quarta-feira, 30 de agosto de 2023

NÃO CONHEÇO VOCÊS

Uma das histórias mais famosas da Bíblia está retratada na Parábola das Dez Virgens (Mt 25:1-13). A passagem termina com o noivo abordando as virgens imprudentes com uma resposta que em muitos aspectos capta o espírito do texto bíblico: “Se vocês são minhas amigas, por que não vieram quando fui anunciado? Sinto muito, não conheço vocês.” 

A seguir, destacarei algumas nuances linguísticas do texto grego de Mateus 25:11 e 12, mais especificamente o significado contido na expressão: “Eu não conheço vocês”. 

OS PORMENORES SÃO IMPORTANTES 
A cena descrita na parábola de Jesus é caracterizada por uma solenidade profunda. No idioma original, o fato pode ser observado quando o verbo no presente é usado na narração de um fato do passado. Os estudiosos chamam essa particularidade linguística de “presente histórico”, uma mudança no tempo do verbo que adiciona um sentido vivo à cena. Alguns até argumentam que Mateus usa o “presente histórico” para destacar momentos importantes da narrativa (por exemplo, veja S. Wolfgang, “Das Präsens Historicum als makrosyntaktisches Gliederungssignal im Matthäusevangelium”, New Testament Studies 22/4 [1976], p. 475). Quando os leitores percebem a ênfase, perguntam a si mesmos o que está acontecendo e prestam mais atenção. Além disso, o verso 11 menciona duas vezes a palavra “Senhor” como parte do pedido das cinco virgens que perderam a chegada do noivo: “Senhor, Senhor, abra a porta para nós!” 

A tradução literal do início do verso 12 é: “Mas Ele respondeu”. A forma tradicional de traduzir o início do verbo 12 é: “Em verdade vos digo: Não vos conheço”. Essa forma de se expressar é como o povo hebreu falava. Não reflete a linguagem típica usada pelos gregos helenistas. A resposta do noivo usa uma fórmula solene, “Em verdade vos digo”, seguida pela forma do verbo grego oida (“saber”), que, nesse contexto, atesta a ausência de uma relação próxima entre o noivo e as cinco virgens imprudentes (W. Bauer, W. F. Arndt, F. W. Gingrich e F. W. Danker, Greek English Lexicon of the New Testament and Other Early Christian Literature, 3ª ed. [Chicago: Chicago University Press, 2000], p. 693). O verbo enfatiza a perplexidade que parece dominar o noivo. 

PEGAR O TOM 
A expressão “eu não conheço vocês”, encontrada na maioria das traduções modernas da Bíblia, é apropriada. No entanto, como às vezes é o caso, essa tradução não reflete na totalidade a força do sentimento na linguagem original. Algumas traduções modernas oferecem alternativas úteis. A forma “Eu não conheço vocês [não temos nenhum relacionamento]” pode ser lida, por exemplo, na versão A Bíblia Amplificada. Por sua vez, a tradução mais recente da The Passion Translation sugere o seguinte equivalente: “Será que as conheço? Não, tenho certeza de que não conheço vocês.” Ambas as versões oferecem um melhor retrato da formulação enfática do texto original de Mateus 25:12 no grego. 

O comentário de Ellen White sobre essa parábola ecoa a declaração contundente contida no texto original: “Não conhecem a Deus; não estudaram Seu caráter; não tiveram comunhão com Ele; por isso não sabem como confiar, como ver e viver. [...] Nesta vida não tiveram comunhão com Cristo; por isso não conhecem a linguagem do Céu, são estranhos às suas alegrias” (Parábolas de Jesus, p. 411, 412). Mais adiante, no mesmo capítulo, ela acrescenta: “Não podemos viver apartados de Cristo aqui, e ainda assim estar aptos para Sua companhia no Céu” (p. 413). 

Portanto, o tom da declaração do noivo não repousa sobre uma indiferença teimosa do próprio noivo ou sobre sua suposta incapacidade de identificar as virgens desaparecidas em meio à escuridão da noite. As virgens imprudentes não são vítimas das circunstâncias, mas de suas próprias decisões. Elas são arquitetas de sua triste realidade por não manter uma conexão íntima e carinhosa com Aquele que deve ser a essência de qualquer comemoração. 

A linguagem utilizada na descrição bíblica oferece um veredito inapelável, dada a ausência completa de um vínculo íntimo com o noivo que justifique sua presença no casamento: “Se vocês são minhas amigas, por que não vieram quando eu fui anunciado? [...] Sinto muito, mas não conheço vocês.” 

Entre a indiferença profética e o frenesi de última hora, está a necessidade de aprofundarmos o vínculo com nosso querido Mestre. Mateus 25:12 é uma lembrança atemporal da importância vital e do significado eterno de nossa caminhada diária com Jesus.

Leandro J. Velardo (via Revista Adventista)

terça-feira, 29 de agosto de 2023

ONDE ESTÁ ARCA DA ALIANÇA?

Existe muita especulação sobre onde estaria a Arca da Aliança atualmente. Apesar de muitas teorias, a grande verdade é que o paradeiro final da Arca é um mistério.

Segundo o livro do Êxodo, a montagem da Arca da Aliança foi orientada por Moisés, que por instruções divinas indicou seu tamanho e forma. Nela foram guardadas as duas tábuas da lei; a vara de Aarão; e um vaso do maná. Estas três coisas representavam a aliança de Deus com o povo de Israel.

No livro de Êxodo (Êx 25:10-22) a Bíblia descreve a Arca da Aliança da seguinte forma: caixa de madeira de acácia, com 2 côvados e meio de comprimento (um metro e dez centímetros ou 110 cm), e um côvado e meio de largura e altura (70 cm). Cobriu-se de ouro puro por dentro e por fora, com uma bordadura de ouro ao redor (Êxodo 25:10-16). Para seu transporte foram colocadas quatro argolas de ouro nas laterais, onde foram transpassados varas de acácia recobertas de ouro. Assim, o objeto podia ser carregado pelo meio do povo.

Sobre a tampa, chamada Propiciatório "o Kapporeth", foi esculpida uma peça em ouro, formada por dois querubins de frente um para o outro, cujas asas cobriam e formavam uma só peça "com" a tampa, a Bíblia não diz que eles estão ajoelhados, e nem que uma asa toca na outra (Êxodo 25:10-21; 37:7-9). Segundo relato do verso 22, Deus se fazia presente no propiciatório no meio dos dois Querubins de ouro em uma presença misteriosa que os Judeus chamavam Shekinah ou presença de Deus.

A Arca fazia parte do conjunto do Tabernáculo, com outras tantas especificações. Somente os sacerdotes levitas poderiam transportar e tocar na arca, e apenas o sumo-sacerdote, uma vez por ano, no dia da expiação, quando a Luz de Shekiná se manifestava, entrava no santíssimo do templo. Estando ele em pecado, morreria instantaneamente.

Nos últimos anos do período dos Juízes de Israel, a Arca da Aliança era guardada pelo sacerdote Eli, e seus filhos Hofni e Fineias. O profeta Samuel, ainda jovem, recebeu uma revelação divina condenando os mesmos ao julgamento, devido a crimes cometidos.

Neste tempo, segundo o relato bíblico, os filisteus invadiram a Palestina, vencendo o exército israelita próximo à localidade de Ebenézer. Estes, vendo-se em situação adversa, apelaram para a Arca, e a trouxeram de Siló. A maldição sobre Eli teria tido lugar, pois a Arca não surtiu efeito na batalha: os israelitas foram derrotados, e o objeto capturado. Os filhos de Eli foram mortos, e este, ao saber da notícia, caiu de sua cadeira, quebrou o pescoço e morreu.

Os filisteus teriam tomado a Arca como despojo de guerra, e a levaram ao templo de Dagom, em Asdode. O relato bíblico conta que a simples presença do santuário naquele local foi o suficiente para que coisas estranhas ocorressem: por duas vezes, a cabeça da estátua de Dagom apareceu cortada. Em seguida, moléstias (hemorroidas, especificamente, além de um surto de ratos) teriam assolado a população de Asdode, inclusive príncipes e sacerdotes filisteus, o que fez com que a arca fosse transportada para Ecrom, outra cidade filisteia. Porém, a população local reagiu negativamente à sua presença, e a enviou de volta ao território de Israel numa carroça. O tempo de permanência da Arca na Filístia teria sido de sete meses.

A carroça, puxada por vacas, parou em Bete-Semes, onde foi recebida por um certo Josué (personagem diferente do Josué, comandante da Conquista de Canaã). Os bete-semitas, movidos pela curiosidade, olharam para o interior da Arca, e morreram instantaneamente fulminados. Em seguida, foi transportada para Quireate-Jearim, onde ficou aos cuidados de Eleazar por 20 anos.

No início de seu reinado, Davi ordenou que a Arca fosse trazida para Jerusalém, onde ficaria guardada em uma tenda permanente no distrito chamado Cidade de Davi. Com o passar do tempo, Davi tomou consciência de que a Arca, símbolo da presença de Deus na Terra, habitava numa tenda, enquanto ele mesmo vivia em um palácio. Então começou a planejar e esquematizar a construção de um grande Templo. Entretanto, esta obra passou às mãos de seu filho Salomão.

No Templo, foi construído um recinto (chamado na Bíblia de "oráculo") de cedro, coberto de ouro e entalhes, dois enormes querubins de maneira à semelhança dos que havia na Arca, com um altar no centro onde ela repousaria. O ambiente passou a ser vedado aos cidadãos comuns, e somente os levitas e o próprio rei poderiam se colocar em presença do objeto sagrado.

Desaparecimento
A Arca permaneceu como um dos elementos centrais do culto a Deus praticado pelos israelitas durante todo o período monárquico, embora poucas referências sejam feitas a ela entre os livros de Reis e Crônicas.

Em 605 a.C [Primeira invasão a Judá], 597 a.C [Segunda Invasão a Judá] e 586 a.C [Terceira e última invasão a Judá], Nabucodonosor II, rei da Babilônia, invadiu o Reino de Judá e tomou a cidade de Jerusalém. O relato bíblico menciona que na ultima invasão no ano 586 a.C Nebuzaradã, comandante da guarda imperial, conselheiro do rei da Babilônia, foi a Jerusalém e incendiou o templo do Senhor, o palácio real, todas as casas de Jerusalém e todos os edifícios importantes. (2 Reis 25:8–9). Depois desse grande incêndio que teria destruído todo o templo e a cidade de Judá, a Arca da Aliança desapareceu completamente da narrativa Bíblica e não há mais menção dela a partir desse ponto, pois o próprio relato se torna vago quanto ao seu destino.

