quinta-feira, 25 de dezembro de 2025

O "COMPLEXO DE DEUS"

Milênios se passaram desde o Éden e ainda estamos chafurdando no mesmo problema. Entretanto, a distância do evento originário do pecado já é tamanha que nos esquecemos completamente dos porquês e estamos cada vez mais afundando em nosso próprio mal. Quero te mostrar nesse texto que estamos aumentando nossa aposta no pecado original nos tempos atuais. E isso nos mostra que o fim está próximo.

Como foi no começo, será o fim. Recapitule comigo a história humana até aqui. Fomos iniciados no pecado. Em seguida, foi-nos revelado o mal que isso significa, sofremos a consequência, prometemos nunca mais repetir e iniciou-se um processo de luta constante para correção do problema. Descobrimos que não poderíamos resolvê-lo, então Deus veio e proveu uma solução que não dependeria de nós: Sua morte e a distribuição da graça a todo aquele que crê.

Isso, porém, criou um ponto de bifurcação. Como a solução é facultativa, só aceita quem quer, e há sempre os que não querem. Esses optaram por continuar a jornada humana na Terra por seus próprios meios e caminhos. A maioria de nós, diga-se de passagem.

Como a história até aqui nos demonstrou, somos incapazes de nos consertar. E o efeito de buscar a solução por nossos próprios meios e caminhos, apenas nos afunda mais em complexidades e maldades, como quem gira em círculos. Na verdade, descemos em espiral. Retornando lentamente ao ponto máximo do desgaste dessa tentativa inútil: o ponto onde começamos.

Entretanto, agora convencidos (nem todos) dessa incapacidade e tendo rejeitado por decisão própria a solução divina, só nos resta o orgulho de insistir no primeiro erro: queremos ser como Deus.

O pecado original traz luz aos dias de hoje
Muito se discutiu na história e na teologia sobre qual era o pecado original. Achamos por muitos séculos que o sexo foi a origem de todo o problema. Mas se olharmos o relato de Gênesis 3, veremos que ele claramente nos revela o problema. Quando Eva passou próximo demais da árvore proibida, foi convencida pela astúcia de uma serpente que o fruto contrariava as afirmações divinas: “Certamente não morrereis” (Gênesis 3:4).

Você consegue imaginar alguém que não conhecia o pecado ouvindo a sua primeira mentira? Foi o mesmo sentimento estranho e curioso de quando ouvimos histórias maldosas ou cruéis, uma espécie de interesse e medo misturados, que faz parecer que o clima mudou em nosso redor.

Eva também sentiu esse estranho interesse por aquela serpente que havia afirmado algo incorreto (o primeiro contato com o mal): “É assim que Deus disse: Não comereis de toda árvore do jardim?” (Gênesis 3:1). No afã de corrigir o erro, ela engajou com a serpente, para seu próprio infortúnio. Aliás, nosso infortúnio.

A serpente então afirmou o contrário do que Deus tinha dito. “Não morrereis” é mais do que uma informação errada, é uma afronta contra o Criador de todas as coisas. A criatura afirmou que o Ele não dizia a verdade. Mas a mentira nunca vem sem argumentos. A serpente, aproveitando a exibição de vida que dava a Eva ao falar com ela, afirmou que “no dia em que dele comerdes se vos abrirão os olhos e sereis como Deus, conhecedores do bem e do mal” (Gênesis 3:5).

Note que “abrir os olhos” é uma afirmação de empoderamento, o estado que aquela serpente exibia. Ela falava com astúcia, superando os outros animais. Ser conhecedor do bem e do mal é apenas uma característica de quem Deus era. O ponto central no pensamento hebraico é sempre mais importante. No sanduíche de palavras que a serpente usou, no centro está “sereis como Deus”. Perceba que essa mentira veio cercada por duas verdades. De fato, os olhos deles se abriram (Gênesis 3:7) e tornaram-se conhecedores do bem e do mal (Gênesis 3:22).

Naquele momento, surge o “eu” quando só havia um “nós”. Tínhamos sido criados à imagem e semelhança de um “nós”. Pensando somente em si, Eva decide que quer ser como Deus. O que isso significa na prática e como isso se manifestará no fim?

O problema persiste
Ser como Deus é desejar que todas os nossos desejos sejam atendidos. Uma expectativa de controle sobre a vida para obtenção de todos os nossos desejos. Quando a gente tenta ser como Deus, se coloca numa esperança, cria um desejo que é impossível de ser atendido. Impossível de ser manifestado.

Começamos a almejar por uma impossibilidade. Tanto somos assim que muitos de nós imaginam que o Céu será um lugar onde todos os nossos desejos serão realizados, enquanto essa nunca foi a promessa. Alguns, ao ler essa última frase que escrevi, estão estranhando. “E não vai ser?”, é a pergunta. Tomamos por certo que lá teremos tudo o que quisermos.

Todo desejo só é apaziguado quando é atendido ou resolvido. Sede só se resolve com água, fome com comida e sono com uma cama. Quando decidimos que queríamos ser como Deus, desejamos algo que determinou imediatamente nossa infelicidade. Porque uma expectativa não realizada é exatamente a definição de infelicidade. É querer ter uma coisa e nunca obter. E quando a gente decide querer ser como Deus, estamos perdidos, nunca seremos atendidos!

E querer ter os poderes divinos é o que todo mundo quer, mesmo que chamemos de outras coisas. Todo mundo quer realizar a sua própria vontade. Esse é o motivo dos conflitos e das guerras (Tiago 4:1). É claro que tanto Eva como qualquer ser humano normal não pensa em se sentar no trono do Universo e ser um novo Deus governando sobre tudo. Não é isso. Mas todos queremos ser como Ele. É sobre domínio, privilégios e realizações.

Veja o que isso faz: ninguém na história humana teve ou terá uma vida facilitada ou sem frustrações, exatamente porque ninguém consegue tudo. O fato de nós só conseguirmos pensar em felicidade se pudermos tudo, demonstra que a gente se conformou, moldou a ser a alguém que precisa ser Deus. Temos que ter tudo, conseguir tudo ou seremos frustrados e infelizes.

Logo, qual foi o problema da humanidade? Foi desejar aquilo que ela não é, desejar aquilo que ela não pode ter, querer mais do que nos foi dado. Eva se rebelou contra o Criador quando decidiu por si mesma não apenas romper e desafiar a Deus, como a comparar-se à Ele.

Por que isso demonstra o fim?
Essa é exatamente a entronização do homem comentada em Apocalipse 14 ao se referir ao infame número 666. O homem no centro da sua própria governança. O homem fazendo suas vontades, o seu querer. O que, em última instância, é querer ser Deus. Então, quando decidimos que queríamos ser Deus, nos “auto amaldiçoamos” para sempre com um sonho inalcançável. Todas as nossas histórias e vidas são difíceis porque nós estamos amaldiçoados pelo desejo de ter tudo e ser tudo. Sem romper com isso por meio de Cristo, estamos condenados a uma vida infeliz.

As vezes queremos coisas que só Deus pode querer, como, por exemplo, quando plantamos uma jabuticabeira e desejamos que ela desse seu fruto imediatamente. Esse impulso de impaciência humana exibe nossa capacidade por sentir falta de algo que jamais poderíamos obter. Anseios que existem fora de um sentido natural, desejos ilimitados.

Só faria sentido você ser impaciente com coisas que levam tempo se você tivesse a menor expectativa de conseguir agora algo que leva tempo. Mas isso nunca existiu, e ainda assim você sente. Ou seja, nossa carne pede para ser todo-poderosa. A impaciência é uma prova de que está escrito em nossa carne o desejo de ser como Deus.

Esquecemos que já fomos criados à “imagem e semelhança” de Deus. Já éramos como Ele antes do pecado. Por isso, não vivíamos para nós mesmos. Quando decidimos nos comportar como usurpadores, nos distanciamos de quem Ele é. Nunca fomos tão egoístas (palavra humana para definir quem vive para satisfazer a si mesmo), nunca fomos tão 1 Timóteo 4! Nunca fomos tão 666! E por isso lhes digo que estamos caminhando para os momentos finais da história, a experiência humana como a conhecemos está para acabar porque já estamos muito perto do exato ponto que partimos. O círculo terá feito a volta completa, chegaremos às consequências finais da decisão de Eva. E é nesse ponto que a Bíblia nos informa que Deus há de interferir.

Quando o ser humano assumir para si mesmo, em definitivo, a sua própria soberania, a voz do Espírito Santo será calada, e então virá o fim.

Diego Barreto (via O Reino)

terça-feira, 23 de dezembro de 2025

O NATAL SOB A ÓTICA SUBVERSIVA DE MARIA

É claro que a figura central do Natal é Cristo. José, Maria, os Magos, os pastores de Belém, e até os anjos, são apenas coadjuvantes nesta história de esperança para a humanidade. Cada um deles reagiu de maneira diferente à chegada do Redentor ao Mundo. Os pastores anunciaram a todos. Os anjos cantaram nas alturas. Os Magos O presentearam. E Maria, o que fez? Qual teria sido a reação daquela que hospedou em seu ventre o Filho de Deus?

Somente Lucas preocupou-se em relatar o cântico com que Maria expressou sua felicidade e expectativa com a chegada do Messias prometido. Seu cântico ficou conhecido como Magnificat:

"A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegra em Deus meu Salvador; porque atentou na condição humilde de sua serva; desde agora, pois, todas as gerações me chamarão bem-aventurada, porque o Poderoso me fez grandes coisas; e santo é o seu nome. E a sua misericórdia vai de geração em geração sobre os que o temem. Com o seu braço agiu valorosamente; dissipou os soberbos no pensamento de seus corações. Depôs dos tronos os poderosos, e elevou os humildes. Encheu de bens os famintos, e despediu vazios os ricos. Auxiliou a Israel seu servo, recordando-se da sua misericórdia; como falou a nossos pais, para com Abraão e a sua descendência, para sempre" (Lucas 1:46-55).

