sexta-feira, 13 de setembro de 2024

CANDIDATOS ADVENTISTAS

Existem alguns princípios fundamentais que regem a posição da Igreja Adventista do Sétimo Dia sobre política. Um deles é o princípio da separação entre Igreja e Estado, o que leva cada uma dessas entidades a cumprir suas respectivas funções sem interferir nas atividades da outra. A Igreja acredita que adotar uma postura que não envolva filiação partidária ou qualquer tipo de compromisso com partidos políticos é uma das maneiras de manter esse princípio. Tal prática deve nortear não apenas a organização adventista em todos os seus níveis administrativos, mas também as instituições por ela mantidas, seus pastores e servidores.

A Igreja encontra nos ensinos do Senhor Jesus e dos apóstolos base segura para evitar qualquer militância político-partidária institucional. O cristianismo apostólico cumpriu sua missão evangélica sob as estruturas opressoras do Império Romano sem se voltar contra elas. O próprio Cristo afirmou que Seu reino “não é deste mundo” e que, portanto, os Seus “ministros” não empunham bandeiras políticas (João 18:36). Qualquer posicionamento ou compromisso com legendas partidárias dificultaria a pregação do evangelho a todos indistintamente.

Por outro lado, a Bíblia não isenta a comunidade de crentes dos deveres civis, e isso está evidente na ordem de Jesus: “Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” (Marcos 12:17). O Novo Testamento apresenta várias orientações sobre o dever cristão de reconhecer e respeitar os governos e as autoridades (Romanos 13:1-7; Tito 3:1-2; 1 Pedro 2:13-17). Somente quando os poderes temporais impõem transgressão às leis divinas é que o cristão deve assumir a postura de antes “obedecer a Deus do que aos homens” (Atos 5:29).

Candidatos que são adventistas

Entre os direitos do cristão adventista no exercício da cidadania está o de ocupar cargos públicos, eletivos ou não. O Antigo Testamento menciona exemplos de pessoas que exerceram funções de grande projeção nos governos de sua época. Por exemplo, José foi primeiro-ministro do Egito (Gênesis 41:38-46) e, tendo sido colocado por Deus no comando dessa nação, se manteve puro e fiel na corte do rei e foi “um representante de Cristo” junto aos egípcios (Patriarcas e Profetas, p. 369). Daniel exerceu importantes cargos governamentais em Babilônia sob os reinados de Nabucodonosor, Belsazar, Ciro e Dario, e, com lealdade incondicional aos princípios divinos, ele e seus companheiros foram embaixadores do verdadeiro Deus nas cortes desses reis.

É interessante notar que José e Daniel foram nomeados para funções públicas diretamente pelos próprios monarcas. Hoje, na maioria das democracias modernas, oficiais públicos tanto podem ser nomeados como podem ser eleitos por voto popular. A Igreja Adventista do Sétimo Dia respeita a decisão de seus membros de ocuparem cargos públicos, seja por meio de processo eleitoral ou por nomeação direta. Reconhece também que, como nos tempos de José, Daniel e Ester, a sociedade pode ser beneficiada pelo bom exemplo de políticos religiosos que exerçam suas atividades dignamente, sem comprometer princípios cristãos, ao mesmo tempo em que dão um bom testemunho da fé e promovem os valores bíblicos.

Assim, a Igreja Adventista do Sétimo Dia:

  • Determina que candidatos que são adventistas não usem o púlpito nem programas oficiais da igreja para pedir votos.
  • Solicita que os membros que se candidatarem a cargos públicos eletivos deixem suas funções na igreja local durante o período de campanha.
  • Estabelece que pastores, outros obreiros e funcionários que decidirem lançar candidatura devem se desvincular obrigatoriamente do trabalho na organização adventista.
  • Estabelece que pastores e outros obreiros que decidirem atuar em qualquer trabalho direta ou indiretamente relacionado à política partidária, como assessorias, propaganda, publicidade, ou outras atividades afins, devem se desvincular obrigatoriamente do trabalho na organização adventista.
  • Estabelece que pastores jubilados com credencial especial que decidirem lançar candidatura ou atuar em qualquer trabalho direta ou indiretamente relacionado à política partidária, como assessorias, propaganda, publicidade, ou outras atividades afins, tenham sua credencial suspensa, enquanto durar esse envolvimento.
  • Reconhece que, quando membros adventistas se candidatarem a cargo eletivo com mandato, serão candidatos exclusivamente do partido político ao qual se filiarem e nunca candidatos da Igreja Adventista.
  • Estabelece que, quando surgirem situações em que candidatos, membros da igreja ou não, no exercício do mandato, estiverem concorrendo à reeleição ou a qualquer outro cargo público eletivo, serão tratados de acordo com as orientações deste documento.
  • Orienta aos administradores das Associações/Missões e Uniões a serem cautelosos quando consideraram apropriado informar às lideranças eclesiásticas locais (pastores e anciãos) sobre a candidatura de membros adventistas. Que o façam com prudência, sem pedir votos, com toda discrição que a situação exige e em circunstâncias que não contrariem as diretrizes deste documento.
  • Não autoriza que seus membros, quer sejam oficiais públicos, candidatos ou aqueles que tiverem sido eleitos, representem ou falem oficialmente em nome da Igreja Adventista no exercício de suas funções.

Como cristãos, reconhecemos o papel legítimo dos governos organizados na sociedade, respeitamos o direito do Estado de legislar nas questões seculares e consentimos com essas leis quando não contrariam os preceitos divinos. Entendemos também que nossos membros devem assumir responsabilidades civis com seriedade e exercer o papel de cidadãos, mas sem se esquecer da cidadania celestial.

Não desmerecendo as questões políticas e sua importância, entendemos ser um dever da Igreja dar o devido destaque ao objetivo de desenvolver práticas que resultem no fortalecimento da fé e promovam a esperança na iminente volta do Senhor Jesus Cristo. Reconhecemos que a vocação de pregar o evangelho envolve executar ações de solidariedade que expressem amor ao próximo e produzam alívio ao sofrimento humano. Por isso, todo esforço e toda energia devem ser canalizados para o serviço desinteressado em favor das pessoas, revelando profundo interesse na sua salvação. Seja nossa oração: “Vem, Senhor Jesus” (Apocalipse 22:20).

Extraído do Documento Oficial da IASD - Adventistas e a Política

O JULGAMENTO DE JESUS

Estudei o chamado “julgamento” de Jesus em uma perspectiva legal, e descobri que as injustiças foram muito maiores do que eu imaginava. Jesus foi processado e condenado por dois tribunais: o Sinédrio (o Supremo Tribunal Hebraico) e o Romano. Ambos sistemas judiciais são conhecidos pela maneira zelosa com que defendiam a justiça. No entanto, esses sistemas legais foram prostituídos para destruir o homem mais inocente que já viveu.1

A prisão de Jesus, o julgamento e a sentença foram processos ilegais, tornando Seu caso uma farsa total, do início ao fim! “Durante todo o decurso desse julgamento, as regras do processo da lei judaica foram repulsivamente violadas, e o acusado foi privado dos direitos pertencentes até ao mais insignificante cidadão. Ele foi preso à noite, amarrado como um malfeitor, espancado antes de Sua acusação e golpeado em audiência pública durante o julgamento; foi julgado em um dia de festa, antes do amanhecer; foi obrigado a incriminarSe, sob um juramento judicial solene, e foi condenado no mesmo dia da acusação. Em todos esses aspectos, a lei foi totalmente desconsiderada.”2 Este artigo consiste na análise das violações da lei hebraica e romana que culminaram no assassinato de Jesus.