Para os católicos que se utilizam da Septuaginta (Escrituras Sagradas na versão grega dos LXX), o desaparecimento da Arca é narrado no livro de 2 Macabeus, não aceito pelos protestantes e pelos judeus que só aceitam as escrituras em hebraico. Nessa situação o profeta Jeremias haveria mandado que levassem a Arca até o Monte Nebo para ali a esconder em uma caverna.

A busca pela arca
Em julho de 1981, os moradores de Israel foram surpreendidos com uma notícia extraordinária. Moti Éden, um repórter da Rádio Israelense, anunciava em seu programa noturno que dois rabinos haviam encontrado a arca da aliança e que, ele mesmo, era uma testemunha ocular do ocorrido.

O que Éden tinha de fato presenciado foi a escavação clandestina de um grupo de judeus ortodoxos que acreditavam estar a caminho de encontrar o valioso tesouro. Eles criam que um túnel lateral ao muro das lamentações os levaria ao antigo lugar santíssimo do Templo, embaixo do qual estariam escondidas as tábuas da lei e outros artefatos originais. Hoje, o que vemos no local do antigo Templo são as edificações islâmicas do Domo da Rocha e da mesquita de Al Aksa.

O resultado, evidentemente, foi uma reação imediata dos muçulmanos que entraram em luta armada contra militantes judeus, causando a morte de seis estudantes. O quadro só não ficou pior porque o rabino Meir Getz, que liderava as escavações, cedeu a um acordo político, colocando “panos quentes” sobre a questão. Getz morreu em 1995 e um ano depois e o túnel foi parcialmente aberto ao público como atração turística.

A despeito da agitação, nenhuma prova concreta foi apresentada de que a arca tivesse mesmo ali. Mas esta não foi a única vez que alguém pretendeu tê-la encontrado.

Pretensos achados
Os etíopes dizem que a verdadeira arca estaria em seu país, numa capela da cidade de Axum. Eles argumentam que ela foi roubada do templo judeu pelo príncipe Menelik, filho de Salomão e da rainha de Sabá. O curioso é que, com exceção de uns poucos políticos, a ninguém foi permitido ver ou fotografar a arca, o que torna bastante suspeita esta tradição.

Vendyl Jones, provavelmente o mais excêntrico dos descobridores, foi a inspiração para o diretor Steven Spielberg criar o personagem Indiana Jones. O cineasta George Lucas inspirou-se na busca pela Arca para o roteiro de seu filme Raiders of the Lost Ark (intitulado Indiana Jones e Os Caçadores da Arca Perdida, no Brasil. Com base num obscuro texto encontrado entre os Manuscritos do Mar Morto (o Manuscrito de Cobre), Jones diz ter decifrado o mapa de onde estariam a arca e outros utensílios sagrados do Templo.

Em 1988, ele apresentou uma pequena vasilha de barro cujo conteúdo seria o Shemen Afarshimon, o óleo sagrado dos sacerdotes. Análises químicas posteriores pareceram dar certo crédito à sua descoberta, mas o assunto ainda não está tecnicamente encerrado. Mais tarde, em 1992, Jones mostrou aos jornalistas um pote de cinzas que alegou pertencerem originalmente ao ketoret, o incenso sagrado do Templo. Muitos, é claro, dizem que tudo não passa de um embuste.

Com absoluta segurança, ele prometeu que revelaria em agosto deste ano o local exato da arca. Mas até agora nada de concreto foi apresentado e o mérito de Vendyl Jones parece ser apenas o de ter inspirado a criação de um personagem holliwoodiano.

Dentro do arraial adventista, um profissional da área de saúde chamado Ron Wyatt também pretendeu ter encontrado a arca. Infelizmente, a empolgação apressada, seguida da forma fácil como a Internet divulga inverdades, fez com que muitos irmãos, de boa fé, acreditassem na história de Wyatt e a divulgassem, inclusive, através do púlpito.

Embora não tenhamos aqui espaço para mostrar as falhas de suas pretensas descobertas, podemos resumidamente dizer que Wyatt afirmou ter encontrado a arca em 1982. De acordo com sua história, Deus lhe havia dado uma revelação especial, por ocasião de sua visita a Jerusalém, mostrando-lhe a gruta de Jeremias, dentro da qual estaria a arca da aliança.

Munido de uma discutível “permissão” para escavar no local, que fica próximo à porta de Damasco, Wyatt disse ter encontrado ali a espada de Golias, a mesa dos pães asmos, o altar de incenso e outras coisas. Sua trama, recheada por aparições angelicais e visões de Cristo, termina com o achado da arca e os dez mandamentos. Ron disse ainda ter tirado várias fotos, mas quase todas queimaram. A única que restou não oferece nada que possa ser chamado de “convincente”. Apenas uma luz forte onde ele afirma poder visualizar o rosto de Cristo sentado num trono celestial.

Numa teologia muito confusa, Wyatt também apontou o lugar como sendo o Calvário e concluiu que, quando Cristo morreu, seu sangue penetrou o solo, aspergindo a arca que estaria poucos metros abaixo. Este seria o cumprimento de Daniel 9:24. Ora, o texto bíblico não diz que seria ungida a arca e sim o santo dos santos que, se entendido no sentido pessoal, refere-se a Cristo e, no sentido geográfico, ao santuário celestial. Mesmo porque, o lugar santíssimo do santuário terrestre não ficava no Calvário, mas dentro do Templo.

Ron Wyatt afirmou ainda ter recolhido amostras do sangue de Cristo, mas, como nas declarações anteriores, tudo não passou de uma teoria infundada. Como Vendyl Jones, ele também foi desafiado a apresentar provas mais substanciais do que dizia. Então, prometeu que, em um ano ou dois, voltaria ao local com uma equipe de cientistas e revelaria a arca para o mundo. Só esperaria uma ordem de Deus dizendo que chegou a hora de fazê-lo. Mas, Wyatt morreu em 1999 e, até hoje, nenhum de seus colaboradores apresentou qualquer prova que legitime suas afirmações.

O que diz Ellen White?
Como já foi dito, a arca desapareceu por volta de 587 a.C., quando os babilônios atacaram Jerusalém e destruíram o Templo. A Bíblia não descreve como isto aconteceu, mas antigas tradições judaicas revezam entre Josias, Jeremias e Baruque a responsabilidade pela ocultação do objeto. Ellen White, embora não mencione o nome dos envolvidos, parece dar crédito a esta tradição. Ela diz:

“Antes do templo ser destruído, Deus fez saber a alguns de seus fiéis servos o destino do templo, que era o orgulho de Israel ...Também lhes revelou o cativeiro de Israel. Estes homens justos, exatamente antes da destruição do templo, removeram a sagrada Arca que continha as tábuas de pedra, e com lamento e tristeza esconderam-na numa caverna, onde devia ficar oculta ao povo de Israel por causa de seus pecados, não mais sendo-lhes restituída. Esta sagrada arca ainda está oculta, jamais foi perturbada desde que foi escondida” (Spiritual Gifts, vol. 4, pp. 114, 115 (1864); Spirit of Profecy, vol. 1, p. 414, (1870); História da Redenção, p. 195).

“Entre os justos que ainda restavam em Jerusalém, a quem tinha sido tornado claro o propósito divino, alguns havia que se determinaram colocar além do alcance das mãos cruéis, a sagrada Arca que continha as tábuas de pedra, sobre a qual haviam traçado os preceitos do decálogo. Isto eles fizeram. Com lamento e tristeza esconderam a arca numa caverna onde deveria ficar oculta do povo de Israel e de Judá por causa de seus pecados, não mais sendo-lhes restituída. Esta sagrada arca ainda está oculta. Jamais foi perturbada desde que foi escondida” (Profetas e Reis, p. 436).

Assim, descarta-se a ideia de que a arca tenha sido destruída, arrebatada ou transferida para fora de Israel, pois com a iminente chegada dos babilônios, os judeus não teriam tempo de fugir para longe levando consigo um objeto sagrado que demandaria um detalhado cerimonial de transporte.

Será a arca encontrada novamente?
A atitude de esconder objetos sagrados devido a uma ameaça iminente não era estranha. 2 Crônicas 34:14-30 descreve o momento em que, em meio à reforma do Templo, Hilquias encontrou os originais de Moisés que sacerdotes piedosos haviam escondido durante o idolátrico reinado de Manassés. Os Manuscritos do Mar Morto, descobertos em 1947, nas cavernas de Qumran, também exemplificam tal comportamento. Segundo uma hipótese, os textos teriam sido guardados ali em virtude do cerco romano sobre a cidade de Jerusalém.

Várias tradições judaicas baseadas em Jeremias 3:16 fazem supor que a arca reaparecerá no fim dos tempos. Embora o espaço não nos permita expor estas tradições, torna-se digno de nota que Ellen White também fala que as Tábuas serão trazidas novamente à vista dos habitantes da Terra:

“Com Seu próprio dedo, Deus escreveu os Seus Mandamentos em tábuas de pedra. Essas tábuas não foram deixadas aos cuidados dos homens, mas foram postas na arca; e no grande dia em que cada caso estiver decidido, essas tábuas escritas com os Dez Mandamentos serão mostradas para que o mundo inteiro possa ver e entender. Seu testemunho contra o mundo será inquestionável” (Carta 30, 1900; Manuscript Releases 1401. vol. 19, p. 265).

“O precioso registro da lei foi colocado na Arca do Testamento e está lá ainda seguramente escondida da família humana. Mas no tempo apontado por Deus Ele revelará essas tábuas de pedra a fim de serem testemunho para todo o mundo contra o desdém para com Seus Mandamentos e contra o culto idolátrico de um falso sábado” (Manuscript Releases 122, 1901); Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, vol. 1, p. 1109).

“Quando o templo de Deus for aberto, que triunfo não será para aqueles que foram fiéis e verdadeiros! No templo será vista a Arca do Testamento em que foram postas as duas tábuas de pedra nas quais foi escrita a Lei de Deus. Essas tábuas de pedra serão tiradas de seu esconderijo e nelas serão vistos os Dez Mandamentos gravados pelo dedo de Deus. Essas tábuas de pedra que agora jazem dentro da arca do testamento serão um testemunho para a verdade e os reclames da lei de Deus” (Carta 47, 1902); Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, vol. 7, p. 972).