Embora tivesse "sangue azul", pois pertencia à dinastia de Davi, Maria viveu na simplicidade e no anonimato, casada com um operário braçal. O trono antes ocupado por seus ancestrais, agora era ocupado por um rei marionete do império romano, cujo nome era Herodes. Seu povo vivia sob a tirania imperial. Maria era virgem, mas não ingênua. Humilde, mas não idiota. Santa, mas não alienada.

A imagem que construiu-se de Maria não faz jus à sua postura subversiva expressada neste cântico. A jovem desposada com José era uma adolescente questionadora, com um espírito rebelde e revolucionário. Sua alma anelava por mudanças. Ao receber o anúncio trazido por Gabriel, ela soube que o ente gerado em seu ventre era a resposta aos seus anelos.
"Desde o dia em que ouvira o anúncio do anjo, no lar de Nazaré, entesourara Maria todo sinal de que Jesus era o Messias. Sua doce e abnegada existência assegurava-lhe que Ele não podia ser outro senão o Enviado de Deus" (Ellen G. White - Filhas de Deus, p. 38).
Como que vislumbrando o futuro, Maria declarou profeticamente que Deus havia deposto os poderosos do trono, e elevado os humildes. Ela fala como alguém que vivia além do seu próprio tempo. Era como se fosse uma visitante proveniente do futuro. Pra ela, tais fatos não aconteceriam um dia, mas já teriam acontecido. Deus já teria enchido de bens os famintos, e despedido vazios os ricos. Se isso não é uma revolução social, o que é, então? Os defensores do status quo preferem espiritualizar passagens como esta, para que se encaixem em sua agenda ideológica e política. Porém, a jovem Maria não está falando de coisas estritamente espirituais, mas concretas, abrangendo a realidade socioeconômica, política e cultural.

O nascimento de Jesus anunciava que o tempo havia sido subvertido, e o futuro invadira o presente. Aquele que Se apresenta como o Princípio e o Fim, agora vive em nosso meio. A ordem predominante teria que ser colapsada para dar vazão ao Reino de Deus. A revolução há muito esperada fora deflagrada, e aquele seria, definitivamente, um caminho sem volta. Nunca mais o mundo seria como antes.

Como todo subversivo que ameaça o establishment, Maria teve que exilar-se com seu filho e esposo no Egito, onde viveram na clandestinidade até o momento designado por Deus. Pelo cântico que compôs, dá para inferir que valores Maria teria transmitido para seu Filho.
"O menino Jesus não Se instruía nas escolas das sinagogas. Sua mãe foi Seu primeiro mestre humano. Dos lábios dela e dos rolos dos profetas, aprendeu as coisas celestiais. As próprias palavras por Ele ditas a Moisés para Israel, eram-Lhe agora ensinadas aos joelhos de Sua mãe" (Idem, p. 36).
Com o tempo, o cristianismo deixou sua marginalidade essencial, para tornar-se em religião oficial. Maria deixou de ser vista como subversiva, para tornar-se numa espécia de padroeira do status quo. Domesticaram a mãe do Salvador. Desproveram-na de sua rebeldia. Tornaram-na inofensiva. O mesmo fizeram com a igreja cristã, que deu as costas aos pobres, humildes e oprimidos, para aliar-se aos poderosos.

Se quisermos ver as profecias de Maria cumpridas, temos que dar meia-volta, trair nossos laços com os interesses econômicos e políticos, e abraçar nossa vocação subversiva. Se Maria estava certa, e de fato, anteviu o futuro, isso eventualmente acontecerá. E quando ocorrer, o Natal passará a ser celebrado como uma data revolucionária, como é a celebração da revolução francesa ou da inconfidência mineira.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2025

FANÁTICO X LIBERAL

Você conhece bem esses dois tipos. O primeiro é marcado por zelo sem entendimento; o segundo, por opiniões avançadas e liberais. Eles nunca se dão, mas conseguem o mesmo resultado: a destruição da vida espiritual da igreja. São descritos por Ellen G. White da seguinte maneira: "Muitos são fanáticos. São consumidos por um ardente zelo, o qual é tomado por religião.... Outros vão a outro extremo em sua conformidade com o mundo" (Testemunhos Seletos, vol. 1, pp. 169 e 170).

No dia-a-dia da igreja nos deparamos com esses personagens. Eles promovem muito barulho, mas o resultado é como o metal que soa ou como o sino que tine" (1Co 13:1).

Faz alguns anos, participávamos de uma solene reunião administrativa nos Estados Unidos. Os membros daquela comissão estavam analisando o ministério de determinado obreiro, que havia sido indicado para dirigir um importante departamento da Igreja. "Não concordo com a indicação dessa pessoa, porque sua pregação é liberal", bradou alguém. O fato é que, alguns anos depois, se viu o resultado: o pregador não tinha nada de liberal; ao contrário, seu ministério tem levado milhares de pessoas a entender a maravilhosa mensagem da justificação pela fé. Já o zeloso defensor da "essência da verdade", não foi muito longe: ao lidar com as várias situações da vida da Igreja, optou por uma linha dura que só produziu aleijões, contrapondo-se ao espírito que deve caracterizar os seguidores de Cristo.

Antes de tentarmos esboçar o perfil do fanático e do liberal, seria interessante registrar o que o Espírito de Profecia fala sobre Jesus, nosso modelo: "O Salvador nunca foi a extremos, nunca perdeu o domínio de Si mesmo, nunca violou as leis do bom gosto. Sabia quando convinha falar, e quando guardar silêncio. Estava sempre na posse de Si mesmo. Nunca errou no ajuizar os homens ou a verdade" (Obreiros Evangélicos, p. 317).

O fanático — O perfil desse personagem é complexo. Às vezes, dá a impressão de idoneidade e circunspecção. Quando se refere à mensagem, passa aos incautos a imagem de inusitado desvelo pelas normas da igreja. Tem inclinação natural para exacerbar problemas. Exagera os valores, e sempre pensa sozinho. Não pensa em parceria com o Espírito Santo. Suas idéias constituem sua medida. Ele, em síntese, é a medida de tudo e de todos. Além disso, é implacável na avaliação dos faltosos. Mas sua principal característica é a estreiteza de visão. Jamais dá atenção ao conjunto. Estriba-se num pontinho qualquer e faz disso sua causa, pela qual luta com unhas e dentes. Se você quiser conhecer o lado real de um fanático, vá à casa dele com certa frequência. Em pouco tempo ele será desmascarado. Sua piedade é apenas uma capa.

Ellen White assim o descreve: "Há muitos, muitos, que confiam em sua própria justiça. Estabelecem uma norma para si mesmos, e não se submetem à vontade de Cristo, nem permitem que Ele os envolva nas vestes de Sua justiça. Formam um caráter de acordo com o seu bel-prazer. Satanás se agrada de sua religião. Representam falsamente o caráter perfeito — a justiça — de Cristo. Enganados eles mesmos, por sua vez enganam outros. Não são aceitos por Deus. São capazes de levar outras almas para veredas falsas. Receberão afinal sua recompensa, juntamente com o grande enganador — Satanás" (Manuscrito 138, 1902).

Ellen White escreveu muito sobre o fanatismo. O fanático se deixa levar por momentos de arroubo. Aceita ou desenvolve ideias sensacionalistas. Gosta de maicar datas e prever acontecimentos sombrios. Chega a anunciar pragas para os que não aceitam suas ideias.

Hoje em dia, o fanático se confunde com o legalista. Exigente e estrito, cobra tudo de todos e impõe a si mesmo um rosário de formalidades inúteis.

O perfil desse personagem é um guarda-chuva que inclui fanatismo pela reforma de saúde, fanatismo pelos tratamentos naturais, fanatismo pela observância exterior das normas da igreja, fanatismo pela pontualidade, fanatismo pela "boa música", etc. Evidentemente, precisamos promover a reforma de saúde, usar os remédios da Natureza, observar as normas da igreja, pautar nossa vida pela ordem e pontualidade e ouvir ou cantar músicas que promovam nosso desenvolvimento espiritual. O fanático, no entanto, não vai ao cerne das coisas. Fica apenas na superfície, no aspecto mecânico. O importante para ele não é mudança de caráter, mas conformação com a letra do sistema que ele defende.

O fanático é um desastre para a igreja. Ai dos que caem em suas mãos! Ao pregar, faz de sua "mensagem" um chicote. Ao defender uma norma, não demonstra interesse pela pessoa faltosa. Numa comissão, só mostra interesse pela reputação e imagem da igreja. Gente não importa. Sua causa é salvar as aparências. Jesus chamou de "sepulcros caiados" esse tipo de pessoas.

O fanático ou legalista não visita ninguém com o propósito de ajudar. Se vai à casa de uma ovelha errante, seu único objetivo é buscar informações para depois incriminar. Nas reuniões da comissão da igreja, não muda de opinião. Por sinal, já chega ali com seu voto no bolso. Sente-se feliz por ajudar a igreja a se livrar de um incômodo.

Enfim, o fanático não vê Cristo na mensagem, não enxerga o amor, não estende o braço de misericórdia, não sabe conjugar os verbos salvar e recuperar. Seu verbo favorito é expurgar. Na verdade, o fanático não frui a religião; sofre-a.

O liberal — Para o liberal, o campo é o mundo. Nada de restrições, normas e regras. Toda vez que ouve um sermão sobre santificação, parece dizer: "Já vem com religião comportamental." Tem alergia a princípios e normas. A marca de sua religião é "tolerância sem compromisso". O que importa, diz, é o que está no coração. 