VIOLAÇÕES DA LEI HEBRAICA

A prisão de Jesus, por si só, foi ilegal em pelo menos três fundamentos do direito hebraico: o aprisionamento foi feito à noite; foi realizado com a participação de Judas, que teria sido considerado cúmplice de Jesus; e não foi baseado em causa provável por oficiais que procuravam por um julgamento justo.3

O processo judeu foi feito à noite, sigilosamente. Julgamentos à noite eram proibidos4, e por uma boa razão: eles poderiam ser usados para encobrir interesses escusos, sem o devido processo legal. Também foi solapado o direito de participação do público. Grande parte do julgamento foi em oculto, mas a lei hebraica exigia que o julgamento fosse público.5

O Sinédrio não realizou duas sessões com um dia de intervalo. As duas sessões foram realizadas, no máximo, com apenas algumas horas de intervalo.6 Isso não ofereceu oportunidade para que as cabeças esfriassem e a justiça pudesse prevalecer. Em casos importantes, a sentença não poderia ser pronunciada até a tarde do segundo dia. Se o Sinédrio votasse para condenar no primeiro dia, eles deviam deixar a sala de pedra lavrada e reunir-se em grupos de cinco ou seis para discutir o caso. Eles voltavam para casa de dois em dois, de braços dados, ainda buscando argumentos a favor do acusado. Depois do pôr do sol, convocavam um ao outro para discutirem o caso e orar por orientação divina. No dia seguinte, deveriam orar e jejuar até que o caso fosse decidido. Eles se encontravam após o sacrifício da manhã e novamente analisavam as evidências. Podiam mudar o voto para absolver o acusado, mas não para condená-lo. Antes da execução, convidavam pessoas que acompanhavam o julgamento a apresentar, se tivessem, evidências a favor do condenado.7 Jesus não foi beneficiado pelo adequado processo legal, pois os juízes eram obrigados a fazer duas sessões, com um dia de intervalo. Também não era permitido que se reunissem no sábado semanal ou no sábado festivo, além de não terem autorização para reunir-se no dia anterior ao sábado.8

O julgamento ocorreu antes do sacrifício da manhã. De acordo com a lei hebraica, “nenhum homem era considerado competente para atuar como juiz antes do sacrifício e orações que tinham sido oferecidos ao grande Juiz do Céu”.9

Jesus foi agredido fisicamente durante o julgamento, embora Ele devesse ter sido presumido inocente e tratado com respeito. Jesus foi golpeado por um oficial que não gostou da maneira como Ele falou com Anás (João 18:22). Entre as duas sessões do Sinédrio, Jesus também foi repetidamente espancado. Cuspiram nEle, vendaram Seus olhos e O ridicularizaram (Mateus 26:67 e Marcos 14:65, Lucas 22:63-64). Foram atos de brutalidade ultrajantes e cruéis que a lei hebraica não permitia.

As acusações contra Jesus eram vagas. No decorrer do julgamento, a acusação foi mudada de sedição – o que não foi provado, pois as testemunhas “não estavam de acordo” – para blasfêmia, uma vez que Jesus afirmou ser o Filho de Deus (Marcos 14:55-64). As acusações contra um réu deveriam ser sobre um crime específico, e o julgamento precisaria estar baseado nessa acusação. Ainda hoje, se durante um julgamento um promotor não conseguir provar as acusações originais e, por isso, tentar alegar um novo crime, o juiz e o júri irão considerar essa tentativa absurda. Quando as falsas testemunhas contra Cristo não conseguiram provar o crime de sedição, o caso deveria ter sido anulado.10 Blasfêmia, a nova acusação, era um dos delitos conhecidos como dos mais graves para os judeus, porque desrespeitava o próprio Deus, e por isso era considerado equivalente à traição.

O juiz do Sinédrio iniciou a nova acusação de blasfêmia (Mateus 26:63-66). Os juízes do Sinédrio não podiam acusar ou julgar, mas apenas investigar as acusações feitas por testemunhas.11 As testemunhas tinham que dar início às acusações, atuar como promotores, e até mesmo executar a sentença em casos de morte.12 Deuteronômio 17:7 diz: “As mãos das testemunhas serão as primeiras a proceder à sua execução, e depois as mãos de todo o povo.” Aparentemente, a razão para essa regra é que se você tivesse que apedrejar alguém até a morte, você seria levado a pensar duas vezes sobre o motivo de sua acusação. Na realidade, nenhuma testemunha se apresentou para acusar a Jesus de blasfêmia. Acusando a Jesus de blasfêmia, o juiz agiu como um promotor, embora devesse atuar como defensor.13 Além disso, nenhum juiz poderia falar contra o acusado até que, pelo menos, um juiz tivesse falado em seu nome,14 o que não aconteceu no julgamento de Jesus.

A convicção de que Jesus cometera o crime de blasfêmia foi baseada em Suas próprias declarações, e em mais nada.15 A lei hebraica proíbe condenar alguém com base unicamente em sua própria admissão.16 O mesmo ocorre em muitos tribunais modernos, como base no princípio jurídico de Corpus Delicti. Nenhuma testemunha se apresentou para acusar Jesus de blasfêmia.

Jesus foi condenado pelo voto unânime do Sinédrio, que deveria ter resultado em absolvição. Marcos 14:64 diz: “Todos o julgaram digno de morte.” Um júri anglo-saxônico em geral deve ser unânime para chegar a um veredito válido, mas não deveria ser assim com a lei hebraica. A lei hebraica argumentava que o acusado precisava ter pelo menos um defensor no tribunal. De outra forma, a misericórdia estaria ausente, e daria espaço para o espírito de conspiração ou a violência da multidão.17

Os juízes não eram qualificados porque subornaram Judas para lhes entregar Jesus. O próprio Judas admitiu que Jesus era inocente quando confessou publicamente “traí sangue inocente” (Mateus 27:4).

Os juízes eram tendenciosos contra Jesus e O odiavam absolutamente. Portanto, não eram qualificados para julgá-lO de maneira justa. Várias vezes, o chefe dos sacerdotes e os fariseus conspiraram para matar Jesus, inclusive depois que Ele ressuscitou a Lázaro de entre os mortos. João 11:53 registra que “daquele dia em diante, resolveram tirar-lhe a vida”. “Quando um juiz decide em desacordo com a verdade, ele faz a majestade de Deus se afastar de Israel. Mas se julga de acordo com a verdade, mesmo que seja apenas por uma hora, é como se ele restaurasse o mundo inteiro, pois é no julgamento que a presença divina encontra sua habitação em Israel.”18

Os juízes ignoraram a evidência esmagadora a favor de Cristo ser o Messias e, portanto, ser inocente do crime de blasfêmia. A lei hebraica exigia que fossem feitos todos os esforços para encontrar evidências a favor do acusado.19 De acordo com o Antigo Testamento, Jesus cumpriu todas as profecias que mostram que Ele é o Messias. Por exemplo, Ele nasceu em Belém, nasceu de uma virgem, era da casa de Davi, fugiu para o Egito, operou milagres, fez uma entrada triunfal sobre um jumento em Jerusalém, foi traído por 30 moedas de prata, e foi um homem de aflições, pobreza e sofrimento, para citar apenas algumas evidências.

Os juízes procuraram e chamaram falsas testemunhas para condenarem a Jesus. Mateus 26:59-61 diz: “Os chefes dos sacerdotes e todo o Sinédrio estavam procurando um depoimento falso contra Jesus, para que pudessem condená-lo à morte, mas não encontraram, embora se apresentassem muitas falsas testemunhas. Finalmente, surgiram duas testemunhas que afirmaram: ‘Este homem disse: Sou capaz de destruir o santuário de Deus, e reconstruí-lo em três dias.’” Supostamente um julgamento é a busca pela verdade.

A exigência de que pelo menos duas testemunhas, que concordassem em detalhes essenciais, incriminassem a Jesus, não foi cumprida (Deuteronômio 17:6).

VIOLAÇÕES DO DIREITO ROMANO

Depois de violarem impiedosamente muitas de suas próprias leis destinadas a salvaguardar a justiça, os judeus, em seguida, procuraram as autoridades romanas para executarem a sentença de morte contra Jesus. Por causa de sua reputação de ser injusto e cruel, os judeus estavam confiantes em que Pilatos honraria o desejo demoníaco deles, embora Roma se orgulhasse de ter um sistema judicial muito civilizado e justo. Como o advogado Walter Chandler observou: “O sistema judicial romano é incomparável na história da jurisprudência. A Judeia deixou o legado da religião; a Grécia, da literatura; Roma, das leis para a humanidade. Com base nisso, são realizados os julgamentos em todo o mundo.”20

Mau como era, Pilatos viu algo diferente no prisioneiro que estava diante dele. Em vez de carimbar o desejo de morte, ele exigiu que apresentassem as acusações contra Jesus. Os judeus condenaram Jesus por blasfêmia, mas sabiam que essa acusação religiosa não seria suficiente para os romanos. Então, a acusação religiosa foi transformada em acusação política. De acordo com Lucas 23:1 e 2, acusaram Jesus de três violações do direito civil, que culminavam em traição contra César: perversão da nação – sedição contra o governo; proibição do pagamento de impostos, o que é suficiente para chamar a atenção de qualquer político; e alegação de ser rei – traição contra César. Jesus admitiu a Pilatos que Ele era um rei, mas que Seu reino não era deste mundo e que não era uma ameaça para o governo romano. Como os judeus, Pilatos, então, cometeu uma série de erros judiciais, desviando-se das proteções fundamentais das leis romanas.