Embora não possamos ser dogmáticos, estes textos parecem indicar que o reaparecimento da Lei será um ato sobrenatural de Deus por ocasião do Seu juízo sobre os homens. E isto ocorrerá quando cada caso estiver decidido.

Assim, embora possamos admitir um desejo próprio de que a arca seja encontrada, é importante ter prudência e permitir que se cumpra a vontade de Deus. Note-se que um ponto em comum a todos os pretensos descobridores da arca é que nenhum deles até hoje apresentou provas concretas que justifiquem suas afirmações. Fotos que não se revelam, soldados que impedem o acesso ou promessas que não se cumprem são insuficientes para nos fazer acreditar neste tipo de abordagem. E é importante lembrar que mesmo a verdade, se for sustentada com argumentos infundados, torna-se um desserviço à causa de Deus.

[Com informações de Evidências de Deus | Wikipédia)

sexta-feira, 25 de agosto de 2023

O PODER DA FÉ

O crescimento da população evangélica no Brasil é um fenômeno extraordinário e sem precedentes. Entre 1940 e 2010, este grupo religioso saltou de 2,7% para 22,2% dos brasileiros – a expectativa é que os dados do Censo 2022, que ainda precisam ser detalhados, apontem uma representação evangélica de mais de 30% da população. Este aumento estrondoso pode ser verificado pela impressionante expansão das igrejas protestantes, que dobraram o número de templos na última década e hoje passam de 100 mil.

O ‘boom’ das igrejas evangélicas fortaleceu todas as denominações, em geral, mas algumas vertentes se destacam neste avanço acelerado. As líderes em abertura de templos nas últimas décadas foram as pentecostais, tendo em primeiro lugar a Assembleia de Deus — entre 2010 e 2019, esta denominação inaugurou mais de 9.000 igrejas abertas em todo o território nacional, uma disparada de 115% em dez anos.

Tradicionalmente, as pentecostais têm um potencial de capilaridade imenso, particularmente em regiões mais isoladas do país ou periféricas das grandes cidades — com frequência, os templos desempenham papéis fundamentais de assistência às comunidades onde há pouca presença do Estado.

Também estão neste grupo denominações como a Congregação Cristã no Brasil, que abriu 3.445 igrejas na década passada (alta de 92%), e a Igreja Cristã Maranata, com 1.530 novos templos (avanço de 35%) — veja quadro abaixo.

Em segundo lugar no ranking da expansão, vieram as igrejas neopentecostais. Mais concentradas em centros urbanos, estas igrejas compartilham a dedicação à chamada “teologia da prosperidade” — doutrina que promete melhorar a condição financeira de seus fiéis. A neopentecostal brasileira mais conhecida, a Igreja Universal do Reino de Deus, inaugurou 2.515 templos entre 2010 e 2019. Outra denominação famosa neste grupo é a Igreja Mundial do Poder de Deus, criadora de 2.310 locais de culto no mesmo período.
A terceira vertente evangélica que mais se expandiu no país é das igrejas missionárias — Adventista, Metodista, Luterana, Batista, Anglicana, Menonita e Presbiteriana compõem esta categoria. As missionárias incluem algumas das mais antigas igrejas evangélicas brasileiras, mas o grupo cresceu relativamente pouco na última década, registrando cerca de 53% de novos templos contra 76% das neopentecostais e quase 98% das pentecostais. Em parte, esta desaceleração das missionárias é resultado de suas estruturas mais engessadas e hierarquizadas, semelhantes ao catolicismo, que dificulta a reprodução das igrejas em ritmo tão arrebatador quando as outras denominações. 

[Com informações da Veja]

quinta-feira, 24 de agosto de 2023

SACRIFÍCIO HUMANO?

Se você se sente incomodado ao ler Juízes 11, talvez se sinta um pouco melhor em saber que este trecho da Bíblia tem incomodado também a muitos por muitos séculos. Entretanto, esta passagem pede uma melhor compreensão dos fatos e traz tantos conselhos e advertências importantes que não poderíamos deixar de registrá-los.

Após o genuíno arrependimento dos filhos de Israel, Deus suscitou um homem para livrá-los dos filhos de Amom. Jefté era filho de Gileade com uma prostituta. E devido à sua linhagem bastarda, ele foi rejeitado e provavelmente ameaçado por seus irmãos, já que teve de fugir. Andando com “homens levianos” (v.3), certamente recebeu influências negativas que o afastaram do Senhor. Porém, o mesmo título dado a Gideão também lhe foi atribuído: “homem valente” (v.1). Isso levou os anciãos de Gileade a buscá-lo de volta para que liderasse Israel contra os filhos de Amom.

Jefté tornou-se o cabeça de todo o Israel e a Bíblia diz que o Espírito do Senhor veio sobre ele. "Entretanto, a presença do Espírito não garante infalibilidade ou onisciência. Aquele que recebe o Espírito permanece um agente moral livre, e espera-se que faça o devido progresso no conhecimento e crescimento espiritual. Jefté, ignorando o que era correto, precipitadamente votou uma coisa errada. O único julgamento possível no caso de Jefté é o de condenação" (CBASD, Vol. 2, p. 389). Mas já no verso seguinte, vimos que Jefté fez um voto equivocado ao Senhor, dando início a uma das histórias bíblicas mais intrigantes do Antigo Testamento. Jefté não fez simplesmente um voto, mas tentou barganhar com Deus. 

"A ignorância da Lei de Deus por parte de Jefté era muito grande, tendo-se em vista passagens como Lv 18:21; 20:2-5; Dt 12:31; 18:10. Se de fato ofereceu sua única filha em holocausto (oferta queimada), como o sentido literal do texto indica, pode-se afirmar, com certeza, que não agradara a Deus. O sacrifício humano, que se encontra em passagens como 2Rs 3:27; 16:3; 17:17; 2Cr 33:6; Jr 7:31; 32:35, revela que tal costume pagão não era desconhecido entre os hebreus. Louvamos o zelo de Jefté; condenamos seu voto temerário. Desde a Idade Média há intérpretes que argumentam que Jefté jamais teria sacrificado sua filha única, mas que somente a consagrara à virgindade perpétua. As frases “esse será do Senhor” e “jamais foi possuída por varão” são as mais proferidas em prol dessa opinião (Bíblia Shedd).

O registro do voto precipitado de Jefté é uma das mais difíceis passagens das Escrituras. O relato é muito breve para permitir conclusões definitivas sobre o que aconteceu. Aqui, como em outros lugares, deve-se verificar o que diz a Bíblia e evitar a tentativa de harmonizar as afirmações com o conceito pessoal sobre a história. Deve-se tomar a Bíblia como se lê. Sempre que possível deve-se conceder o benefício da dúvida às pessoas e não julgá-las sem justa causa.

O voto de Jefté foi feito sob a pressão das circunstâncias, estando ele no limiar de um empreendimento perigoso. Infelizmente, era em tempos de perigo ou crise que votos como esse eram feitos, quando o estresse emocional contribui para o perigo de fazer promessas precipitadas" (CBASD, Vol. 2, p. 388, 389).

Percebendo, porém, a tragédia que sua promessa insensata lhe causaria, “rasgou as suas vestes e disse: Ah! Filha minha, tu me prostras por completo; tu passaste a ser a causa da minha calamidade, porquanto fiz voto ao Senhor e não tornarei atrás” (v.35).

Alguns estudiosos afirmam que Jefté, ao proferir o voto, não especificou se referir a sacrifício humano, mas de um animal, já que os animais, naquela época, ficavam à porta das casas e que, de modo algum os sacerdotes aceitariam sacrificar uma pessoa; outros dizem que ele realmente se referiu a sacrificar uma pessoa, já que o sacrifício humano era um costume pagão e Israel já havia adquirido muitos destes costumes, mesmo sabendo que Deus não aprovava. Interessante que ele observou a lei dada a Moisés para ser fiel ao voto feito ao Senhor (Lv 19:12), em detrimento de outra ainda mais importante, pois preservava a vida.

A fim de evitar as consequências desastrosas de juramentos humanos insensatos, Jesus condenou os juramentos: “de modo algum jureis… Seja, porém, a tua palavra: Sim, sim; não, não. O que disto passar vem do maligno” (Mt 5:34 e 37). Não era desígnio de Deus que Jefté sacrificasse a própria filha e nem ser humano algum, muito menos que a entregasse ao celibato. Mas a atitude da filha, cujo nome a Bíblia não revela, manifesta a mesma rendição que encontramos em Isaque, ao aceitar que seu velho pai o sacrificasse (Gn 22:9); e a mesma disposição de Cristo quando declarou: “Meu Pai, se possível, passe de Mim este cálice! Todavia, não seja como Eu quero, e sim como Tu queres” (Mt 26:39).

Quando a filha de Jefté disse: “Pai meu, fizeste voto ao Senhor”, vejo ali uma expressão de profunda entrega. Porém, observem as suas primeiras palavras: “Pai meu”. Assim como Cristo apelou “Meu Pai”, esta filha apelou ao seu pai. Era como se ela dissesse: “O senhor é o meu pai, aquele que me ama mais do que tudo, e se achas por bem cumprir o teu voto, eis-me aqui, não questionarei e nem frustrarei os planos daquele que mais me ama!” Apesar do mistério que vela este relato, ainda há uma corrente que defende que Jefté não ofereceu a filha em holocausto, mas a entregou ao celibato. Uma coisa é certa: aos pais é confiado o mais caro dever de zelar pela herança do Senhor (Sl 128:3) e pela negligência ou imprudência podem expor os filhos a situações que poderiam ser evitadas.

Naquela época, uma moça solteira era sinônimo de desgraça e, o fato de ser a única filha de Jefté, significava que o nome de seu pai seria esquecido sem uma descendência. Mas a sua atitude submissa lhe rendeu uma posição de honra na história de Israel, como bem pontua Warren Wiersbe: “Ela merece ser colocada ao lado de Isaque como filha fiel, disposta a obedecer tanto ao pai quanto a Deus a qualquer preço” (Comentário Bíblico Expositivo, v. 2, p.141). Jefté foi infeliz em seu voto, mas sua filha lhe deu um “banho” de fidelidade.

E a questionável história de uma simples virgem, nos lembra a inquestionável história do Filho do Homem. Ela foi o cumprimento de um voto falível e transitório, Jesus, o cumprimento de um voto infalível e eterno! O maior “sacrifício” que Deus aceita é a nossa entrega pessoal. Não precisamos fazer juramentos para garantir que Deus nos abençoe. Basta atendermos ao apelo do apóstolo: “Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional” (Rm.12:1). Vigiemos e oremos!