O liberal, à semelhança do fanático, pensa sozinho. Só que está mais interessado em liberdade. Mas confunde liberdade com liberdades. Não entende que liberdade é fazer o que convém, e liberdades são caprichos fora da ordem. O liberal é, ao mesmo tempo, promotor e símbolo do mundanismo na igreja.

Gosta da doutrina da justificação pela fé sem nenhuma relação com a santificação do caráter. Gosta de falar sobre o que Cristo faz por nós e odeia ouvir sobre o que Ele deseja fazer em nós. Gosta de saber que Cristo nos livra da culpa do pecado, mas abomina ouvir que Ele deseja nos livrar do domínio do pecado.

Através dos séculos, a Igreja tem sido fustigada por esses dois personagens: o fanático e o liberal. O primeiro, torna o caminho mais estreito do que na verdade é; o segundo, alarga-o generosamente. Eles estão em pólos opostos, mas têm um ponto em comum: pensam sozinhos, pois não admitem parceria com o Espírito Santo.

O cristão — O que nos interessa, acima de tudo, é o perfil do cristão genuíno. "Os que seguem o exemplo de Cristo não serão extremistas" (Obreiros Evangélicos, p. 317).

O evangelho produz pessoas sensatas, cujo perfil é um caráter segundo o modelo: Jesus. O que é, pois, um cristão?

1. Uma pessoa justificada, livre da condenação (Rom 5:1; 8:1). Pela fé aceita o que Jesus fez em seu favor na cruz do Calvário.

2. Uma pessoa santificada pela presença de Cristo em sua vida. "Assim que, se alguém está em Cristo, nova criatura é: as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo" (2Co 5:17). Pelo poder divino, sua vida é posta em harmonia com a verdade. Os princípios e as normas da igreja fazem parte da vida interior, refletindo-se no vestir, no falar, no comer, no agir. A conduta cristã é fruto de uma transformação espiritual. Nada de atitudes permissivas, liberalizantes.

3. Uma pessoa cheia de amor, bondade, alegria e domínio próprio (Gl 5:22). Nada de atitudes impositivas, ditatoriais.

4. Uma pessoa cuja vida se desenvolve, em todos os aspectos, para a "glória de Deus" (1Co 10:31). Não se concentra em si mesma. 

5. Uma pessoa de visão equilibrada. Usa de sensatez ao ajuizar os homens e a verdade. Sua medida é Cristo, parâmetro supremo.

Peçamos a Deus que nos ajude a desenvolver uma vida equilibrada, uma visão cristocêntrica da santificação do caráter. Submetamo-nos à influência modeladora do Espírito Santo, para que nossa conduta reflita os encantos da ética cristã. Agindo assim, expurgaremos de nosso coração todo extremismo, e a atmosfera de nossas igrejas se tornará doce e aprazível. Um ninho de amor e justiça.

Rubens S. Lessa (via Revista Adventista)

sexta-feira, 19 de dezembro de 2025

O EVANGELHO SEGUNDO XUXA

"Tudo o que eu quiser, o Cara lá de cima vai me dar".

Este é um trecho de uma música da Xuxa, tema do filme Lua de Cristal, que leva o nome do filme. Foi ao som dessa música icônica que Xuxa, Angélica e Eliana abriram o Criança Esperança deste ano. Uma nova versão da música foi disponibilizada em outubro de 2025, marcando o sucesso contínuo do hit.

Esta reflexão poderia ser sobre o fato de Deus ser chamado de "O Cara lá de Cima" e a mania de celebridades de apelidarem a Deus, como se Ele fosse um igual, ou como se fossem íntimos de alguém com quem pouco conversam, e que pouco deixam falar.

Poderia me deter escrevendo sobre as várias formas de se transgredir o terceiro mandamento da Lei de Deus: “Não tomarás o nome do Senhor Teu Deus em vão, porque o Senhor não terá por inocente o que tomar Seu nome em vão” (Êxodo 20:7). Mas deixarei isto para outra oportunidade... No momento quero pensar sobre a idéia do "Tudo que eu quiser, Ele vai me dar".

Com certeza não era a intenção da Xuxa, nem do Michael Sullivan e Paulo Massadas (autores da canção) expressar de forma tão direta e precisa a idéia básica da teologia da prosperidade.

O pensamento é simples: o que você quer é só pedir, ou, como alguns tem preferido dizer, é só decretar, declarar ou exigir de Deus e Ele fará.

O deus (como creio que é um deus diferente do Deus da Bíblia, escreverei com letra minúscula) pintado pela teologia da prosperidade nos moldes como a conhecemos hoje, é um deus que obedece ordens, que funciona sob pressão, que responde a coações, que se manifesta depois da clara e inequívoca expressão dos desejos humanos.

Este deus é pai, mas um pai como esses dos adolescentes classe média alta, que compensam tudo com presentes. Esse deus em constante barganha, esse deus vendido, esse deus que poderia ser marcado com o carimbo de "fabricação própria", não é o Deus revelado na Bíblia.

É óbvio que muitas pessoas desejam encontrar o Deus da Bíblia, e nesta busca acabam se enroscando nestes deuses genéricos, no deus da Lua de Cristal. Mas ainda assim, sua busca sincera pode levar-lhes a conhecer a Deus como Ele é.

A teologia da prosperidade expressa, não intencionalmente, na música da Xuxa, uma vida cristã diferente do que diz a Palavra de Deus.

A Bíblia não diz: “Felizes os que conseguem um barco novo.” Ela diz: “Felizes sois vós quando por minha causa (Jesus falando) vos injuriarem e vos perseguirem” (Mateus 5:11).

A Bíblia não diz: “Neste mundo morareis em mansões.” Ela diz: “Neste mundo tereis aflições” (João 16:33).

E Ellen White declara: "A aflição e a adversidade podem causar muitos inconvenientes e podem trazer grande crise; mas a prosperidade é que é perigosa para a vida espiritual" (Conselhos sobre Mordomia, p. 148).

A Teologia da Prosperidade passou por atualizações, e atualmente emprega técnicas de coaching, programação neurolinguística e psicologia positiva. A antiga ênfase em dinheiro e saúde deu lugar ao bem-estar e à autoestima. É uma nova roupagem, mas o ser humano continua sendo o centro, enquanto a Bíblia se mantém aprisionada em um cativeiro cultural.

É por isso que o evangelho é descrito por Paulo como loucura, porque é viver, aparentemente, como um louco. E me perdoem os adeptos do "Tudo o que eu quiser, Ele vai me dar", mas essa é uma religião muito fácil. Loucura seria não pertencer a algo assim, onde eu tenho um gênio da lâmpada e pedidos inesgotáveis. Definitivamente esta não é a Loucura do Evangelho.

Pensamento que fica: Mas se for assim, prefiro ficar com a Lua de Cristal.

Esta não é uma boa idéia.

Se não é o Deus da Bíblia que está sendo pregado, se não é o evangelho bíblico que dá fundamento a esta mensagem, é óbvio que não é por este caminho que você vai encontrar o cumprimento das promessas bíblicas, que em muito excedem seus desejos e pensamentos.

Concluo com este pensamento de Ellen White: "Com o gentil toque da graça, o Salvador expulsa da alma a inquieta e não santificada ambição, mudando a animosidade em amor, a incredulidade em confiança. Quando Ele Se dirige à alma, dizendo: 'Segue-Me' (Mateus 9:9), o mágico encantamento do mundo é quebrado. Ao som de Sua voz, o espírito de avareza e ambição foge do coração, e os homens se erguem, emancipados, para segui-Lo" (Profetas e Reis, p. 60).

quarta-feira, 17 de dezembro de 2025

TER OU NÃO TER FILHOS NO TEMPO DO FIM... EIS A QUESTÃO.

A maternidade, que até pouco tempo atrás era um “caminho natural” para toda mulher, tem sido cada vez mais questionada, adiada ou nem mesmo entrado nos planos. Preocupações financeiras (custo de vida, estabilidade), desafios de carreira e conciliação (mercado de trabalho, desigualdade de gênero), foco pessoal (saúde mental, carreira, viagens, autodesenvolvimento), questões ambientais/sociais (guerras, pandemias, mudanças climáticas, instabilidade global) e até mesmo dificuldades de fertilidade, refletindo uma tendência de adiamento ou rejeição da maternidade/paternidade devido a um cenário de inviabilidade e falta de apoio estrutural são alguns dos motivos usados ​​para renunciar à prole.

A quantidade de casais sem filhos no Brasil quase dobrou em pouco mais de duas décadas, segundo dados do Módulo de Nupcialidade e Família do Censo 2022 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgados em novembro de 2025. De 2000 para 2022, esse tipo de composição familiar passou de 13% para 24,1% dos domicílios brasileiros –quase ¼ das residências do país. A categoria foi a que mais cresceu no período. Em 22 anos, o salto foi de 13,9 milhões de famílias.

Diante dos perigos e desafios dos últimos dias, a questão que fica para os cristãos a respeito desse assunto tão recorrente e polêmico é: ter ou não ter filhos neste tempo do fim? O que a Bíblia e o Espírito de Profecia dizem sobre esse tema tão complexo?

A Palavra de Deus predisse que o tempo do fim seria marcado por guerras, terremotos, fome, epidemias e terror (Dn 8:17, 19; Lc 21:9, 10, 11, 26). A Bíblia alertou também que esse período decisivo na história humana seria um tempo de grandes mudanças sociais. Transtornos na vida familiar e corrupção moral estariam entre as coisas “difíceis de manejar” nestes críticos últimos dias (2Tm 3:1-5; Lc 17:28-30; Jd 1:7). Por que, neste tempo do fim, esses fatos tão amplos e poderosos poderiam influenciar a decisão dos cristãos quanto a ter ou não ter filhos?