Pilatos violou a lei contra a dupla incriminação. Depois de investigar a Cristo, e sem testemunhas de acusação, Pilatos deu o veredito: “Não acho nEle motivo algum de acusação” (João 18:38). Segundo Simon Greenleaf, que foi um proeminente professor da Faculdade de Direito da Universidade de Harvard, a decisão de Pilatos “era uma sentença de absolvição, judicialmente pronunciada e irreversível, exceto por um poder superior, mediante recurso. Era dever de Pilatos ter liberado Jesus”. 21 Pilatos tinha o dever de fazer cumprir sua decisão, de expedir soldados romanos para dispersar a enfurecida multidão, e proteger Jesus de seu descontrole. Os judeus se recusaram a aceitar o veredito de Pilatos e inventaram outra acusação de sedição, afirmando que Jesus subverteu o povo da Galileia contra Jerusalém (Lucas 23:4-5). A lei contra a dupla incriminação diz que um homem não pode ser julgado duas vezes pela mesma conduta. Essa lei originou-se com o direito romano, e é um princípio importante na jurisprudência moderna. Pilatos ignorou essa lei e manteve ativo o processo contra Jesus. Pilatos era um covarde, e estava tentando satisfazer sua consciência e a multidão. Vendo uma saída fácil, Pilatos, então, enviou o caso para Herodes. Inescrupuloso como era, Herodes se recusou a condenar Jesus. Atitude equivalente a uma nova absolvição.

Depois de absolver novamente a Jesus, em uma vã tentativa de manter um compromisso com a multidão, Pilatos ordenou que um homem inocente fosse punido com uma surra cruel (Lucas 23:13-16). Essa ação era flagrantemente imoral, ilegal e covarde. Se Jesus era culpado, Ele deveria ter sido punido com algo mais do que uma surra. Mas se era inocente, deveria ter sido libertado e protegido dos judeus. Como o castigo de Jesus não conseguiu apaziguar os acusadores, Pilatos fez outra tentativa frustrada de encerrar o caso: matar um homem. Em comemoração à Páscoa judaica, ele estava disposto a libertar a Jesus ou ao desprezível Barrabás, que era realmente culpado de sedição, roubo e assassinato – acusações levantadas contra Jesus. Pilatos subestimou o ódio dos judeus por Cristo. Os judeus escolheram a libertação de Barrabás e pediram a crucificação do Messias do mundo.

Pilatos mostrou total desprezo pelo inocente Filho de Deus e pela seriedade dos processos judiciais, permitindo que Jesus fosse escarnecido com um manto real púrpura e uma coroa (João 19:2-5).

Pilatos anulou o Estado de Direito, que exige a absolvição de um homem inocente, para preservar sua função política. Pilatos ilegalmente reverteu os seus múltiplos vereditos de inocência, quando os judeus o ameaçaram com uma queixa para César. Uma regra bem estabelecida do direito romano declarava: “O clamor infundado da população não deve ser considerado quando clamam para que um homem culpado seja absolvido ou um inocente seja condenado.”22 Com um show teatral, Pilatos lavou as mãos, quando deveria tê-las usado para “apontar à legião o campo do dever e da glória”23 a fim de combater o crime organizado. A água não lavou o sangue de Jesus de suas mãos. Toda “a água do Mediterrâneo não teria sido suficiente para lavar a culpa do governador romano”.24 Pilatos condenou e matou a Jesus, mesmo que nenhum crime tenha sido declarado formalmente; nenhuma testemunha, chamada; nenhuma evidência, apresentada; nenhuma prova de um ato criminoso, encontrada; e Ele tenha sido considerado inocente! 25

O objetivo deste artigo não é tanto condenar os tribunais humanos, mas elevar a majestade de Jesus Cristo. Quanto maior a injustiça sofrida por Jesus, mais Seu amor brilha por nós. Quanto mais escura a noite, maior o brilho de Sua luz. Embora eu tenha crescido como um cristão e tenha sido ensinado sobre Jesus, não me converti até que tive um encontro pessoal com a injustiça do Calvário. A vontade de Jesus em suportar com paciência e sem oposição a maior farsa da injustiça que o mundo já havia conhecido revelou-me o perfeito amor e bondade de Deus. Então O aceitei em minha vida, e Ele preencheu com alegria meu coração vazio – que em vão tinha perseguido poder, prazer, status e riqueza. Embora seja interessante avaliar todas as injustiças cometidas por judeus e romanos; em última análise, todos somos responsáveis pela morte de Cristo, já que Ele foi “ferido por nossas transgressões” (Isaías 53:5). “Cristo foi tratado como nós merecíamos para que pudéssemos receber o tratamento a que Ele tinha direito. Foi condenado pelos nossos pecados, nos quais não tinha participação, para que fôssemos justificados por Sua justiça, na qual não tínhamos parte. Sofreu a morte que nos cabia, para que recebêssemos a vida que a Ele pertencia. Pelas Suas pisaduras fomos sarados.”26

David Steward (via Diálogo)

REFERÊNCIAS

  1. Honorable Harry Fogle. The trial of Jesus. Jurisdictionary Foundation, Inc., 2000.
  2. GREENLEAF, Simon. The testimony of the evangelists examined by the rules of evidence administered in courts of justice. New York: James Cockcroft & Company, 1874. p. 566.
  3. CHANDLER, Walter M. The trial of Jesus from a lawyer’s standpoint. New York: The Empire Publishing Co., 1908. Vol. 1. p. 226-237.
  4. DUPIN, M. The trial of Jesus before Caiaphas and Pilate. Trad. John Pickering. Boston: Charles C. Little e James Brown, 1839., p. 37.
  5. SALVADOR, Joseph. Histoire des institutions de Moise. Paris: Michel Levy-Freres, 1862). p. 365-366.
  6. BUNCH, Taylor. Behold the man. Mountain View, Califórnia: Pacific Press, Assn., 1940, p. 84-85.
  7. Ibid, p. 67.
  8. WISE, Isaac M. The martyrdom of Jesus. Cincinnati/Chicago: The Bloch Publishing and Printing Co., 1888. p. 91.
  9. BUNCH, p. 90.
  10. Ibid, pp. 85-87.
  11. EDERSHEIM, Alfred. The life and times of Jesus the messiah. New York: Longmans, Green and Company, 1906. p. 309.
  12. MENDELSOHN, S. The criminal jurisprudence of the ancient hebrews. Baltimore: M. Curlander, 1891. p. 110.
  13. BUNCH, p. 64.
  14. Ibid, p. 67.
  15. Ver Marcos 14:61-64.
  16. BUNCH, p. 93
  17. CHANDLER, vol. 1, p. 280
  18. BUNCH, p. 66.
  19. Ibid, p. 105.
  20. CHANDLER, vol. 2, p. 5.
  21. GREENLEAF, p. 565.
  22. DUPIN, p. 81-82 (nota de rodapé da página: Law 12, Code de Poenis)
  23. CHANDLER, vol. 2, 00. p. 137-138.
  24. BUNCH, p. 159.
  25. ROSADI, Giovanni. The trial of Jesus. New York: Dodds, Mead & Company, 1905. p. 237-237, 288, 294.
  26. WHITE, Ellen G. O desejado de todas as nações. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2001. p. 25.

quinta-feira, 12 de setembro de 2024

UM GALO E UM OLHAR

"O galo cantou. O Senhor voltou-se e olhou diretamente para Pedro" (Lucas 22:60-61).

Pedro não foi escolhido por acaso. Sua história de altos e baixos, erros e acertos, simboliza a experiência de muitos outros discípulos do Mestre, em diferentes tempos e lugares. É o retrato de quem possui um coração cheio de paixão, mas carente de sentido. É a minha história e a sua também.

Jesus não poderia permitir que três negações escrevessem um final sombrio para a história do grande discípulo. Mas o que me chama a atenção é a maneira como Cristo alcançou o coração de Pedro, naquela hora estranha. Instrumentos inusitados: um galo e um olhar.

Não foi um anjo, um milagre. Não foi um raio, um trovão. Não foi um grito. Se Jesus chamasse Pedro pelo nome, naquele dia haveria uma cruz a mais. Mas se nenhum contato fosse estabelecido entre os dois, talvez contássemos hoje a história de duas forcas.

O galo cantou e os olhos de Pedro foram atraídos pelo olhar do homem rejeitado. Fronte arroxeada, lábio inferior rachado, supercílio sangrento: face desfigurada. Mas os olhos tinham um milagre a oferecer. As trevas da noite não impediram que Pedro fosse tocado pelo perdão e compaixão expressos naquele olhar. É interessante observar que, mesmo constrangido, envergonhado e sem explicações, o pescador não desviou o olhar. Certamente lembrava de seu naufrágio pessoal, na última vez que tirara os olhos de Cristo.

