambiente real que causa o medo e até a simulação em ambientes virtuais 3D. Em alguns casos, especialmente quando há crises de pânico, o tratamento pode requerer o uso de tranquilizantes, combinados com antidepressivos, e a pessoa deve procurar ajuda médica especializada. Além de aliviar os sintomas da ansiedade, os antidepressivos “regulam” a ação dos neurotransmissores ligados ao humor, como a serotonina. Exercício e sono também são fundamentais.
Entretanto, esse não é o foco aqui. Estamos falando de ansiedade adquirida que se torna um hábito e precisa ser desaprendida. E o melhor ponto de partida para desconstruir o mecanismo da ansiedade é o ensino do próprio Cristo. Em Mateus 6, Jesus fez sete proposições fundamentais para mudar nossa maneira de pensar e ajudar a quebrar esse ciclo doentio. Se na primeira parte de Mateus 6 Cristo diz que não devemos seguir a hipocrisia dos hiper-religiosos, na segunda metade Ele insiste que não adotemos o materialismo dos secularizados. O Mestre vai à raiz do pensamento e do sentimento. Mudando a maneira de encarar Deus e a vida, mudamos as ideias dentro de nossa cabeça e os sentimentos dentro do nosso peito. Vamos aos sete princípios:
1. Princípio da valorização. A vida é mais importante do que o alimento e o corpo vale mais do que a roupa (v. 25). A premissa é do maior para o menor: se Deus nos deu o que é mais importante, vai dar também o que é menos importante. O alimento e a roupa não são fins em si mesmos; o corpo e a vida são.
2. Princípio da providência. Deus está no controle da natureza. Se Ele cuida dos passarinhos, então cuidará ainda mais de nós, pois valemos mais que eles (v. 26). O objetivo dessa comparação não é minimizar o valor das aves, mas maximizar o valor do ser humano, destacando a provisão divina. Não se preocupe só em obter, pois Deus Se ocupa em dar.
3. Princípio da eficácia. O futuro não está em nossas mãos e, portanto, a ansiedade é inútil. Ela não traz nenhum benefício, pois não muda as circunstâncias (v. 27). A ansiedade não ajuda a acrescentar um simples centímetro à altura nem uma hora à vida.
4. Princípio da durabilidade. Se as flores, que desaparecem rápido, recebem de Deus sua beleza, quanto mais nós, que somos destinados à eternidade (v. 28-30). A ansiedade é uma espécie de horizonte limitado; por isso, é preciso ver a vida por uma perspectiva mais ampla.
5. Princípio da espiritualidade. A ansiedade é uma marca do “mundo”, que se preocupa muito com as coisas terrenas (v. 31). Já o crente confia que nosso Pai celestial conhece tudo a nosso respeito e sabe o que precisamos (v. 32). As pessoas mundanas e as religiosas têm valores e preocupações diferentes: enquanto as primeiras colocam o foco no que passa, as outras pensam no que é eterno.
6. Princípio da prioridade. Quando damos o primeiro lugar ao reino e à justiça de Deus, o Criador provê o que precisamos (v. 33). O reino de Deus, anunciado no passado na qualidade de promessa, existe no presente na forma de graça e se manifestará no futuro no esplendor da glória. Ele começa no coração e culmina no espaço de todo o globo. Se vivemos na esfera em que Deus domina, não precisamos buscar o controle de tudo nem andar ansiosos pelas coisas.
7. Princípio da “presentificação”. Viva no agora e um momento de cada vez. Viver no agora é aprender a lidar com o vazio de incertezas do futuro. Cada dia tem sua própria carga, e não vale a pena sobrecarregar o presente com coisas que pertencem ao futuro (Mt 6:34). Por isso, é fundamental subdividir as tarefas e compartimentalizar os desafios. Coloque o foco no hoje. Você nem sabe se vai estar vivo amanhã. Se o ontem já passou e o futuro ainda não chegou, o único momento que realmente está sob nossa influência é o presente. A ansiedade não resolve o desafio de amanhã, mas cria um problema para hoje.
Portanto, da perspectiva de Jesus, a ansiedade é inútil, prejudicial e um sinal de incredulidade. No fundo, ela cresce dentro de nós quando a alimentamos com as conspirações do mundo, dúvidas a respeito do nosso valor e desconfiança do poder divino. Quando Deus ocupa todo o coração, não sobra espaço para a ansiedade – o que não significa que eventualmente o cristão não possa ficar ansioso.
A vivência do evangelho, que inclui a libertação do medo, é o fim da ansiedade. Quem está em Cristo tem tranquilidade de espírito, pois Ele é nossa paz (Mt 11:28-30; Jo 14:27; 16:33; Ef 2:14; Fp 4:7). O amor, personificado por Deus (1Jo 4:8, 18), elimina o medo. Portanto, tranquilize-se! Substitua o medo pelo amor, a dúvida pela confiança e a ansiedade pela paz.
Numa linda passagem sobre o cuidado divino, Ellen White enfatiza que devemos expor “continuamente” perante Deus nossos temores e tudo que nos causa ansiedade, pois nada que tira nossa paz é insignificante para Ele nem insolúvel e grande demais para Aquele que “sustém os mundos e rege o Universo” (Caminho a Cristo, p. 100). “Ao passo que a preocupação e a ansiedade não remediam um simples mal, podem produzir grande dano”, diz ela (O Lar Adventista, p. 431). Mas não temos que encarar sozinhos a vida, pois Deus está do nosso lado. Ele é a resposta definitiva para a ansiedade. "Os que submetem a vida à Sua direção e ao Seu serviço jamais se verão colocados numa posição para a qual Ele não haja tomado providências. Seja qual for nossa situação, se somos cumpridores de Sua Palavra, temos um Guia a nos dirigir o caminho; seja qual for nossa perplexidade, temos um seguro Conselheiro; seja qual for nossa tristeza, perda ou solidão, possuímos um Amigo cheio de compassivo interesse" (A Ciência do Bom Viver, p. 248 e 249).
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