Ellen White apoiou amplamente o plano original de Deus em relação ao matrimônio e a paternidade com bênçãos divinas para o homem. Ela comprovou com seu próprio exemplo ao casar-se e ter quatro filhos. Com respeito a oportunidade de ter ou não ter filhos neste tempo, é evidente que não vamos encontrar uma citação direta. Ellen White não escreveu muito acerca de ter filhos no tempo do fim, apesar de mencionar a atuação dos filhos e jovens ao serem usados por Deus na pregação final do evangelho.

“Nas cenas finais da história deste mundo, muitas destas crianças e jovens encherão de admiração o povo pelo seu testemunho em favor da verdade, o qual será dado de modo simples, no entanto com espírito e poder. Foi-lhes ensinado o temor do Senhor, e o coração se lhes abrandou por um estudo da Bíblia cuidadoso e acompanhado de oração. No próximo futuro, muitas crianças serão revestidas do Espírito Santo, e farão na proclamação da verdade ao mundo uma obra que, naquela ocasião, não pode bem ser feita pelos membros mais idosos das igrejas” (Conselhos aos Pais Professores e Estudantes, p. 166).

Ellen White também menciona que Deus permitirá que alguns filhos descansem antes dos tempos difíceis e finais.

“Frequentemente o Senhor me tem revelado que muitos pequeninos hão de ser levados ao descanso antes do tempo de angústia. Veremos nossos filhos outra vez. Encontrar-nos-emos com eles e os reconheceremos nas cortes celestes. Ponde no Senhor a vossa confiança, e não temais" (Carta 196, 1899 - Orientação da Criança, p. 566).

Ao verificarmos o que Ellen White escreveu sobre matrimônio e família (O Lar Adventista) e sobre filhos e paternidade (Orientação da Criança), não vemos nada que possamos supor que o plano do Senhor para os matrimônios é que evitem ter filhos. Presume-se que esses temas delicados são deixados para consideração da consciência de cada um, a busca por uma resposta concreta em oração e reflexão.

Também é fato que Ellen White notava de maneira muito conveniente que alguns matrimônios que ela conhecia, optaram por não ter filhos. As seguintes declarações ilustram essa questão:

“O egoísmo, que se manifesta de variadas formas, segundo as circunstâncias e a constituição peculiar dos indivíduos, deve morrer. Se tivessem filhos, e seu pensamento fosse compelido a desviar-se de si mesmo para o cuidado deles, para instruí-los e ser-lhes um exemplo, ter-lhes-ia sido isso uma vantagem. [...] O cuidado de crianças em uma família exige bastante tempo no lar, com as atenções comuns da vida doméstica, dando oportunidade para o cultivo da mente e do coração” (Testemunhos para a Igreja, vol. 2, pp. 230-231).

“Daquilo que me foi mostrado, os adventistas guardadores do sábado têm um fraco sendo do imenso lugar que o mundo e o egoísmo ocupam em seu coração. Se têm desejo de fazer o bem o glorificar a Deus, há muitos modos de fazê-lo. Mas vocês não sentiram que esse é o resultado da verdadeira religião. Esse é o fruto que cada árvore boa produzirá. Não perceberam que lhes é requerido interessar-se pelos outros, considerar os casos deles como se fossem seus, e manifestar interesse altruísta por aqueles que estão em maior necessidade de ajuda. Vocês não têm se achegado aos mais necessitados. Se tivessem filhos próprios para exercitarem cuidado, afeição e amor, não estariam tão encerrados em si mesmos com seus interesses pessoais. Se os que não têm filhos e a quem Deus fez mordomos de recursos, abrissem o coração para amparar crianças que necessitam de amor, cuidado e afeição e de serem ajudadas com os bens deste mundo, poderiam ser muito mais felizes do que são hoje” (Testemunhos para a Igreja, vol. 2, p. 328-329).

Há uma carta que menciona o tema de forma direta, e um dos parágrafos foi publicado numa compilação dos escritos de Ellen White:

“Na realidade não é prudente ter filhos agora. O tempo é curto, os perigos dos últimos dias estão sobre nós, e as criancinhas, em grande parte, serão levadas antes disso” (Carta 48, 1876 - Eventos Finais, p. 36).

Até onde se pode constatar, essa é a única consideração sobre o tema nos escritos de Ellen White. É pertinente verificar que, mais do que em qualquer outra apresentação, as cartas pessoais devem ser analisadas em seu contexto e em harmonia com as circunstâncias que as motivaram. Assim, impõe-se a necessidade de complementar de maneira breve as informações relativas aos conselhos de Ellen White acerca de não ter filhos no tempo do fim.

Esse parágrafo da obra Eventos Finais foi retirado de uma carta de três páginas do Arquivo de Cartas e Manuscritos do Centro White (Carta 48, 1876). Ellen White se dirige nessa ocasião ao pastor Van Horn e sua esposa Adélia. Suas palavras são proferidas com compaixão, porém também são firmes, e ao escrever, ela se manifesta com um sentimento de pena. A família Van Horn tinha ido trabalhar em Oregon, onde uma grande obra evangelizadora a esperava. Ao mesmo tempo, Ellen White os adverte que Satanás tinha planos para frustrar os propósitos de Deus.

A maior parte da carta se aplica especialmente a Adélia, uma mulher com grandes talentos, mas ao mesmo tempo com perigosas limitações. Ellen White a descreve como uma pessoa emotiva, perigosa, às vezes negligente e muito ansiosa. Ellen White lhe diz que o cuidado dos filhos intensifica ainda mais essas características e cessa a obra que ela poderia realizar.

“Adélia, meu coração sente muito pesar porque você tem falhado, porque rouba a Deus. Você é naturalmente temerosa e se apossa de dificuldades emprestadas. Você não poderia ter descanso ou paz mental separada dos seus filhos, e por sua disposição ansiosa, o caminho para a realização da sua obra se fechou. E isso não é tudo: o trabalho é grandemente realizado de maneira descuidada.”

É evidente que o conselho de não ter filhos se dirige a uma mulher com características peculiares e com desafios especiais como esposa de pastor. Não parece sensato aplicar esses conselhos a todos os matrimônios em qualquer circunstância. De qualquer maneira, apesar das exigências da obra de Deus e da adequação pessoal para uma paternidade responsável, é um dever inevitável para todo filho de Deus que está avaliando o fato de trazer filhos ao mundo nesse tempo especial.

A paternidade é, sem dúvida, um privilégio e uma sagrada responsabilidade. Porque os filhos hão de ser preparados para este tempo e para a eternidade.

“A todos os pais que professam crer na breve volta de Cristo, é dada uma solene obra de preparo, para que eles e seus filhos possam estar prontos para receber o Senhor, na Sua vinda" (Nos Lugares Celestiais, p. 212).

Sobre esses assuntos complexos, o Pai do céu outorgará sabedoria do alto a todos os que agirem com humildade.

terça-feira, 16 de dezembro de 2025

JUGO DESIGUAL

A Bíblia contém amplos conselhos que orientam a uma boa escolha do parceiro para a vida. Em 2Co 6:14 encontra-se um excelente e clássico exemplo: “não vos prendais ao jugo desigual com os incrédulos”. Para início de conversa, precisamos entender o que significa “jugo”. Trata-se de uma peça de madeira, um tipo de canga que se prende com correias ao pescoço de animais de carga, para que assim possam puxar uma carroça ou um arado (1 Sm 6:7). Num sentido figurado negativo, o jugo representa domínio, opressão (Gn 27:40; Jr 28:2; Gl 5:1); sofrimento (Lm 3:27); mas do ponto de vista positivo, representa comprometimento (Mt 11:29-30) e companheirismo (Fp 4:3).

Então, em que consistiria o jugo desigual? Geralmente, usavam-se pares de animais de carga como bois ou cavalos para puxar os arados que abriam sulcos na terra para receber as sementes. Se o jugo sobre um fosse mais pesado que sobre o outro, fazendo com que caminhassem em ritmos diferentes, o arado acabava puxado na diagonal, e, eventualmente, travava, agarrando-se ao solo. Isso, obviamente, atrasava todo o processo. Ambos tinham que caminhar na mesma velocidade, de modo que os sulcos se abrissem uniformemente nos dois extremos do arado. Portanto, os animais precisavam ter mais ou menos o mesmo porte, carregando jugos de pesos iguais.

Já na época de Abraão, havia preocupação por parte dos pais religiosos sobre este assunto (Gn 24:3). O Comentário Bíblico Adventista (CBASD) diz que “a demora em fazer planos para o casamento de Isaque, provavelmente se devia ao desejo de Abraão, em evitar que seu filho tomasse por esposa uma Cananeia”. 

Semelhantemente, Isaque pediu a Jacó para não tomar “esposa de entre as filhas de Canaã” (Gn 28:1) pois, “ele não as via com bons olhos” (Gn 28:8). Posteriormente, após o êxodo, Deus proíbe Seus filhos de contraírem matrimônio com as filhas das outras nações (Dt 7:3), porque, “não pode haver felicidade nem segurança nas alianças feitas com os que não amam nem servem a Deus. As trágicas experiências de Esaú (Gn 26:34-35) e Sansão (Jz 14:1) são testemunho eloquente em favor da admoestação divina de manter-se separados dos incrédulos.

Avançando ao Novo Testamento, observamos que Paulo também coloca a impossibilidade de ligação entre o santuário de Deus e os ídolos, por isso, um acordo, casamento ou uma aliança entre crentes e incrédulos é igualmente inconcebível. Pois quando se trata de uma relação tão estreita como o matrimonio, o cristão que verdadeiramente ama ao Senhor, em nenhuma circunstância se unirá com um incrédulo, mesmo que tenha a nobre esperança de ganhá-lo para Cristo, o que em outras circunstancias seria digno de elogio.