Em Patmos, João também foi impressionado pelo olhar do Filho do Homem. Ao descrever a cena, entre outras coisas, ele disse: "Seus olhos eram como chama de fogo" (Apocalipse 1:14). Muitos desconhecem o sentido dessas palavras. Afinal, que sentido há em comparar o olhar de Cristo ao fogo? Mas pare para pensar: se quisesse perfurar uma superfície muito dura, como aço, o que você utilizaria? Um prego não resolveria o problema. Um martelo seria de pouca utilidade. Não há nada melhor que o fogo. Para João, o olhar de Jesus é olhar que a tudo penetra. Seus olhos são capazes de enternecer o coração mais frio, a vida mais endurecida pelo pecado.

Talvez hoje mesmo você esteja se escondendo pelos cantos da vida, negando a Cristo com o silêncio de suas atitudes. Será que as pessoas em sua casa, em seu trabalho, na faculdade, têm ouvido algo além de suas três negações? O que é preciso acontecer para que sua história mude de uma vez? A que horas o seu galo vai cantar?

Um galo e um olhar foram o suficiente para que Pedro percebesse sua situação e se levantasse arrependido. Fique atento aos pequenos sinais que o Céu lhe envia: um conselho, uma perda, uma chance, uma frase, um apelo...

Tem alguém olhando para você.


"Pedro tinha negado seu Senhor, mesmo com maldição e juramento; mas aquele olhar de Jesus como que dissolveu o coração de Pedro, e o salvou. Ele chorou amargamente, arrependeu-se de seu grande pecado e converteu-se; e, então, ficou preparado para fortalecer seus irmãos" (Ellen G. White - História da Redenção, p. 214).

quarta-feira, 11 de setembro de 2024

QUEM FOI MALCO?

Malco foi um servo do sumo sacerdote Caifás, cuja orelha direita foi cortada por Pedro na ocasião da prisão de Jesus no Getsêmani. A história do incidente envolvendo Malco está registrada nos Evangelhos Sinóticos (Mateus 26:51; Marcos 14:47; Lucas 22:49-51). Porém, é o Evangelho de João que fornece mais detalhes sobre o ocorrido (João 18:10).

Malco e a prisão de Jesus
A Bíblia diz que na noite em que foi traído, Jesus foi ao Getsêmani com seus discípulos com o objetivo de orar ao Pai. Certa altura da noite, ali mesmo no jardim, vieram os homens que receberam a responsabilidade de capturar o Senhor.

Esses homens eram guardas do Templo que estavam a serviço do sumo sacerdote Caifás. Com eles também estavam os legionários romanos. Malco não pertencia a nenhum destes dois grupos. Ele era um servo pessoal de Caifás. Todos eles foram guiados por Judas Iscariotes, o discípulo traidor que se comprometeu a identificar Jesus.

Segundo a narrativa bíblica, Malco estava entre os primeiros homens que chegaram para capturar o Senhor. Os oficiais que integravam a guarda do Templo andavam armados e por vezes eram agressivos.

Pedro corta a orelha de Malco
Quando os homens que foram capturar Jesus se aproximaram dele, Pedro reagiu rapidamente. Ele desembainhou sua espada e cortou a orelha direita de Malco. Todo o contexto parece sugerir que Malco também estava armado naquela ocasião. A espada utilizada por Pedro certamente era uma das duas espadas que os discípulos carregavam naquela noite (Lucas 22:38).

Apesar de esse episódio ter sido registrado nos quatro Evangelhos, apenas João informa que o nome do servo do sumo sacerdote que teve sua orelha decepada era Malco. Da mesma forma, João também é o único a informar que foi o apóstolo Pedro quem cortou a orelha direita de Malco. Ellen White diz: "Em sua indignação, Pedro puxou precipitadamente da espada e procurou defender o Mestre, mas apenas cortou uma orelha do servo do sumo sacerdote" (O Desejado de Todas as Nações, p. 491).

Ao cortar a orelha de Malco, Pedro não estava apenas ferindo alguém para proteger Jesus, ele estava também acabando com todos os sonhos daquele jovem, pois não se podia ter qualquer mancha ou defeito para ser escolhido sacerdote no templo. Não importava a realidade ou circunstância, o sacerdote devia ser perfeito fisicamente, e uma orelha a menos não tornava as coisas mais fáceis neste sentido. Talvez a situação toda não tenha demorado muito, na verdade a narrativa bíblica dá mesmo a entender que não se passaram nem cinco minutos naquelas circunstâncias, mas deve ter sido uma eternidade para o jovem Malco que vê o sangue jorrar, a orelha cair, seus sonhos despencarem. Pedro deve ter parado por um instante e pensado que errou, afinal ele não merecia perder a orelha apenas, mas a cabeça toda. Estava do lado errado, na hora errada e tentando prejudicar o único certo. Só que nesta confusão toda, estava Jesus.

Após cortar a orelha de Malco, Pedro imediatamente foi repreendido por Jesus. Em primeiro lugar, Jesus lhe avisou que todos aqueles que lançam mão da espada, à espada morrerão. Em segundo lugar, Jesus lhe disse que se fosse para alguém defendê-lo, Ele teria orado ao Pai para que Ele enviasse mais de doze legiões de anjos. Em terceiro lugar, Jesus deixou claro que era da vontade do Pai que Ele sofresse, conforme havia sido revelado nas Escrituras (Mateus 26:52-54).

Jesus cura a orelha de Malco
Mesmo em meio a todo aquele tumulto, Jesus tocou a orelha de Malco e o curou (Lucas 22:51). É interessante notar que mesmo na hora de sua prisão, Jesus mostrou misericórdia e compaixão justamente a um daqueles homens que foram prendê-lo.

A maravilha desta história é pensar que Jesus aparece e ajuda até quem não merece, até quem não pede e até quem luta contra Ele. Uma lição para quem se julga cristão. Afinal, você ampara quem precisa, quando não é uma pessoa que você gosta muito? Como você reage quando um amigo ou irmão peca e o povo todo vira as costas e parece queimar o filme andar com a pessoa? Você faz como Pedro que agride e mostra logo que não é daquele grupo errado ou como Cristo que apoia, sente a dor e tenta ajudar na restauração?

Este foi o último milagre de cura feito por Jesus Cristo em seu ministério terreno que ficou registrado na Bíblia. Mais tarde, uma pessoa que era parente de Malco identificou Pedro como um dos seguidores de Jesus. No entanto, Pedro negou conhecer o Senhor (João 18:26).

Não se sabe o que aconteceu com Malco, pois a Bíblia não conta, mas é certo que sua vida nunca mais foi a mesma. Ele encontrou a fonte do amor, recebeu um milagre especial e foi testemunha de uma prisão injusta do ser mais bondoso que conheceu. Malco pode ter continuado no templo, ou abandonado o interesse da vida religiosa, mas levou para sempre a lição daqueles minutos com Cristo e este deve ser nosso exemplo para vida!

LIÇÕES DE UM JOVEM NU

“Um jovem, vestindo apenas um lençol de linho, estava seguindo Jesus. Quando tentaram prendê-lo, ele fugiu nu, deixando o lençol para trás” (Marcos 14:51, 52).

A cidade de Jerusalém estava vivendo a noite mais dramática de sua história. Judas liderava a turba de sacerdotes e soldados que iam prender Jesus. Já era noite. Muitas pessoas apenas observaram a cena, mas um jovem não se conteve. Do jeito que estava, enrolado em um lençol, pulou de sua cama e infiltrou-se no meio da turba que estava levando Jesus preso. Ele não se deu conta de que estava indevidamente vestido e de que poderia ser exposto ao vexame.

"O lençol era de linho, tecido usado apenas por pessoas ricas. Este jovem saiu sem as roupas de baixo, um indicativo de que havia se vestido com pressa para seguir Jesus. A tradição diz que pode ter sido João Marcos. Esta é a única passagem nos evangelhos na qual encontramos uma menção ao incidente" (Bíblia de Estudo Andrews).

Esse jovem é um símbolo daqueles que seguem a multidão, mas sem saber direito o que está acontecendo. Ele representa os seguidores ocasionais e os discípulos de plantão. O jovem estava seguindo a Jesus, mas sem medir as consequências. Estava vestido inconvenientemente e despreparado para enfrentar as dificuldades. Esse texto nos ensina algumas lições:

Primeira - os que se cobrem com um lençol representam os que seguem a Cristo sem compromisso. Aquele jovem tornou-se um discípulo casual, de improviso, que seguia a Jesus movido apenas pela curiosidade. Ainda hoje, muitos estão na igreja, mas não seguem a Jesus de verdade. Estão no meio da multidão, mas não têm qualquer aliança com Ele.