Ilustração: "Jephthah's rash vow. Judges XI - 39" de John Opie (1761-1807)

terça-feira, 22 de agosto de 2023

DUELO COM O DIABO

Aquele estava sendo um dia normal de culto até que Raul Grandão entrou. Tudo estava acontecendo conforme o esperado. Os músicos tocavam habilmente, no ritmo certo, para que a congregação cantasse em adoração a Deus. As crianças esperavam ansiosamente pelo momento especial da história. Um casal idoso olhava os pequenos, relembrando como era cuidar de três crianças com menos de sete anos de idade durante o culto. A paz enchia a sala.

Então, Raul Grandão invadiu a igreja como um búfalo bravo. Seus gritos anunciavam sua chegada bem antes de abrir as portas. O alvoroço da sua entrada parou tudo. As crianças estavam aterrorizadas, encolhidas na segurança do colo dos pais. A maior parte da congregação tentou continuar cantando, mas era difícil louvar mais alto que a voz do Grandão.

Os músicos? Não mudaram o ritmo. Seu dever era muito mais importante do que a chegada do Raul Grandão. O pastor, conhecendo muito bem aquele homem, ficou sentado, orando silenciosamente, e esperou para ver como o Espírito Santo agiria.

Raul Grandão, com seu hálito de deixar qualquer um bêbado, também estava louvando a Deus. Alto. Muito alto! “Jesus é nosso Rei, nosso Redentor, nosso Salvador, nosso Irmão”, cantava ele, acabando-se em lágrimas. “Sou um pecador, mas Jesus me ama mesmo assim”, continuava Grandão, com a fala arrastada pelo efeito do álcool.

Um casal de diáconos o conduziu para a lateral do templo, como um barco que puxa um navio enorme por meio de um canal estreito. Várias vezes os diáconos já haviam lidado com aquela situação. O demônio rum parecia trazer à tona o pior de Raul Grandão. Embora suas palavras glorificassem a Deus, sua vida era alimentada pelas drogas e não pelo amor de Deus.

Raul Grandão seguia a orientação dos diáconos, ainda proclamando a bondade de Deus com rugidos bêbados, enquanto eles o levavam para uma das fileiras do fundo. Logo a normalidade do culto foi restabelecida.

EMBATE ESPIRITUAL
Sem interrupção por poucos minutos. Então, Armando chegou. Ele não tinha uma casa de verdade, morava debaixo da ponte perto da igreja. Seus únicos amigos formavam uma gangue de traficantes de drogas e assassinos. Armando tinha cicatrizes, era bravo, forte e perigoso, um homem a ser evitado a todo custo.

Até aquele dia, uma “igreja” nunca esteve na sua lista de lugares a ser visitados. Armando irrompeu pelas portas gritando blasfêmias contra tudo o que é divino. – Eu sou o diabo! – proclamava ele. Daquele momento em diante as coisas pioraram, aterrorizando a congregação e transformando o culto em um palco de demônios.

O pastor, que já havia visto Armando repreender outras pessoas embaixo da ponte, baixou a cabeça e começou a orar silenciosamente com o fervor do apóstolo Paulo: “Agora é Sua vez, Senhor! O inimigo está aqui nos desafiando a levantar e lutar contra ele. Ou a correr e nos esconder. Eu clamo pelo Teu Espírito Santo para que venha com total poder ao nosso culto agora, Senhor. Se o inimigo nos declarar guerra, por favor, mostra-nos a Tua paz!”

O pastor esperou ansioso para ver o que o Espírito faria. Quase imediatamente houve uma agitação lá no banco do fundo, onde Raul Grandão estava sentado com os diáconos. Ele, ainda com hálito de embriagado, se levantou cambaleante, encontrou suas pernas e marchou silenciosamente na direção de Armando, como uma cobra atrás de um rato.

Raul Grandão não é chamado assim por acaso. Ele é mais alto do que todos. Parece um caminhão grande e se movimenta como se tivesse a missão de “limpar a estrada”. Todos se afastaram para dar espaço enquanto ele avançava na direção de Armando, que sentiu sua presença se aproximando e virou o rosto na direção de Raul.

– Você não vai mais blasfemar contra meu Jesus nesta casa de culto! – desafiou o Grandão. Aquilo despertou o pior de Armando, que continuou com seu palavreado cheio de ódio, mas dessa vez jogando tudo isso na cara de Raul. Nada daquilo o deteve. Ele permanecia em pé, a apenas alguns centímetros do “diabo”. Grandão agarrou Arnaldo pelos ombros e ordenou ao inimigo que o deixasse naquele momento!

Armando, quase desmaiando com o bafo de Raul, gritou ainda mais alto. Assim, Grandão soltou os ombros de Armando e, com suas mãos gigantescas, apertou as bochechas de seu oponente. – Saia desse homem agora mesmo! – gritou Grandão, nariz a nariz com Armando e com os demônios que tinham se apossado da vida daquele homem.

A batalha barulhenta, poderosa, demoníaca e divina, deixou a igreja paralisada por 20 minutos. Os demônios de Armando tentaram gritar mais alto que os comandos de Raul Grandão, mas a conexão dele com Jesus ficava mais forte a cada grito dos demônios.

De repente, como ocorreu algumas vezes há muitos séculos na Galileia, os demônios fugiram. Fraco, como se os demônios tivessem levado seus ossos, Armando desabou nos braços receptivos de Raul Grandão. Então, sóbrio como se tivesse bebido apenas da “água da Vida”, Grandão abraçou Armando como a um bebê recémnascido.

– Ele agora é nosso – gritou bem alto Raul Grandão, enquanto pastor, diáconos, idosos, pais, crianças e várias visitas correram para participar da comemoração. Os músicos começaram a tocar um ritmo mais vivo com notas mais agudas. E todos passaram a cantar juntos uma nova música: “A Canção dos Redimidos”.

LIÇÕES PARA TODOS
Quando ouvi essa história, fiquei impressionado e cheio de perguntas. “Será que isso realmente aconteceu?”; “Será que Armando e Raul Grandão são de verdade ou personagens criados pelos contadores de história?” Porém, logo eu soube que a história é verdadeira e eles são pessoas reais.

Então, me surgiram mais perguntas: “Por que o pastor ficou sentado quieto, orando, em vez de pular no meio deles e resolver os problemas?”; “Quanto aquela igreja estava sintonizada com o Espírito Santo para ser uma comunidade acolhedora, para receber um bêbado e um endemoninhado?” E a pergunta mais importante de todas: “Como posso ajudar minha igreja a ser como essa congregação?”

Dick Duerksen (Revista Adventista)

segunda-feira, 21 de agosto de 2023

NÚMEROS NA BÍBLIA

Muitos dos números na Bíblia têm um profundo significado profético ou espiritual. Tanto no Antigo como no Novo Testamento, os números revelam conceitos e significados ocultos que normalmente escapam ao leitor casual. Ao longo da história, homens com grandes mentes, como Agostinho, Isaac Newton e Leonardo da Vinci, mostraram mais do que apenas uma curiosidade passageira sobre a importância dos números na Bíblia. Certa vez, Jesus disse: “Até os cabelos da cabeça de vocês estão todos contados” (Mateus 10:30, NVI). Logo, obviamente, os números da Bíblia devem ser cuidadosamente considerados.

Pelo menos 12 números na Bíblia destacam-se: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 10, 12, 40, 50 e 70. Para expressar essa verdade, um ou dois exemplos bíblicos foram dados abaixo. No entanto, muito mais pode ser dito sobre este assunto, assim estes exemplos servem apenas como uma introdução.

1 – Representa absoluta unicidade e unidade (Efésios 4:4-6, João 17:21, 22).

2 – Representa a verdade da Palavra de Deus, por exemplo, a lei e os profetas (João 1:45), duas ou três testemunhas (2 Coríntios 13:1), e uma espada de dois gumes (Hebreus 4:12). Ver Marcos 6:7 e Apocalipse 11:3. Também é usado 21 vezes nos livros de Daniel e Apocalipse.

3 – Representa a Divindade/Trindade. Os anjos proclamaram “Santo” três vezes ao Deus Trino (Isaías 6:3). Veja também Mateus 28:19 e 1 João 5:7-8.

3 ½ – Representa a rejeição e a apostasia. É a dissecção do sete, o número perfeito. Por 3 ½ anos, Elias fugiu da perseguição. Jesus foi crucificado no final do período de 3 ½ anos. Estevão foi o primeiro mártir cristão, apedrejado no final dos 3 ½ anos de pregação dos apóstolos em meio a perseguições. Havia 3 ½ anos proféticos quando a igreja entrou na clandestinidade durante a Idade das Trevas, de 538 a 1798.

4 – Representa a verdade universal, como nas quatro direções (norte, sul, leste, oeste) e os quatro ventos (Mateus 24:31, Apocalipse 7:1, Apocalipse 20:8). Em atos 10:11, um lençol com quatro pontas simboliza o evangelho indo a todos os gentios.

5 – Representa o ensino. Primeiro, há os cinco livros de Moisés. Em segundo lugar, Jesus ensinou sobre as cinco virgens prudentes e foram utilizados cinco pães de cevada para alimentar os 5 mil.

6 – Representa o culto do homem, e é o número do homem, significando sua rebelião, imperfeição, obras e desobediência. Ele é usado 273 vezes na Bíblia, incluindo os seus derivados (por exemplo, sexto) e outras 91 vezes como “sessenta” ou “60”. O homem foi criado no sexto dia (Gênesis 1:26, 31). Veja também Êxodo 31:15 e Daniel 3:1. O número é especialmente significativo no livro de Apocalipse, como o “666”, que identifica a besta. “Aqui há sabedoria. Aquele que tem entendimento calcule o número da besta, pois é número de homem. Seu número é seiscentos e sessenta e seis” (Apocalipse 13:18).

7 – Representa a perfeição, e é o sinal de Deus, o culto divino, obediência e descanso. O “príncipe” dos números da Bíblia, é usado 562 vezes, incluindo os seus derivados (ex. sétimo). (Veja Gênesis 2:1-4, Salmo 119:164 e Êxodo 20:8-11, apenas como alguns dos exemplos). O número sete também é o mais comum na profecia bíblica, ocorrendo 42 vezes em Daniel. Em Apocalipse, há sete igrejas, sete espíritos, sete candelabros de ouro, sete estrelas, sete lâmpadas, sete selos, sete chifres, sete olhos, sete anjos, sete trombetas, sete trovões, sete mil mortos em um grande terremoto, sete cabeças, sete coroas, sete últimas pragas, sete frascos de ouro, sete montanhas, sete reis.

