A política geralmente traz consigo uma conotação negativa. Normalmente se pensa que a atividade política envolve uma conduta ética comprometida, distorção da verdade, endosso temporário de grupos de interesses especiais e intensas críticas sobre os pontos de vista e caráter dos oponentes. Se você é identificado como um “líder político”, provavelmente não vê isso como um elogio.
Falar de “política na igreja” envolve dizer que há um elemento estranho na organização, que serve para minar a esperada pureza do processo e o foco definido na missão. Muitos preferem pensar que a igreja deve estar acima da política. Este artigo afirma que a política é uma parte necessária da vida em comunidade – até mesmo na vida da igreja – e que os princípios espirituais devem nortear a administração do poder.
As sociedades, com exceção das ditaduras, operam com base na política. Toda organização precisa de um sistema de estrutura e autoridade. A política é o processo de organizar a distribuição do poder e o ambiente para o controle de valores na sociedade. Caso contrário, a vida se torna uma busca pela sobrevivência por meio da força bruta. Na sociedade civilizada, a política é uma característica necessária da vida com os outros.
A política ganhou uma imagem um tanto negativa por causa do comportamento e de práticas questionáveis empregadas por pessoas ou grupos que advogam causas e ideologias específicas. Um martelo pode ser usado para pregar um prego que prende dois pedaços de madeira. Ou o martelo pode ser usado para quebrar uma janela e facilitar a entrada do ladrão que vai roubar uma casa, ou ainda para ferir um oponente. A política, da mesma maneira, pode ser usada para propósitos bons ou corruptos.
A igreja também emprega procedimentos políticos para determinar quem tem autoridade e como a organização funcionará. A igreja é uma organização dinâmica, não estática. Ela opera em um ambiente de mudanças e emprega processos políticos para permanecer relevante.
A política é necessária na igreja! A necessidade urgente é de que os membros e líderes da igreja saibam como usar a política de maneira ética e sábia; evitar o mau uso intencional ou acidental da política; e garantir que os processos políticos resultem em bem para toda a igreja.
Essa abordagem levanta imediatamente considerações éticas e morais. Como cristãos, não podemos simplesmente ignorar a espiritualidade quando pensamos em política. Eugene Peterson faz uma importante observação a respeito das implicações políticas da liderança: “Tendo em vista que a liderança é necessariamente um exercício da autoridade, ela facilmente se torna um exercício do poder. Mas, assim que isso acontece, ela começa a causar danos tanto ao líder quanto ao liderado" (The Message: The New Testament, Psalms, and Proverbs).
A política é um elemento necessário e apropriado na vida da igreja. Mas a política da igreja deve ser estruturada em uma plataforma ética bastante diferente daquela que geralmente prevalece na sociedade.
COMO OS LÍDERES CRISTÃOS DEVEM AGIR?
Quais são os comportamentos políticos apropriados para os líderes em uma organização religiosa? O que constitui o processo político na igreja?
Presume-se que cada líder em uma organização cristã vá exercer sua função com base nos valores espirituais vindos de um crescente relacionamento espiritual com Jesus. Assim, espera-se que cada líder reflita a imagem de Cristo em todo o tempo. Entretanto, todo líder necessita reconhecer quão fácil é permitir que questões pessoais influenciem o comportamento de um líder.
Uma das tarefas mais difíceis da liderança é a pessoa ser honesta consigo mesma diante de Deus. É muito simples usar a linguagem espiritual e uma capa de piedade religiosa para camuflar os interesses pessoais. O primeiro comportamento político da liderança é estar em paz com Deus e manter esse relacionamento. Ao assim fazer, dará mostras de seu comportamento, influenciará a conduta e levará reflexão moral às próprias meditações. Quando os líderes cuidam em manter sua vida particular com Deus, sua vida pública cuidará de si mesma.
Em sua carta à igreja em Corinto, Paulo lembrou: “Eu mesmo, irmãos, quando estive entre vocês, não fui com discurso eloquente nem com muita sabedoria para lhes proclamar o mistério de Deus. Pois decidi nada saber entre vocês, a não ser Jesus Cristo, e este, crucificado. E foi com fraqueza, temor e com muito tremor que estive entre vocês. Minha mensagem e minha pregação não consistiram de palavras persuasivas de sabedoria, mas consistiram de demonstração do poder do Espírito, para que a fé que vocês têm não se baseasse na sabedoria humana, mas no poder de Deus” (1 Coríntios 2:1-5).