Segunda - os que se vestem com um lençol são um símbolo daqueles que vivem superficialmente. O lençol era a única cobertura que aquele jovem possuía; portanto, era uma proteção superficial. Quando lhe arrancaram o lençol, não havia mais nada para lhe proteger a vergonha. Hoje, ainda há muitas pessoas que vivem uma vida rasa, descomprometida, superficial. Têm apenas um verniz, uma aparência de piedade, mas nenhuma essência de santidade.

Terceira - aqueles que se cobrem com um lençol são adeptos do pragmatismo. Eles preferem o que certo em lugar do que é certo. Não era certo sair de lençol, mas naquele momento deu certo. Era noite, e ele pensou que poderia passar despercebido. O lençol enrolado no corpo, à noite, parecia uma vestimenta decente. Sua ética era a ética do momento, da conveniência. Muitos ainda hoje agem da mesma forma. Estão mais preocupados com resultados do que com a Verdade; buscam mais a conveniência pessoal do que fazer o que é certo diante de Deus.

Quarta - aqueles que se cobrem com um lençol são um símbolo daqueles que não podem se defender. Aparentemente favorecido pela escuridão, na verdade o jovem viu-se indefeso quando foi atacado. Ao precisar usar suas mãos, o lençol caiu e ele ficou nu. Eram suas mãos que faziam com que o lençol aderisse ao corpo. Ao liberar as mãos, o lençol caiu e ele ficou vulnerável, exposto, desprotegido. O inimigo agarrou o lençol, a única coisa que lhe protegia. Ficou nu. Fugiu nu.

As máscaras podem nos esconder por um tempo, mas ninguém consegue prendê-las com plena segurança. Uma hora a máscara cai e deixa a pessoa em maus lençóis, ou pior, sem lençol. Muitos se infiltram no meio da multidão despreparados para a luta. Na hora da crise, quem estiver trajando apenas um lençol ficará exposto ao opróbrio e à vergonha.

Você precisa trajar toda a armadura de Deus! Você precisa ser um discípulo de verdade, um seguidor de Cristo pronto a viver e morrer com Ele e por Ele, sem precisar fugir envergonhado.

Séculos antes dessa ocorrência, no Éden, Adão e Eva se viram despidos de sua pureza e santidade (Gn 3:7). Então, “sentiam temor pelo futuro, a falta de alguma coisa, uma nudez de alma. […] Sentiram uma carência que nunca tinham experimentado antes” e tomaram eles mesmos providência para cobrir a nudez (Ellen White, História da Redenção, p. 38). No Apocalipse, a igreja de Laodiceia esconde a própria nudez, sob as vestes tecidas dos próprios méritos (Ap 3:18). Entretanto, nem folhas de figueiras de um cristianismo superficial nem as finas vestes laodiceanas de nossos melhores feitos cobrem a nudez espiritual. A graça de Cristo é a única cobertura a que devemos recorrer.

terça-feira, 10 de setembro de 2024

POR QUE JUDAS TRAIU JESUS?

Existem muitas dúvidas sobre as motivações que impulsionaram e, por fim, levaram Judas a entregar Jesus aos líderes judeus. Podemos destacar algumas questões, mas é complicado oferecer uma resposta definitiva para essa pergunta.

1. Processo longo. Temos que admitir que Judas se uniu aos discípulos motivado pelo caráter amoroso de Cristo e pelo poder que Ele demonstrou durante Seu ministério (Mt 10:4). Assim como os outros discípulos, Judas veio a Jesus com suas imperfeições, mas nunca as dominou. A mais perniciosa delas era a avareza, que o cegou para a verdadeira natureza da obra de Cristo (Jo 12:6; cf. Mt 26:15). Depois de permanecer com Jesus cerca de um ano, é provável que Judas tenha expressado suas frustrações aos discípulos e talvez tenha criticado, pelas costas, o trabalho de Jesus. Isso levou o Mestre a fazer uma pergunta retórica aos discípulos: “Não é fato que Eu escolhi vocês, os doze? Mas um de vocês é um diabo [diabolos, caluniador, adversário]” (Jo 6:70, NAA). Nesse ponto, Judas ainda não estava pensando em traí-Lo (v. 71; cf. Lc 6:16).

A frustração de Judas com a direção do trabalho de Jesus atingiu um ponto crucial após Maria tê-Lo ungido com um perfume tão valioso. Ele escondeu sua verdadeira oposição, mas seu egoísmo foi exposto, e Jesus o repreendeu com delicadeza (Jo 12:5-8). Desta vez, Judas buscou os líderes judeus com o propósito de trair o Mestre (Mc 14:10; Mt 26:14). No momento da Última Ceia, o inimigo já havia colocado no coração de Judas a ideia de trair Jesus (Jo 13:2). O ponto de não retorno foi alcançado durante a Ceia, quando Jesus o identificou como traidor, dizendo que Satanás havia entrado nele (v. 27). O texto bíblico relata que “Judas logo saiu. E era noite” (v. 30).

2. A motivação. É seguro afirmar que Judas era dominado pelo egoísmo e pela avareza, o que o levou a trair Jesus. Em primeiro lugar, podemos presumir que Judas, assim como os outros discípulos, acreditava que Jesus era um Messias político destinado a libertar Seu povo dos romanos. Unir-se a Ele poderia assegurar-lhe uma posição proeminente no reino de Cristo. Em segundo lugar, Judas logo começou a perceber que a visão de Jesus para Seu reino era de natureza espiritual, não militar, e isso o frustrou. Ao que parece, após a tentativa fracassada do povo de coroar Jesus como rei à força, Judas começou a questionar se deveria manter sua lealdade a Ele (Jo 6:14, 15, 70, 71). Em terceiro lugar, é provável que Judas não tenha gostado da ideia de Jesus estar prevendo Sua própria morte, algo incompatível com o conceito de Messias militar que ele tinha em mente (cf. Mc 14:8, 10). Em quarto lugar, sabemos que, ao entregar Jesus, Judas esperava que, como em ocasiões anteriores, Ele escapasse (Mt 27:3), talvez antecipando uma demonstração de Jesus como um Messias militar.

Durante a prisão do Salvador, tornou-se evidente que Ele poderia ter escapado, mas optou por não fazê-lo (Jo 18:5-8). Ficou claro que Jesus, e não os soldados ou Judas, estava no controle de Seu destino. Quando Judas percebeu que Jesus estava prestes a ser morto, tentou interromper o que pensava ter desencadeado (Mt 27:3, 4), porém era tarde demais; Jesus tinha vindo para morrer. Impelido por um profundo sentimento de culpa, Judas saiu e tirou sua própria vida (v. 5). Sim, Judas ansiava por um lugar no reino militar de Cristo visando ao benefício pessoal, mas não no Seu reino espiritual. Judas jamais compreendeu que a missão de Jesus era oferecer Sua vida em favor daqueles que integrariam Seu reino eterno.

Ángel Manuel Rodríguez (via Revista Adventista)

Ilustração: O beijo mais famoso nas páginas do NT e, possivelmente em toda a Bíblia, é o beijo traidor dado por Judas a Cristo. Pv 27:6 diz que “fiéis são as feridas feitas pelos que ama, mas os beijos do que aborrece são enganosos”. Dos quatro Evangelistas, três deles mencionam a cena do beijo traidor. João a silencia. O texto de Lucas o conta assim: “E, estando ele ainda a falar, surgiu uma multidão; e um dos doze, que se chamava Judas, ia adiante dela, e chegou-se a Jesus para o beijar. E Jesus lhe disse: Judas, com um beijo trais o Filho do homem?” (Lc 22:47-48). Ellen White comenta: "Cristo não recusou o beijo do traidor. Nisso, Ele nos deu exemplo de tolerância, amor e simpatia. Se somos Seus discípulos, devemos tratar nossos inimigos como Ele tratou Judas" (Vida de Jesus, p. 86).

Ellen White diz que "a história de Judas apresenta o triste fim de uma vida que poderia ter sido honrada por Deus. Judas tinha naturalmente grande amor ao dinheiro. Alimentara o mau espírito de avareza até que se lhe tornara o motivo dominante na vida. O amor de Mamom sobrepujara o amor de Cristo. Tornando-se escravo de um vício, entregou-se a Satanás, para ser impelido a toda extensão do pecado" (O Desejado de Todas as Nações, p. 504).

