Mas então... o cristão pode fazer uma “fezinha” na Mega da Virada? Seria mero capricho da igreja ser contra jogos de azar?
A posição da igreja com respeito aos jogos é a mencionada no
Manual da Igreja, baseada na Bíblia Sagrada. Veja que, entre as razões para a disciplina de um membro, está a prática de jogos de azar: “Violação da lei de Deus, como adoração de ídolos, homicídio, roubo, linguagem baixa, jogos de azar, transgressão do sábado, e falsidade habitual e propositada” (p. 66). Leia também, a
Declaração Oficial da IASD sobre o jogo.
Na Bíblia não há uma orientação específica sobre o assunto, pois na época em que foi escrita, tal meio de ganho não existia. Entretanto, há princípios bíblicos que nos levam a concluir que tal prática não é compatível com o cristianismo. Em minha avaliação bíblica sobre o assunto, creio que jogar na Mega da Virada, na loteria, no jogo do bicho ou em quaisquer outros jogos de azar é pecado por pelo menos sete motivos que irei delinear a seguir:
1) Os jogos e apostas contrariam o princípio divino sobre a necessidade de trabalhar para comer. Deus nos ensina nas Sagradas Escrituras que a fonte de nosso sustento deve ser o trabalho. Elas são muito claras em dizer que é com o “suor do nosso rosto” que devemos conquistar o sustento diário (Gn 3:19). Esse princípio divino dado ao primeiro casal humano, no Éden, após caírem no pecado, continuou até os dias do Novo Testamento, pois o apóstolo Paulo, pelo Espírito Santo, escreveu: “Quando ainda estávamos com vocês, nós lhes ordenamos isto: se alguém não quiser trabalhar, também não coma” (2Ts 3:10, NVI). Portanto, o princípio do trabalho-comer é para nós ainda hoje. A Mega da Virada não submete-se à essa necessidade.
Esta ilusão de um enriquecimento fácil e rápido que os jogos de azar despertam no coração do ser humano (em especial do brasileiro, devido à toda esta conjuntura econômica e política em que vivemos), acabam seduzindo muitos corações, inclusive de alguns que se consideram seguidores de Jesus. As Escrituras afirmam categoricamente que a prosperidade se dá mediante ao trabalho. “A riqueza de precedência vã diminuirá, mas quem a ajunta com o próprio trabalho a aumentará” (Pv 13:11). Dinheiro nunca deve ser ganho de maneira fácil, senão com o “suor do rosto”. Toda e qualquer atividade que desvie o foco do cristão dos “tesouros do Céu” e o faça focalizar apenas o ganho fácil e rápido, torna-se perigosa e deve ser vista com cautela.
2) O jogo é um sistema baseado na injustiça. Ou seja, temos milhares de apostadores que perdem para um ou apenas alguns ganharem. A Bíblia nos orienta a não participarmos de injustiças, pois colheremos males: “O que semeia a injustiça segará males; e a vara da sua indignação falhará” (Pv 22:8). É fato que o dinheiro que alguém ganha na loteria será aquele mesmo que muitos outros perderam. Ou seja, para uma pessoa ganhar 500 milhões na Mega da Virada será necessário que milhões de outras pessoas tenham perdido suas apostas. Logo, jogar é pecado, pois leva as pessoas a participarem de forma objetiva de um sistema injusto, tentando levar alguma vantagem dele.
O cristão não deve ser tolo. Ele deve ouvir a voz de Deus que diz: "Melhor é o pouco com justiça, do que a abundância de bens com injustiça" (Pv 16:8). Prejudicar o próximo é praticar injustiça. Amigo, se isto não pesa para seu cristianismo há um grande problema em seu discernimento. Há coisas que o dinheiro não pode comprar. Para o cristão ganhar dinheiro com indícios de injustiça significa receber dinheiro sujo.
3) As motivações que levam as pessoas a jogar são erradas. Algumas apresentam muitos e muitos planos cheios de boas intenções caso ganhem o prêmio, mas sabemos que a motivação maior é o enriquecimento rápido e sem trabalho, além, é claro, de colocar sua esperança no jogo. Dentre as motivações erradas que mais vemos em quem coloca a sua esperança nos jogos é a avareza, o egoísmo, o desejo de ganhar sem trabalhar, e outros muitos desejos pecaminosos que não cabem na vida de um servo de Deus. Os totais distribuídos pelos prêmios (somas expressivas) podem despertar a ganância dentro de nós. Decorre disso que o ato de jogar nasce de um desejo ganancioso, o que transforma o ato em algo condenado por Deus, que combate a ganância nos dois últimos mandamentos da Sua santa Lei. Jesus deu uma ordem que cabe muito bem aqui: “Então, lhes recomendou: Tende cuidado e guardai-vos de toda e qualquer avareza; porque a vida de um homem não consiste na abundância dos bens que ele possui” (Lucas 12:15). Jogar é pecado porque, quase sempre, é motivada por desejos pecaminosos que não agradam a Deus e não estão de acordo com a vontade Dele.