10 – Representa lei e restauração. Naturalmente, isso inclui os Dez Mandamentos em Êxodo 20. Veja Mateus 25:1 (dez virgens), Lucas 17:17 (dez leprosos), Lucas 15:8 (cura, dez moedas de prata).

12 – Representa a igreja e a autoridade de Deus. Jesus tinha 12 discípulos, e haviam as 12 tribos de Israel. Em Apocalipse 12:1, os 24 anciãos e os 144.000 são múltiplos de 12. Na cidade de Nova Jerusalém há 12 fundações, 12 portas, 12 mil estádios, uma árvore com 12 tipos de frutos 12 vezes por ano, consumidos por 12 vezes 12.000 ou pelos 144.000 (Ver Apocalipse 21).

40 – Representa uma geração e tempos de prova. Choveu durante 40 dias durante o dilúvio. Moisés passou 40 anos no deserto, assim como os filhos de Israel. Jesus jejuou por 40 dias.

50 – Representa poder e celebração. O Jubileu veio após 49 anos (Levítico 25:10), e o Pentecostes ocorreu 50 dias após a ressurreição de Cristo (Atos 2).

70 – Representa a liderança e julgamento humanos. Moisés designou 70 anciãos (Êxodo 24:1); O Sinédrio era composto por 70 homens. Jesus escolheu 70 discípulos (Lc 10:1). Jesus disse a Pedro para perdoar 70 vezes 7.

666 – Como mencionado, seis representa o número do homem; 666 representa o reino do homem em oposição a Deus. 666 é um número poligonal, mais precisamente o número triangular de 36 pois é representado geometricamente por um triângulo equilátero com 36 unidades de lado, começando por uma na primeira, duas na segunda, três na terceira, continuando esta progressão até à 36ª fila. Assim, o 666 também simboliza uma trindade de contrafação. Alguns são muito supersticiosos sobre o número 666 e se recusam a ter números de telefone, placas de automóveis, cartões de crédito que o contenham. Esta fobia é conhecida como hexacosioihexecontahexafobia. Mas não temos que ter medo do número 666 em si. É simplesmente um número natural seguinte ao 665 e que antecede o 667. No entanto, o Apocalipse diz: “Aqui há sabedoria. Aquele que tem entendimento calcule o número da besta, pois é número de homem. Seu número é seiscentos e sessenta e seis” (Ap 13:18).

144.000 – Povo remanescente de Deus, também chamado de Israel espiritual (Ap 14). Representam os apóstolos dos últimos dias. Como Jesus tinha 12 líderes que partilhavam o evangelho, no momento da Sua primeira vinda, um exército de 12 vezes 12.000 será batizado no Espírito Santo para preparar o mundo para a segunda vinda de Cristo. Outra pista interessante relacionada com os 144.000 é encontrada em 1 Crônicas 27: O exército de Davi era composto por 12 conjuntos de 24.000, totalizando 288.000, o que significava dois exércitos de 144.000, que alternava o seu serviço durante todo o ano. Em 1 Crônicas 25, um grupo literal de “24 vezes 12” (288) Levitas conduziam a música de louvor do templo (um para o dia, um para a noite), metade de 288 = 144.

Doug Batchelor | Traduzido pelo blog Sétimo Dia | Original: Keys to Bible Numbers

sexta-feira, 18 de agosto de 2023

FALTA DE AMOR NA IGREJA

Após a ascensão de Jesus Cristo, João permaneceu como fiel e ardoroso obreiro do Mestre. Juntamente com os demais discípulos, fruiu o derramamento do Espírito no dia do Pentecostes, e com novo zelo e poder continuou a falar ao povo as palavras da vida, procurando levar seus pensamentos para o invisível.

A vida do apóstolo estava em harmonia com seus ensinos. O amor de Cristo que ardia em seu coração induziu-o a empenhar-se em fervoroso e incansável labor por seus semelhantes, especialmente por seus irmãos na igreja cristã. “Conhecemos a caridade nisto: que Ele deu a Sua vida por nós, e nós devemos dar a vida pelos irmãos” (1Jo 3:16).

Depois da descida do Espírito Santo, quando os discípulos saíram para proclamar um Salvador vivo, seu único desejo era a salvação de almas. Rejubilavam-se na doçura da comunhão com os santos. Eram ternos, prestativos, abnegados, voluntários em fazer qualquer sacrifício pelo amor da verdade. Em seu contato diário entre si, revelavam aquele amor que Cristo lhes ordenara. Por palavras e obras de altruísmo, procuravam acender este amor em outros corações.

Um tal amor deviam os crentes sempre acariciar. Mas pouco a pouco, houve uma mudança. Os crentes começaram a olhar os defeitos uns dos outros. Concentrando-se nos erros e dando lugar a severas críticas, perderam de vista o Salvador e Seu amor. Tornaram-se mais estritos na observância de cerimônias exteriores e mais rigorosos na teoria do que na prática da fé. Em seu zelo para condenar os outros, passavam por alto os próprios erros. Perderam o amor fraternal que Cristo havia ordenado que tivessem.

Percebendo que o amor fraternal estava diminuindo na igreja, João insistiu com os crentes sobre a constante necessidade desse amor. Suas cartas à igreja estão repletas desse pensamento. Ele escreveu: “Amados, amemo-nos uns aos outros, porque o amor procede de Deus; e todo aquele que ama é nascido de Deus e conhece a Deus” (1Jo 4:7-11).

Não é a oposição do mundo o que mais ameaça a igreja de Cristo. É o mal cultivado no coração dos crentes que acarreta suas mais graves derrotas, e que mais atrasa o progresso da causa de Deus. Por outro lado, o mais forte testemunho de que Deus enviou Seu Filho ao mundo é a existência de harmonia e união entre as pessoas de variados temperamentos que compõem Sua igreja. É privilégio dos seguidores de Cristo dar esse testemunho. No entanto, para fazer isso, precisam se colocar sob a liderança de Cristo. O caráter deles precisa se amoldar ao Seu caráter, e a vontade deles à Sua vontade.

“Novo mandamento vos dou”, disse Cristo. “Assim como Eu vos amei, que também vos ameis uns aos outros” (Jo 13:34). Que maravilhosa declaração! Mas como é pouco praticada! Lamentavelmente, o amor fraternal está faltando na igreja de Deus hoje em dia. Muitos que professam amar o Salvador não amam uns aos outros. Os incrédulos estão observando para ver se a fé dos professos cristãos está exercendo uma influência santificadora na vida dessas pessoas. Somos todos membros de uma mesma família, todos filhos do mesmo Pai celestial, com a mesma bendita esperança da imortalidade. O laço que nos une deve ser fraterno e afetuoso.

"Quem ama o seu irmão vive na luz, e não há nessa pessoa nada que leve alguém a pecar. Mas quem odeia o seu irmão está na escuridão, anda nela e não sabe para onde está indo, porque a escuridão não deixa que essa pessoa enxergue" (1Jo 2:10, 11).

[Ellen G. White - Atos dos Apóstolos, pp. 284, 285]

quinta-feira, 17 de agosto de 2023

A PERSEGUIÇÃO NO APOCALIPSE

Em geral, as pessoas temem o sofrimento. Elas o odeiam e tentam evitá-lo. Uma forma de sofrimento é a perseguição religiosa, que, em alguns casos, pode até levar ao martírio. Porém, as pessoas que vivem nos países em que há forte proteção legal e liberdade religiosa costumam se esquecer de que sofrer por amor de Jesus faz parte do presente destino do cristão. O próprio Jesus profetizou o sofrimento (Jo 15:18-21; 16:2, 3). Todos os apóstolos sofreram perseguição e não a consideraram “coisa estranha” (1Pe 4:12, 13). Aqueles que não sofrem perseguição de não cristãos ou mesmo de outros cristãos podem não perceber esse tema tão presente no livro de Apocalipse ou projetá-lo somente para os últimos momentos da história da Terra. Entretanto, tal visão limitada pode nos impedir de compreender e apoiar nossos irmãos e irmãs que estão sofrendo hoje.

O livro de Apocalipse contém muitas referências à perseguição e ao sofrimento. Esse tema permeia o livro. Embora a palavra “perseguir” (dioko) seja encontrada apenas uma vez em Apocalipse – o dragão persegue a mulher pura, a igreja (Ap 12:13) –, Robert H. Mounce, em sua obra The Book of Revelation, argumenta que a ideia de perseguição não se limita a esse termo. Palavras específicas, frases e trechos narram perseguição e feroz oposição. A perseguição da mulher pelo dragão é descrita em Apocalipse 12 de maneira gráfica e simbólica. O dragão tenta afogar a mulher e fazer com que ela seja arrebatada pelo rio (Ap 12:15).

Encontramos muitas vezes o termo “sangue” (haima) em contextos que ressaltam morte violenta (Ap 1:5; 6:10; 17:6). Em diversas passagens as palavras “morto” (nekros) e “morte” (thanatos) indicam martírio (Ap 1:5, 18; 14:13). João participou da “tribulação” (thlipsis) que outros cristãos sofreram (Ap 1:9). A igreja de Esmirna sofreu boa parte dessa tribulação (Ap 2:9, 10). A grande multidão virá da grande tribulação (Ap 7:14). A palavra “paciência” ou “perseverança” (hupomone) encontra-se em contextos de perseguição (Ap 1:9; 2:2, 3, 19; 13:10; 14:12). Apocalipse 2:10 descreve uma perseguição futura com a palavra “sofrer” (pascho).

Em algumas passagens, “morte” ou “assassínio” (apokteino) indica perseguição (Ap 2:13; 13:15), assim como podem indicar os termos “assassinato” (phonos; Ap 9:21) e “assassino” (phoneus; Ap 21:8; 22:15) em outras. Na igreja de Pérgamo, Antipas foi morto como “testemunha fiel” (Ap 2:13). Jesus é a testemunha fiel suprema (martus; Ap 1:5).

Jesus foi morto (sphazo; Ap 5:6, 9, 12) como um animal sacrifical. Alguns de seus seguidores também seriam violentamente mortos (Ap 6:9). Cristãos também foram decapitados (pelekizo; Ap 20:4). A cidade santa (que, segundo Stephen Smalley, em seu livro The Revelation of John, representa a igreja) será calcada aos pés (pateo; Ap 11:2).