Sem rendição incondicional e completa a Jesus, não há caráter que possa ser transformado, fraquezas que possam ser vencidas, más tendências que possam ser redirecionadas. Só existe um meio pelo qual podemos ser desviados do caminho do espírito crítico e insubmisso, autossuficiência, vaidade, hipocrisia, desonestidade, avareza e de interesse egoísta, que caracterizou Judas. Esse meio é o reconhecimento de nossa vulnerabilidade e a entrega sincera e diária do controle da vida a Ele, que conhece os verdadeiros motivos e intenções do coração.

segunda-feira, 9 de setembro de 2024

MANIFESTAÇÕES

Manifestações políticas e sociais marcaram o feriado de 7 de setembro. Na Avenida Paulista, em São Paulo, oposicionistas ao governo liderados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e o pastor Silas Malafaia realizaram um protesto com forte tom político. Simultaneamente, o Grito dos Excluídos e Excluídas ecoou em várias cidades do país, com foco na defesa dos direitos dos mais vulneráveis.

Essas manifestações públicas exigem reflexão e respostas sobre as seguintes questões: Os cristãos deveriam participar desses atos públicos? Pastores e servidores da organização adventista deveriam sair às ruas e apoiar protestos populares?

Vale a pena mencionar uma citação inspirada da escritora Ellen White, que esclarece alguns pontos: “O governo sob que Jesus viveu era corrupto e opressivo; clamavam de todo lado os abusos — extorsões, intolerância e abusiva crueldade. Não obstante, o Salvador não tentou nenhuma reforma civil. Não atacou nenhum abuso nacional, nem condenou os inimigos da nação. Não interferiu com a autoridade nem com a administração dos que se achavam no poder. Aquele que foi o nosso exemplo, conservou-Se afastado dos governos terrestres. Não porque fosse indiferente às misérias do homem, mas porque o remédio não residia em medidas meramente humanas e externas. Para ser eficiente, a cura deve atingir o próprio homem, individualmente, e regenerar o coração”.1

Como Igreja, respeitamos as reivindicações porque nós temos saído às ruas para defender ideias, como o projeto Quebrando o Silêncio, contra o álcool, o fumo e as drogas e em defesa da liberdade religiosa. Saímos com os jovens no projeto Missão Calebe chamando a atenção da sociedade para o bem, entre outras iniciativas. A Igreja deve assumir seu papel na sociedade como uma organização ativamente envolvida nas questões pertinentes aos interesses e necessidades dos cidadãos. Reconhece também o desafio de ser relevante e fazer a diferença na vida das pessoas e das comunidades onde ela está inserida. 

Quanto às questões que envolvem desigualdade e injustiça social, a igreja desenvolve, apoia e realiza projetos sociais e educacionais que beneficiam a vida comunitária. Suas várias frentes de atuação envolvem a ADRA (Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais), ASA (Ação Solidária Adventista), escolas, colégios e universidades, entre outros programas promovidos pelos vários departamentos e instituições da denominação. No entanto, busca agir na defesa de suas convicções sem conflitar com os princípios bíblicos e sem protestar contra ideologias e autoridades constituídas.

Não é errado defender ideias e ideais, e todos têm o direito de se manifestar livremente, conforme a própria Constituição Brasileira prevê. Como Igreja, contudo, alertamos que nessas manifestações existem pessoas com intenções equivocadas que não combinam com os nossos pensamentos e princípios cristãos. Muito mais do que reivindicar, nossa missão é proclamar. Como cristãos, fomos chamados para influenciar o mundo e devemos continuar fazendo isso através do amor, doando-se e desgastando-se pelo bem da comunidade.

Na continuação, Ellen White diz: “Não pelas decisões dos tribunais e conselhos, nem pelas assembleias legislativas, nem pelo patrocínio dos grandes do mundo, há de estabelecer-se o reino de Cristo, mas pela implantação de Sua natureza na humanidade, mediante o operar do Espírito Santo. 'A todos quantos O receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus; aos que creem no Seu nome; os quais não nasceram do sangue, nem da vontade do varão, mas de Deus' (Jo 1:12, 13). Aí está o único poder capaz de erguer a humanidade. E o instrumento humano para a realização dessa obra é o ensino e a observância da Palavra de Deus”.

Agora, no caso dos pastores e dirigentes... se eles acham que prestariam um serviço melhor à humanidade por meio da política, não deveriam ser coerentes e deixarem o ministério pastoral dedicando-se à carreira política integralmente? Ellen White foi muito contundente quanto a esse assunto, ao escrever que “todo mestre, ministro ou dirigente em nossas fileiras que é agitado pelo desejo de ventilar suas opiniões sobre questões políticas, deve converter-se pela crença na verdade ou renunciar à sua obra”, afinal, “o dízimo não deve ser empregado para pagar ninguém para discursar sobre questões políticas”.2 Em vez disso, cada ministro deve se lembrar de que a “cada dia o tempo de graça de alguém se encerra. Cada hora alguns passam para além do alcance da misericórdia. E onde estão as vozes de aviso e rogo, mandando o pecador fugir desta condenação terrível? Onde estão as mãos estendidas para o fazer retroceder do caminho da morte? Onde estão os que com humildade e fé perseverante intercedem junto a Deus por ele?”3 Como disse o apóstolo Paulo, “importa que os homens nos considerem como ministros de Deus” (1Co 4:1).

Ellen White continua nos advertindo: "Não devemos, como um povo, envolver-nos em questões políticas. Todos fariam bem em dar ouvidos à Palavra de Deus: Não vos prendais a um jugo desigual com os incrédulos em luta política, nem vos vinculeis a eles em suas ligações. Não há terreno seguro em que possam estar e trabalhar juntos. O fiel e o infiel não têm terreno neutro em que possam encontrar-se."4

Estamos, como adventistas, neste mundo com uma mensagem especial que é preparar um povo para o encontro com o Senhor! Cremos que a nossa força não deve estar nas manifestações por justiça, mas em anunciar a volta do Senhor Jesus, a verdadeira causa!

Finalizo com este pensamento de Ellen White: "Os que são genuinamente cristãos são ramos da Videira verdadeira, e darão o mesmo fruto que ela. Agirão em harmonia, em comunhão cristã. Não usarão distintivos políticos, mas os de Cristo. Que devemos então fazer? - Deixai os assuntos políticos em paz."5

Não desmerecendo as questões políticas e sua importância, entendemos ser um dever dar o devido destaque ao nosso verdadeiro papel, que é desenvolver práticas que resultem no fortalecimento da fé e promovam a esperança na iminente volta do Senhor Jesus Cristo. Reconhecemos que a vocação de pregar o evangelho envolve executar ações de solidariedade que expressem amor ao próximo e produzam alívio ao sofrimento humano. Por isso, todo esforço e toda energia devem ser canalizados para o serviço desinteressado em favor das pessoas, revelando profundo interesse na sua salvação. Seja nossa oração: “Vem, Senhor Jesus” (Apocalipse 22:20).

Referências
1. O Desejado de Todas as Nações, p. 358.
2. Fundamentos da Educação Cristã, p. 477.
3. Patriarcas e Profetas, p. 92.
4. Mensagens Escolhidas, v. 1, p. 337.
5. Obreiros Evangélicos, p. 392.

sexta-feira, 6 de setembro de 2024

DEPENDÊNCIA OU MORTE!

Segundo o jornalista Laurentino Gomes, no livro 1822, o famoso grito de “Independência ou morte” dado pelo imperador D. Pedro I foi envolvido em mais simplicidade do que se imagina. Para quem não se recorda, a tal frase foi dita na tarde do dia 7 de setembro de 1822.

Gomes diz, em seu livro, que o imperador estava montado provavelmente em uma mula e subia a serra do Mar, em São Paulo, às margens do riacho Ipiranga. Dom Pedro era um jovem prestes a completar 24 anos e, naquele dia, estava com dor de barriga. Chegou a tomar um chá para aliviar o incômodo.

Histórias curiosas à parte, o tal grito marcou simbolicamente a decisão de o Brasil, governado naquele período pela monarquia, libertar-se politicamente de Portugal e deixar de ser uma colônia para se posicionar como nação independente.

A independência do Brasil teve motivações ideológicas, políticas e econômicas. Isso se deu, aliás, com grande parte das nações e muitas somente conseguiram se desconectar dos países colonizadores após guerras e conflitos sangrentos.

Mas será que sempre é saudável ser independente? Independência implica, também, seguir na vida de maneira autônoma e sem uma ajuda maior. Alguns jovens, por exemplo, gostam de se sentir independentes dos pais, principalmente na hora de sair com os amigos.

Espiritualmente, a Bíblia apresenta os riscos da independência. Lúcifer, o anjo portador de luz, resolveu agir de maneira independente do amor e das leis divinas e houve guerra no céu. O resultado foi que ele se transformou em Satanás, o adversário de Deus, que trabalha para destruir o ser humano. Adão e Eva também optaram por seguir independentes diante da orientação de Deus para não comerem da árvore da ciência do bem e do mal. O apóstolo Pedro, desejoso de caminhar sobre as águas como Jesus havia feito, afundou quando parou de depender de Cristo e não confiou mais em Seu poder.