A Bíblia exorta o cristão à prudência, sobriedade, sabedoria, justiça, ao contentamento com a Providência sobre sua vida, a não amar o dinheiro, não se entregar à ambição, cobiça, ao uso do discernimento para não ignorar os desígnios do inimigo (2Co 2:11). É importante que entendamos que as Escrituras nos advertem claramente de que não devemos amar ao dinheiro. Ele nos exorta: "Porque o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores". (1Tm 6:10).
4) A Bíblia Sagrada exorta-nos a nos contentar com o que temos. O jogo não incita o crescimento nessa virtude, mas contrariamente inflama os excessos das obras da carne (Gl 5:19-21). Quando Jó perdeu tudo o que tinha, a sua piedade com contentamento era louvável (Jó 1:21). Ele não culpou Deus nem correu para a sua “esperteza” para resolver a sua situação desesperadora. Ele confiou no Senhor. É assim o contentamento com piedade é ganho (1Tm 6:6). Preocupar com o dia de amanhã não é louvável, pois evidencia pouca fé (Mt 6:25-30). Não é fácil ser contente com o que temos, mas é um alvo de crescimento para o cristão sério. Paulo, o apóstolo, pela experiência na vida cristã, aprendeu a ser contente com o que tinha (Fp 4:11-13). Viver com o que temos nos ensinará a termos essa virtude. Jogar nunca nos ensinará contentamento. Muito menos nos levará à piedade.
Ellen G. White escreve: “O princípio dos mundanos é tirar o máximo que lhes for possível das perecíveis coisas desta vida. O amor do lucro egoísta, eis o princípio dirigente de sua vida. A mais pura alegria, porém, não se encontra em riquezas, nem na cobiça que sempre deseja ansiosamente mais, mas onde reina contentamento, e onde o abnegado amor é o princípio dominante. Há milhares de criaturas que passam a vida na satisfação de suas inclinações, mas cujo coração vive cheio de pesar. São vítimas do egoísmo e do descontentamento, no vão esforço de satisfazer o espírito pela condescendência com o próprio eu. Em sua fisionomia, no entanto, acha-se estampada a infelicidade, e na sua influência encontra-se um deserto, pela ausência de boas obras que há em sua vida” (Testemunhos Seletos, v. 1, p. 360).
5) Na Bíblia não encontramos nenhum exemplo de servo de Deus ocupando-se nessa prática de sorte. A Bíblia ensina que o homem abençoado, aquele que é feliz, é aquele que tem a sua esperança em Deus, andando nos caminhos Dele, e tem o seu sustento como fruto de seu trabalho e esforço: “Como é feliz quem teme ao Senhor, quem anda em seus caminhos! Você comerá do fruto do seu trabalho, e será feliz e próspero” (Sl 128:1,2, NVI). Dinheiro fácil, jogos e outros atalhos para o enriquecimento são caminhos perigosos para o servo de Deus e, geralmente, são caminhos que não correspondem ao que Deus preparou para nós. Jogar é pecado, pois não traz ao ganhador um dinheiro que seja fruto de seu trabalho e esforço, mas de uma esperança pautada na facilidade e, como vimos, muitas vezes, também em motivações muito erradas e em um sistema que usa de injustiças para gerar o prêmio.
O cristão é chamado para ser uma testemunha: uma luz nas trevas, um elemento que preserva e conserva boas qualidades na sociedade (Mt 5:13-16). A ocupação do cristão é de anunciar as virtudes daquele que nos chamou das trevas paras a sua maravilhosa luz (1Pe 2:9). Nas Escrituras Sagradas achamos louvor para os justos (2Pe 2:7) e os fieis (1Co 4:2; Cl 12:2; Ef 6:21; Hb 3:5), mas nunca são louvados por Deus os que confiam na sorte.
6) Jogar é contrário ao princípio da mordomia cristã. A Bíblia revela que Deus é dono de tudo o que há no mundo. Nada nos pertence. “Do Senhor é a terra e tudo o que nela existe, o mundo e os que nele vivem” (Sl 24:1, NVI). Ellen G. White afirma: “Quer sejam grandes quer pequenos os seus talentos, lembre-se de que o que possui apenas lhe pertence em depósito. Assim Deus o está provando, dando-lhe oportunidade de se demonstrar fiel. A Ele deve você toda a sua habilidade. A Ele pertencem suas faculdades do corpo, do espírito e da mente e para Ele devem ser empregadas. Seu tempo, influência, inteligência e habilidades — de tudo deve dar contas Àquele que dá todas as coisas. Usa melhor seus talentos quem, mediante fervoroso esforço, procura executar o grande plano do Senhor para o reerguimento da humanidade” (Mensagens aos Jovens, p. 48).