É bom lembrar que “jugo desigual” significa uma “diferença de padrão” entre o casal, ou seja, também entre dois cristãos ele pode ocorrer: diferenças culturais, por exemplo, podem ditar ritmos e maneiras distintos de se conduzir a vida. Imagine um relacionamento em que não seja possível um diálogo sobre temas de interesse comum. Poderíamos enumerar ainda as questões de faixas etárias, graus de instrução e até o fato de serem oriundos de camadas sociais diferentes.

De que forma a metáfora do “jugo desigual” se ajusta ao contexto da sociedade no qual você está inserido? Sob que lentes precisamos observar a Bíblia para que seus ensinamentos nos esclareçam satisfatoriamente a vontade de Deus para hoje?

“Não se ponham em jugo desigual com descrentes”. Segundo o dicionário digital Michaelis, descrente = 1. Que não crê ou perdeu a crença; 2. Cético, incrédulo; 3. Pessoa que perdeu a fé.

É preciso deixar claro que não há neste verso bíblico a intenção de estimular nenhum tipo de discriminação, nem tampouco demonizar aqueles que perderam a fé ou deixaram de crer. O que temos aqui é a demonstração clara de que Deus se preocupa conosco indicando, inclusive, o melhor caminho para a felicidade conjugal. Deus jamais proibirá algo sem antever os resultados.

Salomão, o homem mais sábio da história declinou espiritualmente ao se aparentar com Faraó casando-se com sua filha. (1Rs 3:1). Pouco a pouco, sua fé foi enfraquecida e logo misturou-se em cultos pagãos, desonrando assim a Deus.

“Andarão dois juntos, se não estiverem de acordo?” (Amós 3:3). Na dinâmica da vida cristã, qualquer ligação com incrédulos que tende a diminuir o amor ou mudar a direção da peregrinação para Deus é um jugo desigual.

Todos desejam ter felicidade no relacionamento, no entanto, ao escolher alguém para namorar é possível que o desejo pessoal seja mais forte que a orientação bíblica. Nesse caso, seguir os próprios desejos torna-se uma armadilha para a felicidade conjugal futura. Seria a orientação bíblica sobre o jugo desigual ultrapassada para nosso tempo?

Para entender melhor o que a Bíblia quer lhe dizer:

1. Você está disposto(a) a fazer concessões? Quem seguirá a fé de quem? Quem baixará a guarda primeiro quando os princípios forem questionados?

2. Que valores prevalecerão? Questões como sexo antes do casamento, ambientes e festas, alimentos, missão, fidelidade a Deus... Após o casamento, virão os filhos. E então? Serão educados mediante os valores de quem?

3. Mudanças extraordinárias não acontecem depois do “sim” no altar. A tendência é que a convivência acentue ainda mais as diferenças, principalmente as que dizem respeito à fé individual.

4. A desobediência à vontade de Deus terá consequências. Não é sensato imaginar que a desobediência irá trazer consigo felicidade.

Felicidade não está associada à liberdade irrestrita. Felicidade tem a ver com escolhas acertadas. Se a vida a dois é um assunto importante para você, não será demais dedicar tempo para meditar, orar a Deus e escolher com muito cuidado a pessoa com a qual você compartilhará os melhores momentos de seu futuro.

ESPÍRITO DE PROFECIA
Ellen G. White aplica o conceito de "jugo desigual" para alertar sobre a união de um cristão com um incrédulo, principalmente no casamento. Ela argumenta que essa união pode levar a consequências espirituais negativas, como a perda da fé, frustrações e o distanciamento de Deus, pois um parceiro cristão não pode compartilhar sua fé com um não-cristão de forma harmoniosa. A advertência também se estende a outras formas de associação íntima que não promovem valores cristãos.

De acordo com Ellen White, “seja todo passo em direção da aliança matrimonial caracterizado pela modéstia, simplicidade, e sincero propósito de agradar e honrar a Deus. O casamento afeta a vida futura tanto neste mundo como no vindouro. O cristão sincero não fará planos que Deus não possa aprovar” (Ciência do Bom Viver, p. 359).

É indispensável observar esses pontos, pois “é da hora de seu enlace matrimonial que muitos homens e mulheres datam seu êxito ou fracasso nessa vida, e suas esperanças de existência futura” (O Lar Adventista, p. 43).

Ellen White adverte que "unir-se a um incrédulo é colocar-se no terreno de Satanás. Você ofende o Espírito de Deus e perde Sua proteção. Pode sujeitar-se a tão terríveis desvantagens na peleja da batalha pela vida eterna?" (Testemunhos Seletos 2, p. 120).

Ela também nos faz alguns importantes alertas: 

"O crente raciocina que, nas novas relações, tem de conceder alguma coisa ao companheiro de sua escolha. São patrocinados entretenimentos sociais, mundanos. A princípio com grande relutância de sentimentos por parte do crente ao fazer isto, mas depois o interesse na verdade vai-se tornando cada vez menor, e a fé se transforma em dúvida e incredulidade" (Cartas a Jovens Namorados, p. 81).

“[No namoro] os filhos de Deus não devem nunca se aventurar a pisar terreno proibido. O casamento entre crentes e incrédulos é proibido por Deus. Mas muitas das vezes o coração não convertido segue seus próprios desejos, e formam-se casamentos não sancionados por Deus. Por causa disso muitos homens e mulheres estão sem esperança e sem Deus no mundo” (Fundamentos da Educação Cristã, p. 500).

"É perigoso formar aliança mundana. Satanás sabe bem que no momento em que presencia o casamento de muitos rapazes e moças encerra a história de sua experiência e utilidade cristãs. Por algum tempo, poderão se esforçar para viver uma vida cristã, mas seus esforços são feitos contra uma constante influência na direção oposta" (Mensagem aos Jovens, p. 453).

"Homens e mulheres de outro modo sensatos e conscienciosos, fecham os ouvidos aos conselhos; são surdos aos apelos e rogos de amigos e parentes, e dos servos de Deus. A expressão de um aviso ou advertência é considerada impertinente intromissão, e o amigo que é fiel bastante para pronunciar uma admoestação, é tratado como inimigo. Tudo isso é como Satanás deseja. Ele tece seu encanto em volta da alma, e esta se torna enfeitiçada, apaixonada. Não é este um quadro traçado pela imaginação, mas apresentação de fatos. Deus não dá sua sanção a uniões que Ele proibiu expressamente" (O Lar Adventista, p. 61).

CONCLUSÃO
Assim como um boi e um jumento não conseguem arar a terra de maneira uniforme, pessoas com crenças diferentes também terão dificuldades ao longo da caminhada. A Bíblia não apoia o “jugo desigual” porque não haverá unidade de pensamento e propósito no relacionamento. Paulo escreveu: “Concordem uns com os outros no que falam, para que não haja divisões entre vocês, e, sim, que todos estejam unidos num só pensamento e num só parecer” (1Co 1:10).

O jugo desigual é um dos pecados que mais entristecem o Espírito Santo, mesmo que o rapaz ou a moça seja de boa índole. Ao nos advertir sobre isso, Deus não está nos privando da felicidade ou da liberdade. Pelo contrário, Ele está nos livrando da frustração e do sofrimento. Ele sabe que errar no casamento pode levar à perdição eterna.

Se você ainda está escolhendo um companheiro para a vida, lembre-se de que relacionamentos saudáveis e duradouros são feitos de paciência, joelhos no chão e um jugo que seja possível de carregar. E se você já é casado(a) e sofre as consequências de escolhas equivocadas do passado, ore a Deus e faça de tudo para que seu testemunho seja uma porta sempre aberta para que seu cônjuge conheça também a felicidade em Cristo!

segunda-feira, 15 de dezembro de 2025

HANUKKAH E O TIROTEIO

Atiradores deixaram 15 pessoas mortas e 40 feridas, incluindo dois policiais, durante uma celebração do festival judaico de Hanukkah, neste domingo (14), na praia de Bondi, em Sydney. O feriado judaico geralmente ocorre entre o final de novembro e o final de dezembro. Dois homens dispararam tiros contra as pessoas que comemoravam a data no local. Os suspeitos são pai e filho, de acordo com a polícia.

A palavra חֲנֻכָּה (Chanuká) significa “dedicação”. Essa palavra aparece na Torá em contextos de dedicação do altar e consagração — e deu origem ao nome da festa judaica que celebra a vitória da luz sobre a escuridão, fazendo uma metáfora sobre o bem que vence o mal. É também a comemoração da vitória da pureza sobre a degeneração e da espiritualidade sobre o materialismo.

A história começa no século II A.C., quando o Império Selêucida ocupava o Oriente Médio. Nesse período, o rei da Síria, Antíoco Epifânio, emitiu decretos contra os judeus, proibindo-os de cumprirem seus ritos.

Ameaçados com a violação de sua fé, o povo de Israel começou a luta pela liberdade religiosa e política. Após formar um exército e derrotar o Império em Jerusalém, os judeus reinauguraram um de seus templos sagrados na cidade, mas se depararam com um cenário de destruição.

Ao verem o candelabro do recinto apagado, o acenderam novamente, mas havia óleo suficiente para manter a chama apenas por um dia. Porém, milagrosamente, reza a lenda que a vela permaneceu acesa durante oito dias, e houve tempo suficiente para preparar mais óleo. Por isso o Hanukkah é também conhecido como Festa das Luzes.

Para relembrar o acontecimento, anualmente a comunidade judaica realiza uma bela celebração, repleta de simbologia. As datas do Hanukkah variam de acordo com o calendário judaico. Este ano é celebrado de 14 a 22 de dezembro.

As famílias judias acendem velas no chanukiá, que é um candelabro de nove de braços, onde diariamente se acende uma vela da direita para esquerda, até que no 8º dia o candelabro está completamente acesso. Essa tradição remete às luzes guardiãs da comunidade judaica. 