Além de serem ameaçados de morte, os cristãos sofrerão boicote econômico (Ap 13:17). Ao terem o selo de Deus (Ap 7:2-4), eles não possuirão a marca da besta (Ap 13:16). Isso os colocará em evidência para que sejam perseguidos. Eles morarão nas proximidades do reino de Satanás (Ap 2:13) e serão atormentados pela sinagoga dele (Ap 2:9; 3:9). Serão confrontados e provados pelas “coisas profundas de Satanás”. O dragão pelejará (poieo polemon) contra o remanescente (Ap 12:17) por meio da besta que emerge do mar (poieo polemon; Ap 13:7) e da besta que emerge da terra (Ap 13:11-17) e as vencerá (Ap 13:7), ao menos temporariamente. A batalha do Armagedom (Ap 16:14; 16) será a luta final. A última ameaça de Satanás e seu exército contra a Nova Jerusalém e o povo de Deus, descrita em Apocalipse 20:7-10, se provará inútil e vã. Portanto, percebe-se que a perseguição está em todas as partes do livro de Apocalipse.

NUANCES DA PERSEGUIÇÃO
As informações sobre a perseguição no livro de Apocalipse podem ser agrupadas dentro dos seguintes tópicos:

1. A perseguição não está limitada a um período na história. O livro de Apocalipse menciona perseguições nas mensagens às sete igrejas. Apocalipse 12 a 14 apresenta um panorama do conflito entre Satanás e Jesus e Satanás e a igreja, iniciando com o nascimento do Messias e terminando com a segunda vinda de Jesus. A perseguição da igreja por longos períodos da história, simbolicamente descritos como “1.260 dias”, “42 meses” ou “um tempo, dois tempos e metade de um tempo”, é claramente expressa. Em Apocalipse 13 há uma longa profecia de uma futura adoração do dragão, da besta que emerge do mar e da imagem da besta.

2. A perseguição é local e universal. Há uma discussão acadêmica sobre até que ponto os cristãos do 1º século sofreram perseguição. Normalmente se admite que, de fato, ocorreram conflitos locais e perseguições na história primitiva da igreja, conforme afirma J. Nelson Kraybill em seu livro Apocalypse and Allegiance. Com relação ao tempo do fim, o apóstolo João viu uma união religiosa apóstata – Babilônia (Ap 17:1-7; veja também Ap 12-14) – apoiada por uma aliança política (Ap 17:2, 12, 13) e que guerreava contra o povo de Deus em nível universal.

3. A perseguição pode ter origens diferentes. O martírio de Jesus, o sofrimento de João, a perseguição dos cristãos em Esmirna e a morte de Antipas não estão diretamente atribuídos a um poder específico. No entanto, a circunstância histórica dos primeiros séculos indica que o Império Romano foi peça-chave na perseguição e morte dos cristãos.

As cartas às igrejas de Esmirna e Filadélfia mencionam aqueles que se autodeclaravam “judeus”, mas não eram (Ap 2:9; 3:9). Alan S. Bandy, no livro Prophetic Lawsuit in the Book of Revelation, afirma que essas duas igrejas estavam, de certa forma, em conflito com as comunidades judaicas em Esmirna e Filadélfia.

Apocalipse 12 descreve a perseguição do verdadeiro povo de Deus pelo dragão nos períodos medieval e pós-medieval. No entanto, conforme afirma Simon J. Kistemaker em New Testament Commentary: Exposition of the Book of Revelation, o dragão utiliza como poder humano a besta que emerge do mar – a grande e poderosa igreja medieval. Angel M. Rodríguez, em Future Glory, ressalta que o remanescente da mulher (Ap 12:17) será atacado pela besta que emerge do mar e também pela besta que emerge da terra, a América protestante. Portanto, o livro de Apocalipse vê Satanás, o adversário do Cordeiro, como protagonista por trás de todas as perseguições. Ele utilizou e utilizará diversos poderes políticos para perseguir o povo de Deus, como o Império Romano, poderes políticos dos últimos dias e também entidades religiosas como os judeus, religiões não cristãs e até mesmo igrejas cristãs.

4. A perseguição pode vir de formas variadas. O Apocalipse menciona blasfêmia (Ap 2:9; 13:6), perseguição (Ap 12:13), tribulação e sofrimento (Ap 1:9; 2:9-10), boicote econômico (Ap 13:17) e martírio (Ap 1:18; 2:10; 6:9, 10; 20:4). Há dúvidas se o conflito com falsos mestres e doutrinas enganadoras – a investigação das coisas profundas de Satanás (Ap 2:24) – também pode vir a ser perseguição.

5. A perseguição pode ser provocada pelo testemunho do povo de Deus. João utilizou com bastante frequência a família da palavra martu, “dar testemunho”, “prova” e “testemunha” (como pessoa). Um mártir é alguém que testifica da verdade com a própria vida. A palavra martus (testemunha) refere-se a Jesus e seus seguidores (Ap 2:13; 17:6). Jesus é o exemplo a ser seguido pela igreja.

Grant R. Osborne, em Revelation, e Richard Bauckham, em Theology of the Book of Revelation, destacam que o testemunho dos cristãos é primeiramente um estilo de vida de fidelidade a Cristo, e, em segundo lugar, um testemunho verbal durante o período de sofrimento deles. Perseguição e testemunho estão, muitas vezes, correlacionados, no sentido de que testemunhas fiéis têm que sofrer.

6. Perseguição e seguir a Jesus são coisas que andam de mãos dadas. Apocalipse 14:4 menciona que os 144.000 seguem (akoloutheo) o Cordeiro “por onde quer que Ele vá”. O contexto se refere a uma situação de perseguição extremamente difícil. No Evangelho de João, Jesus é descrito como o Bom Pastor. Suas ovelhas o seguem (Jo 10:4, 27). Porém, João, em seu evangelho, também coloca “seguir a Jesus” no contexto de sofrimento e até de martírio (Jo 12:23-26; 13:36, 37; 21:19). Para os cristãos que seguem o Cordeiro, a perseguição é algo normal e não uma “coisa estranha” (1Pe 4:12). É algo a ser esperado. Portanto, os cristãos devem evitar a perseguição, se puderem? Sim. Devem eles evitá-la a todo custo? Não.

7. A perseguição será levantada pela recusa dos crentes em ser leais às instituições humanas. O livro de Apocalipse prevê um conflito entre aqueles que têm o selo de Deus em sua fronte (Ap 7:2-4) e aqueles que aceitam a marca da besta em sua fronte ou na mão direita (Ap 13:16), o que levará à perseguição de fiéis seguidores de Cristo no tempo do fim. Esses eventos ainda estão por vir e sobrepujarão tudo o que anteriormente já aconteceu na história da igreja.

8. A perseguição é muitas vezes retratada em conexão com a ideia de guerra. Por exemplo, de acordo com Richard Bauckham, em The Climax of Prophecy, os 144 mil (durante o sexto selo), que obviamente terão que viver nos tempos em que os ventos serão soltos (Ap 7:1-4), são descritos como o exército messiânico. Sua contrapartida é o exército demoníaco de 200 milhões de seres que surgem durante a sexta trombeta (Ap 9:16). O conflito entre Miguel e o dragão é descrito como uma guerra no Céu (Ap 12:7). A perseguição dos remanescentes (santos) por meio do dragão (besta que emerge do mar) é descrita como uma guerra travada contra eles (Ap 12:17; 13:7). A última batalha, em conjunto com a segunda vinda de Cristo, é a batalha do Armagedom (16:16; 17:14; 19:11-21). No entanto, essa batalha tem natureza espiritual em vez de militar.

A ideia de guerra faz parte do tema do grande conflito, o que, nas Escrituras, provavelmente se desenvolva mais claramente no livro de Apocalipse. Conflito e guerra ocorrem em nível pessoal, de grupo e também no nível cósmico. Em outras palavras, não estão limitados ao planeta Terra, mas também são percebidos no Universo. O plano de salvação idealizado por Deus resolve todos esses níveis de conflito. O ponto decisivo no grande conflito é a morte de Jesus na cruz, retratada no livro de Apocalipse como a morte do Cordeiro. A morte do Messias enfatiza a forma de ser obtida a vitória. Assim como o Cordeiro vence por meio do sofrimento, de idêntica maneira vencem seus seguidores. Eles não se envolverão em atos de violência.

9. O livro de Apocalipse demonstra a reação dos cristãos diante da perseguição. Quando ocorre perseguição e tribulação, a pergunta é: “Como os cristãos enfrentam tal situação?” Há duas formas possíveis de reação correlacionadas. Uma delas é a reação intrapessoal. A outra é uma reação exterior que tem que ver com ações observáveis. Normalmente, a ação exterior é lutar ou fugir. No livro de Apocalipse, a luta física não é uma opção para o povo de Deus. Isso faz com que lhes reste apenas a outra possiblidade, ou seja, fugir. Por fuga entende-se a mudança para outra área geográfica ou a busca de esconderijos.

O Apocalipse não discorre muito sobre o apoio mútuo entre os cristãos perseguidos. No entanto, o cuidado pelos companheiros cristãos pode ser refletido em várias partes do livro. A igreja de Éfeso é desafiada a voltar ao seu primeiro amor, o que inclui o amor fraternal (Ap 2:2; veja 2:19). O termo “serviço” (diakonia; Ap 2:19) inclui serviço aos companheiros cristãos. Os membros da igreja têm responsabilidade uns pelos outros (Ap 3:2). Eles também são chamados a servir uns aos outros em tempos de aflição.

Isso nos leva à reação intrapessoal para com a perseguição. Algumas dessas pessoas que estão sofrendo perseguição certamente já se perguntaram: “Por que Deus permite tanta crueldade?” No entanto, essa pergunta não é feita de maneira direta em Apocalipse. Assim, é mais proveitoso perguntar: “Como os seguidores do Cordeiro podem reagir à perseguição?” Apocalipse revela:

▪ Eles se voltam para Deus em oração (Ap 6:10).

▪ Eles percebem e reconhecem que os pensamentos de Deus não são os deles, e que o plano da salvação idealizado por Deus lhes ultrapassa a compreensão. Enquanto os seguidores do Cordeiro repousam e outros mártires são acrescentados ao número deles (Ap 6:11), é dado tempo ao “povo de Deus” que ainda permanece na Babilônia do tempo do fim para que abandone esse sistema de contrafação (Ap 18:4).