Portanto, empregar nossos recursos que Deus nos confiou naquilo que é desnecessário contraria a vontade de Deus, e somos tidos como mordomos infiéis e, consequentemente, seremos condenados à morte eterna. A respeito desse assunto Ellen G. White escreve: “Todo homem é um mordomo de Deus. A cada um confiou o Mestre Seus meios; mas os homens pretendem que esses meios são propriedade sua. Diz Cristo: 'Negociai até que Eu venha' (Lc 19:13). Vem o tempo em que Cristo exigirá o Seu com os juros. Dirá a cada um de Seus mordomos: 'Dá contas da tua mordomia' (Lc 16:2). Os que esconderam o dinheiro de seu Senhor em um lenço na terra, em vez de dá-lo aos banqueiros, e os que esbanjaram o dinheiro de seu Senhor gastando-o em coisas desnecessárias, em vez de pô-lo a render empregando-o em Sua causa, não receberão a aprovação do Mestre, mas decisiva condenação. O servo inútil da parábola levou de volta o único talento a Deus, e disse: 'Senhor, eu conhecia-Te, que és um homem duro, que ceifas onde não semeaste e ajuntas onde não espalhaste; e, atemorizado, escondi na terra o Teu talento; aqui tens o que é Teu'. O Senhor pega-lhe nas palavras: 'Mau e negligente servo; sabes que ceifo onde não semeei e ajunto onde não espalhei; devias então ter dado o Meu dinheiro aos banqueiros, e, quando Eu viesse, receberia o Meu com os juros' (Mt 25:24-27)” (Testemunhos Seletos, v. 1, p. 364, 365).
Levemos em consideração o seguinte: Aplicar dinheiro em jogos, onde as possibilidades de ganho são remotíssimas, enquadra-se dentro de uma administração responsável dos nossos bens? Nossos compromissos com a família, estado, igreja e o próximo poderão ser atendidos a contento se empregarmos parte do nosso dinheiro em jogos? Há em alguns desses jogos o risco de perda de vultuosa soma de dinheiro. Já ouvimos relatos de pessoas que perderam quantia elevada de dinheiro. Caminho que parecia tão fácil para sua esperteza mais tarde tornou-se frustração e prejuízo.
7) Muitas pessoas, devido a exagerada frequência nos jogos e apostas, acabam viciando-se nessas práticas. E também deixam de fazer as coisas realmente necessárias em sua vida, como cuidar da própria saúde, cumprir com responsabilidades familiares e sociais. Essas pessoas tornam-se escravas desses jogos, em que ganhar se torna uma obsessão, dominando completamente seus pensamentos. Nesse ponto, elas já perderam a sua liberdade de filhos de Deus e dos princípios básicos do Evangelho, tornando-se “escravos da corrupção, pois aquele que é vencido fica escravo do vencedor” (2Pe 2:19). A Bíblia não recomenda a procura de grandes riquezas e fortunas (Mt 6.19). O acúmulo delas pode ter efeitos negativos sobre quem as detém (por exemplo, tornar-se um “deus” que destrona a Deus do coração da pessoa ). Essa possibilidade leva-nos a algo que poderá trazer resultados negativos para o nosso relacionamento com Deus.
Esses sete motivos são suficientes para que eu me afaste desse tipo de jogo e paute o meu crescimento financeiro e profissional no trabalho, na disciplina, no empenho, no mérito e em outras virtudes que a palavra de Deus nos ensina. Por isso, creio que jogar é pecado, e todo cristão deva se afastar desse tipo de jogo.
É oportuno acrescentar que isto não inclui sorteios dos quais participamos involuntariamente. Se compro algo em uma loja e depois de alguns dias ganho um prêmio graças àquela compra, isso não tem o mesmo caráter de uma aposta. Trata-se apenas de um presente que a loja decidiu dar a um cliente. Ainda que a empresa possa utilizar o sorteio da loteria para decidir para quem vai o prêmio, este decorre de uma compra de um produto necessário, e não do gasto em uma aposta.
Querido amigo leitor, desejo que Deus abençoe a sua vida. Se estás passando por dificuldades e estás sendo tentado, o conselho bíblico não é de lançar sortes mas de lançar tudo sobre o Senhor porque Ele tem cuidado de vós (1Pe 5:7). A promessa de Deus é que Ele nunca nos deixará nem nos desamparará (Hb 13:5). Este Senhor bondoso e poderoso sabe o que necessita o Seu filho comprado pelo sangue de Cristo (Mt 6:32), e, com amor, suprirá “muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos; segundo o poder que em nós opera” (Ef 3:20). Sem dúvida, Deus pode suprir as nossas necessidades de maneiras extraordinárias, mas deve ser observado que é Ele quem faz tais prodígios. Espere no Senhor e achará alivio em Seu tempo para a glória de Deus (Is 40:31). Ele exorta-nos a buscarmos em primeiro lugar o Seu reino e Sua justiça: “Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas lhes serão acrescentadas” (Mt 6:33).
Somente quando buscarmos e compreendermos a afeição, a solicitude e a justiça de Deus, é que as preocupações se desfarão. Quando virmos a Deus como Ele realmente é, não conseguiremos mais preocupar-nos. Esse é o xis da questão. De fato, Jesus está dizendo que, se devemos nos preocupar com alguma coisa, que seja como a nossa relação com Deus. Talvez você esteja procurando as coisas erradas da vida. Se puser as coisas mais importantes em primeiro lugar, as coisas secundárias virão como o subproduto natural. Jesus estava convicto de que, quando realmente confiamos em Deus e O amamos e O entendemos, a preocupação ansiosa não encontra lugar em nossa vida.