Contexto bíblico - João 10:22 menciona que Jesus estava em Jerusalém durante a Festa da Dedicação (Hanukkah), o que demonstra que a festa não era considerada antibíblica por Ele, mas sim um evento cultural e comemorativo importante para a comunidade judaica. A Festa das Luzes pode ser vista como uma metáfora para Cristo como a "luz do mundo", um tema que ressoa com a mensagem cristã. A história do Hanukkah pode servir também como um lembrete significativo da fidelidade contínua de Deus e um momento para reflexão e dedicação pessoal a Deus.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2025

COMO CONVIVER COM OS OUTROS

Relacionamentos são sempre desejáveis, mas nem sempre agradáveis. Uma palavra ou atitude inadequada pode destruir em segundos uma amizade construída durante anos. Nenhum homem é uma ilha. Dependemos uns dos outros. Pelo nosso relacionamento com as pessoas, podemos ser uma influência para o bem e uma fonte de conforto a todos que nos cercam.

As dicas divinamente inspiradas a seguir foram extraídas de um excelente livreto de Ellen G. White chamado Como Conviver com os Outros. Descubra lições objetivas que vão ajudá-lo a prevenir conflitos e a fortalecer seus relacionamentos.

1. O inimigo que mais carecemos temer é o próprio eu. Nenhuma vitória que possamos ganhar será tão preciosa como a vitória sobre nós mesmos.

2. Não se vingue. Quando puder, remova toda a causa de mal-entendido. Evite a aparência do mal. Faça o que estiver em seu poder, sem comprometer os princípios, para conciliar o próximo.

3. Se lhe forem dirigidas palavras impacientes, nunca responda no mesmo tom. Lembre-se de que ‘a resposta branda desvia o furor’ (Pv 15:1). Há um poder maravilhoso no silêncio. As palavras ditas em réplica a alguém encolerizado por vezes servem apenas para o exasperar. Mas se a cólera encontra o silêncio, é um espírito amável e indulgente, em breve se esvai.

4. Se Cristo habitar em nós, seremos pacientes, bondosos e indulgentes, alegres no meio das contrariedades e irritações. Tal é a tarefa que sobre nós impende; mas não pode ser cumprida sem o auxílio de Jesus, firme decisão, um alvo bem determinado, contínua vigilância e oração incessante.

5. Se temos a compreensão da paciência de Deus para conosco, não devemos ser achados a julgar ou a acusar ninguém. Quando Cristo vivia na Terra, quão surpreendidos ficariam os que O acompanhavam, se, depois de familiarizados com Ele, Lhe ouvissem dizer uma palavra de acusação, crítica destrutiva ou impaciência. Não esqueçamos que aqueles que O amam devem reproduzi-Lo em seu caráter.

6. O cristianismo torna as pessoas bem-educadas. Cristo era cortês, mesmo com Seus perseguidores; e os Seus verdadeiros seguidores devem manifestar o mesmo espírito.

7. Estude cuidadosamente o caráter divino-humano, e inquira constantemente: ‘Que faria Jesus em meu lugar?’ Esta deve ser a medida do nosso dever. Nada faça entre os estranhos, na rua, nos carros, em casa, que tenha a menor aparência de mal. Faça cada dia alguma coisa para melhorar, embelezar e enobrecer a vida que Cristo resgatou com Seu própria sangue.

8. Cultive o hábito de falar bem do próximo. Detenha-se sobre as boas qualidades daqueles com quem está associado, e olhe o menos possível para seus erros e fraquezas. Quando é tentado a queixar-se do que alguém disse ou fez, louve alguma coisa na vida ou caráter dessa pessoa. Cultive a gratidão. Louve a Deus pelo Seu admirável amor em dar a Cristo para morrer por nós.

9. É pelas relações sociais que a religião cristã entra em contato com o mundo. Cristo não deve ser escondido no coração como um tesouro cobiçado, sagrado e doce, fruído exclusivamente pelo possuidor. Devemos ter Cristo em nós como uma fonte de água, que corre para a vida eterna, refrescando a todos os que entram em contato conosco.

10. Devemos viver neste mundo para ganhar almas para o Salvador. Se ofendemos os outros, prejudicamo-nos a nós mesmos. Se os beneficiamos, somos nós mesmos beneficiados; pois a influência de toda ação boa se reflete em nosso próprio coração

quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

10 ATITUDES (ESPIRITUAIS) PARA O NATAL

Está chegando o Natal... É momento de celebrarmos apenas um único fato: “Cristo Jesus […] embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se; mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens. E, sendo encontrado em forma humana, humilhou-se a si mesmo e foi obediente até a morte, e morte de cruz!” (Fp 2:5-8). E isso ocorreu “porque Deus tanto amou o mundo que deu o seu Filho Unigênito, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna. Pois Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para condenar o mundo, mas para que este fosse salvo por meio dEle” (Jo 3:16-17). É isso que celebramos.

Por que é importante anualmente trazer à memória o nascimento de Cristo? Porque importa “trazer à memória o que me pode dar esperança” (Lm 3:21). E, mediante essa esperança, Paulo nos exorta: “Alegrem-se na esperança” (Rm 12:12), logo, Natal é período de alegria e celebração! E celebração por algo extraordinário, o fato de que “um menino nos nasceu, um filho nos foi dado, e o governo está sobre os seus ombros. E ele será chamado Maravilhoso Conselheiro, Deus Poderoso, Pai Eterno, Príncipe da Paz. Ele estenderá o seu domínio, e haverá paz sem fim sobre o trono de Davi e sobre o seu reino, estabelecido e mantido com justiça e retidão, desde agora e para sempre” (Is 9:6-7). Assim, celebrar o nascimento do “Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!” (Jo 1:29) é também se lembrar do que isso significa para o nosso futuro: que, naquele grande dia, “o próprio Deus estará com eles e será o seu Deus. Ele enxugará dos seus olhos toda lágrima. Não haverá mais morte, nem tristeza, nem choro, nem dor, pois a antiga ordem já passou” (Ap 21:3-5).

A ocasião do Natal deve direcionar nossos pensamentos para a Palavra que “estava com Deus, e era Deus [e] estava com Deus no princípio” (Jo 1:1-2). Não para o feriado, a Ceia, os presentes, as férias ou o que for, pois isso não é nem de longe o foco. Minha sugestão? Celebre o Natal pensando em Cristo e nas consequências da vinda dEle à terra. Eu recomendaria comemorar a data com algumas atitudes que tomam como ponto de partida muito do que foi dito no episódio do nascimento de Cristo:

1. Renove sua fé – lembrando, como disse Gabriel, que “nada é impossível para Deus” (Lc 1:37). Você tem vivido de fato como quem crê que o seu Deus pode tudo? 

Ellen White diz: "O exercício de uma fé viva significa aumento de força espiritual e desenvolvimento de firme confiança. Falar-se em impossibilidades não significa fé. Para Deus, nada é impossível" (Vidas que Falam, p. 259).

2. Renove sua entrega a Deus – lembrando, como disse Maria, que importa que “aconteça comigo conforme a tua palavra” (Lc 1:38). Você tem de fato priorizado a vontade de Deus em tudo, amando “o Senhor, o seu Deus de todo o seu coração, de toda a sua alma, de todas as suas forças e de todo o seu entendimento [e amando] o seu próximo como a si mesmo” (Lc 10:27)? Tem buscado de fato “em primeiro lugar o Reino de Deus e a Sua justiça” (Mt 6:33)? 

Ellen White afirma: "Quando a operação do Espírito divino for sentida no coração, veremos muitos buscando, com fervor e em primeiro lugar, o reino de Deus e Sua justiça. Então as coisas terrenas tomarão seu devido lugar subordinado e as celestiais serão supremas nas afeições dos filhos de Deus" (Testimonies on Sabbath School Work, p. 72).

3. Adore ao Senhor – assim como disse Maria, que seus lábios digam “Minha alma engrandece ao Senhor e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador” (Lc 1:47). Você tem de fato adorado a Deus “em espírito e em verdade” (Jo 4:24)? 

Ellen White observa: "Onde quer que a alma se dilate em busca de Deus, aí é manifesta a obra do Espírito, e Deus Se revelará a essa pessoa. A tais adoradores ele busca. Espera recebê-los, e torná-los Seus filhos e filhas" (O Desejado de Todas as Nações, p. 123).

4. Confie que a graça de Deus está presente em sua vida – por saber, como disse Maria, que “A sua misericórdia estende-se aos que o temem, de geração em geração” (Lc 1:50). Você tem vivido como quem sabe que a compaixão de Deus é absoluta para aqueles que O buscam em arrependimento? 

Ellen White declara: "A graça de Cristo é nossa única esperança de salvação. Quando confiarmos plenamente em Deus, quando nos apoiarmos nos méritos de Jesus como Salvador que perdoa os pecados, receberemos todo o auxílio que possamos desejar. (Fé e Obras, p. 31).

5. Lembre-se de que a presença de Jesus traz alegria - como disse o anjo aos pastores, “estou lhes trazendo boas novas de grande alegria” (Lc 2:10). Será que você tem vivido a alegria que é “fruto do Espírito” (Gl 5:22-23)? Aquela que vem “porque seus nomes estão escritos nos céus” (Lc 10:20)? Você deixa seu ânimo se guiar mais pela tristeza causada pelas dificuldades da vida ou pela alegria causada pelo fato de que Jesus te deu a vida eterna?

Ellen White orienta: "Não precisamos guardar nosso próprio registro das provas e dificuldades, dos desgostos e tristezas. Quando, apesar das circunstâncias desagradáveis, repousamos confiadamente no amor de Jesus e mantemos nossa comunhão com Ele, o sentimento da Sua presença inspirará uma alegria profunda e tranquila" (Obreiros Evangélicos, p. 477).