▪ Eles conservam o que têm e não permitem que suas coroas lhes escapem das mãos (Ap 2:25; 3:11). Essa atitude também é descrita como perseverança, paciência, resignação (hupomone), um conceito importante em Apocalipse.

▪ Eles seguem o Cordeiro (Ap 14:4) e aceitam o sofrimento como algo inerente ao discipulado.

▪ Eles buscam o bem de seus inimigos mediante o testemunho fiel de sua vida, suas palavras e seu serviço como sacerdotes (Ap 12:11; 1:6).

▪ Eles confiam no terno cuidado de Jesus (Ap 1:5-7) e nas muitas promessas divinas contidas no livro de Apocalipse. Jesus têm as chaves da morte e do inferno (Ap 1:18). Ele ajuda seu povo a perseverar (Ap 2:10) e não permite que seja tocado pela segunda morte (Ap 2:11). Ele limita os fardos para que se tornem suportáveis (Ap 2:24; 3:10). Jesus até influencia os inimigos de seu povo a reconhecer que esses cristãos são amados por Deus (Ap 3:9).

10. Perseguição e morte não são consideradas derrota. No Evangelho de João, a morte de Jesus não é entendida como sua derrota, mas como sua glorificação (doxazo; Jo 7:39; 12:16, 23; 13:31) e exaltação (hupsoo; Jo 3:14; 8:28; 12:32-34). O livro de Apocalipse traz essa mesma abordagem. Assim como a aparente derrota de Jesus era, na realidade, sua vitória, da mesma forma o fiel sofrimento de seus seguidores (mesmo o martírio) não deve ser entendido como derrota. O livro de Apocalipse inverte a compreensão comum e torna derrotados os aparentemente vitoriosos, e vitoriosos os aparentemente derrotados. Essa inversão leva as pessoas a atentar para o fato de que Deus avalia as situações de maneira diferente e que elas são diferentes do que pareciam ser. Ironicamente, foi a aparente vitória satânica com a morte de Jesus que derrotou o próprio Satanás.

A PERSEGUIÇÃO NÃO É O FIM
O fato de o tema “perseguição” estar presente em todo o Apocalipse pode ser desalentador, principalmente para os cristãos que estão sofrendo perseguição. Porém, o Apocalipse não é um livro deprimente. É um livro muito positivo que fala do amor de Jesus por seus seguidores, de salvação e de uma nova condição de cristãos como um reino e sacerdotes; fala de auxílio constante e de uma esperança maravilhosa.

À luz da perseguição, devemos ter em mente que cerca de metade do livro é dedicada ao julgamento divino, isto é, à vindicação do nome de Deus e de seu povo. Os cristãos também são animados pela promessa constantemente repetida da iminência do regresso de Cristo. A ressurreição é a concretização da esperança de vida eterna para os cristãos sofredores. Ao mesmo tempo, é o terror de Deus para seus inimigos, pois eles reconhecem que terminou seu único poder, o da morte. Portanto, o Apocalipse não é um livro sobre morte; é sobre a vida através de Cristo e com Ele. A perseguição não é a palavra final. Deus tem a palavra final. Enquanto isso, amamos e ajudamos aqueles que estão sofrendo.

Ekkehardt Mueller (via Revista Adventista)

quarta-feira, 16 de agosto de 2023

NÃO OLHE PARA TRÁS

“Lembrai-vos da Mulher de Ló” (Lucas 17:32).

Essa lembrança à mulher de Ló, foi mantida para nos advertir hoje. Se tem um comando predileto de Deus é para andarmos para frente e avançarmos. Em todos os episódios, de vitória e intervenção divina, o conselho de olhar para frente é dado. Olhar para trás é retroceder e se apegar ao que geralmente nos deprime. Esse segundo menor versículo na Bíblia, traz um significado enigmático e completo dado por Jesus. Essa história se dá em Sodoma e Gomorra, descrita em Gênesis 19. No contexto de resgate, um conselho se destaca no momento em que Ló e sua família são arrastados para fora da cidade. Esse conselho foi uma advertência: “Fuja por amor à vida! Não olhe para trás” (Gn 19:7).

No entanto, a mulher de Ló, cujo nome é desconhecido, desobedece e se transforma em uma estátua de sal. Ellen G. White diz: "A esposa de Ló olhou para trás na direção de Sodoma, e, murmurando contra as atitudes de Deus, foi transformada em uma estátua de sal, a fim de que permanecesse como advertência a todos quantos desconsideram as especiais misericórdias e providências do Céu" (Testemunhos para a Igreja 4, p. 111).

Essa situação traz uma indagação natural: “Foi só uma olhadinha, que mal teria nisso?”. Aqui, não se trata de uma olhada casual, resultado de uma curiosidade feminina, mas uma olhada de desejo. Embora tenha sido o olho que exerceu o ato, foi o coração que olhou. No fundo, ela queria voltar. Amava ainda o que deixou. Estava ali só em corpo. O passado era a constituição do seu presente. 

Há um filosofo contemporâneo que fez a melhor análise sobre o tempo, diferenciando-o em: vazio e científico. Henrique Bergson, afirmava que o tempo mais presente é aquele que faz parte do esquema mental e ocupa a vontade do coração. O presente para Bergson é residual, o passado para ele é como se fosse uma entidade que alimenta e determina o futuro. O passado é um reservatório de memórias que afeta constantemente o presente.

John L. Mason disse: "Quanto mais se olha para trás, menos se avança." Thomas Jefferson estava certo ao proferir: "Gosto mais dos sonhos sobre o futuro do que da História." Hubert Humphrey pronunciou: "Acredite-me: os bons tempos nunca foram assim tão bons. Os verdadeiros bons tempos são hoje, e tempos melhores ainda virão amanhã. Ainda não entoamos nossas melhores canções." Satchel Paige falou uma verdade: "Não olhe para trás; pode ter alguma coisa se aproximando de você." E Charles Kettering acrescenta: "Você não conseguirá ter um futuro melhor se ficar o tempo todo pensando no passado."

A mulher de Ló eternizou Sodoma e Gomorra em seu coração. Hoje, o apego ao que temos e conquistamos nos desvia de olhar para frente. As condições emocionais e financeiras de muitos aprisionam o seu foco e paradigma. Ao olhar para trás, a mulher de Ló duvidou que o Senhor poderia lhe conceder algo melhor do que aquilo que ela já experimentara. Desde o momento da escolha, Ló diante de Abraão, ensinou aos seus a valorizarem o que simplesmente veem e vivem na ocasião.

O passado deve ser visto para tirarmos lições, e não para habitarmos nele. Embora vivamos no presente, onde vivemos e estivemos já é passado quando temos a esperança em Jesus. Essa vida, profissão, bens e relações teremos que deixar para trás. Avance em fé para o que está à frente. Não julgue como a mulher de Ló, quando supôs que nada no futuro poderia ser melhor que aquilo que estava sendo deixado. “Olhos jamais viram, nem ouvidos ouviram o que Deus tem preparado, para os que o amam” (1Co 2: 9). O céu nos aguarda e nada, nem ninguém pode nos fazer olhar para trás.

terça-feira, 15 de agosto de 2023

ACOMODADOS

Gente acomodada vive quebrando espelhos. Fujões da realidade, fantasiam um universo de êxito que só existe na sua própria preguiça. Postergam mudanças, inventam desculpas e se beatificam de perfeição. Que só tem na sua imaginação. O problema? Acomodados são radioativos. Expelem a toxina do desleixo pelo ar. É cheiro sem ver, mas está lá. ⁣⁣

Vou na jugular. Um apático é opaco. Sem gosto, sem sonho, sem provocação, sem endorfina, nem hobbies. Este tipo detesta conversar, muito menos se avaliar. Qualquer meta é cruz e miragens nutrem sua lerdeza. Cuidado com isso! Se você é descuidado, acomodada, ou vai deixando tudo na mesma, o chão pode se abrir. Porque a zona de conforto tem um abismo sob o tapete. Lodo movediço.⁣
Então, é pra ser inquieto, estressado, insatisfeito? Jamais. Só que desligar desejos empoeirando planos dá câncer relacional. É dureza viver ao lado de alguém desapaixonado por algo mais. Estudar um idioma? Que nada. Praticar um esporte? Pra quê? Subir na balança ou almejar uma promoção? Bobeira. Surpreender o cônjuge? Ah, conta outra! E cuidar da autoestima, acelerar o passo, ou tratar a unha encravada? Xiii. Tudo pra depois. ⁣
Só que o depois devora o hoje. A sonolência é sorrateira e a inércia a vilã da realização. Na Bíblia? Dorminhocos ruíram. Sansão dormiu (Jz 16:19); a Sulamita dormiu (Ct 3:1); Êutico cochilou (At 20:9); até os discípulos roncaram (Mt 26:40). Por isso, a Palavra grita: “desperta tu que dormes!” (Ef 5:14) e “vigiai e orai” (Rm 13:11). Ou seja, derrote esta autosabotagem miniaturizante. Já!⁣
Deus vai ter que lhe enfiar num peixe ou jogar no poço pra você viver seu máximo? Jonas e José saltaram das redes de balanço ousando impossíveis. Não espere a coxa latejar para sair do vale. Como Jacó. Faça algo. Qualquer coisa. Mas faça. Surpreenda-se como ponto de partida até que surpreender outros seja a linha de chegada. Logo ali. ⁣
Pronta para desacomodar? Melhore nisso. Urgente. Nocauteie o egoísmo que não se preocupa com os demais. Eles esperam iniciativa, propósito e evolução. Bóra retornar ao espelho exigindo força do Céu? Faça da zona de conforto uma zona de confronto.⁣
Que tal? Coragem.⁣

Odailson Fonseca (via instagram)

"O Senhor convida Seu povo para despertar do sono. O fim de todas as coisas está às portas. Quando os que conhecem a verdade forem cooperadores de Deus, aparecerão os frutos da justiça. Pela revelação do amor de Deus no esforço missionário, muitos serão despertados e levados a reconhecer a malignidade de seu procedimento. Verão que no passado seu egoísmo os desqualificou para serem cooperadores de Deus. A exibição do amor de Deus que se vê no abnegado ministério em favor dos outros, será o meio de levar muitas pessoas a acreditar na Palavra de Deus tal qual ela é" (Ellen G. White - Testemunhos para a Igreja 9, p. 40).

segunda-feira, 14 de agosto de 2023

PÉROLAS AOS PORCOS

Jesus recomendou que não déssemos pérolas aos porcos (Mt 7:6). O porco não é capaz de avaliar o valor de uma pérola, nem de apreciar a sua beleza. Pensando tratar-se de comida, ele a ingere, mas seu organismo não a digere, de modo que, ele acaba por expeli-la da mesma maneira que a engoliu. Semelhantemente, há consciências que ainda não estão aptas a digerir a verdade, nem tampouco são capazes de atribuir-lhe o devido valor. Dá mesma maneira que a recebem, descartam-na, pois não reconhecem o seu valor.