Pressupondo que a vida pessoal dos líderes com Deus recebe os devidos cuidados, há várias formas de comportamento que ilustram seu envolvimento de forma apropriada na vida política da organização. Essas formas de comportamento incluem:
- Um registro do compromisso com a transparência.
- Honestidade e integridade – viver o que prega. As pessoas vão discernir as características repetitivas dos atos da liderança e tirarão conclusões a respeito do caráter e dos motivos.
- Preocupação deliberada pela conformidade e justiça.
- A humildade, combinada com a autoconsciência de que ninguém está certo todo o tempo.
- Compromisso de servir em vez de receber honras.
- Respeito e civilidade para com os oponentes.
- Coragem para resistir aos grupos de interesses especiais.
- Sistema integrado de pensamento – compreensão de como tudo está conectado.
- Disposição de ouvir outras perspectivas.
- Compromisso com a não violência e meios pacíficos.
- Buscar habitualmente colaboração e parceria.
- Atenção constante para com a construção da verdade.
- Respeito constante pela diversidade.
AMBIENTE POLÍTICO: ESTABELECIMENTO E MONITORIZAÇÃO
Como uma organização (como é a igreja) pode estabelecer e monitorar seu próprio ambiente político e processos relacionados para que não seja precisamente descrita como uma “organização política”?
Qualquer esforço válido – seja espiritual, político, econômico, acadêmico ou caritativo – necessita de um sistema de organização para existir por qualquer período de tempo e alcançar os objetivos compensadores. A igreja é uma organização tanto religiosa como política. Ao longo dos séculos, seu foco na missão e na exaltação de Jesus como seu líder a têm elevado acima da política comum.
No entanto, compete às organizações da igreja garantir que o caráter de sua atividade política venha conferir credibilidade à sua proclamação. As seguintes práticas, no mínimo deveriam estar evidentes, de imediato:
- Procedimentos claramente definidos (ou seja, constituições e estatutos, políticas e práticas).
- Composição dos representantes dos grupos de tomada de decisão.
- Distribuição da autoridade cuidadosamente designada e documentada.
- Procedimentos e disposição para manter líderes responsáveis.
- Dialogar/escutar o suficiente antes de as decisões serem tomadas.
- Verificação das informações em vez de confiar em rumores e pressuposições.
- Respeito pelo papel exercido por uma imprensa independente.
- Uso apropriado da tecnologia na comunicação. (A tecnologia pode ser mal-utilizada como um meio de ampliar a política.)
- Comunicação das informações em tempo hábil.
- Reconhecimento do princípio da autoridade majoritária enquanto se preserva o respeito pelas necessidades e opiniões das minorias. A maioria nem sempre está certa.
- Submissão pessoal dos membros e dos grupos de líderes ao senhorio de Jesus Cristo.
- Honestidade quanto às motivações pessoais.
- Sensibilidade para com a diversidade, incluindo o impacto da cultura, geografia e circunstâncias locais.
- Processos de tomada de decisão que envolvam e dependam da oração, reflexão espiritual e discernimento dirigido pelo Espírito.
CONCLUSÃO
A política, mesmo na igreja, é inevitável. Embora a política possa ser facilmente corrompida e mal utilizada para fins partidários ou pessoais, os líderes e organizações podem empregar a política de maneira apropriada.
Quando aplicada no contexto do evangelho, a política pode levar à paz, à reconciliação e ao avanço da missão, em vez de promover a dissensão e a divisão.
A tendência humana é a de exercer poder e autoridade, pelo menos em certo grau, no interesse de si mesmo – o desejo de ser o primeiro, de subir a escada do sucesso, de derrotar os competidores, de ser considerado poderoso, de obter prestígio e louvor. Uma liderança semelhante à de Cristo significa exercer o poder e autoridade para o bem dos outros. Os líderes cristãos não abandonam o uso da autoridade, mas, ao contrário, exercem seu poder com base no serviço sacrificial para o bem de outros.
Lowell C. Cooper (via Diálogo Universitário)