6. Reflita sobre quem é Jesus – como o anjo disse aos pastores, “Hoje, na cidade de Davi, lhes nasceu o Salvador, que é Cristo, o Senhor” (Lc 2:11). Você consegue compreender o profundo significado prático e objetivo de ter sido escolhido e chamado por Aquele que salva e que é Senhor de todo o universo?

Ellen White observa: "Qual é o caminho da salvação? Cristo declara: 'Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida.' Por mais pecaminosos e culpados que sejais, sois chamados, sois escolhidos" (Fundamentos da Educação Cristã, p. 251).

7. Glorifique a Deus – como os anjos cantaram, “Glória a Deus nas alturas” (Lc 2: 14). Você tem glorificado o Senhor não só com os lábios, mas com cada atitude sua?

Ellen White alerta: "Há muitos que podem passar como cristãos mas que são indignos do nome. Não possuem caráter cristão. Quando seu cristianismo é posto à prova, sua falsidade é demasiado evidente. Verdadeira religião é vista na conduta diária. A vida do cristão é caracterizada por atividade sincera e desprendida para fazer o bem a outros e para glorificar a Deus" (Testemunhos para a Igreja 3, p. 377).

8. Pense em como você tem contribuído para a paz entre as pessoas – como os anjos cantaram, “paz na terra aos homens aos quais ele concede o seu favor” (Lc 2:14). Você tem sido um bem-aventurado pacificador (Mt 5:9), alguém que transborda a paz que é “fruto do Espírito” (Gl 5:22-23), ou tem sido agressivo, promovido discórdias, usado a língua para o mal, feito intrigas, inflamado corações, estimulado conflitos, alimentado polêmicas, se deleitado em controvérsias?

Ellen White adverte: "Não haja discórdia, nem suspeitas ou maledicência, para não ofendermos a Deus. Busca a plenitude que há em Cristo. Que cada pensamento, palavra e ato O revele. Circunda tua alma com uma atmosfera que fortaleça a vida espiritual. Cultiva a fé, a esperança, o ânimo e o amor. Reine a paz de Deus no teu coração" (Testemunhos Seletos 1, p. 493).

9. Analise o quanto vale sua vida hoje – como disse o velho Simeão, “Ó Soberano, como prometeste, agora podes despedir em paz o teu servo” (Lc 2:29). Você seria capaz de dizer hoje mesmo a Deus que pode partir em paz desta vida, porque o tempo que passou sobre a terra já valeu a pena? Tem vivido cada dia como se fosse o último? Tem abençoado o próximo? Tem perdoado? Tem edificado vidas? Tem deixado um legado? Viveu seus anos amando, ajudando, abençoando, entregando-se, devotando-se? Em resumo, sua vida já deu frutos dignos de serem apresentados diante do Criador? Se não… o que está esperando?

Ellen White aconselha: "Tudo com que temos que nos haver, é este dia de hoje. Hoje devemos amar a Deus de todo o coração, e ao nosso próximo como a nós mesmos. Devemos viver cada dia como se soubéssemos ser ele nosso último dia na Terra. Se soubéssemos que Cristo viria amanhã, não haveríamos então de comprimir no dia de hoje todas as palavras bondosas, todos os atos desinteressados que nos fosse possível? Devemos ser pacientes e amáveis, e possuídos de fervor intenso, fazendo tudo que está em nosso poder para ganhar pessoas para Cristo" (Cuidado de Deus, pp. 368-369).

10. Lembre da verdade máxima da vida - “Pois dEle, por Ele e para Ele são todas as coisas. A Ele seja a glória para sempre. Amém!” (Rm 11:36).

Ellen White exorta: "Agora é nossa oportunidade de esconder nossa vida com Cristo em Deus. Todo momento de nosso tempo e os preciosos talentos que nos foram emprestados por Deus devem ser empregados em Seu serviço. 'Não sois de vós mesmos. Porque fostes comprados por bom preço; glorificai, pois, a Deus no vosso corpo e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus' (1 Coríntios 6:19, 20)" (Este Dia com Deus, p. 230).

Conclusão
A encarnação de Cristo nos conduz a muitas reflexões. Mas refletir não basta, se apenas pensarmos e não tomarmos nenhuma atitude a partir das conclusões a que chegamos. Algo ainda não está bom? Precisa melhorar? Necessita galgar novos patamares? A hora é esta.

terça-feira, 9 de dezembro de 2025

EPIDEMIA SECULAR

Pare por alguns segundos e pense em como seria viver num local sem violência. Conseguiu visualizar? Embora estar em um mundo permanentemente seguro seja o sonho de muita gente, poucos são os que conseguem imaginá-lo.

Assim como eu, creio que você se depara frequentemente com inúmeras histórias de pessoas que sofreram algum tipo de agressão. Em casos extremos, infelizmente, uma parcela dessas pessoas chega a perder a vida. E muitas são mulheres: donas de casa, domésticas, professoras, empresárias e médicas que sonhavam com uma vida melhor, com uma realidade que já não poderão mais ajudar a construir.

Não é novidade que a violência, seja física, moral, sexual ou simbólica, tem afligido a sociedade ao longo dos séculos. Mesmo com todo o desenvolvimento social, educacional e tecnológico, esse é um problema que ainda não conseguimos derrotar. E hoje, mais do que nunca, temos vivido dias que parecem cada vez mais assustadores, repletos de episódios que nos levam a temer a crueldade humana.

Um desses males é conhecido por uma palavra que, infelizmente, tem se tornado familiar no nosso vocabulário: feminicídio. Por trás desse termo encontramos o assassinato de mulheres, cuja motivação tem que ver com o gênero das vítimas.

Nas últimas duas semanas, quase que diariamente, uma série de crimes bárbaros chocou o país: em todos, as vítimas eram mulheres — violentadas e mortas por serem mulheres. Em Florianópolis, uma jovem de 21 anos foi estuprada e estrangulada quando se dirigia para uma aula de natação. Em Jaborandi, na Bahia, outra, de 27 anos, foi arrancada do banho e assassinada a tiros pelo ex-namorado. Na Zona Norte do Rio, um servidor público matou a tiros uma professora e uma psicóloga no Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet), no Maracanã. Em São Paulo, uma mulher foi morta na pastelaria onde trabalhava pelo ex-marido, e uma jovem foi atropelada e, ainda presa no veículo, arrastada pela rua. Ela teve as pernas amputadas e foi internada em estado grave. O suspeito do crime, segundo a família da vítima, teve um breve relacionamento com ela.

Em 2024, o Brasil bateu recorde de feminicídios desde 2015, quando o crime foi tipificado por lei sancionada pela ex-presidente Dilma Rousseff: 1.492 casos. Só na capital paulista houve 53 feminicídios apenas este ano, o maior número da série histórica. Já no estado de São Paulo, os feminicídios aumentaram 10% desde janeiro, informou o Instituto Sou da Paz. E a ocorrência de assassinatos de mulheres em vias públicas quase dobrou do ano passado para cá: um salto de 33 para 48 ocorrências, no comparativo entre os dez primeiros meses de 2024 e 2025.

A violência contra a mulher também bate recorde na internet. No Rio, as denúncias de perseguição e assédio virtual cresceram mais de 5.000%, passando de 55 para 2.834 na última década, conforme atestou o recentemente divulgado Dossiê Mulher. A explosão recente no número de crimes, portanto, não é um ponto fora da curva, mas evidência de que o país vive uma epidemia de violência contra a mulher, resultado de séculos de brutalidade social e cultura misógina.

"É inegável que as redes sociais radicalizaram o ódio às mulheres e o feminicídio no Brasil, transformando essas violências em conteúdos altamente rentáveis, inclusive. Mas, se a mudança de escala do alcance dessas notícias é novidade da contemporaneidade, o ódio e a violência contra as mulheres são constitutivos da história brasileira. Isso significa lembrar o que foi e ainda é apagado na nossa história: o desenvolvimento econômico, político e cultural do Brasil ocorreu a partir da desumanização e objetificação das mulheres por meio da exploração colonial, do trabalho escravo, do controle, da vigilância e de toda sorte de violências de seus corpos e mente" enumera a historiadora Patrícia Valim, professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA). "As mulheres que resistiram às violências e que moldaram a nossa sociedade foram agredidas, mutiladas e mortas".

Mesmo que existam leis de combate a agressões dessa e de outra natureza, ainda há muito a ser feito para mudar mentalidades e comportamentos. É por isso que você e eu precisamos acreditar que é possível vencer toda e qualquer manifestação de agressividade, bem como a dor que ela gera. A postura da sociedade e da justiça em relação à violência denota que o crime contra a mulher é considerado repulsivo. Por esse motivo, a proposta para acabar com este problema é a educação, instruindo desde a maternidade, passando pelas escolas, ruas, igrejas e mídia. A educação contra a cultura machista e a violência é uma ferramenta que pode coibir as agressões praticadas na mulher, definitivamente. 

A ajuda a mulheres em situação de violência também pode vir da sua rede de relacionamentos, como amigos, vizinhos, colegas de trabalho, entre outros. Pode ser que você conheça alguém que esteja passando por uma situação semelhante por perto, seja de violência física, verbal, psicológica ou sexual, ou quem sabe ser a própria vítima. O silêncio perpetua a ação do abusador ou agressor, portanto, o maior desafio de alguém que deseja ajudar, é vencer o medo e romper o silêncio.

Não há dúvidas de que estamos todos chocados com o terror em cada esquina. A vida se tornou tão insignificante que muitos torturam e matam uma pessoa como se ela fosse um mero inseto. Amor, sentimento, dor, sofrimento humano se tornaram profundamente banais para muitos. Mas, o que conforta é saber que a justiça honrará a todos os que foram humilhados e pisoteados pelo pecado. Uma certeza bem gratificante é que o mal, na agenda de Deus, está com data marcada para acabar. Ellen G. White complementa: "Na grande obra de finalização, nos defrontaremos com perplexidades que não saberemos contornar, mas não nos esqueçamos de que as três grandes potestades do Céu estão atuando, que a divina mão está posta ao leme, e Deus fará cumprir os Seus desígnios" (Evangelismo, p. 65).