É frustrante perceber que muito daquilo que valorizamos, pelo qual seríamos capazes até de morrer, não passa de futilidade por quem ainda não teve seus olhos desvendados. Por isso, Paulo orava para que os olhos do nosso coração fossem iluminados para que enxergássemos a verdadeira riqueza (Ef 1:8). Sem esta iluminação, confundimos pérolas com ervilhas, tesouros com meras bijuterias.

Como atribuímos valor a algo? Que critérios usamos? Por que algo que tem valor incomensurável para um, não tem valor algum para outro?

Penso que Jesus nos oferece uma resposta consistente em duas de suas parábolas:

"O Reino dos céus é como um tesouro escondido num campo. Certo homem, tendo-o encontrado, escondeu-o de novo e, então, cheio de alegria, foi, vendeu tudo o que tinha e comprou aquele campo. O Reino dos céus também é como um negociante que procura pérolas preciosas. Encontrando uma pérola de grande valor, foi, vendeu tudo o que tinha e a comprou" (Mateus 13:44-46).

A maior parte das parábolas contadas por Jesus tinha o objetivo de explicar o que era e como funcionava o reino de Deus. Diferente dos reinos deste mundo, o reino de Deus não pode ser localizado geograficamente. Ninguém pode apontá-lo num mapa. Ele é, por assim dizer, uma escala de valores proporcionalmente inversa àquela tão cara ao mundo. As réguas pelas quais o mundo afere todas as coisas são a POSSE, o PODER, o PRESTÍGIO e o PRAZER. Algo só tem valor se nos proporciona uma dessas coisas.

Já no reino de Deus, em contrapartida, valoriza-se o desapego, a humildade e o serviço, valores antagônicos àqueles. Em vez de perguntarmos que benefício aquilo nos proporcionará, perguntamos quantos dele se beneficiarão.

Segundo Jesus, o reino de Deus é semelhante a um tesouro escondido num campo. O que é um tesouro, afinal? Pode ser o que alguém com muito sacrifício amealhou durante toda a vida. Para aquele que o achou, nada custou. Mas para aquele que o escondeu ali, pode ter custado toda a sua vida. O que faz aquele homem que topou com ele acidentalmente? Ele sabe que o campo tem dono. Mas provavelmente o dono desconhece a existência do tesouro. Aproveitando-se disso, aquele homem vai, vende tudo quanto tem e lhe faz uma oferta. Talvez o dono do campo tenha se surpreendido com o valor oferecido. Ele jamais suporia que suas terras valessem tanto. Mas o comprador sabe de algo que ele desconhece. Ele compra o campo mas o que realmente interessa é o que nele está escondido.

Aprendemos com isso que não se pode avaliar nada superficialmente. Abaixo das sucessivas camadas de poeira pode haver um tesouro. Por trás da aparência simples de uma criança pode haver um extraordinário potencial latente. Mas quem se dispõe a cavar? No reino de Deus vale mais a vocação, isto é, aquilo a que se destina algo/alguém do que propriamente a sua situação atual.

Aquele homem vende tudo o que tem para adquirir o campo. O valor que atribuímos a algo é proporcional àquilo de que estamos dispostos a abrir mão para adquiri-lo.

Na segunda parábola, Jesus diz que o reino de Deus é como um negociante que procura e acha uma pérola de grande valor. Ele faz exatamente como o da primeira parábola: vende tudo o que tem para adquiri-la.

Como alguém poderia dispor de toda uma vida por um único objeto? Ora, aquele homem já negociava pérolas. Aquela era a sua profissão. O que ele teria visto naquela pérola em particular que valeria toda uma vida de trabalho?

Na época, a cobiça pelas pérolas era tão grande que os registros históricos mostram que no apogeu do império Romano, o general Vitellius financiou um exército inteiro vendendo apenas um dos brincos de pérola de sua mãe. Todavia, Jesus usa o artigo definido para referir-se a tal pérola. Portanto, não se tratava de uma pérola comum, o que já seria sobremodo valiosa. Embora Jesus não especifique, arrisco dizer que se tratava de uma pérola negra, a mais rara dentre as pérolas.

Valorizamos algo de acordo com sua indisponibilidade. Quanto mais raro, maior valor lhe atribuiremos. Vale aqui a lei da oferta e da procura.

Uma pérola negra não é mais bela que uma pérola comum. Até seu brilho é inferior. No entanto, pérolas negras são raríssimas. Somente uma espécie de ostra encontrada no Taiti chamada pinctada margaritifera é capaz de produzi-la. Esta ostra possui uma listra negra em seu interior. Se a pérola se formar em contato com a listra, a pérola resultante será negra. Entretanto, mesmo entre essas ostras isso é um fenômeno raro – acontece uma vez em cada 10 mil.

Pérolas negras não são produzidas em série. Tudo quanto Deus faz é raro, é único, é especial. As coisas de Deus não são comuns. A própria graça de Deus é um fenômeno raro. Quantos bilhões de seres humanos já viveram neste planeta? Mas quantos deles poderiam arcar com o alto preço de nossa salvação? Quantos seriam aptos? Para tal teriam que ter vivido neste mundo sem ter praticado um único pecado. Alguém se habilitaria? Não foi à toa que João chorava desesperadamente em sua visão registrada em Apocalipse, “porque ninguém fora achado digno” (Ap 5:4a).

Jesus é a nossa pérola negra, aquele que “não tinha parecer nem formosura; e, olhando nós para ele, nenhuma beleza víamos, para que o desejássemos” (Is 53:2). Desprovido de beleza, porém, raro, raríssimo, sui generis.

Se considerarmos o livro de Cânticos e o relacionamento de Salomão e Sulamita como uma alegoria do relacionamento entre nós e Cristo, faremos coro à resposta que ela dá às suas amigas:

“Que diferença há entre o seu amado e outro qualquer, ó você, das mulheres a mais linda? Que diferença há entre o seu amado e outro qualquer, para você nos obrigar a tal promessa? O meu amado tem a pele bronzeada; ele se destaca entre dez mil” (Cânticos 5:9-10).

Estatisticamente, qual a probabilidade de surgirem na humanidade pessoas como Leonardo da Vinci, Mahatma Gandhi, Albert Eistein, Siddarta Gautama, Maomé e outros? Ínfimas, provavelmente. E qual a probabilidade de surgir alguém como Jesus Cristo, capaz de reatar nossa comunhão com Deus? Absolutamente, zero!

Portanto, tudo o que se refere a Ele é raro, raríssimo. Seu Reino é único. Sua graça é ímpar. Quem não entendeu isso certamente não teve seus olhos desvendados ainda, e, por isso, não pôde contemplar o esplendor do Seu reino, nem ter consciência da inefabilidade de Sua graça.

Se não percebermos o quão rara é a graça, não lhe atribuiremos o devido valor. Corremos o risco de a confundirmos com uma graça barata, expressão cunhada pelo teólogo alemão Bonhoeffer.

Apesar de a salvação nos ser oferecida gratuitamente, ela custou muito caro a Ele, da mesma maneira que a produção de uma pérola custa muito caro à ostra. O único trabalho que o negociante de pérolas tem é o de encontrar a ostra e abri-la. Devo admitir que não é nada fácil abrir uma ostra hermeticamente fechada. E não adianta tentar quebrá-la. Sua casca é duríssima. A melhor saída é esperar o momento em que a ostra se abre por si só, revelando assim o seu conteúdo.

Jesus diz que até nos dias de João Batista, o reino de Deus era tomado à força. Porém, até ali, ninguém havia obtido êxito em apossar-se de tão preciosa pérola. Mas, chegada a plenitude dos tempos, a ostra se abriu e a pérola tornou-se disponível aos homens.

Embora seja exteriormente resistente, a ostra é interiormente muito sensível. Talvez mais sensível que os olhos humanos. Se um cisco no olho é capaz de nos levar ao desatino, imagine o que significa para a ostra quando seu interior é invadido por um grão de areia. A dor é incalculável. Sua reação para tentar diminuir o desconforto é cobrir o grão de areia com camadas de carbonato de cálcio. A substância vai endurecendo até formar a pérola.

Pode-se dizer que pérola é a cicatriz da ferida causada pelo grão de areia invasor. Da mesma maneira, para que o reino de Deus nos tornasse acessível, Jesus teve que ser ferido. Isaías profetizou cerca de setecentos anos antes, que Ele seria “desprezado e o mais indigno entre os homens; homem de dores e experimentado no sofrimento. Como um de quem os homens escondiam o rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum” (Is 53:3).

Jesus recebeu em Seu corpo inocente feridas em todas as extremidades, nas mãos, nos pés, na cabeça, nas costas e no tronco. As feridas deixaram de sangrar. Mas as cicatrizes permanecem mesmo em Seu corpo glorificado. Elas são as testemunhas do preço pago pela nossa redenção e admissão no reino de Deus. Não é por coincidência que as doze portas de acesso à Nova Jerusalém, símbolo de sua igreja e do seu reino, são representadas por doze pérolas (Ap 21:21).

Será que temos atribuído o devido valor a esta graça? De que estaríamos dispostos a abrir mão por ela? Quanto vale o que custou a vida do único inocente a ter passado por esta terra? Pois o valor de Sua vida é proporcional ao valor da salvação que nos é oferecida gratuitamente. Não valorizar isso é pisar o Filho de Deus, profanar o sangue da aliança e insultar o Espírito da graça (Hb 10:29).

Hermes C. Fernandes (via facebook)

"Os anjos choram ao ver a verdade preciosa de origem celeste lançada aos porcos, para ser apanhada por eles e pisada na lama e na sujeira. 'Nem deiteis aos porcos as vossas pérolas; para que não as pisem e, voltando-se, vos despedacem' (Mateus 7:6). Estas são as palavras do Redentor do mundo" (Ellen G. White - Testemunhos para a Igreja, vol. 3, 425).