No evangelho de João, capítulo 15, está a síntese da necessidade de dependência. Cristo, referindo-se a Si mesmo, declara nos versículos 1 e 2 que “eu sou a videira verdadeira, e meu Pai é o agricultor. Todo ramo que, estando em mim, não der fruto, ele o corta; e todo o que dá fruto limpa, para que produza mais fruto ainda”. O ser humano é o ramo que precisa estar ligado à Videira verdadeira.

No versículo 4, a ênfase é maior ainda na dependência de Deus. O Senhor mesmo diz que devemos permanecer nEle. Depender de Cristo é se submeter a Ele em todos os aspectos da vida. É deixar que Ele controle as vontades, pensamentos e, por consequência, as ações. Isso exige uma decisão diária amparada por constante oração, meditação profunda na Palavra de Deus e no testemunho visível dessa atuação.

Parafraseando o imperador, nosso grito espiritual deve ser “dependência ou morte”. Ou aprendemos a depender de nosso Senhor e Salvador e entendemos que nosso eu precisa ser soterrado para dar lugar a Deus, ou corremos risco de morrermos espiritualmente. O dramático é que essa morte quase não é percebida e acontece aos poucos. Por isso, o alerta individual precisa soar logo. Dependência já de Deus!

Felipe Lemos (via Comunicação Estratégica)

"Deus quer que cada alma por quem Cristo morreu se torne uma parte da vinha, ligada com o tronco original, e dele extraia a nutrição. Nossa dependência de Deus é absoluta, e nos deve conservar bem humildes; e, por causa de nossa dependência dEle, nosso conhecimento dEle será grandemente aumentado. Deus quer que removamos toda espécie de egoísmo, e a Ele nos acheguemos, não como donos de nós mesmos, mas como uma possessão adquirida pelo Senhor." (Ellen White - Mente, Caráter e Personalidade, vol. 1, p. 261)

quinta-feira, 5 de setembro de 2024

JÁ RAIOU A LIBERDADE NO HORIZONTE

Neste sábado, o Brasil celebra sua independência frente a Portugal. Festejamos o dia em que demos o grito do basta, deixamos de ser o quintal do país europeu, chacoalhamos de sobre nós o jugo da escravidão e passamos a ser livres para determinar nossos próprios caminhos. Na sequência escolhemos um monte de caminhos errados, é verdade, mas liberdade é o tipo de coisa que faz sentido comemorar. Ninguém questiona a alegria que nasce da libertação.

Poucas palavras evocam sentimentos tão positivos como “liberdade”. De poetas a publicitários, de filósofos a políticos, de escravos a libertários, todos apelam para o conceito, embora nem sempre entendam ou vivam a verdadeira liberdade. Dependendo do momento histórico, esse tema ganha ainda mais relevância. Hoje se fala muito em liberdade, mas ela corre risco.

A Bíblia menciona frequentemente esse tópico. Por exemplo, ela diz que devemos escolher os caminhos da vida e não da morte (Dt 30:19); o Espírito do Senhor ungiu Jesus para proclamar a liberdade (Lc 4:18); a verdade e o Filho libertam (Jo 8:32, 36); onde está o Espírito está a liberdade (2Co 3:17); “tudo” é permitido, mas nem tudo convém (1Co 6:12); devemos viver como pessoas livres, mas não podemos abusar da liberdade e usá-la para o mal (Gl 5:13; 1Pe 2:16).

A ideia bíblica de liberdade, portanto, não é no sentido de uma licença para agir como quiser. Como ensina uma antiga ilustração, o trem é livre enquanto permanece no trilho. Se ele sair do trilho, ganha certa “liberdade” superficial, mas perde a verdadeira liberdade para ir, vir e cumprir seu propósito. O mesmo acontece com as pessoas que saem dos “trilhos”. Liberdade não é o direito de fazer o que é errado, mas ter a opção de fazer o que é certo.

Ellen G. White diz: "Verdadeira liberdade e independência são encontradas no serviço de Deus. Este serviço não imporá sobre vós nenhuma restrição que não aumente a vossa felicidade. Acedendo aos Seus reclamos, encontrareis tal paz, contentamento e prazer que nunca poderíeis desfrutar na vereda de desenfreada licenciosidade e pecado. Estudai então devidamente a natureza da liberdade que desejais. É ela a liberdade dos filhos de Deus, para serem livres em Cristo Jesus? Ou chamais liberdade à condescendência egoísta com paixões baixas? Tal liberdade conduz ao mais penoso remorso; é a escravidão mais cruel" (Fundamentos da Educação Cristã, p. 88).

Muitas pessoas querem ser livres, mas não aceitam se submeter a Deus. Não existe liberdade sem estar ligado a Cristo. Só existem dois senhores, e temos que decidir a qual deles serviremos. As escolhas do dia a dia determinam se de fato somos livres ou não.

Ellen G. White afirma: "Toda pessoa que recusa entregar-se a Deus, acha-se sob o domínio de outro poder. Não pertence a si mesma. Pode falar de liberdade, mas está na mais vil servidão. Não lhe é permitido ver a beleza da verdade, pois sua mente se encontra sob o poder de Satanás. Enquanto se lisonjeia de seguir os ditames de seu próprio discernimento, obedece à vontade do príncipe das trevas. Cristo veio quebrar as algemas da escravidão do pecado para a alma. 'Se pois o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres.' 'A lei do Espírito de vida, em Cristo Jesus” nos liberta “da lei do pecado e da morte' (Romanos 8:2)" (O Desejado se Todas as Nações, p. 32).

O pecado cria amarras que só podem ser quebradas pelo poder de Deus. Por meio dEle, recebemos três tipos de liberdade:

1. Liberdade de consciência. Não existe liberdade que não nasça na consciência. E somente Jesus pode oferecer esse tipo de coisa. Nascemos pecadores, inclinados a fazer o que é errado, dignos de condenação e morte eterna. Mas, quando aceitamos que nossa culpa foi paga por Jesus, a sentença condenatória é tirada de nossos ombros. Uma pessoa revestida da graça de Deus é como se nunca tivesse pecado. E, se eventualmente quebramos a lei de Deus e nos arrependemos, Jesus devolve nosso acesso à presença de Deus. Paulo declarou: “Portanto, agora já não há condenação para os que estão em Cristo Jesus” (Rm 8:1).

2. Liberdade para obedecer. Quem deseja fazer a vontade de Deus com as próprias forças pode ser considerado uma boa pessoa, mas não é livre. Em Romanos 8, encontramos a descrição da luta entre os desejos da natureza humana pecaminosa e os da nova natureza em Cristo. Paulo diz que Jesus veio nos libertar da escravidão do pecado. A graça é o único poder capaz de quebrar o domínio do pecado no coração humano.

Mesmo tendo ainda a natureza pecaminosa, depois da conversão, temos liberdade para obedecer. Por isso, rejeitamos determinadas coisas, embora a Bíblia não seja explícita em proibi-las. Por exemplo: fumar ou não fumar; ir a determinados lugares ou não; assistir a certos filmes ou não; tomar certas bebidas ou não. Fazemos o certo porque somos livres para obedecer.

3. Liberdade de conhecimento. Quanto mais conhecemos Jesus, maior é nossa liberdade (Jo 8:32). O conhecimento da verdade liberta. O conhecimento divino proporciona acesso a uma fonte inesgotável de sabedoria. Quem tem comunhão com Jesus conhece a verdade e o próprio Deus. Quem não conhece a verdade será enganado e escravizado por superstições e preconceitos. Somente aqueles que buscam o conhecimento do Senhor crescem em liberdade.

Sobre o título do post, retirado do trecho do Hino da Independência “já raiou a liberdade no horizonte do Brasil”, o compositor Evaristo da Veiga metaforicamente coloca a liberdade como um “sol” que já raiou, ou seja, já é uma realidade. Cristo veio a este mundo “para proclamar liberdade aos cativos e a abertura de prisão aos presos” (Isaías 61:1). O Sol da Justiça nasceu “e salvação trouxe debaixo das suas asas” (Malaquias 4:2). Seja livre hoje em Cristo Jesus e cante como Leonardo Gonçalves: "Sempre estive preso ao meu prazer e minha dor, mas eu hoje tenho liberdade no Senhor... Livre enfim, livre enfim, do pecado que me afeta, que me impede de seguir, livre enfim, livre enfim, da culpa e da amargura, que me fazem regredir, livre enfim."

quarta-feira, 4 de setembro de 2024

SILÊNCIO SOBRE O VOTO

Sejam quais forem as opiniões que tenhais em relação a dar o vosso voto em questões políticas, não as deveis proclamar pela pena ou pela voz. Nosso povo deve silenciar acerca de questões que não têm relação com a terceira mensagem angélica.