Mateus 24:12 diz que “por se multiplicar a iniquidade, o amor se esfriará de quase todos”, mas no verso 13 encontramos outra fórmula atual: “Aquele, porém, que perseverar até o fim, esse será salvo”. Resumindo, somos chamados a perseverar em Cristo, nossa única esperança, e que nos prometeu um mundo novo e sem violência. Você pode acreditar.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

JARDINS

Algumas das principais histórias da Bíblia aconteceram em jardins. De fato, o destino da humanidade foi definido neles. 

O primeiro foi o Éden. Tudo que existe de mais belo hoje em nosso planeta não passaria de uma pálida recordação do que foi o jardim original. Tudo estava bem até que o inimigo entrou pela porta dos fundos, disfarçou-se de serpente e tentou atrapalhar o plano original. Usando meias-verdades, ele enganou o primeiro casal e os fez comer do fruto proibido. Satanás ficou satisfeito. Para ele, essa era a prova de que Deus era um ser tirano e de que Suas exigências não eram razoáveis. Ou o Criador eliminaria a humanidade, revelando-Se cruel, ou teria que desconsiderar a desobediência, sendo forçado a readmitir no Céu Satanás e os anjos caídos.

Mas, quando o diabo estava prestes a dar seu grito de vitória, Deus disse: “Ainda não acabou.” Uma nova batalha seria travada em outro jardim. No Getsêmani, Aquele a quem Paulo se refere como o segundo Adão seria tentado e testado pelo diabo (Rm 5:19). Se, fazendo Adão e Eva pecarem, o inimigo não pôde se declarar vitorioso, fazer Jesus fracassar significaria pôr fim às esperanças humanas.

O maligno usou sua melhor estratégia. Deixou Jesus aparentemente abandonado. Fez cair sobre os discípulos um tipo de sono sobrenatural, para que, ao olhar para eles, Jesus Se questionasse se valia mesmo a pena entregar a vida para salvar a humanidade. Além disso, o diabo usou Judas, um dos discípulos, para trair Jesus e entregá-Lo aos romanos. Cristo estava só. Suava gotas de sangue. Estando cercado por um exército que tinha como missão prendê-Lo e levá-Lo a julgamento, Jesus Se levantou e disse: “Sou Eu.” Quando fez isso, toda a estratégia do mal foi ao chão. Observe um interessante contraste: No Éden, Adão cai. No Getsêmani, Jesus Se levanta. No Éden, Deus tem uma palavra que dá origem a tudo que existe de bom. No Getsêmani, Jesus tem uma palavra que é capaz de derrotar todo o mal.

No Éden e no Getsêmani, pecado e salvação se encontram. Nossa salvação vem de Deus, um Pai que nos ama tanto a ponto de não poupar nenhum esforço para nos trazer de volta para Seus braços. O relato de Sua ação salvadora na luta entre o bem e o mal é a maior história jamais contada. É o drama das eras.

Nesta história, dois jardins compõem o palco para acontecimentos cruciais. Do primeiro jardim vêm pecado, perda, vergonha e morte. Do segundo, fluem esperança, alegria e vida.

Os dois jardins nos convidam a contemplar, em espírito de oração, o preço de nossa salvação. Neles vemos não só o quanto Cristo sofreu por nós, mas também quão grande é a graça de nosso maravilhoso Deus. Ellen G. White diz: "O Jardim do Éden, com sua pútrida mancha de desobediência, deve ser cuidadosamente estudado e comparado com o Jardim do Getsêmani, onde o Redentor do mundo sofreu agonia sobre-humana quando os pecados do mundo todo foram depostos sobre Ele" (Cristo Triunfante, p. 21).

Satanás não venceu no Éden. Também não pôde vencer no Getsêmani. Mas continua tentando vencer no “jardim do coração humano”. O segredo da vitória neste jardim é ter Jesus no centro. Abra a porta e permita que Ele reine em sua vida.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

FUTEBOL, POLÍTICA E RELIGIÃO

“Política, futebol e religião não se discutem. Se quiser ser meu amigo, não me fale de seu partido político, de seu time de futebol ou de sua religião. Cada um que vote em quem quiser, torça para quem quiser e escolha a religião que quiser”.

Certamente essas frases (ou suas variantes) já foram usadas inúmeras vezes para tentar aplacar ou prevenir uma discussão entre dois ou mais dialogantes. Em nosso país, onde a fragmentação política é grande, a paixão futebolesca arrebata e a diversidade religiosa cresce, as pessoas tendem a ficar cada vez mais divididas por esses temas tão pessoais. As preferências são formadas geralmente mais com os sentimentos que com a inteligência. Em consequência da defesa inflamada de um favoritismo pessoal, a violência não é rara quando as divergências estão ladeadas, como em comícios, eleições e jogos. Também as inimizades e discussões muitas vezes brotam quando as pessoas apresentam suas crenças religiosas.

No ano que vem ocorrerá o mais repercutido evento esportivo do mundo. Milhões de pessoas em nosso país interromperão suas atividades para, de forma entusiasmada, acompanhar as partidas de futebol da Copa do Mundo. Poucos meses depois, serão realizadas as eleições gerais no Brasil. Apesar da natureza distinta desses dois eventos, a torcida pelos candidatos não costuma ser muito diferente da torcida pelos times de futebol. Frequentemente os eleitores torcem pelos seus candidatos preferidos com muita paixão, substituindo a racionalidade adequada a uma escolha eleitoral por uma devoção impensada.

Como o cristão, que busca a paz, deve se posicionar diante de divergências que envolvem convicções pessoais? Num passado relativamente recente, os evangélicos brasileiros mantinham-se um tanto alheios e indiferentes à coisa mundana que era considerada a política, e as igrejas reprimiam as paixões esportivas. Mas o crescimento das denominações cristãs coincidiu com as maiores oportunidades de participação política dos diversos setores da sociedade (incluindo as igrejas), e as recreações esportivas deixaram de ser condenadas, a ponto de os novos conversos nem saberem que um dia o futebol foi censurado nos sermões.

Hoje as denominações evangélicas contam com um número de adeptos na casa dos milhões. Os candidatos se dirigem esfomeados às igrejas buscando eleitores entre os fiéis, reescrevendo com linguagem bíblica suas agendas políticas. E, como as ideologias sociais contém tanto elementos convergentes quanto divergentes à fé cristã, há cristãos que passam a aceitar ou rejeitar determinadas ideologias com um fervor religioso, como se uma doutrina política específica fosse parte de sua doutrina cristã.

Surpreendentemente, existe agora a figura do cristão politizado. A ideologia é uma doutrina a mais no seu credo de fé. Assim, a cristandade está sendo dividida não somente pelas diferentes interpretações doutrinárias, mas também pelo sincretismo entre cristianismo e política. Essa situação leva à pergunta: “O ativismo partidário enriquece ou corrompe o cristianismo?”

É indiscutível que a pregação do evangelho resulta em transformação social. Mas a mensagem de Cristo vai além. Seu foco é a redenção espiritual: um ser humano perdido em pecado sendo salvo após o arrependimento por meio da fé em Cristo. Salvo do pecado e da morte eterna. Salvo para uma vida renovada, com pensamentos e atitudes alinhados com a revelação da vontade de Deus encontrada na Bíblia. Mudanças sociais podem ser um caminho para tocar o coração de uma pessoa quanto à necessidade de redenção espiritual, ou são consequências dessa redenção. Não combina com o discurso de Cristo substituir a redenção espiritual pela redenção social.

Nem Jesus nem os primeiros cristãos tiveram como meta mudar as estruturas sociais e políticas de seu tempo. João Batista, por exemplo, esteve mais preocupado com a condição espiritual de seu governante que com suas políticas públicas (Mt 14:3, 4). O apóstolo Paulo orientou os fiéis que a mudança de condição social é questão secundária (1Co 7:20-24), e Cristo recusou Se aproveitar de qualquer posição de liderança política para favorecer Sua missão (Jo 6:15).

Nenhuma ideologia política leva em conta a realidade espiritual, a condição do pecado e o plano da redenção. Respostas mais ou menos satisfatórias para os problemas sociais podem ser dadas, mas a política não apresenta a saída para o mais profundo dilema humano: o pecado, mal que verdadeiramente rouba a dignidade pessoal. Ideais políticos podem traçar caminhos para tirar pessoas da pobreza, da violência, dos vícios, da incultura e da doença, mas são incapazes de oferecer contentamento, paz interior, temperança, conhecimento da Verdade e cura para a alma. Podem melhorar o mundo, mas não melhorar as pessoas. Isso só Cristo faz.

Em vista disso, é irrazoável que o cristão aplique ao ativismo partidário o mesmo fervor que deveria devotar à Grande Comissão de Cristo (Mt 28:19, 20). Pode, e deve até certo ponto, se interessar pelas questões da sociedade, mas seu interesse e sua atuação sempre serão secundárias e subordinadas à missão maior de apresentar Cristo como única esperança para os problemas humanos. Mesmo se trabalhar na política, nenhuma agenda partidária substitui os valores do Reino de Deus. Davi, acima de ser rei, era um homem segundo o coração de Deus. Daniel, antes de ser um estadista, era um profeta do Altíssimo. José, além de ser o governador de uma nação, era principalmente um homem que sonhava os sonhos de Deus. Ester, adiante das preocupações da corte medo-persa, preocupava-se com o povo de Deus.

Numa sociedade polarizada, o cristão não tem a missão de acentuar as diferenças, mas a tarefa de convidar todas as pessoas a uma convergência em torno do Rei Jesus. Só assim as soluções humanas que dividem serão substituídas pela solução divina que une.