Se já um povo se deveu aproximar de Deus, esse é o povo Adventista do Sétimo Dia. Têm sido feitos admiráveis projetos e planos. Tem-se apoderado de homens e mulheres um ardente desejo de proclamar alguma coisa, ou ligar-se com alguma coisa; eles não sabem o quê. O silêncio de Cristo sobre muitos assuntos, porém, era verdadeira eloquência.

Irmãos, não vos lembrais de que a nenhum de vós foi imposta pelo Senhor qualquer responsabilidade de publicar suas preferências políticas ou de sobre elas falar na congregação, quando o povo se reúne para ouvir a Palavra do Senhor.

Não devemos, como um povo, envolver-nos em questões políticas. Todos fariam bem em dar ouvidos à Palavra de Deus: Não vos prendais a um jugo desigual com os incrédulos em luta política, nem vos vinculeis a eles em suas ligações. Não há terreno seguro em que possam estar e trabalhar juntos. O fiel e o infiel não têm terreno neutro em que possam encontrar-se.

Aquele que transgride um dos preceitos dos mandamentos de Deus é transgressor de toda a lei. Mantende secreto o vosso voto. Não acheis ser vosso dever insistir com todo o mundo para fazer como fazeis.1

Existem, entre os que professam crer na verdade presente, alguns que serão assim incitados a exprimir seus sentimentos e suas preferências políticas, de maneira que se introduzirá na igreja a divisão. O Senhor quer que Seu povo enterre as questões políticas. Sobre esses assuntos, o silêncio é eloquência. Cristo convida Seus seguidores a chegarem à unidade nos puros princípios evangélicos que são positivamente revelados na Palavra de Deus. Não podemos, com segurança, votar por partidos políticos; pois não sabemos em quem votamos. Não podemos, com segurança, tomar parte em nenhum plano político.

Os que são genuinamente cristãos são ramos da Videira verdadeira, e darão o mesmo fruto que ela. Agirão em harmonia, em comunhão cristã. Não usarão distintivos políticos, mas os de Cristo.

Que devemos então fazer? - Deixai os assuntos políticos em paz.2

1. Ellen G. White, Mensagens Escolhidas, v. 1, pp. 336-337.
2. Idem, Obreiros Evangélicos, pp. 391-392.

segunda-feira, 2 de setembro de 2024

AS APOSTAS ONLINE E O CRISTÃO

As apostas online são uma das tendências da era digital para apostar em eventos esportivos, cassinos, loterias e outros tipos de jogos de azar por meio da internet. Com a popularização dos dispositivos móveis (celulares, tablets etc.), as apostas online se tornaram extremamente acessíveis, permitindo que quase qualquer pessoa participe delas.

Por que são perigosas?
As apostas online são perigosas por várias razões. Primeiramente, a facilidade de acesso e a disponibilidade 24 horas por dia podem levar ao desenvolvimento de comportamentos compulsivos e ao vício. Além disso, a ilusão de controle e a promessa de ganhos fáceis aumentam o risco de se gastar dinheiro de forma irresponsável.

Embora existam histórias de pessoas que ganharam grandes quantias, a realidade é que a maioria dos apostadores perde dinheiro. As casas de apostas são projetadas para garantir lucro aos operadores, e as probabilidades são sempre desfavoráveis ao jogador. A esperança matemática de quem aposta é extremamente baixa, e os prêmios pagos pelas casas não chegam, em média, a 10% do valor arrecadado por elas.

As casas de apostas utilizam complexos programas de computador e análises estatísticas para garantir que sempre saiam ganhando. Mesmo que um apostador tenha um conhecimento profundo sobre um esporte no qual aposta, as chances reais de ganhar dinheiro são mínimas.

“Iscas” para os apostadores
As casas de apostas utilizam várias estratégias para atrair e manter os apostadores. Propagandas com celebridades, bônus de boas-vindas, apostas grátis e promoções são algumas das iscas comuns. Além disso, a gamificação das plataformas de apostas, com gráficos atraentes e a possibilidade de apostas ao vivo, aumenta a excitação e o envolvimento dos usuários, tornando mais difícil para eles pararem de apostar.

Associação com organizações criminosas
Infelizmente, o setor de apostas online também tem mostrado diversos casos de associação a atividades criminosas. A natureza dessa atividade facilita práticas como a lavagem de dinheiro e outras ações ilícitas.

Esquemas de manipulação de resultados em eventos esportivos já foram descobertos em ligação com sistemas de apostas online. Por exemplo, a Operação Penalidade Máxima, liderada pelo Ministério Público de Goiás, descobriu que atletas profissionais eram pagos para influenciar o resultado de jogos de futebol. Em apenas uma das partidas investigadas, a organização criminosa envolvida faturou mais de R$ 2 milhões.

Além disso, há casos de sites fraudulentos de apostas que desaparecem com o dinheiro dos apostadores. Uma operação recente da polícia descobriu que até mesmo as máquinas de “pescar” bichinhos de pelúcia não estão imunes às fraudes. Muitas delas possuíam um microchip para dificultar a obtenção do prêmio, e outras utilizavam brinquedos “piratas”.

Nos últimos anos, o poder público promulgou leis e estabeleceu regulamentações para as apostas esportivas no Brasil. Porém, mesmo que as autoridades tenham legalizado algumas dessas atividades, como cristãos, elas não nos “convêm” (1 Coríntios 6:12).

Por que a Bíblia não aprova os jogos de azar?
Apostar em jogos de azar ou em qualquer empreendimento de retorno duvidoso é condenado pela Bíblia e pelos escritos de Ellen White. Apostas podem ser uma forma de idolatrar o dinheiro, enquanto as Escrituras Sagradas dão importância a valores como trabalho honesto e contentamento com o que se tem. Ellen White afirma no livro Mente, Caráter e Personalidade, volume 2, página 736, que “esses divertimentos abrem a porta para grandes males. Não são benéficos em sua tendência e têm uma influência excitante, produzindo em alguns espíritos uma paixão por esses jogos que levam ao jogo de azar e à dissipação. Todos esses jogos devem ser condenados pelos cristãos”.

Na Bíblia, Deus disse a Adão: “No suor do teu rosto comerás o teu pão” (Gênesis 3:19). Longe de ser uma maldição, nosso Pai Celeste deseja que Seus filhos sejam felizes ao receber um salário honesto, ganho não às custas das esperanças vazias de milhares de apostadores, mas como fruto de trabalho útil que agrega valor à sociedade.

Por fim, o Senhor também não deseja que arrisquemos perder os bens que Ele nos deu, trazendo sofrimento para nós e nossas famílias. “A riqueza obtida de forma desonesta diminuirá, mas quem a ajunta aos poucos terá cada vez mais.” (Provérbios 13:11)

Alexander D. da Silva (via Notícias Adventistas)

Nota do blog: Querido amigo leitor, desejo que Deus abençoe a sua vida. Se estás passando por dificuldades e estás sendo tentado, o conselho bíblico não é de lançar sortes, mas de lançar tudo sobre o Senhor porque Ele tem cuidado de vós (1Pe 5:7). A promessa de Deus é que Ele nunca nos deixará nem nos desamparará (Hb 13:5). Este Senhor bondoso e poderoso sabe o que necessita o Seu filho comprado pelo sangue de Cristo (Mt 6:32), e, com amor, suprirá “muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos; segundo o poder que em nós opera” (Ef 3:20). Sem dúvida, Deus pode suprir as nossas necessidades de maneiras extraordinárias, mas deve ser observado que é Ele quem faz tais prodígios. Espere no Senhor e achará alivio em Seu tempo para a glória de Deus (Is 40:31). Ele exorta-nos a buscarmos em primeiro lugar o Seu reino e Sua justiça: “Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas lhes serão acrescentadas” (Mt 6:33).

Ellen G. White adverte: "[...] as apostas, o jogo de azar... são todas de sua [de Satanás] própria invenção, e ele tem induzido homens a levarem avante esses divertimentos com tanto zelo como se estivessem ganhando para si a própria dádiva da vida eterna. Despendem os homens somas imensas em busca desses prazeres proibidos; e o resultado é que, as faculdades que Deus lhes deu, que foram compradas pelo precioso sangue do Filho de Deus, são degradadas e corrompidas. As faculdades físicas, morais e mentais que por Deus são dadas aos homens, e que pertencem a Cristo, são zelosamente usadas em servir a Satanás, e para desviar os homens da justiça e da santidade" (Conselhos sobre Mordomia, p. 84).